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Enfermería Global

On-line version ISSN 1695-6141

Enferm. glob. vol.10 n.22 Murcia Apr. 2011

 

ADMINISTRACIÓN - GESTIÓN - CALIDAD

 

O enfermeiro frente ao paciente fora de possibilidade terapêutica: dignidade e qualidade no processo do morrer

El enfermero frente al paciente sin posibilidad terapéutica: dignidad y calidad en el proceso de la muerte

 

 

De Oliveira Furtado, A.M.*; Silva de Souza, S.R. de O.**; Da Silva Ramos, J.***; Ferreira, M. de C.A.****

*Enfermeira. Especialista em Nefrologia.
**Enfermeira. Chefe da unidade de Terapia Intensiva do Hospital Pedro Ernesto.
***Enfermeira da Unidade semi-intensiva do Hospital Pedro Ernesto.
****Enfermeiro. Especialista em Terapia Intensiva. Rio de Janeiro. Brasil.

 

 


RESUMO

Trata-se de uma pesquisa de caráter descritivo de abordagem qualitativa, tendo como base a percepção e preparo do enfermeiro frente ao paciente fora de possibilidade terapêutica. Os dados permitiram observar que há uma preocupação por parte dos entrevistados com o preparo para lidar com a morte e o morrer, fato este que ainda sofre muitas limitações. Apesar destas o cuidado é a única prática que não cessa diante das diversas situações em que o paciente se encontra.

Palavras chave: Enfermeiro; Paciente fora de possibilidade terapêutica; Dignidade/qualidade no morrer.


RESUMEN

Se trata de una investigación de carácter descriptivo de enfoque cualitativo, basado en la percepción y la preparación del enfermero frente al paciente sin posibilidad terapéutica. Los datos permitieron notar que existe una preocupación de los entrevistados con la preparación para lidiar con la muerte y el morir, hecho que aún posee muchas limitaciones. Pese a ello, el cuidado es la única práctica que no termina frente a las distintas situaciones en las cuales el paciente se encuentra.

Palabras clave: Enfermero; Paciente sin posibilidad terapéutica; Dignidad/calidad en el morir.


ABSTRACT

This is a descriptive character search with a qualitative approach based on the perception and preparation of the nurse faced with patients for whom there is no therapy possible. The data reveal that there is a concern on the part of interviewees with preparedness to deal with death and dying, an area that still suffers many limitations. Nevertheless, care is the only practice that does not end with the various situations in which patients findthemselves.

Key words: Nurses, Patient outside possibility; Dignity/quality in die.


 

Introdução

Tradicionalmente, as unidades de terapia intensiva (Utis) destinam-se ao tratamento de pacientes graves, passíveis de recuperação ou em risco de vida, o que exige que a unidade seja dotada de recursos humanos e materiais. Portanto as Utis concentram recursos humanos e tecnológicos sofisticados, geralmente não disponíveis em outras áreas do hospital, proporcionando, assim, assistência considerada como uma das mais complexas do sistema de saúde1.

A Uti é um setor que alberga pacientes gravemente enfermos necessitando de cuidados especiais, dentre esses cuidados estão à preocupação com a qualidade da assistência. Qualidade esta que está diretamente relacionada com a satisfação ou a superação das expectativas do cliente, sendo ele o foco da atenção de toda a organização. Essa qualidade significa o envolvimento de todas as pessoas, desde a mais alta administração até o responsável pelas tarefas mais simples2.

Pensar em terapia intensiva implica depararmo-nos com a doença em alto nível de complexidade e com o limite entre a vida e a morte3. Um aspecto muito relevante para a equipe intensivista é o paradoxo vivido por esta. O Cti é um universo onde se somam tecnologia de ponta, conhecimento científico atualizado e competência técnica dos profissionais. Então ainda no imaginário, instala-se ali o poder de grandes decisões e do controle da vida e da morte, entretanto, o paciente no dinamismo do viver/morrer desmonta o ilusório de tudo controlar. É quando caímos da onipotência, frustração e "incompetência", em que a morte aponta o nosso limite, nossa finitude, o que pode nos levar a evitar o contato com o outro, e consequentemente consigo mesmo.

Mesmo diante das situações de difícil controle, o cuidado permanece, sendo o objeto de trabalho do enfermeiro; mas que a cura; portanto, ainda que não tenha esperanças de vida, da cura de uma doença, haverá cuidado a ser realizado. Somos cuida dores e no Cti vivenciamos de perto a cura e o cuidado; cuidado este que "cura", considerando cura como a integração das várias partes da pessoa que ficaram fragmentadas com o adoecimento. É a presença humana que torna a profissão imprescindível,essencial e que jamais será substituída por máquinas3. Cuidar é um ato individual.

Este objetiva analisar a percepção do enfermeiro frente ao paciente fora de possibilidade terapêutica na Unidade de Terapia Intensiva, levantar as principais ações dos enfermeiros acerca da morte na sua prática diária e discutir os aspectos relevantes no preparo do enfermeiro diante do processo do morrer.

 

Metodologia

Trata-se de uma pesquisa de caráter descritivo, com abordagem qualitativa, o objeto deste estudo tem como base a percepção e preparo do enfermeiro frente ao paciente fora de possibilidade terapêutica. Estudo realizado em um Hospital Universitário do Município do Rio de Janeiro.

Os dados foram coletados com a aplicação de um instrumento construído a partir dos objetivos propostos através de um questionário semi-estruturado com questões abertas e fechadas. Os sujeitos submetidos a este foram todos os enfermeiros da Unidade Intensiva deste mesmo hospital.

Neste estudo foram respeitados os preceitos éticos da resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde que trata de diretrizes sobre pesquisas envolvendo seres humanos.

O tratamento dos dados qualitativos foi analisado de forma categorizada, dando ênfase às falas dos sujeitos mais freqüentes e de maior relevância para pesquisa.

 

Resultados e discussão

A amostra foi composta por 18 enfermeiros que compõem o quadro de funcionários do setor de Terapia Intensiva de um hospital universitário do horário diurno e noturno. Foram agrupados de 1 a 18, antecedidos pela letra E. No primeiro momento será descrito o perfil dos participantes no que diz respeito à idade e tempo de formado fazendo uma comparação com o momento em que tiveram preparo para lidar com a morte.

 

A morte é um evento que acompanha a vida profissional de todo enfermeiro, evidenciando que se deve ter um preparo para tal situação. Dos 18 entrevistados, apenas 4 (22,2%) relataram que tiveram um preparo durante a graduação, 6 (33,3%) negaram qualquer preparo, 6 (33,3%) passaram a ter o contato com a situação já no ambiente de trabalho, 1(5,6%) diz que foi através da educação familiar e 1 (5,6%) relata que foi da própria vivência. Isso nos traz um desfio: preparo profissional, evitando inseguranças e estresse emocional diante da situação. Foi possível constatar que não há muita diferença dos enfermeiros formados há muito tempo (superior a 10 anos), em comparação com os recém formados (inferior a 10 anos) em relação no preparo diante da morte e do morrer. Tal fato evidencia que não houve mudanças significativas na formação dos futuros "enfermeiros" diante desta situação.

Embora boa parte dos enfermeiros não tivesse preparo para lidar com a morte, muito deles vêem como um processo natural com um percentual de 61,1%(11) devido seu preparo que acontecera no ambiente de trabalho.

No entanto isso não quer dizer que o enfermeiro é um ser "frio", mas que buscou meios adaptativos para lidar com as mais diversas situações. Podemos confirmar ou confrontar algumas delas conforme a fala dos sujeitos:

E12: "Apesar de achar a morte um processo natural, no fundo espera-se que o paciente melhore e retorne para sua casa"/

E13: "Vejo como um descanso, principalmente quando há sofrimento/

E16: "Mesmo achando natural para pacientes críticos, não aceito a morte". É preciso apoio espiritual e psicológico"/

E10: "Consigo restringir ao meu trabalho, sem levar para casa ou ficar abalada".

Outros consideram um processo desgastante 16,7%(3), ver em Gráfico 1. No ambiente terapêutico da UTI, inúmeros procedimentos são realizados diariamente, pacientes com risco de morte ou fora de possibilidade terapêutica favorecendo muitas vezes o estresse dos profissionais, porém, a equipe de saúde busca proporcionar, através de seu desempenho, um trabalho de qualidade5.

 

E5: "Estressante, porém faz parte do nosso trabalho"/

E15; "Pode parecer que somos frios,mas esta situação nos coloca diante de dilemas familiares vividos ou que iremos vivenciaf.

Em 11% (2) representam os que consideram ser um momento em que se sentem muito tristes (Gráfico 1).

E6: "Não é só pelo fato da morte de uma pessoa, mas todo sofrimento que envolve os familiares. O contato com eles é pior'

O discurso da nossa formação é de que o cuidado deve ser humanizado, mas o enfermeiro deve manter-se distante emocionalmente dos pacientes assistidos na unidade de cuidados intensivos. Diante dessa realidade, cabe a equipe multiprofissional sensibilizar-se para cuidá-lo de forma humanizada e individualizada, conduzindo a família acompanhante, favorecendo a formação do vínculo que se encontra fragilizado por este processo de hospitalização6.

O ser humano é singular e o profissional não deve ser visto como um caso a parte, alguns se sentem fracassados diante da morte com 5,6%(1). Além do sentimento de despreparo com 5,6%(1), refletindo na importância de atenção que deveria ser dada a essa temática. Acredita-se que o preparo profissional possa refletir numa assistência mais efetiva para o paciente e menos estresse para o profissional.

Na questão 3 que aborda se o enfermeiro acha importante o preparo para lidar com a situação de morte, 100% dos enfermeiros responderam que sim.

E1: "acho importante para a saúde mental. Deveria ser incluído na grade curricular"/

E6: "ajudaria as nossas emoções"/

E8: "ajudaria a entender que uma fase do processo de viver"/

E7: "é importante porque a faculdade não nos prepara"/ "para respeitar, tratar com dignidade, saber lidar com a família e consigo mesmo"/

E14: "porque atenderíamos com mais qualidade"

A enfermeira é o elo consistente de promover a compreensão da doença e o processo de morte, bem como tornar o evento mais controlável para o paciente e a família, devendo ser uma defensora da pessoa em fase terminal e trabalhar para garantir os direitos dessa pessoa, uma "morte tranquila" ou de morrer com dignidade7 Na nossa história de vida, na nossa concepção de mundo, de vida e morte. Com certeza muito mais que um profissional altamente competente, eficiente tecnicamente,o cliente fora de possibilidade terapêutica necessita de um ser humano conforte que cuide8,10.

A Tabela 2 (ver em anexo 3) mostra um ou mais mecanismos mais frequentemente utilizados pelos enfermeiros, denotando que cada um possui características singulares para lidar com o processo de morte, estando ele preparado ou não. E apesar das mais variadas situações adotadas, o cuidar foi à única prática que não cessou. O cuidado é um ato individual prestado constantemente pela enfermagem.

 

Conclusão

Os cuidados de enfermagem envolvem o fornecimento de conforto, manutenção da vida, atendimento das necessidades físicas e emocionais. O preparo do profissional para lidar com a morte e seus processos implica em criar estratégias, o qual na maioria das vezes é cursado de estresse emocional e desgaste mental para a equipe, paciente e familiar.

Com o estudo foi possível perceber que lutamos, ainda que sem preparo adequado, mas que oferecemos conforto e dignidade ao paciente fora de possibilidade terapêutica e lutamos como profissionais comprometidos com a necessidade do outro. Mas acima de tudo precisamos entender que ter preparo profissional não impede de nos sentirmos angustiados e tristes diante da situação.

Fica evidente que o cuidado-prática inerente ao enfermeiro é o único que não cessa diante das diversas situações em que o paciente se encontra.

Seria de grande valia para o paciente e aos profissionais de enferrmagem que o processo de morte/morrer fosse mais explorado durante sua formação.

 

Referências

1. Silva MCM, Sousa RMC. Aversão simplificada do therapeutic intervention scoring system e seu valor prognóstico. Rev. Esc. de Enfermagem-USP,2004;38(2):217-24.         [ Links ]

2. Knobel E. Terapia Intensiva: Enfermagem. São Paulo: atheneu, 2006.         [ Links ]

3. Silva LD. Cuidados ao paciente crítico: fundamentos para enfermagem. Rio de Janeiro: Cultura Médica,2.ed.,2003.         [ Links ]

4. Coll'iere MF. Promover a vida. Coimbra-sindicato dos enfermeiros portugueses,2. edição: Lidel,1999.         [ Links ]

5. Santos I et al. Enfermagem Assistencial no Ambiente Hospitalar: realidade, questões, soluções. São Paulo: Atheneu, vol.2, 2005.         [ Links ]

6. Chaves EMC, Falcão LM, Fialho AVM, Monteiro ARM, Silva L F. Humanização e tecnologia na unidade de terapia neonatal. Revista Nursing, 2007;10(113):467-470.         [ Links ]

7. Smeltezer SC, Bare BG. BRUNNER & SUDDARTH. Tratado de Enfermagem Médico-cirúrgica. 9a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002.         [ Links ]

8. Arruda EM, Gonçalves LH. A enfermagem e a arte do cuidar. Florianópolis: Univ. de Santa Catarina,1999.         [ Links ]

9. Rider JE. Enfermagem conteporânea: desafios, questões e tendências, 5.ed, Porto alegre: artmed,1998.         [ Links ]

10. Prado C, Santos SN. Reflexões sobre o processo de humanização da equipe de enfermagem. Nursing, 2008;11(119):189-194.         [ Links ]

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