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Enfermería Global

versión On-line ISSN 1695-6141

Enferm. glob. vol.14 no.37 Murcia ene. 2015

 

DOCENCIA-INVESTIGACIÓN

 

Quando a comunicação é nociva no encontro entre profissional e família da criança hospitalizada

Cuando la comunicación es nociva en el encuentro entre profesional y familia del niño hospitalizado

When the communication is harmful in the encounter between health professional and family of hospitalized child

 

 

Santos, Leidiene Ferreira*; Oliveira, Lizete Malagoni de Almeida Cavalcante**; Munari, Denize Bouttelet***; Barbosa, Maria Alves***; Peixoto, Myrian Karla Ayres Veronez**** e Nogueira, Alyne Leite Gomes*****

*Mestre em Enfermagem pela Faculdade de Enfermagem/UFG/Brasil; Professora Assistente. Departamento Enfermagem. Universidade Federal de Tocantins-TO, Campus Palmas-TO. E-mail: leidienesantos@uft.edu.br
**Enfermeira, Doutora em Ciências da Saúde pela Universidade de Brasília/UNB/Brasil; Professora Associada da Faculdade de Enfermagem/UFG.
***Doutora em Enfermagem pela Universidade de São Paulo/USP/Brasil; Professora Titular da Faculdade de Enfermagem/UFG.
****Enfermeira, Mestre em Enfermagem pela Faculdade de Enfermagem/UFG; Professora Assistente da Universidade Federal do Mato Grosso, Campus Barra do Garças
*****Enfermeira, Mestre em Enfermagem pela Faculdade de Enfermagem/UFG/. Brasil

 

 


RESUMO

Introdução: Identificar os efeitos nocivos da comunicação entre profissionais de saúde e famílias de crianças hospitalizadas.
Metodologia: Pesquisa descritiva exploratória. Os dados foram coletados durante as sessões de um Grupo de Apoio para Pais e Família (GRAPF) por meio de gravação em mídia digital, e analisados por meio de um processo conhecido como "caixas" em que se parte de categorias pré-definidas, no caso, formas típicas de comunicação e os elementos que as caracterizam. Participaram das sessões do grupo indivíduos que concordaram em participar do estudo, assinando o Termo de Consentimento Livre e que preencheram os seguintes critérios de inclusão: idade de 18 anos ou mais e pertencer a uma família de uma criança hospitalizada na Unidade de Internação Pediátrica investigada no período de coleta de dados.
Resultados: A análise do material resultou na proposição das categorias: "Atender de modo impessoal e puramente técnico", "Ordens e lições de moral" e "Mensagens contraditórias".
Conclusões: Medo, incertezas, estresse e ansiedade, identificados nas falas dos participantes do grupo, indicam efeitos nocivos em relação ao uso, ou não uso, da comunicação, e sugerem que o comportamento de alguns profissionais está alicerçado no modelo biomédico assistencial de atenção à saúde.

Palavras-chave: Comunicação; Enfermagem; Relações profissional-família; Saúde da família.


RESUMEN

Introducción: Identificar los efectos dañinos de la comunicación entre los profesionales de la salud y las familias de los niños hospitalizados.
Métodos: Estudio exploratorio descriptivo. Los datos fueron recolectados durante las sesiones de un Grupo de Apoyo para Padres y Familia (GRAPF) por grabación digital, y se analizaron a través de un proceso conocido como "cajas" en que se parte de categorías pre-definidas, en el caso, formas típicas de comunicación y los elementos que los caracterizan. Participaron en las sesiones de grupo individuos que aceptaron participar en el estudio mediante la firma del consentimiento informado y que cumplían los siguientes criterios de inclusión: edad mayor de 18 años y pertenecer a una familia de un niño hospitalizado en la Unidad de Hospitalización Pediátrica investigado en período de recolecta de datos.
Resultados: El análisis de los datos dio lugar a la propuesta de las categorías: "Atender de modo impersonal y puramente técnico", "Órdenes y lecciones morales " y "Mensajes contradictorios".
Conclusiones: El miedo, la incertidumbre, el estrés y la ansiedad, identificados en las declaraciones de los participantes del grupo, indican efectos perjudiciales con respecto al uso o no uso de la comunicación, y sugieren que el comportamiento de algunos profesionales se basa en el modelo biomédico de atención de salud.

Palabras clave: Comunicación; Enfermería; Relaciones Profesional-Familia; Salud de la Familia.


ABSTRACT

Introduction: Identify harmful effects of communication between health professionals and families of hospitalized children.
Methods: Descriptive exploratory research. Data were collected during sessions of a Support Group to Parents and Family (SGPF) through recording on digital media, and analyzed using a procedure known as "boxes" which began of pre-defined categories, in this case, typical forms of communication and the elements that characterize them. It had been part of group sessions individuals who agreed to be part of the study, signing the Informed Consent Form and who met the following inclusion criteria: age of 18 years old or over and belong to a family of a hospitalized child in Pediatric Inpatient Unit investigated in the period of data collection.
Results: The analysis of the material resulted in the proposition of categories: "Meeting in an impersonal way and purely technical", "Orders and moral lessons" and "Contradictory Messages".
Conclusions: Fear, uncertainty, stress and anxiety, identified in the speeches of the group participants, indicate harmful effects with respect to the use or non-use, communication, and suggest that the behavior of some professionals is grounded in the biomedical model of health care assistance.

Key words: Communication; Nursing; Professional-Family Relations; Family Health.


 

Introdução

A comunicação é um recurso que permite, ao profissional de saúde, estabelecer relacionamento interpessoal com os indivíduos, ajudando-os na sua recuperação e superação de situações traumáticas. Sendo assim, por meio dela, criam-se condições para que a equipe de enfermagem efetive mudanças, no intento melhorar a situação experienciada por sua clientela(1).

Todavia, nem sempre a comunicação é usada de maneira que favoreça a construção de uma relação positiva entre profissionais de saúde e família. Além disso, em relação a atenção de enfermagem em pediatria, pesquisas revelam que a equipe de saúde comumente não considera a família em seu plano de trabalho, ficando suas ações dirigidas, exclusivamente, à doença da criança(2,3). Dessa maneira, a família e a criança não são atendidas em suas necessidades e nem percebidas em sua totalidade, passando, praticamente, despercebidos os aspectos emocionais, as inseguranças, as dúvidas da criança e de seus familiares.

Essa situação indica prejuízo na comunicação/interação entre famílias e profissionais de saúde, já que eles ainda focalizam sua atenção em cuidados técnicos, com pouca ou nenhuma preocupação com a família(3).

Contudo, na perspectiva do cuidado humanizado, o diálogo é ferramenta indispensável na construção do relacionamento entre equipe de saúde e família. A falta de comunicação, de respeito, de empatia, de atenção e de generosidade, prejudica a comunicação/interação e contribui para uma assistência impessoal e desumana(4,5).

Estudos com famílias são fundamentais para que possamos produzir evidências que, de alguma maneira, possibilitem que mudanças na forma de atender suas necessidades e melhorar a qualidade da assistência prestada(3,6). Entendendo a necessidade de compreender melhor os aspectos que são limitadores de uma comunicação efetiva e afetiva para com a família da criança hospitalizada, a partir do estado da arte sobre o tema, foi que nos propusemos ao desenvolvimento dessa pesquisa, cujo objetivo foi identificar efeitos nocivos da comunicação entre profissionais de saúde e família no processo de experienciar a situação de ter uma criança hospitalizada.

 

Metodologia

Pesquisa descritiva baseada em dados produzidos durante sessões de um Grupo de Apoio a Pais e Familiares (GRAPF); do tipo aberto, isto é, permitia a entrada de novos membros em todos os encontros e a participação em uma sessão não implicava na obrigação de comparecer a outras sessões; homogêneo em relação a seus participantes, já que todas as pessoas convidadas para esta atividade tinham, em comum, a experiência de ter uma criança da família hospitalizada em Unidade de Internação Pediátrica/UIP; e com o objetivo de oferecer apoio, acolhimento e informações à família das crianças hospitalizadas.

O GRAPF foi coordenado por duas enfermeiras e supervisionado, na sua organização e condução, por uma enfermeira especialista em Dinâmica de Grupo e outra com experiência na atenção a familiares de pessoas internadas em Unidade de Terapia Intensiva.

A investigação foi realizada na UIP de um Hospital Escola localizado em Goiânia-Goiás, no período de fevereiro a julho de 2010. A UIP em questão possui dois blocos de internações: a Clínica Pediátrica (CP) e a Unidade de Terapia Intensiva Neonatal. A CP possui 20 leitos com média de ocupação diária de doze leitos. A UTIN tem 10 leitos destinados ao cuidado de recém-nascidos (RN) graves e, quase sempre, possui ocupação total dos leitos.

Participaram das sessões grupais indivíduos que aceitaram fazer parte da pesquisa, assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e atenderam aos seguintes critérios de inclusão: ter idade igual ou superior a 18 anos e pertencer à família de uma criança hospitalizada na UIP investigada, no período da coleta de dados.

Foram analisadas nesse estudo doze sessões grupais, que foram gravadas em mídia digital e posteriormente transcritas pela coordenadora do grupo e, para garantir o sigilo quanto à identidade e evitar exposição e constrangimento dos sujeitos, na apresentação dos resultados, os familiares foram identificados pela letra F seguida de um número (1 a 34 - total de familiares que participaram do estudo) e pela letra G acompanhada pelo número do encontro a que esse familiar esteve presente.

Os dados foram analisados a partir da técnica de análise temática Bardin(7), especificamente, o procedimento de distribuição de conteúdos por "caixas". Esse processo requer que a análise seja feita a partir de categorias pré-definidas, que nesse caso foram as formas típicas de comunicação(8) e os elementos que as caracterizam. O procedimento analítico detalhado foi realizado partindo da transcrição das gravações das sessões grupais, seguida da pré-análise, com exploração do material pela leitura exaustiva e compreensiva, a fim de identificar os elementos que caracterizam as formas típicas de comunicação.

Esse estudo foi elaborado e desenvolvido, seguindo as recomendações da Portaria 196/96 do Conselho Nacional de Saúde e aprovado por um Comitê e Ética em Pesquisa Humana e Animal, localizado em Goiânia Goiás (protocolo 153/2009).

 

Resultados e discussão

No total, 34 familiares participaram das sessões do GRAPF. O número de pessoas em cada sessão variou de três a sete, com média de 4,7 por encontro. Os participantes foram, principalmente, mães (23; 67,6%), tios (5; 14,7%), avós (4; 11,8%) e pais (2; 5,9%) das crianças.

A análise do material resultou na proposição das categorias: "Atender de modo impessoal e puramente técnico", "Ordens e lições de moral" e "Mensagens contraditórias", as quais contribuíram para compreender as repercussões provocadas pela postura e condutas inadequadas dos profissionais de saúde nas experiências vividas pela família durante a hospitalização da criança.

É importante destacar que a comunicação é um ato criativo; não existe somente um agente emissor ou receptor, mas uma troca entre os indivíduos que constituem um sistema de interação e reação, isto é, um processo recíproco que promove mudanças na maneira de sentir, pensar e atuar dos envolvidos(1). Ela é um recurso indispensável para se estabelecer o cuidado de enfermagem que vislumbra uma assistência de qualidade não só a criança, mas também à sua família(3,9,10).

Nesse sentido, algumas formas de comunicação têm resultados nocivos, provocando efeitos colaterais indesejáveis(8), o que contribui para acentuar o sofrimento da família que convive com uma criança hospitalizada, como será apresentado nas categorias a seguir.

Atender de Modo Impessoal e Puramente Técnico

A construção de uma relação cordial entre a equipe de saúde, a família e a criança, é extremamente importante para o bem estar da família(1,11). A conduta fria, impessoal e puramente técnica, no atendimento, contraria qualquer pressuposto de uma assistência terapêutica e humanizada. Quando o profissional de saúde não interage/estabelece comunicação com a pessoa a qual está atendendo, encarando-a como objeto, a ação benéfica dessa relação torna-se extremamente limitada(8).

Sendo assim, a comunicação terapêutica, ou seja, aquela que não prejudica, que não causa dano, é imprescindível no encontro profissional/família(8), já que essa clientela sente dificuldade em lidar com o sofrimento e precisa de orientações sobre o estado de saúde da criança e de apoio(12-14).

Quando os profissionais assumem postura verticalizada, em relação às demandas da família, sem muito esforço para interagir e estabelecer comunicação efetiva, ela se sente ignorada e marginalizada pois, além de se sentir impotente frente à doença da criança, sequer sabe da real condição clínica da mesma(11):

[...] fizeram [os profissionais de saúde] uma rodinha, assim, lá no quarto, conversou, conversou, conversou e conversou e foi embora! E aí, eu fiquei perdida! Porque aí ele não perguntou nada, não falou nada (F25G10).

[...] falei assim: "doutora, eu queria", ela nem deixou eu terminar de falar, "não, a gente só passa alguma coisa sobre os RN no final da tarde". Se você não chegar neles e falar assim "doutor, como é que tá ele?" eles não te falam nada (F7G1).

Pra mim, o maior peso é eles [profissionais de saúde] saber de alguma coisa e não comentar, não contar pra gente! [...] Os resultados dos exames, eles não me diz! Aí, eu fico assim, "será que é alguma coisa grave?". Eles sabe e não passa pra gente. Então, a gente fica angustiada, sem saber o quê que tá acontecendo. Eu preferia, assim, que eles mudassem isso, sabe (F9G12).

Os depoimentos mostram que, de modo geral, a ação de ignorar o direito da família de ser ouvida e de receber informações relacionadas ao diagnóstico, quadro clínico e evolução da criança, compromete o bem estar físico e mental da família, aumenta sua ansiedade e seu estresse, e resulta em prejuízo na comunicação/interação entre profissional/cliente.

Os relatos das famílias indicam que a postura assumida, pelos profissionais de saúde, não só comprometem a comunicação como também a humanização do cuidado. Intervenções terapêuticas em saúde dependem do interesse do profissional em envolver-se e acreditar que sua presença é tão importante quanto os procedimentos técnicos que realiza(1).

Estudos(3,5,8) indicam que a comunicação nociva entre equipe de saúde e familiares faz com que eles se sintam sem importância, corroborando para o surgimento de conflitos e tensões que resultam em sofrimento psíquico.

Esse comportamento contribui ainda com o bloqueio dos canais de comunicação. Nesse cenário, a família sente-se constrangida, pouco à vontade e sem liberdade de expressar o que de mais significativo está vivenciando. Essa situação empobrece, significativamente, a qualidade da assistência(8):

[...] porque se eu for conversar com eles [profissionais da saúde], e eles sei lá.

[...] faz mal até pro meu bebê. [...] nossa eu morro de medo (G1F12).

[...] eu não reclamo do que eu vejo, porque eu tenho medo, porque assim eu não to aqui o dia inteiro. Eu tenho medo da pessoa [profissionais de saúde] descontar no meu filho. Fazer alguma coisa com meu filho depois que eu sai daqui (G2F7).

Percebemos que ao atender a família, de modo impessoal e puramente técnico, o profissional de saúde desencadeia vivencias e experiências desestruturantes, intensificando o sofrimento da família frente à situação de ter/viver com uma criança hospitalizada. Essa postura faz com que a família fantasie situações negativas e, inclusive, tenha medo dos profissionais de saúde.

Estudos recentes(11,15) também apontam que a falta de aproximação entre profissionais e família faz com ela, muitas vezes, mesmo vivenciando momentos de insatisfação, se sujeite às condições impostas pela equipe de saúde, pois teme represálias em relação à criança.

É imprescindível humanizar a assistência à criança e sua família, mas, para isso, é necessário ir além da realização de procedimentos técnicos e da oferta de tecnologias avançadas. A humanização, na perspectiva da família, é um conjunto complexo de atitudes motivadas por um pensamento ético, humanitário, social e holístico(16).

No contexto da humanização da assistência, cabe, ao profissional de saúde, a responsabilidade de oferecer apoio emocional à família para que ela encontre forças para superar a situação de ter e conviver com uma criança hospitalizada. Assim ele deve se comprometer a disponibilizar um momento do seu dia para ouvir as queixas e dificuldades da família, e atender às necessidade de informações, de apoio emocional e de treinamento para o cuidado da criança(4,17).

Ordens e Lições de Moral

Lições de moral consistem em fazer julgamentos ou juízos de valor em relação a condutas do cliente que se chocam com os valores ou modo de pensar do profissional da saúde. Comumente, as mensagens são veiculadas com tom de crítica, desaprovação ou ironia(8):

[...] quando eu chegava pra tirar o leite, teve um dia que eu chegava tão angustiada que quase não saia. A enfermeira chegou e falou: mãe você não tem vergonha na cara de tirar só esse tantinho de leite não? Desse jeito. Aí me deu aquela coisa ruim. [... ] aí desse dia pra cá assim, num deu mais vontade de chegar alegre, tirar o leite (F7G1).

Falei pra ela que eu tinha fé, assim, que o neném ia sair de lá. Só que ela [profissional da saúde] falou que [começa a chorar]. [...] eu tinha que pensar na outra possibilidade, que não era pra mim ter fé. Esse dia eu respondi mal a ela. Saí de lá chorando. Aí, eu fui e falei pra ela sair de perto de mim, que ela tava me atrapalhando, que além dela não me ajudar, ela tava era me estressando. Aí, esse dia acabou pra mim (F12G4).

Os depoimentos mostram o quanto é sofrido, para os familiares, serem criticados ou chamados a atenção de maneira inadequada ou, até mesmo, injusta. Nas situações ilustradas nos depoimentos a equipe de saúde, ao invés de contribuir para reduzir o estresse, ansiedade e sofrimento do familiar, produz efeitos nocivos, configurando-se em uma das principais fontes promotoras de vivências desestruturantes. A equipe de saúde deve apoiar e contribuir para redução do sofrimento dessas pessoas, por meio de atitudes como demonstrar atenção e ter responsabilidade por aquilo que comunica as pessoas(4,18).

Pesquisa(15) realizada com familiares de crianças hospitalizadas em unidade de cuidados intensivos pediátrico, mostrou que a família tem sua condição de vulnerabilidade intensificada, já que as interações são, na maioria das vezes, negativas, em razão do ambiente hostil, das ameaças reais e imaginárias, de profissionais de saúde que detém o poder sob a criança e da ruptura que a família sofre em sua estrutura.

Ao trabalharmos com famílias de crianças hospitalizadas fazer julgamentos ou juízos de valor, é uma forma de comunicação nociva já que, comumente, essa postura provoca reações de irritação e raiva, e podem provocar bloqueios, resistências e comprometer, significativamente, a saúde da família(8).

A vulnerabilidade da família manifesta-se pelas divergências entre família e equipe de saúde, provocadas pelo distanciamento entre essas pessoas. Os profissionais de saúde mantêm-se distante da família, tratando-a de modo estritamente profissional, só se relacionando durante as visitas e fornecendo informações que, nem sempre, sanam, realmente, as dúvidas da família(15).

Notamos que um ambiente de acolhimento à família e a disponibilidade para dar informação e estabelecer comunicação efetiva, proporciona um pilar que sustenta uma boa interação profissional/cliente, e promove um clima emocional positivo na realização do cuidado de enfermagem.

Estudo realizado, para identificar se os enfermeiros tinham consciência dos efeitos nocivos da comunicação não verbal no contato com pacientes e famílias, mostrou que os profissionais percebem e reconhecem suas inadequações(19). Assim, o problema está em reconhecer e lapidar seus conhecimentos sobre a importância de um relacionamento terapêutico e colocá-lo em prática.

Nesse cenário é importante destacar que o profissional de saúde não deve ser apenas um realizador de cuidados técnicos, mas compreender a importância de seu papel de facilitador da vivência de hospitalização, tanto para a criança, quanto para sua família(4).

Mensagens contraditórias

Por mensagem contraditória entende-se a presença simultânea de informações discrepantes. Ela é nociva porque provoca confusão, dificuldade de discriminação, além de dúvidas e ansiedade(8).

Estudo realizado com pacientes terminais revelou que a comunicação efetiva, entre profissionais de saúde/paciente/família, favorece o planejamento dos cuidados e melhora a qualidade do atendimento a essas pessoas, contudo, informações distorcidas podem comprometer a satisfação com o cuidado recebido e a preparação para o fim da vida(20).

Nos relatos é possível identificar mensagens contraditórias, já que as informações chegam à família de maneira distorcida, corroborando para seu sofrimento e ansiedade:

[...] só que é assim, um médico fala uma coisa, outro fala outra, mas ninguém nunca sentou pra mim pra me explicar o quê que é e o quê que ajuda (F25G10).

[...] eu fiquei muito triste, eu cheguei lá na UTI falou que meu neném tava com meningite. Aí depois fez ultrasson, falou que tava normalzinho, tava tudo normal (G8F31).

[... ] aí tinha um exame que ele iria fazer, uma cintilografia. ...aí ela [profissional da saúde] falou: mãe tira a roupinha dele que ele vai ser cortado pra ver o tumor. Aí eu assustei, falei assim: moça, me explica aqui, tumor de quê? Porque eu não to sabendo se ele tem algum tumor. Me explica essa situação porque eu to perdida (F26G10).

Comumente, nas instituições de saúde, a diluição das responsabilidades, a falta de entrosamento entre os membros das equipes e a inexistência de uma chefia eficiente, que coordene e integre esses profissionais, aumenta expressivamente a incidência de mensagens contraditórias entre profissional/profissional e profissionais/clientes, corroborando para situações de confusão e insegurança(8).

Estudo realizado com familiares de crianças com doença crônica(12), mostrou que comunicação não efetiva também pode comprometer a saúde da criança, já que, em muitos casos, a família apenas reproduz as informações recebidas dos profissionais sem, realmente, compreendê-las. Assim, seu conhecimento acerca da doença e tratamento não é insuficiente, o que pode desencadear obstáculos para que a família se sinta em condições de cuidar da criança.

Ainda, as crianças destacam, como aspecto positivo, a maneira como os profissionais de enfermagem tratam seus pais e a relação alcançada entre ambos. Elas consideram a relação de simpatia, ou antipatia, percebida em determinadas situações. O conceito que as crianças têm da qualidade da atenção de enfermagem está condicionado à relação do pessoal dessa equipe com seus pais ou adultos significativos(21).

Outro aspecto que deve ser considerado, pela equipe de saúde, é a co-participação da criança no processo cuidar, pois estudo recente(21) mostrou que, as vezes, os profissionais dirigem-se apenas as mães esquecendo-se que as crianças também compreendem o que é dito. Assim, é importante salientar que a comunicação estabelecida com as crianças tem papel imprescindível na mediação das suas experiências e nas idéias que elaboram sobre o processo saúde/doença. Nesse sentido, é importante que a criança também seja respeitada como indivíduo e faça parte da interação profissional e família.

Nessa perspectiva, fica evidente que a ação de informar deve fazer parte da prática diária dos profissionais de enfermagem para que a família e a criança possam se sentir cuidadas, e para reduzir o padrão de ansiedade dessas pessoas(3,12), proporcionando uma assistência de qualidade, minimizando as chances de ações nocivas relacionadas à comunicação/interação entre família, criança e equipe de saúde.

Ignorar o Problema do Cliente

Ao fugir e evitar o problema da família da criança hospitalizada, o profissional sinaliza dificuldade de delimitar sua possibilidade de atuação e medo de não ser capaz de ajudar o cliente. Nessas situações, comumente, a família se sente sem liberdade de expressar o que lhe é mais relevante. Por esse motivo, essa forma de comunicação tem como resultado a dificuldade de vínculo dentre profissional/família(8):

[...] eu to precisando de alguém pra conversar, pra me entender, pra me dá uns conselhos. Pra me ajudar (G6F1).

[...] só que até então ninguém nunca sentou pra conversar comigo (F25G10).

É importante destacar que a família sofre quando o profissional de saúde assume uma postura rígida, inflexível, com pouca ou nenhuma demonstração de compaixão e respeito por sua dor(3).

Para a família o ambiente hospitalar é um lugar assustadoramente desconhecido, em que ela se sente insegura para expor suas dúvidas e medos e, muitas vezes, se sente excluída das conversas realizadas por profissionais de saúde em relação à saúde da criança, uma vez que essas pessoas geralmente usam uma linguagem que não é compreendido pela família(13). Desenvolver habilidades de comunicação, apesar de não ser tarefa fácil, é de fundamental importância à equipe de saúde, já que ela deve conhecer o significado das mensagens enviadas para, então, elaborar um plano assistencial adequado às reais demandas das pessoas assistidas(1,22), favorecendo a humanização do cuidado(23).

Considerando que a família vivencia experiências desestruturantes que a colocam em situação de sofrimento psíquico constante(24), os profissionais de saúde devem refletir sobre suas práticas e reorganizar seus processos de trabalho visando uma atuação em equipe, em que as ações sejam interdependentes e complementares(2,6,25), tendo como foco o cuidado humanizado ao binômio criança-família.

O familiar se sente acolhido quando percebe que, além do cuidado dispensado à criança, o profissional também demonstra atenção à família, estabelecendo com a mesma uma relação de troca, apoio e respeito(3,26).

Assim é impossível, aos profissionais da saúde, realizar qualquer ação na assistência ao ser humano sem lançar mão de habilidades de comunicação interpessoal e, não basta ao profissional usar somente a comunicação verbal; é preciso estar atento aos sinais não verbais emitidos durante a interação com o paciente(19).

É indispensável, no processo de cuidar, a compreensão do outro como ser humano integral. Nesse sentido, salienta-se que os profissionais de saúde devem voltar-se para as coisas mesmas, para as experiências vividas pela família, pois essa atitude permitirá desvelar o mundo vida dessas pessoas e corroborar para a construção de práticas assistenciais pautadas no respeito, atenção e solicitude(8).

Dessa maneira, para se alcançar uma assistência verdadeiramente humanizada ao binômio criança-família, é preciso investir em mudanças na formação do profissional, proporcionar ao graduando a oportunidade de focalizar sua atenção nessa clientela e na maneira de gerenciar as UIP, visando deslocar a assistência pautada no modelo biomédico, para a assistência alicerçada nas relações e no potencial humano(27).

 

Conclusão

Os resultados dessa pesquisa indicam que a comunicação pode ser um recurso terapêutico ou nocivo, no contexto de assistência à saúde. Dessa maneira, ela pode ser usada a fim de beneficiar a família da criança hospitalizada e ajudá-la na vivência/superação de momentos difíceis ou pode comprometer ainda mais sua saúde física e mental, proporcionando momentos traumáticos e desestruturantes.

Nos relatos dos participantes do GRAPF foi possível identificar várias necessidades apresentadas pelos familiares, tais como receber informações sobre diagnóstico e quadro clínico da criança, manter diálogo/interagir com a equipe de saúde e receber atenção e respeito.

Medo, incertezas, estresse e ansiedade, identificados nas falas dos participantes do grupo, indicam efeitos nocivos em relação ao uso, ou não uso, da comunicação, e sugerem que o comportamento de alguns profissionais da UIP pesquisada ainda está alicerçado no modelo biomédico assistencial de atenção à saúde, em que se valoriza o tratamento biológico, a cura. Essa postura contribui para que não seja oferecido cuidado centrado na criança e na sua família e para uma assistência fragmentada, refletindo em insegurança e insatisfação por parte dos familiares.

Chamou-nos a atenção a opção feita, pelos profissionais da saúde, de se ausentar frente às necessidades da família, ou seja, não participar/cuidar/ouvir/comunicar/compartilhar. Salientamos que, para nós, optar por "não fazer" é também uma ação que, por sinal, compromete muito a saúde física e mental da família. Esse comportamento nos remete ao cuidado desumanizado, a coisificação e objetivação da família e de suas demandas.

Todavia, é válido considerar que a maioria dos profissionais de saúde não recebe formação acadêmica direcionada para o trabalho com famílias e situações que exijam habilidades de relacionamento interpessoal. Nesse sentido é importante que cursos de graduação, na área da saúde, incluam o estudo da assistência à família em sua grade curricular, oportunizando aos graduandos trabalhar com essa clientela, a fim de compreender a complexidade e a necessidade de incluí-la em seus planos de cuidados.

Acreditamos que os resultados dessa pesquisa podem contribuir para despertar profissionais de saúde para a importância de valorizar a família no ambiente hospitalar e tornar a comunicação uma estratégia terapêutica para assistência à criança e sua família, favorecendo os processos de enfretamento e superação frente a situação de ter e conviver com uma criança hospitalizada.

Essa atitude poderá ajudar os profissionais a compreender o contexto em que surgiu a doença e os mecanismos de enfrentamento de cada pessoa. Além disso, adentrar a vida da família e olhar com os olhos de quem vive a experiência, e não somente como espectador, permite ao profissional compreender o verdadeiro impacto da doença na dinâmica familiar e o sensibiliza para a valorização das experiências humanas e compaixão pela dor do outro.

 

Recebido: 29 de outubro de 2013
Aceito: 11 de janeiro de 2014

 

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