Introdução
O tratamento das queimaduras graves permanece um dos grandes desafios da Medicina. Sua complexidade e gravidade tornam o tratamento do grande queimado uma atividade árdua que evolui dia a dia junto aos avanços da Medicina. Esse atendimento passou de uma atividade isolada do cirurgião geral para uma atividade multidisciplinar envolvendo diversas áreas médicas e não-médicas, recebendo contribuições da medicina intensiva, do maior conhecimento dos processos de cura das feridas e mais recentemente dos conhecimentos advindos da engenharia de tecidos.
Em alguns centros de tratamento de queimaduras, para que a mortalidade seja de 50% dos casos na faixa etária de 0 a 14 anos de idade é necessário que a queimadura atinja 98% da superfície corpórea.1 Porém, até mesmo nestes centros de excelência, as sequelas funcionais e não-funcionais decorrentes a queimaduras permanecem um problema com o qual os profissionais precisam lidar.
Muitos recursos, existentes há décadas, têm seu espaço garantido no tratamento dos pacientes queimados e de suas sequelas, mas novas alternativas surgem graças ao avanço da engenharia de tecidos ou terapias porluzes como o laser e luz pulsada.2,3
Definimos sequela de queimaduras como qualquer condição corporal anormal relacionada ou decorrente de uma queimadura. Entendemos como funcional as que levam a qualquer limitação da função e não-funcional quando ainda existe a sequela, porém não existe limitação da função, antigamente chamada de sequela estética.
As cirurgias da fase aguda do tratamento do paciente queimado é um dos momentos de maior vulnerabilidade às complicações e causadora de um grande estresse ao organismo.1 O adequado planejamento e execução cirúrgica ajudam a minimizar estes problemas além de diminuir as seqüelas funcionais e não-funcionais e a facilitar a reinserção do indivíduo na sociedade. No entanto o que notamos em nosso dia a dia é que a incidência de sequelas de queimaduras é cada vez maior. Provavelmente em decorrência da sobrevida dos pacientes na fase aguda que vem aumentando nos últimos anos.1,4,5 Não devemos negligenciar o fato das sequelas de queimaduras, funcionais ou não, decorrerem essencialmente de cicatrizes com má evolução, isto é, cicatrizes hipertróficas ou queloidianas. Portanto o tratamento realizado na fase aguda é o principal fator prognóstico para a existência das sequelas. Devemos ter em mente que queimaduras que cicatrizam com mais de 10 dias de existência têm 33% de chance de formarem cicatrizes hipertróficas, sendo que após 21 dias essa chance chega a 80%.6
Centros médicos com atividades acadêmicas (graduação, pós-graduação e/ou residência médica) têm necessidade de padronizar seus procedimentos para que as informações sejam passadas de maneira uníssona aos alunos, independentemente de quem as ministra. Assim a criação de algoritmos de procedimentos facilita o aprendizado, o desenvolvimento de protocolos e a sua replicação.
O tratamento das sequelas de queimaduras segue os princípios gerais da Cirurgia Plástica. Devemos ter como objetivo primordial sempre buscar restabelecer o sítio operado da maneira mais próxima possível ao seu estado natural. Como regra geral deveu adotar procedimentos que irão do mais simples ao mais complexo (Tabela I), em geral, sem pular etapas e perder a possibilidade de resolução de forma efetiva e simples. A ordem de atendimento das sequelas deverá obedecer aos aspectos funcionais primeiramente e posteriormente os aspectos estéticos, se possível alcançar os dois objetivos simultaneamente. Devemos sempre considerar que a principal causa das sequelas é a falta de tecidos, o que é frequentemente subestimado durante o pré-operatório e em geral secundário a cicatrizes patológicas ativas ou antigas, quando já não podemos identificar a cicatriz patológica. Retalhos locais devem ser sempre que possível utilizados, eles apresentam mesma cor, textura, espessura e não sofrem contração. Já os enxertos são menos previsíveis em seu resultado. Na face apresentam bons resultados por serem finos e manterem a mímica facial, no entanto devem ser realizados sempre que possível nas unidades estéticas faciais (Fig. 1).
Devemos realizar o máximo de tratamentos em um mesmo ato cirúrgico, isto diminui o tempo de tratamento, acelera a recuperação e diminui o número de anestesias ao qual o paciente é submetido. As cicatrizes devem ser sempre que possíveis colocadas nas linhas de repouso da pele, as chamadas linhas de Langer (Fig. 2), isto fará com que o aspecto final da cicatriz seja melhor e menos aparente. Técnicas complementares não cirúrgicas devem ser sempre lembradas para complementar os resultados. As principais são cosmiatria, maquiagem, infiltração de corticosteróides, tatuagem e próteses.
Sempre devemos respeitar a opinião e as necessidades do paciente e insistir na plena compreensão do paciente sobre os procedimentos e suas limitações, em geral maior que o imaginado pelos pacientes, caso isto não ocorra poderá ocorrer uma decepção seguida de frustração, o que acabará por abalar a relação de confiança entre o médico e o paciente.
O momento correto de se atuar no tratamento de uma sequela é variado, dependerá da gravidade da sequela e das consequências que esta sequela está causando. Quando possível, devemos aguardar a fase de maturação das cicatrizes para intervir, neste momento, já é conhecido o estado final da lesão, podendo, portanto, tratar por completo a sequela. Quando a sequela apresenta lesão severa e impeditiva das funções vitais normais, deve ser tratada precocemente, sabendo-se que nesta fase as cicatrizes não estarão maduras e poderá haver perda dos resultados alcançados devido a evolução da cicatriz ainda não madura. Pode ocorrer ainda, devido ao processo inflamatório em geral intenso, sangramento mais abundante durante o procedimento, tornando-o mais difícil e de maior risco ao paciente.
Preferencialmente devemos realizar suturas por planos, no mínimo dois ou três planos, com a função de perfeitamente coaptar os planos teciduais e diminuir as tensões na linha de sutura, como frequentemente temos o alargamento das suturas externas, estas devem ser sempre que possível intradérmica, assim, evitamos as marcas dos pontos simples que invariavelmente aparecem nestes pacientes.
Não devemos esquecer que sempre ou quase sempre, nossos pacientes tendem a evoluir com cicatrizes de má qualidade, processos inflamatórios intensos e que respondem de maneira pobre aos tratamentos. Nossas cirurgias ocorrem em geral em pacientes difíceis, partimos de um início difícil ou eles não teriam desenvolvidos sequelas que necessitam tratamento cirúrgico.
O objetivo deste estudo é apresentar o algoritmo de atendimento a pacientes com sequelas de queimaduras funcionais ou não do ambulatório de sequela de queimaduras da Divisão de Cirurgia Plástica da Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo ( São Paulo - SP - Brasil) para que o raciocínio cirúrgico dos alunos seja sistematizado e os resultados do tratamento das sequelas de queimaduras melhorados.
Material e métodos
Foram analisados 640 prontuários de pacientes em acompanhamento ambulatorial no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e 1100 cirurgias realizadas nestes últimos 5 anos. Baseada nesta experiência e nestes pacientes é que fizemos este algoritmo.
Dos pacientes em acompanhamento 78% das queimaduras decorreram de acidentes domésticos, sendo 40% em decorrência do álcool líquido.
As cirurgias mais frequentemente realizadas foram o tratamento de contraturas, 52% dos pacientes, sendo o pescoço (28.5%) e axila (22.2%) os locais mais acometidos. As cirurgias mais realizadas foram ressecção parcelada de cicatriz (18%), liberação de retração cicatricial com retalho local (32.5%), ressecção e enxertia de pele para liberação de retração cicatricial (21.6%) expansor de pele (15.2%).
Os principais tipos de procedimentos realizados no tratamento das sequelas são apresentados na Tabela II.
Ressecção e sutura de cicatriz | É o procedimento mais simples. É a simples ressecção e sutura borda a borda da lesão. Nem sempre é possível realizar a ressecção completa da lesão em etapa única, nestes casos realizamos ressecções parceladas.5,7 |
Expansor de pele | É o procedimento onde se reduz a quantidade de cicatrizes. Traz grande satisfação aos pacientes mas demanda grande colaboração deles. Apesar de ser um procedimento simples, a escolha do expansor e a sua colocação apresentam curva de aprendizagem com complicações, deiscência da sutura após a sua colocação e distorção das estruturas normais. |
Retalho local | É o método de eleição para tratamento de bridas e pequenas retrações. O retalho local mais utilizado é a plástica em "Z " com ângulo de 60º e as suas combinações, entre elas as sequências de "Z " e duplo retalho em "Z " oposto. Simples de ser executado pode ser realizado até mesmo em áreas queimadas, tomando-se o cuidado de se preservar ao máximo a irrigação dos retalhos através de descolamentos mínimos e retalhos espessos.5,7 |
Matriz de regeneração dérmica | Devido ao preço e curva de aprendizado longa, não deve ser considerado como primeira opção. Apresenta vantagens, especialmente quanto a sequela da área doadora do enxerto definitivo, mas também apresenta desvantagens como incidência de complicações devido a curva de aprendizado, infecção, perda da matriz, não integração do enxerto de pele definitivo e retração. Atualmente realizamos rotineiramente o curativo com pressão negativa sobre a matriz como maneira de apressar a internação, melhorar o conforto e aumentar a integração da matriz no leito.7,8 |
Enxerto de pele | No tratamento de sequelas de queimaduras utilizamos sempre enxertos em lâminas. Apresenta como principais vantagens em relação ao enxerto em malha, o melhor resultado estético (textura e pigmentação), melhor resultado funcional, menor taxa de cicatrizes patológicas (cicatrizes hipertróficas e queloidianas) e menor quantidade de cicatrizes, apenas nas emendas. Na face utilizamos sempre que disponível enxerto de couro cabeludo.7, 9, 10, 11, 12, 13 |
Retalhos expandidos | Em algumas situações os retalhos são as melhores indicações para a reconstrução, como a reconstrução das mamas, mas muitas vezes a área doadora não é suficiente, neste tipo de situação, realizamos a combinação do retalho com a sua prévia expansão. Apesar de trabalhoso, os resultados são bons, seguros e consistentes. No entanto, requer curva de aprendizado tanto do retalho quanto do expansor.2,5 |
Retalhos microcirúrgicos | Utilizado em casos complexos quando não resta mais nenhuma opção de reconstrução e a alteração funcional é severa. Os mais comumente utilizados são o retalho lateral da coxa, o TRAM e o grande dorsal.7,14, 15, 16 |
Implante de cabelo | Utilizado como primeira opção na reconstrução do supercílio. Apresenta resultados excelentes, tendo como desvantagens a necessidade de se realizar duas ou três sessões para apresentar aspecto cheio e natural e a necessidade de se cortar constantemente o pelo, pois ao contrário do pelo original do supercílio o cabelo continua a crescer.5,7 |
Laser ou luz pulsada | A terapia por luz orientada torna as cicatrizes mais finas e com aspecto melhor, pois coagula os excessivos vasos sangüíneos presentes no local da cicatriz o que diminui a vermelhidão. |
Infiltração de corticosteroide | A rotina é a infiltração de triancinolona na concentração de 20 mg/ml. A aplicação é realizada intralesional, logo abaixo da superfície, evitando o subcutâneo. A aplicação é repetida a cada mês e em geral são necessárias três aplicações para se ter resultado. |
Cosmiatria | O arsenal de recurso utilizados na cosmiatria aumenta dia a dia. Os recursos mais comumente utilizados são: clareadores, triancinolona associada a ácidos glicólico e retinóico; ácidos glicólico e retinóico; pulse dye laser e luz pulsada. |
Tratamento da área doadora | Utilização de filme de poliuretano aplicado diretamente sobre a área e protegido ou não por um curativo secundário de gaze de queimado e faixa crepe. Apresentacomo vantagens em relação a outras técnicas, menos dor, menor necessidade de troca de curativos, melhor higiene pessoal (banho).17 Como desvantagem, dificuldade de aplicação em certas regiões, formação de coleções. |
Compressão | Todos os pacientes submetidos a enxerto de pele, tanto autógeno como associado com matriz de regeneração dérmica, são tratados com malhas compressivas na área receptora do enxerto quanto na área doadora do enxerto, por um período que varia de poucos meses a anos. O critério de utilização depende de cada caso, mas está relacionado ao processo inflamatório do local. |
Tatuagem | Estamos a cada dia utilizando mais o recurso da pigmentação definitiva ou tatuagem, nossas principais indicações são aréola do complexo areólo papilar, supercílio e áreas com cabelo ralo em couro cabeludo, nestes dois últimos, como método complementar para preencher a pouca quantidade de folículos pilosos. |
O raciocínio desenvolvido neste algoritmo se baseia no diagnóstico inicial que classifica as sequelas de queimaduras funcional ou não-funcional (Fig. 3).
O tratamento tem início com a seguinte pergunta: “É possível tratar ou melhorar a sequela com fisioterapia ou terapia ocupacional?” (Fig. 4). Se a resposta for afirmativa, o paciente é encaminhado, podendo retornar ainda como uma sequela funcional ou passar a ter uma sequela não funcional (Fig. 5). Na maioria dos casos coexiste a sequela funcional e a não-funcional, nestes casos, damos preferencia para tratar inicialmente a funcional.
Nos pacientes em que não é possível o tratamento com fisioterapia ou terapia ocupacional, o tipo de sequela deve ser identificado (brida ou sinéquia). No caso das bridas, o tratamento é realizado com a utilização de retalhos locais; o mais comumente utilizado é a plástica em “Z” (Fig. 6).
Se a sequela for uma sinéquia ou uma retração, a sua liberação será realizada prioritariamente com enxertia de pele espesso (Fig. 7).
Se não for possível a liberação com enxerto de pele, por exemplo, já foi enxertado e teve resultado ruim ou ainda, não há área doadora de qualidade para doar enxerto, optamos por utilizar matriz de regeneração dérmica, desde que possamos completar o tratamento com enxerto fino, caso contrário, realizamos retalho de pele de transposição ou a distância (microcirúrgico) (Fig. 8).
Após esta fase o paciente passa a ser tratado como possuidor de sequelas não-funcionais (Fig. 9). Nesta fase, a primeira pergunta é, “o que se quer com a cicatriz, melhorá-la?”; se a resposta for sim, o paciente é encaminhado ao tratamento cosmiátrico (Fig. 10). No caso do objetivo ser a redução da cicatriz, realizaremos ressecções parceladas, enquanto conseguimos melhora, pois em algum momento, ainda que seja possível a ressecção parcelada da cicatriz, ela voltará a alargar e o resultado será perdido (Fig. 11).
Na impossibilidade de se realizar a ressecção parcelada, optamos, sempre que possível, pela colocação de expansor de tecidos. Repetimos o processo até atingir o objetivo (Fig. 12 y 13).
Quando não é possível o uso dos expansores de tecidos, utilizamos o enxerto de pele de espessura média com ressecção de toda área a ser tratada até atingirmos tecido são (sem fibrose) (Fig. 14).
Nos pacientes em que há escassez de área doadora, utilizamos matriz de regeneração dérmica. Neste caso, o enxerto poderá ser fino. Deve-se retirar todo o tecido cicatricial sem que nenhuma fibrose permaneça no leito (Fig. 15).
Resultados
Dos 640 pacientes em acompanhamento foram realizadas 1100 cirurgias distribuídas conforme Gráfico 1. A distribuição de cirurgias realizadas em nosso serviço entre 2014 e 2018 (média de 1.71 cirurgias por paciente) baseada na aplicação do algoritmo proposto, está apresentada na Tabela III e Gráfico 2.
Procedimento | Nº. de cirurgias | % do total de cirurgias |
---|---|---|
Ressecção do tecido cicatricial | 290 | 26.4% |
Ressecção com fechamento primário | 198 | 18% |
Ressecção e enxertia | 70 | 6.4% |
Ressecção e retalho local | 22 | 2% |
Liberação de brida | 526 | 47.8% |
Liberação e retalho local | 180 | 16.3% |
Liberação e plástica em Z | 179 | 16.2% |
Liberação e enxertia | 167 | 15.2% |
Expansor (inserção ou retirada) | 129 | 11.7% |
Implante capilar | 43 | 4% |
Revisão de cicatriz inestética | 52 | 4.7% |
Infiltração de corticóide | 25 | 2.2% |
Troca de curativo | 11 | 1% |
Outros | 23 | 2.1% |
TOTAL | 1100 | 100% |
Discussão
Em razão da dificuldade no tratamentodas sequelas de queimaduras desenvolvemos um algoritmo onde se tornasse fácil o ensino dos conceitos e do raciocínio lógico (Fig. 16). A padronização dos procedimentos e das condutas, tornou o atendimento de sequelas de queimaduras reprodutível, de fácil compreensão por parte dos cirurgiões plásticos e ainda melhoraram os resultados. Desta maneira, acreditamos que a formação acadêmica se torna mais fácil e efetiva.
As principais mudanças destes últimos anos foram o aumento do número cirurgias com expansores de tecidos, o uso mais frequente fez com que conseguíssemos resultados antes tidos como improváveis, como áreas em face e membros inferiores e superiores. Ocorreu ainda, uma solicitação espontânea por parte dos pacientes que em contato com outros, passaram a questionar quanto a possibilidade de utilizar este método de tratamento. Houve também o aumento do uso de matriz de regeneração dérmica, em função da maior disponibilidade do material, além da melhora resultados, certamente contribui para isto o melhor entendimento da técnica por parte dos cirurgiões como o uso do sistema de pressão negativa sobre as matrizes.
Uma das primeiras questões quando se propõe um algoritmo é a divisão das sequelas de queimaduras em funcional ou não funcional (estética). Entendemos que se tratando de pacientes vítimas de queimaduras, nunca se lida apenas com aquestão estética e sim com o não funcional, isto porque para se melhorar uma sequela do ponto de vista estético precisamos partir de uma situação normal, onde o corpo não apresenta cicatrizes ou outras lesões, situação esta inexistente nos pacientes vítimas de queimaduras. Neles estamos tentando reparar o estado original do paciente, uma situação de normalidade, similar a prévia ao evento ocorrido, independentemente de seu aspecto estético. Buscamos a forma original, igual a todos, sem as deformações ou desfigurações naturais nas queimaduras.7Infelizmente, ainda que a Medicina tenha evoluído muito nas últimas décadas, não conseguimos alcançar este objetivo. No máximo, diminuímos as seqüelas, aliviando retrações, melhorando a textura, cor e elasticidade e até mesmo escondendo ou disfarçando cicatrizes que por vezes são constrangedoras ao paciente. Desta maneira, só podemos falar em estética quando partimos de um estado de normalidade, sem sequela alguma envolvida.
A função é prioritária em nossa atividade, não podemos imaginar o retorno ao estado original sem termos uma função normal; assim, todo o tratamento se inicia tentando se restabelecer qualquer déficit de função que exista. Apenas após a obtenção do melhor resultado possível no restabelecimento da função, é que buscamos a melhoria dos aspectos não funcionais.Na maioria dos casos, ao tratarmos a sequela funcional já temos a oportunidade de melhorar o aspecto não-funcional, assim, conseguimos melhorar os dois aspectos relacionados a sequela de queimadura simultaneamente.
O tratamento das sequelas não consiste apenas em cirurgias, desta forma, devemos utilizarde atividades complementares como a terapia ocupacional, fonoaudiólogo, cosmiatria e psicologia. Em diversas ocasiões podemos ter resultados no tratamento de cicatrizes apenas com o uso de malhas compressivas, terapia ocupacional e cosmiatria que dispensam tratamento cirúrgico.
O terapeuta ocupacional quanto o fonoaudiólogo apresentam-se como parte integral da equipe multidisciplinar que presta assistência ao paciente queimado, tanto na fase aguda como na fase tardia. Nos pacientes com sequelas de queimaduras, eles deverão conversar com a equipe médica para saber o planejamento cirúrgico e, assim, traçar um plano de reabilitação que vise o retorno do paciente às suas atividades o mais rápido possível e com maior qualidade de vida. A parceria cirurgião-terapeuta representa um aspecto fundamental na orientação do paciente, pois promove a cooperação durante o tratamento e viabiliza a reabilitação no menor tempo possível.
Enquanto os pacientes aguardam pela cirurgia reparadora, o terapeuta ocupacional também poderá atuar através da confecção de adaptações que irão auxiliá-los na realização de suas atividades com maior independência e autonomia. Uma vez que a cirurgia reparadora tenha sido realizada, o terapeuta ocupacional deverá reabilitar os pacientes através da prescrição e confecção de órteses, visando a prevenção de novas incapacidades e o posicionamento adequado dos membros acometidos, controle cicatricial, e simulação e treino de atividades de vida diária (higiene, alimentação, vestuário), potencializando o regresso destes sujeitos às suas atividades de vida diária e de trabalho.
A cosmiatria através de tratamentos tópicos (cremes, lasers e luz pulsada) consegue mudar as características das cicatrizes e da pele. Sua atuação pode ocorrer durante o tratamento cirúrgico ou no final do tratamento, quando recursos cirúrgicos estão esgotados e ainda se deseja alguma mudança, como o clareamento da pele.
Bastante importante também é o atendimento psicológico que nos auxilia no relacionamento e nas expectativas relacionadas ao tratamento como um todo. Oferece escuta ao sujeito que sofreu queimaduras acompanhando, de acordo com o desejo de cada um e com seus recursos, que são únicos, a subjetivação da experiência traumatizante que é a queimadura. Em outros casos, identifica situações de crise (por exemplo, no pré-cirúrgico) e intervém para que haja elaboração da mesma.
Conclusão
O raciocínio médico padronizado é uma arma poderosa na obtenção de resultados consistentes na prática diária da Medicina. E os algoritmos são métodos auxiliares simples e eficazes neste sentido.
Em razão da dificuldade no tratamentodas sequelas de queimaduras desenvolvemos o algoritmo que apresentamos neste artigo, fácil e útil para ensino dos conceitos, a padronização dos procedimentos e das condutas, e para a melhoria dos resultados
Desta maneira também, acreditamos que a formação acadêmica se torna mais fácil e efetiva.