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Enfermería Global

On-line version ISSN 1695-6141

Enferm. glob. vol.14 n.40 Murcia Oct. 2015

 

CLÍNICA

 

Concepção de saúde e autocuidado pela população masculina de uma Unidade Básica de Saúde

Concepción de salud y autocuidado de la población masculina de una Unidad Básica de Salud

Conception of Health and Self-Care by Male Population from a Basic Health Care Unit

 

 

Quandt Xavier, Sheila*; Ceolin, Teila**; Echevarría-Guanilo, María Elena***; da Costa Mendieta, Marjoriê****

*Enfermeira. Universidade Federal de Pelotas (UFPel) E-mail: squandtxavier@yahoo.com
**Enfermeira. Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem UFPel. Professora Assistente da FEn UFPel.
***Enfermeira. Doutora em Ciências. Professora do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem UFPel.
****Enfermeira. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem UFPel. Brasil.

 

 


RESUMO

Objetivo: Conhecer os cuidados à saúde no olhar da população masculina que frequenta grupos de educação em saúde de uma Unidade Básica de Saúde (UBS) no Sul do Rio Grande do Sul (RS).
Método: Consiste em um estudo qualitativo, do tipo descritivo e exploratório, desenvolvido com seis usuários de uma UBS de zona urbana do município de Pelotas (RS). Os dados foram coletados em novembro e dezembro de 2012 por meio de entrevista semiestruturada, e, após submetidos a análise de conteúdo. O estudo obteve aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Pelotas.
Resultados: A partir da análise dos dados foi possível identificar três temas: descrição dos participantes; concepção de saúde e percepção do cuidado (autocuidado) à saúde. Os resultados obtidos apontaram que os homens têm a preocupação acerca do cuidado à saúde e realizam ações preventivas como forma de manutenção da saúde.
Considerações finais: A compreensão dos homens sobre o processo de saúde e autocuidado contribui para a realização de ações, e essas são efetivas para a melhoria das condições de vida.

Palavras chave: Assistência à saúde; saúde do homem; processo saúde-doença; autocuidado; atenção primária à saúde; saúde da família.


RESUMEN

Objetivo: Conocer la visión acerca de los cuidados de la salud de la población masculina que frecuenta grupos de educación en salud de una Unidad Básica de Salud (UBS) en el Sur de Rio Grande del Sur.
Método: Consiste en un estudio de abordaje cualitativa, de tipo descriptivo exploratorio, desarrollado con seis pacientes de una UBS de zona urbana del municipio de Pelotas (RS). Los datos fueron recogidos en noviembre y diciembre de 2012 por medio de entrevista semiestructurada, y después sometidos a análisis de contenido. El estudio recibió aprobación del Comité de Ética de Investigación de la Universidade Federal de Pelotas.
Resultados: A partir del análisis de los datos fue posible identificar tres temas: descripción de los participantes; concepción de salud y percepción acerca del cuidado con la salud. Los resultados obtenidos apuntaron que los hombres tienen preocupación acerca del cuidado con la salud y realizan acciones preventivas como forma de mantenimiento de la salud.
Consideraciones finales: La comprensión de los hombres sobre el proceso de salud y autocuidado contribuyen a la realización de acciones, y estas son efectivas para la mejora de las condiciones de vida.

Palabras clave: Prestación de atención de salud; salud del hombre; proceso salud-enfermedad; autocuidado; atención primaria de salud; salud de la familia.


ABSTRACT

Objective: To know the care to health in a look to male population which attends groups of education in health from a Unity of Primary Health Care (UBS) in Southern of Rio Grande do Sul (RS).
Method: It consists in a qualitative study, descriptive and exploratory, developed with six users of a UBS from the urban area of the city of Pelotas (RS). Data collection occurred on November to December of 2012 through a semi structured interview, and after submitted to content analysis. The study had approval from Committee of Ethics and Research from Faculdade de Enfermagem at Universidade Federal de Pelotas.
Results: From the analysis of data, it was possible to identify three themes: participants' decryption; conception of health, and perception of care (self-care) to health. The obtained results pointed that men have a worry about care to health and perform preventive actions as a way to maintain their health.
Final Considerations: Men's comprehension about the process of health and self-care contributes to the accomplishment of actions, and these are effective to the improvement of the conditions of life.

Key words: Delivery of health care; men's health; health-disease process; self care primary health care; family health.


 

Introdução

A saúde do homem ganhou maior enfoque, devido aos altos índices de morbidade e mortalidade bem como a baixa procura deste grupo pelos serviços de Atenção Primária à Saúde (APS). Visando à melhoria da saúde da população, nos últimos anos, no Brasil, houve a implantação de diversas políticas no Sistema Único de Saúde (SUS), entre estas a Política Nacional de Atenção Integral a Saúde do Homem (PNAISH), a qual foi normatizada pela Portaria no 1.944, de 27 de agosto de 2009 (1,2). A PNAISH está interligada com a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) e com as estratégias de humanização, dentro dos princípios que regem o SUS. A política elencada objetiva facilitar e ampliar o acesso da população masculina aos serviços de saúde, contribuir para a redução das causas de morbimortalidade e promover a atuação dos profissionais de saúde frente a aspectos socioculturais (3).

Apesar da implantação da PNAISH representar um grande avanço no que se refere ao cuidado à saúde do homem, os indicadores de mortalidade divulgados pelo Ministério da Saúde, em 2010, mostram que os homens (57,11%), quando comparado às mulheres, ainda estão em situação desfavorável de saúde (4). Fato que pode estar relacionado com a menor procura dos serviços de saúde, por parte de esta população, levando à identificação de doenças em estágios mais avançados (3).

Os dados, acerca da participação da população masculina nas ações de saúde, representam um atual e importante desafio para os serviços de saúde, pois o cuidado com o corpo, quando se refere à saúde, geralmente não é um assunto presente na socialização dos homens (5), uma vez que historicamente cuidados com a saúde ou presença de doença têm sido relacionados a fragilidade.

Para realização ações de prevenção de doenças e promoção da saúde a população, neste caso aos homens, é necessário levar em consideração a percepção dos indivíduos acerca do processo saúde-doença e do cuidado à saúde realizados. Além disso, é importante considerar às diferenças de gênero em relação aos hábitos comportamentais, como por exemplo, tabagismo, alcoolismo, o tipo de alimentação, ambiente de trabalho e a prática de atividade física (6).

O enfermeiro, como profissional da saúde, tem por responsabilidade o desenvolvimento de ações que auxiliem no cuidado a saúde, assim como de contribuir para que os indivíduos tenham as ferramentas necessárias para a prática do cuidado, dentro do contexto ao qual estão inseridos, em especial com a população masculina, visto que esta carece de autocuidado (7).

Desta maneira, é importante que os enfermeiros conheçam como está ocorrendo o empenho masculino referente à adoção de estilo de vida saudável, no âmbito da promoção da saúde, para que desta forma os profissionais busquem suprir as lacunas deste cuidado, incentivando ações voltadas às necessidades dessa população, e coloquem a PNAISH efetivamente em prática.

Neste contexto, o estudo teve como objetivo conhecer os cuidados à saúde no olhar da população masculina que frequenta grupos de educação em saúde de uma Unidade Básica de Saúde no Sul do RS.

 

Métodos

Este estudo configura-se como parte da pesquisa intitulada "Cuidados à saúde realizados pela população masculina de uma Unidade Básica de Saúde de Pelotas", a qual se caracterizou por uma abordagem qualitativa, descritiva e exploratória. Foi desenvolvido em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) urbana do município de Pelotas-RS, que possui três equipes de Estratégia de Saúde da Família (ESF) implantadas, uma equipe de apoio (uma assistente social, dois odontólogos, uma nutricionista, dois técnicos de farmácia, quatro recepcionistas e dois do serviço de higienização) e está vinculada à Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Pelotas (UFPel).

O município de Pelotas se localiza no Sul do Rio Grande do Sul (BR) e possui uma população estimada de 328.275 habitantes (8), sendo aproximadamente, 154.198 (46,97%) do sexo masculino.

A pesquisa recebeu aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa da Faculdade de Enfermagem da UFPel, sob o parecer no 070/2012. A mesma obedeceu aos princípios éticos contidos no Capítulo III, da Resolução do Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) 311/2007 e também respeitou as Resoluções no 196/96 e no466/12 de competência do Conselho Nacional de Saúde do Ministério da Saúde (9,10).

Na UBS abordada, o grupo que contemplava a participação da população masculina foi o grupo de hipertensos e diabéticos, visto que até o momento a UBS não realiza ações específicas para atender a demanda masculina da população.

Cabe destacar que o número de habitantes acompanhados pela UBS e a participação dos homens nos grupos, foram os fatores que contribuíram para escolha da UBS do estudo.

Destacou-se a população entre 20 e 59 anos de idade, por representar uma parcela significativa da força produtiva no país, a qual apresenta alto índice de mortalidade e baixa procura pelos serviços de saúde da Atenção Primária à Saúde (APS).

Os seis participantes da pesquisa foram escolhidos conforme os seguintes critérios: ser do sexo masculino; faixa etária de 20 a 59 anos de idade; participar de pelo menos um grupo de educação em saúde da UBS escolhida para a coleta de dados; e ser cadastrado no Sistema de Cadastramento e Acompanhamento de Hipertensos e Diabéticos (HiperDia).

Para a coleta de dados, inicialmente foi realizado um levantamento, de acordo com os critérios de seleção, sendo encontrados 110 homens cadastrados. Foram selecionados dois participantes de cada equipe de ESF, cadastrados no Programa Nacional de Atenção a Hipertensão Arterial e Diabetes Mellitus (HiperDia) e que frequentavam o grupo de Hipertensos e/ou Diabéticos. No grupo em que houve mais de dois participantes que correspondiam aos critérios de seleção, foi priorizando a cronologia de idade decrescente. A entrevista foi realizada na UBS, após o término do grupo. Como forma de garantir o anonimato, na descrição dos resultados os sujeitos foram identificados pelas iniciais do nome, seguido pela idade.

A coleta de dados ocorreu por meio de entrevista semiestruturada, as quais foram realizadas entre novembro e dezembro de 2012. Na entrevista se buscou obter informações acerca da concepção de saúde e doença; percepção de cuidado da sua saúde; prática ou não desses cuidados; motivo que os levou a participar do grupo de saúde; recebimento de informações dos profissionais de saúde, no grupo que participavam, como cuidar da saúde; realização de atividades de lazer; existência de espaços de lazer no bairro; participação em atividades na comunidade; e acerca de como consideravam o acesso aos serviços de saúde.

Os dados obtidos nas entrevistas foram transcritos e analisados de acordo com a Análise de Conteúdo de modalidade Temática (11). Emergiram três temas: Descrição dos participantes, concepção de saúde e percepção do cuidado (autocuidado) à saúde.

 

Resultados e discussão

Buscando atender o objetivo de conhecer os cuidados à saúde realizados pela população masculina entre usuários frequentadores de grupos de educação em saúde de uma Unidade Básica de Saúde, são apresentados a seguir os resultados de acordo com a ordem dos temas identificados, antecedidos de uma breve descrição dos participantes da pesquisa.

Descrição dos participantes

Foram entrevistados seis homens, os quais apresentavam idades entre 35 e 56 anos. Houve prevalência de cinco homens casados, apenas um referiu ser solteiro. Em relação ao número de filhos, três mencionaram possuir entre dois a quatro filhos e dois não possuía filhos.

Referente à escolaridade e renda familiar apenas um apresentava o ensino fundamental completo, os demais alegaram ensino fundamental incompleto. Referiram receber entre um e três salários mínimos mensais, proveniente, para maioria dos homens, da aposentadoria.

Renda e escolaridade são fatores que interferem diretamente nas questões de saúde, podendo influenciar os sujeitos na concepção ou entendimento das informações sobre saúde, na adoção de atitudes de vida saudáveis, na utilização dos serviços de saúde e na adesão aos tratamentos terapêuticos (12).

Quanto ao tabagismo, dois homens relataram ser fumantes, um há vinte anos e outro há trinta. Cabe destacar que nenhum referiu ser etilista. De acordo com o Ministério da Saúde, a população masculina faz uso de bebidas alcoólicas e tabaco em maior frequência, quando comparado com a população feminina, o que contribui para o agravo à saúde e aumento de riscos e problemas em longo prazo (3,13).

Quanto às patologias, três dos entrevistados eram portadores de Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS), dois de Diabetes mellitus (DM), e um apresentava as duas doenças. Pesquisas realizadas em cidades brasileiras, nos últimos 20 anos, apontaram alta prevalência de HAS, sendo que 35,8% nos homens e 30% em mulheres (14). Estima-se, na população brasileira, que 11% da população igual ou superior a 40 anos seja portadora de DM (15).

Concepção de saúde

O profissional de enfermagem tem uma parcela e ação importante na realização de ações educativas de promoção da saúde e prevenção de doenças, bem como, no esclarecimento de dúvidas e na motivação da população masculina a cuidar da saúde (16)

Quando se trata de ações de promoção da saúde e prevenção de doenças, é importante conhecer a compreensão dos homens sobre o processo saúde-doença de acordo com o contexto no qual estão inseridos.

O conceito de saúde é diferente para cada pessoa, o qual envolve o conjunto sociocultural, político, econômico, assim como, valores individuais, princípios e crenças (17). Isto pode ser observado nos relatos obtidos, uma vez que os participante da pesquisa conceituaram a saúde de maneira diferente, como observado a seguir:

A saúde pra mim é o fundamental é, se a pessoa não tiver saúde, não adianta ter dinheiro [...]. Se não cuidar a saúde não adianta eu ter o melhor serviço, melhores carros, melhores mansões, se eu não tiver saúde [...]. Eu acho que a saúde é fundamental (G.S.,52).

Bom, a saúde pra mim seria, começaria pelo meio ambiente [... ] depois é a saúde com nosso corpo, cuidado, procurar fazer exame médico periodicamente [...]. Então, eu entendo que a saúde começa no meio ambiente, depois em casa, depois no corpo, e aí vai não é? Se houvesse mais prevenção, entendo eu, muita doença poderia ser evitada [...] (A.S.F.,56).

Diante dos relatos apresentados, é possível perceber que a saúde representa algo importante na vida dos entrevistados e principalmente necessário para sentir-se bem. É importante destacar, que a saúde é resultante de várias condições, tais como, alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, emprego, lazer e acesso aos serviços de saúde (18) e não apenas a ausência de doença (19).

As ações preventivas geralmente estão mais associadas às mulheres do que aos homens (20). Porém com base nos comentários de dois participantes, destaca-se que é possível identificar, a preocupação relacionada com os cuidados à saúde e a prevenção, descrito nas falas seguintes:

[...] então a vida vai te mostrando, que tu tem que ter cuidado com a saúde do modo geral, por que se tu não cuidar, tu vai deixando, tem certas doenças que se tu não ti prevenir, quando tu vai ver [...] já esta grave [...] (G.S, 52).

[...] o homem principalmente, e a mulher também, mas só que o homem né, a gente chega numa certa idade, o homem tem aquele tabu de não querer consultar, alguns exames, né, que constrange um pouco, mas tem que fazer [...]. Então pra mim a saúde começa, primeiro com a prevenção, assim como a segurança e outras coisas mais, tem que prevenir (A.S.F., 56).

Neste caso, o exame referido pelo entrevistado é o toque retal, o qual é considerado uma medida preventiva, de baixo custo, para detecção de câncer de próstata, porém a realização do procedimento afeta o imaginário masculino, o que contribui para o afastamento de muitos homens da prevenção do câncer de próstata (21).

Ao estabelecer um questionamento sobre a doença, pode-se perceber que esta também engloba percepções divergentes, como reproduzido nos discursos subsequentes:

[...] doença pra mim basicamente é algo que surge como problema de mau funcionamento do corpo humano, e que é difícil de resolver, isto é, que é difícil de curar e tratar, pra mim isto é doença (A.S.F., 56).

A doença, acho que é a pior coisa que pode acontecer com o ser humano [...], até uma dor de cabeça, uma dor de dente [... ] (G.S, 52).

Doença é uma coisa que desequilibra tudo, né (B.E.S.S., 56).

Ressalta-se a importância em conhecer a concepção de saúde e de doença da população, visto que esse enfoque está conectado à individualidade da pessoa, do contexto em que ela vive, e da sua cultura, na qual, espera-se que o enfermeiro, assim como demais profissionais da saúde, considere estas concepções para que juntos, profissional e usuário, possam planejar ações compatíveis com a realidade do indivíduo.

Percepção do cuidado (autocuidado) à saúde

Os participantes do estudo foram interrogados sobre a percepção de cuidado à saúde, apresentando diferentes concepções. Segundo a maioria dos entrevistados, o cuidado com a saúde é imprescindível, e abrange fatores como a prevenção, o conhecimento do corpo, a alimentação, a procura pelo médico e a realização de exames, como pode ser evidenciado pelos seguintes relatos:

[...] que é a prevenção né, eu acho que se nós nos prevenir, em primeiro lugar com a higiene, eu acho que isso aí já é o primeiro passo, não é? Por que se não tiver higiene, não se auto examinar, não conhecer o seu corpo, como vai ver se está precisando de ajuda ou não, então que tem haver um cuidado, assim nesse sentido, e uma prevenção, assim nesse sentido (A.S.F., 56).

É tu se alimentar sempre, tomar café da manhã, almoçar, jantar (pensativo), quando tem que sair pra dar uma volta, tu pode sair e tudo (A.M.R., 35).

Ah, procurar o médico de vez em quando, fazer algum exame, alguma coisa né, que é pra pessoa saber onde é que ele vai precisar, né (B.E.S.S., 56).

O cuidado à saúde de si mesmo ou autocuidado, é o comportamento do indivíduo para estabelecer e conservar a própria saúde, por meio do desenvolvimento de ações de promoção à saúde e prevenção de doenças para seu próprio benefício. Estas ações envolvem cuidados com a higiene, a alimentação, estilos de vida, fatores ambientais e fatores socioeconómicos (22).

Dentre as atividades de autocuidado realizadas, os entrevistados apontaram a participação no grupo, realização de consulta médica, uso de medicações para controle da HAS e DM, alimentação adequada e prática de atividades físicas, conforme apresentado na sequência:

Que eu realizo, é esses que eu tó fazendo né, ir no médico de vez em quando, frequentar aqui (referindo-se ao grupo), quando eu posso eu venho [...] (B.E.S.S., 56).

Ah eu, vindo no grupo, a medicação pra pressão alta né, diurético que eu tomo de manhã, tá faltando exercício que eu sou, que eu tó malandro [...],e no dia-a-dia de um modo geral no caso, desde o cabelo, a higiene pessoal, tudo faz parte de um geral [...] (G.S, 52).

Cabe ressaltar que as atividades desempenhadas coincidiram com o conceito de cuidado à saúde, referido pelos sujeitos anteriormente. Porém, nas falas não foi relatado sobre o que consideram alimentação saudável ou prática de exercícios corporais.

Em diversos momentos, os usuários dos serviços de saúde reproduzem o discurso hegemonicamente estabelecido como adequado, por exemplo, que são cuidadosos com alimentos gordurosos e que praticam atividade física (23), embora não o executem.

Diante das colocações dos homens, é notável que estes demonstraram preocupação frente à questão do cuidado à saúde, e também que realizam ações para cuidar desta, dentro das suas possibilidades, no meio ao qual estão inseridos. Estes discursos contradizem a literatura, que aponta que o cuidado é percebido como uma ação distintamente feminina, enquanto os homens são ensinados a serem fortes e resistentes (16).

Os participantes também foram questionados a respeito da realização de atividades de lazer, as quais são indispensáveis para a qualidade de vida. A maioria refere gostar de estar em casa, com a família e passear, podendo ser evidenciado pelas próximas falas:

[...] Eu sou muito de estar em casa, tomando um chimarrão, escutando uma música, ah me faz muito bem, às vezes eu saio também, não vou dizer que não, mas eu prefiro muito estar em casa [... ] (B.E.S.S., 56).

Diversas. Esportes, em geral, esportes e família, as coisas normais de família mesmo, uma festinha de família, uma saída no final de semana, uma reunião de família pra espairecer, por aí, em casa, saindo, na igreja, um futebol, não tenho problema, é normal (R.T.A., 50).

[... ] eu fico em casa, eu me sento no pátio, fico sentado, quando tem que dar uma volta, uma caminhada, eu dou uma volta ainda (A.M.R., 35).

Um dos sujeitos apontou o lazer, como algo necessário, além da dedicação ao trabalho e a família, como observado pelo seguinte discurso:

[...] porque a vida de um ser humano, que eu penso assim, não é só trabalho, trabalho, trabalho, tu tem horas de lazer, tem hora de trabalho, hora de dedicar a família, então tu tem que tá bem de saúde (G.S., 52).

As práticas de lazer proporcionam a realização de momentos, atividades, ações agradáveis e favoráveis ao tempo disponível. Além disso, o lazer permite que benefícios biológicos como, condicionamento físico e fortalecimento de sistemas metabólicos sejam alcançados, mas também tem influência em outros determinantes sociais de saúde como, acesso à cultura e sociabilidade (24). Estas práticas são de fundamental importância para promoção da saúde de forma integral, tendo como funções principais o descanso, o divertimento e o desenvolvimento da personalidade (25), as quais também precisam ser incentivadas pelos profissionais da saúde.

Quanto aos espaços de lazer no bairro no qual os entrevistados residem, a maioria relatou não haver atualmente nenhum local propício para momentos e atividades de lazer. Ainda é possível perceber a insatisfação de um dos entrevistados, identificada pela fala:

De lazer, não só aqui, mas em todos bairros, tá meio precário [...] mas isso aí é geral, não só no nosso bairro, todos bairros, toda cidade tu vai aí, não tem, era pra ter uma pracinha pra levar as crianças, tem local é, se procurar tem até, mas não como a gente queria que fosse (G.S., 52).

A promoção da saúde não está focada apenas nas ações dos sujeitos e profissionais, mas principalmente no ambiente social e ecológico em que se constituem (26). No município no qual o estudo foi realizado há poucos e precários espaços públicos disponíveis para lazer e práticas esportivas.

Questionou-se acerca da participação em atividades na comunidade, visto que a integração social pode influenciar na compreensão da saúde e seus cuidados. Observou-se que quatro dos participantes relataram não participar de nenhum grupo religioso, associação, conselho de saúde ou outro, apenas do grupo de Hipertensos e Diabéticos. Ainda, outros dois referiram participação em grupos religiosos. Os relatos estão descritos na sequência:

É, não, nós até fomos convidados, mas quando nós fomos convidados nós não tinha condições de integrar o grupo [...], grupos religiosos, às vezes a gente tem uma comunicação uns com os outros aí, somos lideres, aí a gente se encontra, troca ideia, aqui no bairro, outras cidades também [...] (A.S.F., 56).

É, não, a minha esposa é que vai (no grupo religioso), eu não [...]. Ela me convida pra ir, mas não sei, eu respeito às decisões dela e tudo, até adoro e acho bonito quem frequenta, mas não sei (B.E.S.S., 56).

A participação social permite o contato com as pessoas e grupos, e consequentemente o estabelecimento de vínculos sociais. Além disso, a participação no planejamento, nas decisões e ações da comunidade, contribui diretamente e efetivamente para a promoção da saúde da população (12, 27).

Desta maneira, percebe-se que são diversos os aspectos que podem ser investigados pelos enfermeiros e demais profissionais, para que se alcance melhor atenção à saúde da população masculina em Unidades Básicas de Saúde. Essas informações podem contribuir positivamente para a realização de ações voltadas à realidade da população, levando em consideração a singularidade de cada um. Ressalta-se a importância de identificar as necessidades de cuidados à saúde do homem, a partir das concepções de saúde e percepção de cuidados que cada indivíduo constrói, a partir da sua vivência.

 

Considerações finais

Acredita-se que por meio desta pesquisa, foram encontradas informações relevantes a respeito da percepção dos homens sobre o cuidado à saúde e o processo saúde-doença, como exemplo a preocupação destes com a realização de práticas de cuidado e efetivação de ações preventivas como forma de manutenção da saúde.

Foi possível observar que a compreensão dos homens sobre o processo de saúde e autocuidado, contribui para realização de ações, e essas são efetivas para a melhoria das condições de vida.

Conclui-se que a participação da população masculina nas ações de saúde é um desafio, tanto para o homem com suas particularidades, como também para os serviços de saúde e os profissionais atenderem a essa demanda.

Sugere-se que novas pesquisas referentes aos cuidados com a saúde do homem sejam efetivadas, incluindo diferentes realidades, contextos e percepções, no intuito de contribuir com as instituições e profissionais da saúde para o planejamento e concretização de ações no âmbito da promoção a saúde e prevenção de doenças.

 

 

Recebido: 18 de fevereiro de 2014
Aceito: 24 de abril de 2014

 

 

Referências

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