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Cirugía Plástica Ibero-Latinoamericana

On-line version ISSN 1989-2055Print version ISSN 0376-7892

Cir. plást. iberolatinoam. vol.37 n.3 Madrid Jul./Sep. 2011

https://dx.doi.org/10.4321/S0376-78922011000300006 

 

 

Reconstrução torácica. A experiência do Serviço de Cirurgia Plástica dos HUC - 1998-2008

Reconstrucción torácica. Experiencia del Servicio de Cirugía Plástica del Hospital Universitario de Coimbra 1998-2008

Thoracic Reconstruction. The HUC's Plastic Surgery Department experience 1998-2008

 

 

 

Ramos, S.*, Pinheiro, S.*, Diogo, C.**, Bernardo, J.***, Freire dos Santos, M.J.****

* Interno de Cirurgia Plástica
** Assistente Hospitalar de Cirurgia Plástica
*** Chefe de Serviço de Cirurgia Cardiotorácica
**** Chefe de Serviço de Cirurgia Plástica
Hospital Universitario da Coimbra. Coimbra. Portugal

Correspondência

 

 


RESUMO

A reconstrução torácica representa um desafio cirúrgico. Os defeitos são não só grandes mas frequentemente complexos, envolvendo a parede torácica em toda a sua espessura.
Os autores fazem uma revisão dos casos de reconstrução da parede torácica levados a cabo no período entre 1998 e 2008, pelo serviços de Cirurgia Plástica em colaboração com o serviço de Cirurgia Cardiotorácica.

Palavras chave: Defeito torácico, Reconstrução torácica, Retalho musculocutâneo.


RESUMEN

La reconstrucción de la pared torácica representa un desafío quirúrgico. A menudo, los defectos no son solo grandes, sino además complejos, afectando a todas las capas de la pared del tórax.
Presentamos una revisión de la casuística de pacientes sometidos a reconstrucción torácica en el Hospital Universitario de Coimbra, Portugal, en el periodo comprendido entre 1998 y 2008 en colaboración con el Servicio de Cirugía Cardiotorácica.

Palabras clave: Defecto torácico, Reconstrucción tórax, Colgajos músculocutaneos.

Código numérico: 5100-158332.


ABSTRACT

Thoracic reconstruction represents a surgical challenge. Often, the deffects are not only large, but also complex, involving all layers of the thoracic wall.
The authors reviewed the medical records of the patients who underwent thoracic reconstruction, operated in cooperation with the Cardiothoracic Surgery Department, between 1998 and 2008, in Coimbra University Hospital, Portugal.

Key words: Thoracic deffect, Thoracic reconstruction, reconstruction, Musculocutaneous flaps.

Numeral Code: 5100-158332.


 

 

Introdução

A reconstrução da parede torácica representa um desafio cirúrgico, requerendo por vezes a abordagem conjunta de diferentes especialidades, nomeadamente a Cirurgia Plástica e a Cirurgia Cardiotorácica.

Os defeitos com que o cirurgião se depara são por vezes complexos, não só em termos de dimensões mas também em termos de profundidade. Frequentemente há necessidade de reconstruir a parede torácica em toda a sua espessura atendendo à tridimensionalidade dos mesmos.

Este trabalho faz uma revisão da experiência conjunta dos serviços de Cirurgia Plástica e de cirurgia Cardiotorácica dos HUC na reconstrução torácica ao longo dos últimos 10 anos.

A parede torácica é a estrutura responsável pela protecção de órgãos vitais torácicos (coração, pulmões, grandes vasos) e abdominais superiores (fígado, baço e rins) (1).

Para além disso, desempenha um papel na função respiratória proporcionando uma armação flexível capaz de expansão durante a inspiração, permitindo a criação da pressão negativa necessária para a expansão pulmonar.

Os defeitos da parede torácica podem resultar de traumatismo, patologia tumoral (primária ou secundária), processos infecciosos (com ponto de partida externo-pós esternotomia, empiema, ou interno-fístulas broncopleurais), sequelas de radioterapia, ou ainda de defeitos congénitos (pectus excavatum, pectus carinatum, S. Poland, fendas esternais) (2)

Como princípios gerais da reconstrução torácica podem delinear-se os seguintes pontos (3):

1. Desbridamento adequado que permita a eliminação completa dos tecidos envolvidos pelo processo patológico

2. Obliteração de espaços mortos intratorácicos

3. Estabilização esquelética; apesar de não haver consenso, geralmente considerase indicada sempre que sejam ressecadas mais de 4 costelas ou quando o defeito criado é superior a 5 cm (1).

4. Cobertura adequada, levando em conta considerações funcionais e estéticas.

A selecção da técnica reconstrutiva depende da localização e tamanho do defeito.

Um outro aspecto que deve ser levado em conta prende-se com o estado global do paciente. A existência de comorbilidades associadas pode condicionar a opção terapêutica.

Do mesmo modo, devem ser ponderadas a morbilidade da zona dadora bem como a disponibilidade de tecido autólogo. Intervenções prévias podem limitar a escolha, como é o caso, por exemplo de uma toracotomia que limita a utilização de retalho musculocutâneo de grande dorsal.

Não é de mais realçar a importância de uma história clínica adequada bem como uma avaliação pré-operatória cuidada, focando não só aspectos locais-dimensões e profundidade do defeito, mas também globais (função cardíaca, pulmonar, antecedentes, etc.)

De entre as opções de cobertura disponíveis, as mais frequentemente utilizadas são os retalhos musculares ou miocutâneos regionais (1,4): Pectoralis major, Latissimus dorsi, Rectus abdominis, Serratus anterior, Trapezius.

Retalhos perfurantes locais (retalho perfurante da artéria toracodorsal, retalho das perfurante das artérias intercostais) podem ser considerados como uma opção terapêutica válida quando não estão presentes cavidades nem espaço morto (5).

A utilização de retalhos livres é rara e geralmente reserva-se para casos em que as opções regionais não estão disponíveis ou já foram usadas.

A estabilização esquelética da parede prende-se com a necessidade de restaurar as funções mecânica e funcional da parede torácica, postas em causa sempre que os defeitos criados atingem as dimensões já referidas anteriormente.

Dispomos para isso de diferentes opções.

O material autógeno pode tratar-se de enxertos ósseos (costela), fascia ou grandes retalhos musculares. Estes grandes retalhos são capazes de estabilizar grandes defeitos da parede torácica, evitando movimentos paradoxais, especialmente num contexto de tórax irradiado, pela rigidez sequelar dos tecidos.

Quanto aos materiais sintéticos, são também várias as opções disponíveis: Politetrafluorotileno: Gore-tex®, Polipropileno: Prolene®, Marlex®, Rede mista de Marlex® e metacrilato.

O método inicial de reconstrução recorria à técnica sandwich combinando uma rede de polipropileno com cola de metacrilato. Deve ter-se em atenção que a cola de metacrilato está sujeita a uma reacção exotérmica enquanto solidifica pelo que se deve ter cuidado com a sua aplicação. Por outro lado também tem sido associada a casos de acidose sistémica.

Atendendo a estes efeitos, muitas instituições optaram por substituir a rede mista por uma rede simples de polipropileno, obviando assim a utilização do metacrilato. A rede de polipropileno não é contudo a solução ideal uma vez que tem uma tendência para a fragmentação, e, se infectada, é bastante difícil de remover.

Actualmente, o material mais adequado parece ser o politetrafluoroetileno, apresentado na forma de rede de 2 mm de espessura (1).

Faremos de seguida uma breve revisão dos retalhos pediculados regionais à disposição para reconstrução da parede torácica.

O retalho de latissimus dorsi, seja nas variante muscular pura, seja na variante miocutânea é de grande utilidade na reconstrução da parede torácica.

A sua vascularização e arco de rotação conferem-lhe grande versatilidade na reconstrução de defeitos da linha média anterior e posterior, defeitos paramedianos ou para transposição intratorácica.

De acordo com a classificação de Mathes e Nahai, pertence ao grupo V. Tem portanto um pedículo dominante que é a artéria toracodorsal e pedículos acessórios constituídos pelas perfurantes intercostais e lombares.

Se baseado nos pedículos acessórios, é usado como retalho turnover, permitindo assim a cobertura de defeitos posteriores.

Quando baseado no pedículo toracodorsal, o arco de rotação permite que alcance zonas a distâncias consideráveis, sendo então usado em defeitos anteriores e laterais.

À semelhança do anterior, o retalho de pectoralis major, englobado no grupo V da classificação de Mathes e Nahai, permite retalhos musculares puros ou com palette cutânea associada.

O pedículo dominante é a artéria toracoacromial. Os pedículos acessórios são constituídos pelas perfurantes paraesternais da torácica interna.

Utilizado como retalho turnover, baseado nos pedículos acessórios, tem aplicação na cobertura de defeitos da linha média anterior.

Se baseado no pedículo dominante pode cobrir defeitos anteriores e da linha média.

Este retalho tem a vantagem de apresentar, do ponto de vista funcional, uma morbilidade mínima da zona dadora.

O músculo rectus abdominis enquadra-se no grupo III da classificação de Mathes e Nahai. Tem dois pedículos capazes de, por si só suportarem o retalho. São eles a artéria epigástrica superior (art. torácica interna) e a artéria epigástrica inferior (art. ilíaca externa). Na reconstrução torácica, utilizando retalhos pediculados, o pedículo escolhido é o da artéria epigástrica superior.

A utilização deste retalho permite a escolha de uma palette cutânea vertical ou horizontal (TRAM).

Tem aplicação na cobertura de defeitos da linha média ou anterolaterais.

O maior óbice à sua aplicação prende-se com a morbilidade significativa da zona dadora. A fraqueza da parede abdominal pode condicionar o aparecimento de hérnias.

O retalho de trapezius tem aplicação na cobertura de efeitos da região cervical posterior e linha média posterior.

Pode utilizar-se nas variantes muscular ou musculocutânea.

Tem um pedículo dominante-ramos descendente da artéria cervical transversa e pedículos minor acessórios (tipo II)

O serratus anterior é usado apenas para reconstrução de defeitos intratorácicos. É um músculo de tipo III; um dos pedículos é um ramo proveniente da artéria toracodorsal e o outro é proveniente da artéria torácica lateral (6).

A utilização de epiplon está justificada quando há necessidade de preenchimento de espaço morto, graças à sua grande superfície e maleabilidade. O facto de ser um tecido muito vascularizado e rico em células de propriedades imunológicas, torna-o uma opção atraente quando nos deparamos com leitos pouco vascularizados.

Pode ser baseado nas artérias gastroepiploicas direita ou esquerda.

Tem a desvantagem de obrigar a uma laparotomia para a colheita, acrescentando morbilidade ao procedimento (7).

 

Material e método

No período compreendido entre 1998 e 2008 foram operados 14 doentes em articulação com o Serviço de Cirurgia Cardiotorácica, 10 doentes eram do sexo masculino. A idade média dos doentes foi de 56,1 anos (mínima 41 e máxima 71).

 

Resultados

A etiologia mais frequente foi a neoplásica (10 casos), seguida da infecciosa (4 casos).

Relativamente às situações de etiologia tumoral, verificaram-se 3 casos de tumores benignos (1 caso de tumor fusocelular peitoral, 1 caso de lipoma da região peitoral e um caso de fibromatose da parede torácica anterior)

Entre os tumores malignos, 4 eram primários e 3 eram secundários.

Nos tumores primários registaram-se 1 caso de lipossarcoma de baixo grau da parede torácica anterior, 1 caso de condrossarcoma da omoplata, 1 caso de carcinoma pleomórfico da parede costal e um caso de tumor mixoide infraclavicular. Os tumores secundários corresponderam a metástase de osteossarcoma (1 caso), a metástase torácica de carcinoma epidermoide brônquico (1 caso) e a metástase esternal de angiossarcoma do mediastino (1 caso).

Nos casos de origem infecciosa, registaram-se 3 fístulas esternocutâneas, 2 pós bypass e 1 pós traumatismo. O último caso tratava-se de doente com antecedentes de tuberculose pulmonar com um piopneumotórax crónico que tinha sido abordado por toracostomia que não foi possível encerrar directamente (Tabla I).

 

Todos os doentes foram tratados com retalhos musculocutâneos pediculados regionais. O latissimus dorsi foi usado em 7 casos, o pectoralis major em 3 casos e o rectus abdominis com ilha cutânea vertical em 4 casos.

Em 6 doentes (3 casos de reconstrução com retalho de latissimus dorsi e 3 casos de retalho de rectus abdominis de ilha vertical), para além da realização de um retalho musculocutâneo, foi também efectuada uma toracoplastia com prótese de polipropileno. (Fig. 1-2).

 

Não se registaram complicações major nos casos estudados. Num dos doentes houve uma deiscência parcial da ferida operatória da zona dadora de um grande dorsal que foi resolvida com um autoenxerto de pele.

 

Discussão

A reconstrução da parede torácica pode revestir-se de um certo grau de complexidade; frequentemente requer uma abordagem multidisciplinar do doente, tanto em termos de preparação pré-operatória, como durante a cirurgia propriamente dita (9). A casuística apresentada reflectiu este aspecto, sendo a totalidade das cirurgias efectuadas resultado de uma boa articulação entre os serviços de Cirurgia Cardio.torácica e Cirurgia Plástica.

As opções terapêuticas eleitas na revisão de casos que foi feita recaíram sobre a utilização de retalhos musculocutâneos locais, recorrendo, quando que necessário, à utilização de material sintético sempre que tal se revelou indispensável para assegurar a estabilização da parede torácica. Estes dados estão de acordo outras séries publicadas na literatura. (3,8,9).

Os retalhos musculares pediculados regionais constituem actualmente o gold standard na reconstrução de defeitos complexos da parede torácica (8).

Pelo seu considerável volume e robustez permitem a protecção de órgãos nobres e a obliteração de espaço morto. Proporcionam também uma cobertura adequada de material sintético se este tiver sido utilizado.

O facto de apresentarem uma vascularização sólida e fiável torna-os interessantes no sentido em que podem combater a infecção e estimular a cicatrização.

As desvantagens desta opção terapêutica prendemse essencialmente com a morbilidade da zona dadora e com a duração da intervenção cirúrgica. Ambos podem ser relevantes num contexto de um doente frequentemente debilitado do ponto de vista global.

A experiência do autor sénior deste trabalho mostra que estes retalhos musculares regionais são uma opção fiável e segura, o que se demonstra pelos resultados até agora obtidos (ausência de complicações major e resolução do defeito torácico).

 

Conclusão

Os defeitos da parede torácica podem revestir-se de um elevado grau de complexidade, obrigando à colaboração de múltiplas especialidades no seu tratamento. Entre as opções cirúrgicas mais frequentemente usadas destacam-se os retalhos musculares pediculados regionais.

 

 

Correspondência:
Dra. Sara Castendo Ramos
Servicio de Cirugía Plástica
Hospital Universitario de Coimbra
Praceta Mota Pinto, 3000 Coimbra, Portugal
e-mail: sara.ecr@gmail.com

 

 

Referência

1. Knoetgen, J., Jonhson, C., Arnold, P.,: Reconstruction of the chest, in Mathes' Plastic Surgery, Philadelphia, Elsevier, 2006, Pp: 411-456.         [ Links ]

2. Weinzweig, N., Weinzweig, J,: Chest wall reconstruction, in Plastic Surgery Secrets, Philadelphia, Hanley and Belfus, 1999, Pp: 336-340.         [ Links ]

3. Cohen, M. Ramasastry, S.,: Reconstruction of complex chest wall defects. The American journal of Surgery, (1996) 172: 35.         [ Links ]

4. Brown D, Borschel G,: Michigan Manual of Plastic Surgery, Lippincott Williams & Wilkins, Philadelphia, 2004, Pp: 334-348.         [ Links ]

5. Blondeel, P., Morrison, C.,: Chest wall reconstruction, in Perforator flaps, St. Louis, Quality Medical Publishing, 2006, Pp: 853-866.         [ Links ]

6. Masquelet A, Gilbert A,: An Atlas of Flaps in Limb Reconstruction, Dunitz, London, 1995, Pp: 203-240.         [ Links ]

7. Aston S, Beasley R, Thorne C,: Grabb and Smith Plastic Surgery, 5th edition, New York: Lippincott-Raven, Pp:1023-1030.         [ Links ]

8. Wiesner et al,: Reconstruction of complex and unusual defects of the thoracic wall. Eur J Plast Surg. (1993) 16:118.         [ Links ]

9. Lasso, J. M., et al,: Reconstrucción de defectos torácicos de espesor total. Presentación de 8 casos de especial complejidad. Cir. plást iberolatinoam. 2009, 35 (4): 249.         [ Links ]

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