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Enfermería Global

On-line version ISSN 1695-6141

Enferm. glob. vol.11 n.26 Murcia Apr. 2012

https://dx.doi.org/10.4321/S1695-61412012000200008 

DOCENCIA - INVESTIGACIÓN

 

A cefaléia e a saúde do trabalhador de enfermagem: análise de uma realidade

La cefalea y la salud del trabajador de enfermería: análisis de una realidad

 

 

Moraes Morais, E.*; Maciel Dutra, L.**; Fontana, R.T.***

*Enfermeira. Servidora Pública da Secretaria de Saúde da Prefeitura Municipal de Entre-Ijuis/RS/BR. E-mail: edinara_moraes@yahoo.com.br
**Enfermeira. Servidora Pública da Secretaria de Saúde da Prefeitura Municipal de Santo Ângelo/RS/BR.
***Enfermeira. Mestre e Doutoranda em Enfermagem pela UFRGS/RS/BR. Professora dos cursos de Graduação e Pós-Graduação da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões-Campus Santo Ângelo/RS. Brasil.

 

 


RESUMO

Trata-se de um estudo transversal que teve como objetivo verificar a prevalência da cefaléia em uma equipe de enfermagem de uma comunidade hospitalar do interior do Rio Grande do Sul/BR. A coleta dos dados foi feita mediante um questionário auto-aplicável, a todos os trabalhadores da equipe, perfazendo um total de 168 sujeitos. Os dados foram analisados mediante estatística descritiva, por meio da análise da distribuição de freqüência. A prevalência de cefaléia encontrada na população estudada foi de 98 %. O estresse foi citado como fator desencadeante em 68% dos questionários analisados e o tratamento farmacológico é utilizado por 86 % desta população. Enxaqueca e cefaléia tensional foram os tipos prevalentes. Os dados demonstram que a cefaléia pode ser considerada um importante agravo à saúde do trabalhador de enfermagem e, por isso, revelam a necessidade de investimentos em ambiência saudável para os mesmos.

Palavras chave: cefaléia; prevalência; equipe de enfermagem.


RESUMEN

Este es un estudio transversal que tuvo como objetivo determinar la prevalencia del dolor de cabeza en un equipo de enfermería en un hospital de la comunidad en el interior de Rio Grande do Sul. La recolección de datos se realizó mediante un cuestionario auto-administrado a todos los empleados del equipo, haciendo un total de 168 sujetos. Los datos fueron analizados mediante estadística descriptiva según el análisis de la distribución de frecuencias. La prevalencia de la cefalea en la población estudiada fue de 98%. El estrés fue citado como un factor desencadenante en el 68% de los cuestionarios analizados y el tratamiento farmacológico se utiliza por el 86% de esta población. La migraña y la cefalea tensional son los tipos predominantes. Los datos muestran que la cefalea puede ser considerada como un importante problema de salud pública del trabajador de enfermería y, por tanto, ponen de manifiesto la necesidad de inversiones en un ambiente sano para ellos.

Palabras clave: cefalea; prevalencia; equipo de enfermería.


ABSTRACT

This is a cross-sectional study aimed to determine the prevalence of headaches in a nursing team in a community hospital in inland Rio Grande do Sul/BR. Data collection was made by a self-administered questionnaire to all employees of the team, making a total of 168 subjects. Data were analyzed using descriptive statistics by analyzing frequency distribution. The prevalence of headaches found in the study population was 98%. Stress was cited as a trigger factor in 68% of the questionnaires analyzed and pharmacological treatment is used for 86% of this population. Migraine and tension headache were the prevalent types. The data show that headaches can be considered a major public health problem in nursing and, therefore, reveal the need for investments in healthy nursing environments.

Key words: headache; prevalence; nursing team.


 

Introdução

De acordo com a Lei Orgânica da Saúde do Brasil(1), em seu artigo 6o parágrafo 3o, a saúde do trabalhador compreende um conjunto de atividades que se destina, através das ações de vigilância epidemiológica e vigilância sanitária, à promoção, proteção, recuperação e reabilitação da saúde dos trabalhadores submetidos aos riscos e agravos advindos das condições de trabalho. O trabalho, entre outros, é considerado como um dos fatores determinantes e condicionantes da saúde e um importante campo para a aplicação das políticas que tenham como escopo a prevenção de agravos e a melhoria da qualidade de vida.

Dentre os problemas de saúde relacionados ao trabalho, destacamos a cefaléia como uma manifestação de diversas doenças ocupacionais constantes na lista das doenças relacionadas ao trabalho(2). Mesmo quando aparece isoladamente, como entidade primária e sem relação com outras doenças, constitui-se como um agravo importante à saúde do trabalhador, prejudicando sua capacidade laborativa.

A cefaléia é uma das manifestações dolorosas mais frequentes na humanidade, sendo experimentada praticamente por todos os seres humanos em alguma fase da vida. Como outras dores, funciona como um sinal de alerta que pode ser interpretado diferentemente em cada indivíduo de acordo com suas experiências dolorosas anteriores(3).

Estudos epidemiológicos têm sido realizados visando obter dados acerca das características da cefaléia em profissionais da saúde. Esses estudos demonstram que ela representa um significativo impacto na qualidade de vida dos trabalhadores, pois, além da dor, aparecem sintomas associados como dores no corpo e limitações físicas que comprometem a vida social, profissional e familiar. As crises variam na intensidade da dor, nos sintomas associados e na frequência das mesmas. Em geral, são mais comuns nas mulheres e possuem prevalência significativa na comunidade hospitalar, constituindo fator de absenteísmo. Contribuem para essa condição, além do estresse inerente ao trabalho, os baixos salários, a sobrecarga de trabalho, a dupla jornada, a diminuição das horas de sono para os trabalhadores noturnos, entre outros(4-6).

Em um estudo realizado em Fortaleza, junto a 22 trabalhadores de um hospital, a cefaléia aparece como o quarto sintoma relacionado ao trabalho, antecedido por distúrbios osteomusculares e desgaste físico(7).

Tanto os que participam do atendimento direto aos pacientes, quanto às equipes de apoio burocrático/administrativo ou técnico, sofrem dessa desordem com índices de prevalência significativos(4-6).

Inicialmente, podemos classificar as cefaléias como primárias quando não ocorrem em função de outra doença e secundárias quando se apresentam como um sintoma de uma condição patológica subjacente(8). As cefaléias primárias que ocorrem com maior freqüência são a enxaqueca e a cefaléia do tipo tensional(4-5). Dados de uma pesquisa junto a trabalhadores de um hospital demonstraram que, entre os portadores de dor de cabeça crônica 65,5% foram classificados como portadores de enxaqueca e 27,6 % como portadores de cefaléia do tipo tensional(5).

Baseando-se na prevalência apontada pelos estudos referentes ao tema e de acordo com os critérios da Sociedade Brasileira de Cefaléia(8), optou-se por caracterizar neste estudo, apenas os dois tipos de cefaléia de ocorrência mais frequente, ou seja a enxaqueca e a cefaléia tensional.

A enxaqueca é uma doença neurovascular na qual ocorrem crises repetidas de dores de cabeça com freqüência variável. A dor, geralmente, é hemicraniana, ou seja, envolve metade da cabeça, e está associada à náuseas, vômitos, desconforto com a exposição à luz e a ruídos altos, podendo durar até 72 horas. Pode ainda ser acompanhada por um conjunto de sintomas neurológicos, chamado de aura que compreende sintomas como escotomas cintilantes, falhas no campo visual, parestesias, entre outros(8).

Alguns pesquisadores atribuem a fisiopatologia da cefaléia à ocorrência de eventos vasculares, sendo a aura decorrente da vasoconstrição e a dor propriamente dita decorrente da vasodilatação(9-10). Também são consideradas alterações na bioquímica cerebral, incluindo desequilíbrios em neurotransmissores como a serotonina(8-10).

As crises leves podem ser resolvidas com medidas simples como sono e repouso, entretanto as crises moderadas ou graves necessitam de tratamento a ser prescrito pelo médico. O reconhecimento dos fatores desencadeantes das crises, por parte do próprio portador dos sintomas, pode ser necessário para possível afastamento ou redução da exposição aos mesmos(8).

A cefaléia tensional pode ser descrita como uma sensação de aperto, pressão ou peso, de localização bilateral, principalmente nas regiões occipital, frontal e apical, com intensidade leve ou moderada. Pode ser aliviada com relaxamento ou atividade física e não há sintomas associados. Na grande maioria das crises está associada a alterações emocionais, estresse psicossocial, tensão e ansiedade. Alterações bioquímicas e nos nociceptores, bem como contratura muscular regional são consideradas em estudos acerca da fisiopatologia deste tipo de cefaléia, entretanto não há consenso entre os pesquisadores(8).

Como o processo de cuidar envolve o estado de bem-estar, acredita-se que um profissional acometido por qualquer tipo de dor poderá ter dificuldades em desempenhar seu papel de cuidador com eficiência e eficácia. Negligenciando-se esta condição, há o consequente reflexo na vida pessoal, ocorrendo diminuição significativa da qualidade de vida do sujeito. Nesse sentido, é fundamental articularem-se ações de promoção da saúde do trabalhador como um mecanismo para a melhoria do atendimento de saúde em geral.

Sendo assim, o objetivo desta pesquisa consiste em verificar a prevalência de cefaléia entre a equipe de enfermagem em uma comunidade hospitalar.

 

Material e método

Pesquisa de abordagem quantitativa, do tipo transversal e descritiva, realizada em um hospital de médio porte localizado na região Noroeste do estado do Rio Grande do Sul(BR), no primeiro semestre de 2009. O hospital, no momento da pesquisa, contava com 176 leitos de internação nas seguintes clínicas: Centro Cirúrgico, Unidade de Terapia Intensiva adulto, Pediatria, Maternidade, Clínica Médica, Clínica Cirúrgica, Emergência, Pronto Atendimento e Banco de Sangue. A equipe de profissionais de constituía-se de 100 médicos, 19 enfermeiros, 162 técnicos e 20 auxiliares de enfermagem. O hospital possui atendimento por convênios, Sistema Único de Saúde e atendimentos particulares.

Participaram da pesquisa 19 profissionais enfermeiros e 143 técnicos/auxiliares de enfermagem, de uma população de 168 trabalhadores em atuação no hospital turno do dia, nas diversas unidades do hospital. Foram critérios para inclusão: pertencer ao quadro funcional do hospital em estudo; pertencer à equipe de enfermagem; aceitar participar. Não foi intenção do estudo classificar os dados por categoria profissional. Optou-se por incluir o auxiliar e o técnico de enfermagem na mesma categoria, considerando que na instituição pesquisada estes trabalhadores desempenham a mesma função, independente dos anos de estudo/grau de escolaridade.

Os dados foram coletados mediante um questionário auto-aplicável. O instrumento utilizado foi um formulário contendo perguntas fechadas relativas à semiologia da cefaléia, caso o sujeito manifestasse positivamente a ocorrência desse sintoma. Foi construído pelos pesquisadores, com alternativas simples, selecionando-se variáveis que atendessem à sintomatologia das diferentes classificações da cefaléia, de forma a sistematizar a análise, respeitando-se a literatura da área no que diz respeito às especificidades indispensáveis para a investigação da dor em adultos. O instrumento versou sobre a unidade em que o sujeito trabalhava, categoria profissional, ocorrência ou não de cefaléia, fatores desencadeantes, sinais e sintomas da dor e associados às crises, período do dia de maior ocorrência da dor, impacto da dor no cotidiano, intensidade da dor, frequência da dor, fatores contribuintes para o final das crises e terapêutica utilizada para o alívio da dor. Algumas perguntas permitiam mais de uma resposta.

Para a análise utilizou-se a estatística descritiva, mediante distribuição da frequência das variáveis.

Aos participantes foi oferecido um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, o qual foi assinado após concordarem com a participação. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética das Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões-campus Santo Ângelo(RS/BR) sob protocolo n.069-04/PPH/08.

 

Resultados

Apenas dois trabalhadores referenciaram não sofrer com a cefaléia, sendo, portanto, a prevalência deste agravo, na equipe de enfermagem, de 98 %, sendo que, dentre os participantes, o auxiliar/técnico de enfermagem foi a categoria em que mais citou o agravo. Dor do tipo pulsátil, constritiva, nas regiões frontal, temporal e cervical, de localização bilateral e unilateral respectivamente, foram as características semiológicas predominantes, o que sugere que os tipos prevalentes, na população estudada, sejam as cefaléias vasculares e tensionais. Dor localizada na região frontal foi citada por 54%, na região temporal por 21%, cervical por 16% e ocular por 9 %. A localização bilateral está presente em 65 % dos sujeitos e unilateral em 27 %; 8% não responderam.

Quanto à intensidade das crises a dor foi considerada moderada por 61% dos respondentes, fraca por 22% e intensa por 17%. Quanto a frequência das crises, ocorrem raramente em 34% dos sujeitos, uma vez por mês em 23%, uma vez por semana em 17%, duas a três vezes por semana em 16% e diariamente em 4%; 6% não responderam.

A cefaléia foi citada isoladamente, sem outros sintomas associados, por 62%. Os sintomas predominantes, associados às crises de cefaléia, foram náusea, fotofobia, fonofobia, vômito e parestesia.

A dor se inicia mais comumente nos períodos da tarde e manhã, respectivamente, com duração entre 30 minutos a 7 dias em 96 % da população analisada. Quanto à convivência com a cefaléia, 44% citou que convive com a dor por tempo igual ou superior a 3 anos, 27% por tempo inferior a 1 ano e 29% não soube responder.

Foram fatores desencadeantes gerais da cefaléia mencionados com maior freqüência: estresse (68%); menstruação (60%); sono (31%); ruídos altos (22%); temperaturas elevadas (18%); luminosidade, jejum e alimentação (12%) e odores (11%). Note-se que as variáveis foram citadas mais de uma vez.

Os fatores mais citados que predispõem a cefaléia durante a rotina de trabalho foram o estresse (34%), a sobrecarga de trabalho (21%), a alimentação e o jejum prolongado (12%) e o cansaço (7 %); 26% não responderam.

Quando analisada a ocorrência da cefaléia de acordo com a unidade de trabalho, os dados demonstraram que o agravo foi mais referenciado, respectivamente, nas unidades de internação cirúrgica, pronto atendimento (urgência e emergência) e unidade de internação clínica. Em todas as unidades foi prevalente a referência do estresse e da sobrecarga de trabalho como fatores desencadeantes da dor associados à rotina de trabalho.

No contexto do hospital analisado, a prevalência de trabalhadores com cefaléia se deu em unidades nas quais se observa maior fluxo de pacientes e sobrecarga de atividades a serem desenvolvidas, o que as configura como agentes estressores. A sobrecarga de trabalho é um problema constante na grande maioria das instituições de saúde brasileiras. A escassez de profissionais e a rotina fatigante podem ser responsáveis pelo absenteísmo/afastamento ocasionado pelas licenças decorrentes das doenças ocupacionais e cansaço, aumentando a carga daqueles que permanecem trabalhando, iniciando-se o ciclo.

É válido ressaltar que, apesar da significativa prevalência do estresse e da cefaléia, citados pelos trabalhadores do setor de unidade de urgência/emergência, este ambiente oferece algumas satisfações aos profissionais, tais como a possibilidade da 'preservação' da vida humana e o status conferido à este setor dentro do hospital, sendo considerada uma das unidades 'detentoras' dos melhores profissionais, dada a exigência decorrente da diversidade e complexidade das situações de cuidado, sobre as quais exige conhecimento e capacidade criativa, o que impede que as atividades tornem-se rotineiras e possibilita uma maior satisfação de seus profissionais.

A dor do tipo constritiva e de localização frontal e bilateral foi mais referenciada nas unidades de internação cirúrgica e centro de material esterilizado. Já em unidades como internação clínica, pediatria, bloco cirúrgico, ambulatório, maternidade (centro obstétrico) e terapia intensiva a prevalência, quanto ao tipo de dor, foi do tipo pulsátil, frontal, uni ou bilateral.

Quanto ao impacto que a cefaléia produz no cotidiano da população estudada, em 42% dos questionários analisados o agravo não interfere no cotidiano; em 40% interfere pouco; 13% interferem muito; 2% inibe as atividades e 1% impede as tarefas; 2% não responderam. O prejuízo profissional e social foi considerado pequeno por 76%; moderado por 22%; intenso por 1% e ausente por 1%.

Quando questionados quanto à existência de doenças associadas 13% fizeram referência a alguma patologia subjacente. Com isso pode-se inferir que 87% das cefaléias são primárias. As doenças subjacentes citadas foram: hipertensão arterial, rinite alérgica, síndrome do intestino irritável, doenças respiratórias, sinusite, desgaste na articulação da mandíbula, hérnia de disco, astigmatismo, herpes ocular, diverticulite, 'problemas' na coluna cervical e lúpus eritematoso sistêmico.

Dentre os fatores considerados contribuintes para o final das crises, os medicamentos foram os mais citados (86%), seguido pelo repouso (49%), sono (36%), lazer (8%) e terapias orientais como acupuntura e auriculoterapia (6%). Mais de uma variável foi citada.

O tratamento farmacológico é utilizado por 86% da população estudada e os fármacos mais citados foram analgésicos em geral como paracetamol, Neosaldina® (mucato de isometepteno, dipirona sódica e cafeína anidra), dipirona sódica e Dorflex® (citrato de orfenadrina, dipirona sódica e cafeína).

Isto posto, pode-se inferir que, ritmo exaustivo de trabalho, trabalho em turnos, demanda excessiva de pacientes acompanhada de deficientes recursos, são fatores que podem expor o trabalhador ao risco de adoecimentos e responsáveis por sofrimento físico e mental. Investir em melhorias das condições de trabalho pode garantir qualidade de vida, considerando que o trabalho é um determinante de saúde e/ou doença e a realidade de muitos hospitais brasileiros, não raramente, dimensionam inadequadamente seus recursos humanos, o que gera organização deficitária do trabalho da enfermagem, contribuindo para a desorganização e ou desconstrução de ambiências saudáveis.

 

Discussão

Os achados desta pesquisa não diferem da maioria dos estudos sobre a temática. Em estudo realizado em Santa Catarina (BR), a prevalência de cefaléia entre os trabalhadores de um hospital formado por enfermeiros, técnicos, administrativos e de apoio, foi de 74,1% e o auxiliar de enfermagem foi a categoria que mais referiu o agravo(6). As cefaléias do tipo migrânea (enxaqueca) e tensional foram prevalentes num estudo realizado no Paraná (BR)(5) e sintomas associados às crises de cefaléia como náusea, fotofobia, fonofobia, vômito foram achados prevalentes e semelhantes aos encontrados no presente estudo. Da mesma forma, quase a metade dos trabalhadores pesquisados em um hospital de São Paulo referiram sofrer desse agravo com 2 a 4 crises por mês, o que pode representar, aproximadamente, uma crise por semana(4).

O estresse como fator precipitante de cefaléia também foi encontrado em outras pesquisas realizadas em comunidades hospitalares(5-6). É provável que o estresse sobrevenha de contratempos de um cotidiano particularmente exaustivo, configurado por baixos salários, sobrecarga de trabalho subsidiada pela dupla/tripla jornada, entre outros características do trabalho da equipe de enfermagem, em especial do auxiliar/técnico, que acumula atividades de duplo emprego com atividades domésticas. É comum esses trabalhadores submeterem-se a poucas horas de sono diariamente, pelo excesso de trabalho(6).

Um estudo realizado junto a 12.988 indivíduos japoneses com idades entre 20-79 anos demonstrou que a probabilidade de ter dores de cabeça aumentou com o nível de estresse destes sujeitos(11).

É oportuno salientar que estudos sobre estratégias de enfrentamento adotadas por pacientes com dor de cabeça apontam para uma tendência a atribuir caráter ansiogênico a eventos corriqueiros, com incapacidade de enfrentá-los de forma eficaz. Casos clínicos têm demonstrado "freqüência significativa de comportamentos de fuga e esquiva associados a uma atitude de conformismo e sentimentos de desamparo quando o problema parece fugir ao controle", características adversas que podem contribuir para o agravamento do quadro clínico de dor, ocasionando implicações sistêmicas para a vida do indivíduo(12: 147) o que pode relacionar-se ao estresse.

A prevalência de acordo com o gênero não foi analisada neste estudo, visto que a população atuante na enfermagem no hospital analisado é predominantemente feminina. Entretanto, alguns estudos sobre o tema revelam predomínio da cefaléia no sexo feminino e em pessoas adultas(6) e outros sugerem associação entre o estresse e a cefaléia do tipo tensional neste gênero, fato atribuído provavelmente às flutuações cíclicas de estrogênio e progesterona(13).

Uma pesquisa que tinha entre os objetivos avaliar a presença de cefaléia antes da gestação, bem como seu comportamento durante os trimestres gestacionais, inclusive no grupo de mulheres que apresentava cefaléia menstrual pré-existente, junto a 1.101 mulheres grávidas entre 12 e 45 anos de idade demonstrou que apresentavam cefaléia 96,73% das mulheres. Das 1.101 que compunham este dado, 1.029 apresentavam cefaléia antes da gestação e apenas 36 apresentaram cefaléias iniciadas durante a gestação, ou seja, há melhora ou desaparecimento da dor na gestação, principalmente durante o segundo e o terceiro trimestres gestacionais(14).

Há uma intrínseca relação entre o período perimenstrual e a ocorrência de cefaléia e o desencadeante primário da cefaléia associada à menstruação parece ser a "remoção do estrogênio mais que a manutenção de sustentados níveis altos ou baixos". Já, as alterações nestes níveis como na gravidez, pelo aumento e na menopausa, pela diminuição, parecem afetar as cefaléias(15:12).

A Sociedade Brasileira de Cefaléia estabelece uma distinção entre os tipos de cefaléia que ocorrem no período perimenstrual. A migrânea menstrual verdadeira consiste em uma enxaqueca sem aura que ocorre exclusivamente no período compreendido entre 2 dias antes do início da menstruação e até 2 dias após o seu término. Já a migrânea com exacerbação no período menstrual ocorre em qualquer parte do ciclo, com exacerbação da freqüência e/ou da intensidade no período perimenstrual(16).

Um estudo que investigou as principais queixas de saúde de profissionais de enfermagem de um hospital público na cidade de Brasília (BR) verificou que, dos vinte profissionais entrevistados, 40% dos técnicos responderam que apresentam cefaléia (tipo enxaqueca) com freqüência. É um dado preocupante, pois a enxaqueca pode estar associada a excesso de trabalho, principalmente noturno, condições geradoras de insatisfação e estresse, além de que, serve de alerta para que o indivíduo investigue com mais atenção esse agravo, com vistas a prevenção de futuras ocorrências mais graves, tais como o acidente vascular cerebral(17). Fatores como número reduzido de trabalhadores, sobrecarga de trabalho, necessidade de realização de tarefas em curto espaço de tempo, relacionamento com familiares e pacientes e indefinição do papel de cada profissional, tornam alguns ambientes mais estressantes que outros(18).

De acordo com as orientações da Sociedade Brasileira de Cefaléia, nos casos em que a alimentação é fator que desencadeia a cefaléia, recomenda-se a restrição dietética específica e individualizada(16). Quanto ao jejum prolongado, é de fundamental importância que se disponibilize ao profissional, durante o turno de trabalho, pausa para alimentação sem prejuízo ao desenvolvimento das atividades, o que supõe recursos humanos em número suficiente.

Em estudo realizado em Taiwan, que identificou que os métodos mais utilizados pela enfermagem para aliviar a cefaléia foram dormir/descansar, medicar-se, e procurar ajuda médica e psicológica(19).

A Sociedade Brasileira de Cefaléia recomenda, nas crises fracas, que seja tentado o repouso em quarto escuro e silencioso, e, se possível, conciliar o sono. Outras medidas como o uso de bolsas de gelo e/ou compressão das artérias temporais podem ser úteis. O tratamento farmacológico deve ser iniciado apenas nas crises que não cederem com tais medidas, sendo indicado o uso de analgésicos comuns, anti-inflamatórios não-esteroidais e antieméticos quando os sintomas de náusea e vômito estiverem associados(16).

Em outras investigações semelhantes ao estudo aqui discutido, o tratamento farmacológico é prevalente para aliviar as crises(5-6), porém outras opções podem ser usadas. Uma experiência realizada por enfermeiras junto a alunas de um Curso de enfermagem demonstrou que a acupuntura é uma terapia eficaz na diminuição da intensidade e freqüência de crises de cefaléia, funcionando como importante prática alternativa no tratamento da dor(3).

 

Conclusões

A partir dos dados obtidos com esta pesquisa foi possível perceber que a cefaléia pode ser considerada um agravo importante à saúde dos trabalhadores de enfermagem. Sua considerável prevalência enfoca a necessidade de projetos que visem melhorar a saúde do trabalhador por meio de ações propositivas no ambiente de trabalho, bem como suporte psicológico para o enfrentamento de situações cotidianas avessas, as quais podem ser geradoras de estresse, principal fator desencadeante das cefaléias nesta comunidade.

Acredita-se que investimentos em ambiência saudável no trabalho pode ser um mecanismo que contribui para a promoção da saúde individual e coletiva dos trabalhadores da equipe de enfermagem, considerando-se que o contexto hospitalar é fatigante, o que requer, não só competência técnica, mas condições saudáveis de vida e trabalho, para que possam enfrentar adversidades que a diversidade do cuidado exige.

Sugerem-se estudos que possam associar a cronobiologia com as manifestações de cefaléia, bem como a (in)satisfação dos profissionais no trabalho nos diferentes turnos e unidades e a associação com este agravo.

 

Referências

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