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Enfermería Global

versión On-line ISSN 1695-6141

Enferm. glob. vol.17 no.50 Murcia abr. 2018  Epub 14-Dic-2020

https://dx.doi.org/10.6018/eglobal.17.2.290051 

Originais

Convivência conjugal com o parceiro estomizado e suas implicações sociais e afetivas: estudo comparativo

Ana Lúcia da Silva1  , Ivone Kamada2  , João Batista de Sousa3  , André Luiz Vianna3  , Paulo Gonçalves de Oliveira3 

1 MD, PhD, Profesor Adjunto, Departamento de Enfermería, Universidad de Brasilia, Brasil.

2 MD, PhD, Professor Asociado, Departamento de Enfermería, Universidad de Brasilia, Brasil.

3 MD, PhD, Profesor Asociado, Departamento de Cirugía, Universidad de Brasilia, Brasil.

RESUMO:

A avaliação do problema da estomia e suas implicações sociais e emocionais na vida conjugal com um parceiro com colostomia é o ponto de partida deste estudo. A condição da pessoa com estomia permanente pode influenciar atividades sociais e diárias com seus cônjuges.

Objetivo

analisar os aspectos sociais e afetivos da convivência diária do cônjuge e seu parceiro com estomia intestinal definitiva.

Método

Estudo comparativo do tipo caso controle, de natureza quantitativa, realizado com cônjuges de estomizados, pareado aos de não estomizados, do Distrito Federal, Brasil. A amostra foi composta por 108 pessoas, sendo 36 cônjuges de estomizados denominado Grupo Caso e 72 cônjuges de não estomizados, intitulado Grupo Controle. Os dados foram coletados de outubro de 2011 a junho de 2012.

Resultados

Mostraram que o Grupo Caso quando comparado ao Grupo Controle, apresentou menor frequência a restaurantes, a eventos coletivos e participa menos de atividades de lazer. Quanto aos hábitos em praticar atividades físicas, à percepção acerca da estabilidade da convivência marital e à avaliação da relação afetiva, foram verificados índices semelhantes em ambos os grupos.

Conclusão

O cônjuge e seu parceiro estomizado sofrem mudanças na convivência diária, mas o vinculo conjugal e os laços afetivos do casal permanecem inalterados.

Palavras chave: Cônjuges; Estomia; Percepção Social; Estudo comparativo

INTRODUÇÃO

A causa mais frequente para a confecção da estomia intestinal é o câncer colorretal1. Isso representa um fato traumático na vida da pessoa, seja pelo estigma que o câncer carrega de morte, sofrimento, dor e medo, seja pelo tratamento, na maioria das vezes, agressivo. São inevitáveis as mudanças físicas e psíquicas, a interrupção de planos futuros, bem como as preocupações financeiras que consequentemente modificam a dinâmica de vida da pessoa, desde a sua rotina diária até sua estrutura familiar e conjugal.

Diante das alterações da imagem corporal o estomizado tende a sentir-se estigmatizado, por julgar-se diferente, ou seja, por não apresentar as características e os atributos físicos considerados normais pela sociedade. Geralmente, o estomizado prefere o isolamento social, o que compromete suas atividades de lazer e recreação. Evita frequentar locais públicos como restaurantes, igrejas, festas e outros. Quando necessita fazer refeição fora de casa, preocupa em sentar-se longe das outras pessoas no estabelecimento, em local mais afastado e em horários menos frequentados por outros2. Pode-se imaginar as razões para tal comportamento, pois não tem controle esfincteriano e está sujeito à eliminações de gases e fezes involuntariamente.

O suporte familiar e social é relevante na melhoria da autoestima e na reinserção social do estomizado3. Entretanto, os familiares sentem-se fragilizados ao deparar com o desconhecido universo da vida sócio-familiar que deverão enfrentar após a estomia do seu ente querido3. No convívio familiar, os estomizados sentem-se angustiados ao perceberem que a sua condição traz sofrimento aos seus entes queridos, mas ao mesmo tempo sentem contentes e confortados por tê-los ao seu lado1.

A dinâmica da convivência marital do cônjuge e seu parceiro com estomia intestinal deve ser observada como fator preponderante na readaptação à nova condição de vida. A pessoa estomizada tem dificuldade em relacionar-se com seu cônjuge, de forma natural, por imaginar ser difícil para o outro manter-se próximo, participarem juntos de atividades sociais e partilharem da mesma cama, devido à possibilidade de exalar odores desagradáveis, extravasar fezes na roupa, entre outras situações comuns na vida do estomizado2.

Estudo que avaliou a qualidade de vida dos cônjuges cujos parceiros tinham colostomia concluiu que viver com uma estomia permanente não afeta apenas o paciente, mas também afeta o cônjuge no que diz respeito aos aspectos físico, social, psicológico e no estilo de vida4. No entanto, em estudo de revisão sistemática foi detectado que há necessidade de orientação e de atividades educativas aos cônjuges de estomizados, pois na prática clínica atual ainda são negligenciados5.

Na literatura existem poucos estudos que fazem referência aos aspectos sociais e afetivos dos cônjuges de estomizados. Há maior enfoque em relação à temática da sexualidade do estomizado e de seu cônjuge6,7.

A presença do estoma influencia a vida dos cônjuges de várias maneiras, mas juntos de seus parceiros, enfrentam os problemas e os auxiliam a se adaptarem às suas novas circunstâncias8. Porem, nesse mesmo estudo, os cônjuges expressaram sentimento de muita solidão, porque as pessoas ao seu redor apenas demonstraram interesse em seu parceiro estomizado, e esqueceram que a doença teve um efeito sobre toda a família8. Assim, surge a necessidade de avaliar a experiência do cônjuge, em contraposição à presença da estomia intestinal do seu parceiro, principalmente nas repercussões sociais e afetivas.

O cônjuge é a pessoa mais próxima do parceiro estomizado, logo, pode ser considerado um prestador de cuidados que está presente no enfrentamento da doença, na manutenção do tratamento e no aprendizado do manuseio do equipamento coletor, dos acessórios, dentre outras tarefas advindas da estomia intestinal. Portanto, a convivência marital com o estomizado exige do cônjuge a adoção de inúmeras medidas de adaptação e reajustamento às atividades diárias. Entretanto, pouco se sabe das implicações que incidem sobre o cônjuge da pessoa com estomia intestinal permanente.

O presente estudo teve como objetivo analisar os aspectos sociais e afetivos da convivência diária do casal, na percepção do cônjuge de pessoas com estomia intestinal definitiva.

MÉTODO

Trata-se de estudo comparativo do tipo caso controle, de natureza quantitativa, realizado com cônjuges de estomizados pareado a cônjuges de não estomizados. Para constituição dos grupos foi realizado emparelhamento do tipo artificial. Para cada cônjuge de estomizado entrevistado foram selecionados dois cônjuges de não estomizados. Foram denominados cônjuges, neste estudo, os parceiros ou companheiros, independentemente do estado civil.

Para eliminar os fatores de confusão, os participantes dessa pesquisa foram emparelhados de acordo com as variáveis que poderiam influenciar na convivência diária dos cônjuges: idade, gênero, grau de escolaridade, renda familiar mensal e tempo de convivência marital.

Os critérios para composição da amostra foram os seguintes: aceitar participar do estudo; ter idade igual ou superior a 18 anos; fluência falada e escrita em língua portuguesa; ausência de doença incapacitante. Para os cônjuges de não estomizados, a exigência foi a convivência marital por no mínimo um ano e, para os cônjuges de estomizados, foi de no mínimo um ano antes e um ano após a confecção da estomia de caráter permanente. Outro aspecto considerado foi o de que os parceiros estomizados estivessem livres de sinais clínicos da doença e sem tratamento no momento da coleta de dados para que não houvesse interferência na análise dos aspectos sociais e afetivos do casal.

Os cônjuges dos estomizados foram selecionados a partir dos membros do Núcleo de Atenção Básica e do Estomizado, da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal (DF), Brasil. Para a constituição do grupo controle foram convidadas pessoas domiciliadas no DF com equivalência nas variáveis estudadas que atendiam aos requisitos do pareamento.

O estudo incluiu uma amostra de conveniência constituída por 36 cônjuges de estomizados e 72 cônjuges de não estomizados. A coleta dos dados foi realizada no período de outubro de 2011 a junho de 2012, por meio de instrumento autoaplicável e preenchido de forma autônoma pelo cônjuge, sem a presença de quaisquer outras pessoas, ficando o pesquisador em ambiente próximo caso houvesse necessidade de algum esclarecimento.

Foi elaborado instrumento específico para o presente estudo, pelos autores, a partir da experiência, de mais de 20 anos, no atendimento a pessoas estomizadas. Em seguida, o questionário foi revisado por cinco juízes, pesquisadores nas áreas do conhecimento metodológico, linguístico e da saúde. A validação se deu com a aplicação a cinco cônjuges de estomizados e a 10 cônjuges de não estomizados, com o objetivo de avaliar a adequação das questões, se eram suficientemente claras para que pudessem ser respondidas com segurança e sem margem para duplo entendimento. Após análise prévia, foi composto o instrumento aplicado na pesquisa.

O questionário foi composto por duas partes: dados sócio-demográficos e aspectos sociais e afetivos. Para caracterização dos aspectos sócio-demográficos analisou-se dados acerca da idade, gênero, grau de escolaridade, renda familiar, estado civil, tempo de união e naturalidade. Nos aspectos sociais e afetivos foram avaliadas as variáveis: hábitos de frequentar restaurantes, de participar de eventos coletivos, de atividades de lazer, as reações do cônjuge frente ao comportamento do parceiro de ficar isolado, interesse em sair de casa, o hábito de praticar atividade física, a percepção do cônjuge acerca da aparência física do parceiro e a situação da união conjugal. Na análise dos aspectos sociais e afetivos foi tomado como referência para o Grupo Caso, desde a confecção da estomia do parceiro e para o Grupo Controle, o início da união.

Os resultados foram analisados com o auxílio do software SPSS (Statistical Package for Social Sciences) 20.0 for Windows. Foi realizada análise estatística descritiva e, para comparação das variáveis, foi aplicado o teste qui-quadrado de Pearson. O nível de significância foi determinado como p( 0,05.

Estudo vinculado ao projeto: “A convivência conjugal com a pessoa estomizada e suas implicações sociais, psíquicas e sexuais”, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob protocolo CEP-FM Nº 011/2009 e todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

RESULTADOS

A amostra foi composta por 108 pessoas, sendo 36 cônjuges de estomizados denominado Grupo Caso e 72 cônjuges de não estomizados, intitulado Grupo Controle. A Tabela I espelha a distribuição das frequências por faixa etária e sexo dos participantes nos dois grupos caso e controle.

Tabela I Distribuição do grupo caso e controle quanto a faixa etária e sexo. (n= 108), Brasília, DF, Brasil, 2012. 

Em relação à renda familiar, a maior proporção, 52,8% no Grupo Caso e 45,7% no Grupo Controle, tinha renda anual acima de US$ 20.000. Não houve diferenças significantes entre as faixas de renda de até US$ 4.000, entre 4.000 e 8.000 e entre 8.000 e 20.000 dólares (p>0,05).

Quanto ao tempo de união estável, no Grupo Caso 35/36 (97,2%) das pessoas e no Grupo Controle 64/72 (90,2%) tinham mais de 5 anos de união (p>0,05). Na distribuição da naturalidade dos participantes do Grupo Caso, 13(36%) eram do Nordeste, 11(30%) do Centro-Oeste, 9 (25%) do Sudeste e 2 (5,6%) eram de cada região Norte e Sul. O Grupo Controle, 17 (23,6%) eram do Nordeste, 33 (45,9%) do Centro-Oeste, 16 (22,2%) do Sudeste e 2 (2,8%) eram de cada região Norte e Sul. Os parceiros dos cônjuges participantes deste estudo, todos possuíam estomia intestinal permanente e o tempo de estomia variou de um ano a mais de cinco anos.

Os resultados de partes das variáveis relativas ao convívio social estão descritos na Tabela II. Não foi observada diferença significante entre os dois grupos estudados (p>0,05).

Tabela II Distribuição de cônjuges segundo grupo e de acordo com os aspectos sociais. Brasília, DF, 2012. (n= 108). 

Reação apresentada pelo cônjuge acerca da preferência do parceiro a lugares isolados, mais tranquilos, 28 (77,8%) do Grupo Caso e 54 (75,1%) do Grupo Controle afirmaram que respeitam a vontade dos seus respectivos parceiros. Outros reagiram com indiferença, 5 (13,9%) do Grupo caso e 12 (16,7%) do Grupo Controle. Os demais não responderam ao questionamento. Não houve diferença estatística significante (p=0,124).

Na visão do cônjuge o interesse do parceiro em sair de casa, Grupo Caso, 25 (69,4%) mantiveram o interesse e 11 (30,6%) mudaram o interesse. O Grupo Controle 36 (50%) mantiveram o interesse em sair de casa e 36 (50%) mudaram o interesse em sair de casa. Não houve diferença significante (p=156).

Quanto às possíveis mudanças nos hábitos do cônjuge em praticar atividades físicas, no Grupo Caso 25 (69,4%) não mudaram seus hábitos, 6 (16,7%) mudaram parcialmente seus hábitos e 5 (13,9%) mudaram totalmente seus hábitos em praticar atividades físicas. O Grupo Controle 48 (66,7%) não mudaram seus hábitos, 15 (20,8%) mudaram parcialmente os hábitos e 9 (12,5%) mudaram totalmente seus hábitos em praticar atividades físicas. Não houve diferença estatística significante (p=0,870). Compreende-se por mudança parcial, aquela em que houve apenas alteração da rotina, e por mudança total a cessação completa da prática de atividades físicas.

No que tange à avaliação pessoal da aparência física do respectivo parceiro, os dados estão descritos na Tabela III. (p=0,086)

Tabela III Distribuição das variáveis de avaliação da aparência física dos parceiros dos entrevistados. Brasília, DF, Brasil, 2012. (n= 108). 

Quanto aos aspectos afetivos relativos às possíveis mudanças no relacionamento dos cônjuges, no Grupo Caso 23 (63,9%) afirmaram que não houve mudanças e 13 (36,1%) afirmaram que houve mudanças na convivência conjugal. No Grupo Controle 37 (51,4%) afirmaram que não houve mudanças e 35 (48,6%) afirmaram que houve mudanças na convivência conjugal. Não houve diferença significante (p=0,332).

Em relação a união conjugal, no Grupo Caso 30 (83,3%) afirmaram não haver riscos de separação e 6 (16,7%) afirmaram haver riscos. No Grupo Controle 61 (84,7%) afirmaram não haver riscos de separação e 11 (15,3%) afirmaram que há riscos de separação. Não houve diferença significante (p=0,471).

DISCUSSÃO

A realização do presente estudo, por aplicação de questionário, de natureza quantitativa, possibilitou avaliar a convivência conjugal com o parceiro estomizado e suas implicações sociais e afetivas.

Com relação à idade dos entrevistados, foi observado que a maioria encontrava-se na faixa etária de 31 a 60 anos. Sendo assim, pode-se inferir que, os estomizados aqui representados por seus cônjuges, estejam também nessa faixa etária, o que diverge de estudos anteriores que encontraram a maioria dos estomizados com idade superior a 60 anos9,10.

Em relação ao sexo, mostrou que grande parte do grupo investigado era do sexo femi nino. E também a maioria tinha grau de escolaridade superior e mais de cinco anos de união estável.

Referente à escolaridade, o ensino superior apresentou maior proporção no grupo caso, enquanto o grupo controle teve maior proporção no ensino médio, mesmo sem diferença significante. Neste estudo chama a atenção o predomínio do grau de escolaridade superior, resultado contrário a estudos de outros autores que detectaram em seus resultados a maioria dos participantes com ensino fundamental4,7,9. O nível mais alto de escolaridade pode facilitar a compreensão da doença e manuseio da estomia e ainda influenciar na condição financeira dos parceiros.

A renda familiar média nos dois grupos ficou acima de cinco salários mínimos para a maioria dos entrevistados, o que representa cerca de 20.000 dólares anuais. Em ambos os grupos a convivência marital, da maioria, foi superior a cinco anos. Esse resultado é coerente com o de outro estudo que concluiu que os cônjuges que possuíam união estável antes da operação a tendência era manter a união. E, os que não tinham o relacionamento sólido, inclinaram a ficar sozinhos após a estomia2. Quanto à procedência dos participantes, verificou-se que eram procedentes das cinco regiões do país, sendo a maioria, nos dois grupos, das regiões Nordeste e Centro-Oeste, o que é compreensível dado a localização geográfica onde o estudo foi realizado.

Na identificação dos aspectos sociais relacionados aos hábitos de frequentar restaurantes em companhia do parceiro, foi evidenciado que os cônjuges dos estomizados frequentam menos restaurantes, em comparação aos cônjuges dos não estomizados, porém não houve diferença significante entre os grupos. Contudo, quando se compara com os que vão frequentemente ou raramente, vê-se que a maioria dos casais do Grupo Caso frequenta restaurantes. Assim, a despeito da estomia, o casal continua a frequentar restaurantes. Estes resultados podem sugerir que a estomia não influencia no hábito de frequentar restaurantes por cônjuges dos estomizados. No entanto, na categoria “não frequenta restaurante”, observou-se que, no Grupo Caso, quase 20% não tem o hábito de frequentar restaurante.

Outros autores já afirmaram que os estomizados deixam de realizar as refeições em restaurantes e outros locais públicos, devido ao possível constrangimento causado pela eliminação de gases, fezes, ruídos e odores desagradáveis em ambientes de refeição, com tendência ao isolamento social2. Neste caso, se o estomizado sente-se estigmatizado e tem receio de ser rejeitado socialmente, essa condição pode se refletir no comportamento do cônjuge e consequentemente contribuir para a redução da frequência de participação em atividades sociais, tais como frequentar restaurantes.

Nesse sentido, a literatura confirma o receio do estomizado de alimentar-se em público, o que provoca redução do prazer da alimentação e leva ao isolamento ou exclusão social. Dessa forma, no presente estudo não fica claro se o cônjuge do estomizado tem menor frequência no hábito de ir ao restaurante em companhia do seu parceiro, em comparação ao Grupo Controle, por livre e espontânea vontade ou porque esta é a vontade do companheiro estomizado. Vale destacar que o cônjuge sente odor desagradável da estomia intestinal do seu parceiro estomizado e as mudanças impostas ao estomizado é uma situação partilhada entre o casal que mantém a condição em sigilo11.

Quanto à participação dos cônjuges em eventos coletivos definidos como festivais de música, shows artísticos, teatro, cinema e competições esportivas, registrou-se que os cônjuges do Grupo Caso participam menos em comparação com o Grupo Controle. Seguindo o raciocínio anterior, ao comparar os que comparecem frequentemente ou raramente, observa-se que a maioria do Grupo Caso também comparece a eventos coletivos com percentual aproximado do Grupo Controle nas mesmas categorias.

Neste caso fica evidente que os cônjuges de estomizados comparecem a eventos coletivos, inferindo que a estomia não interferiu nessa atividade. Entretanto, não se pode deixar de mencionar que 33,3% do Grupo Caso nunca participam de eventos coletivos. Resta dúvida se essa redução da frequência em atividades sociais dos cônjuges dos estomizados ocorre em razão da estomia do seu companheiro. Mas há que se refletir sobre registro em estudo anterior de que metade dos estomizados não retoma suas atividades de lazer ou retoma apenas parcialmente sua participação em eventos coletivos devido à insegurança com a qualidade dos equipamentos coletores, problemas físicos, dificuldades em higienizar-se e receio de problemas gastrintestinais12. Se o estomizado se isola e exclui-se da sociedade, o cônjuge é a pessoa com maior probabilidade de ser afetado por essas mudanças4.

Em relação ao hábito do cônjuge em sair com seu parceiro, foi avaliada a participação do casal em atividades de lazer como dançar, assistir a jogos esportivos (principalmente futebol), churrasco e frequentar clubes. Neste estudo, lazer ou recreação foi visto como parte do cotidiano, e buscou a satisfação pessoal e socialização. Dessa forma, foi verificado que o Grupo Caso participa menos das atividades de lazer quando comparado ao Grupo Controle. Mas, ao comparar aqueles cônjuges que participaram de atividades de lazer, mesmo que em baixa frequência, observou-se que era maioria nos dois grupos.

Esse resultado sugere que a estomia não é motivo para os cônjuges de estomizados deixarem de participar de atividades de lazer. Não obstante, 25% dos cônjuges de estomizados nunca participaram dessas atividades, o mesmo ocorrendo com 16,6% do Grupo Controle. Não há indícios de que as diferenças de percentuais relativas ao lazer são consequências da pouca socialização, mas os dados indicam que a apatia observada nos casais do Grupo Caso possa ser decorrente da estomia. Entretanto, pesquisadores enfatizam que a pessoa com estomia tem dificuldade de adaptar suas atividades de lazer e física13. Nesse sentido, estudo realizado com parceiros de pessoas com estomia permanente, revelou que mais de 70% dos cônjuges tiveram redução de atividades sociais de entretenimento depois que seu parceiro ficou colostomizado4.

Quanto à opinião do cônjuge diante do comportamento do seu parceiro estomizado em preferir ambiente tranquilo, isolado e manter-se distante de outras pessoas, foi inquirido qual seria sua reação e comparado aos cônjuges do Grupo Controle. As respostas dos dois grupos foram idênticas em sua maioria, em afirmar que respeitam a vontade dos seus respectivos companheiros. Isso pressupõe que a escolha do local não é determinada pela estomia, mas, sim pelo respeito à vontade do companheiro e que talvez possa ser um comportamento comum entre os casais independente da condição de saúde.

Quanto ao hábito de praticar atividades físicas e de recreação como ginástica, caminhada, bicicleta, natação, hidroginástica, ioga, dança, futebol e vôlei, foi observado que a maioria em ambos os grupos relatou que não houve mudança na prática de atividade física, sendo que o cônjuge do estomizado apresentou uma frequência ligeiramente superior ao cônjuge do não estomizado. Relativo à mudança parcial e total na prática de atividades físicas, o cônjuge do estomizado apresentou percentual maior quando comparado ao cônjuge do não estomizado. Dessa forma, o hábito de praticar ou não atividades físicas tem outras razões não influenciadas pela estomia intestinal do parceiro.

No presente estudo foi avaliada a percepção do cônjuge acerca do interesse de seu companheiro em sair de casa. Para o Grupo Caso, tomou-se como referência desde a presença da estomia intestinal do companheiro e no Grupo Controle, o início da convivência conjugal. Assim, em ambos os grupos, a maioria dos seus companheiros manteve o interesse em sair de casa. O Grupo Caso apresentou maior frequência relativa à manutenção do interesse em sair de casa e menor taxa de mudanças quando comparado ao Grupo Controle. Assim, esses achados sugerem que a estomia intestinal não interfere no interesse do companheiro em sair de casa, existem outros motivos que não foram identificados. Estudos anteriores apontam que a pessoa estomizada, com o passar do tempo, procura sair do isolamento e superar a discriminação e consegue conviver com a colostomia de forma saudável e se inserir nas atividades sociais2,14.

Quanto à avaliação pessoal da aparência física do respectivo companheiro do entrevistado, a maioria nos dois grupos afirmou que não houve mudanças. O Grupo Caso apresentou percentual maior (61%) quando comparado ao Grupo Controle (45,8%), contrariando as expectativas do senso comum. Aktas e Baykara15 afirmaram em seu estudo que, a confecção de um estoma intestinal acarreta alterações físicas inevitáveis ao estomizado e podem influenciar negativamente o interesse e admiração de seu parceiro íntimo15.

Apesar da constante busca por um corpo ideal não se pode esquecer que as mudanças são inevitáveis e fazem parte de um processo progressivo e irreversível independente da condição de saúde de cada um. As modificações fisiológicas, bioquímicas e psicológicas são consequentes à ação do tempo que não favorecem a manutenção do corpo ideal16.

As alterações na imagem corporal em decorrência da estomia são esperadas assim como o isolamento social inicial imposto pelo próprio estomizado. Devido ao uso do equipamento coletor, as pessoas com estomia modificam o modo de se vestirem, e geralmente usam roupas largas com o propósito de ocultar esses acessórios. Porém, esse tipo de estratégia contribui para o prejuízo na estética corporal2. Entretanto, o estomizado pode conviver melhor com sua nova imagem corporal quando há participação e envolvimento do seu cônjuge nos cuidados diários com o estoma15.

No presente estudo, os dados correspondentes à imagem corporal como “mais atraente”, os cônjuges de estomizado apresentaram menores taxas do que os cônjuges dos não estomizados. No entanto, na análise da aparência física como “menos atraente”, os cônjuges de estomizados tiveram avaliação positiva e apresentaram níveis menores em comparação com os não estomizados. A partir dos resultados encontrados pode-se argumentar que a estomia intestinal é considerada uma deficiência física “invisível” para o cônjuge e interfere ou não interfere na aparência física da pessoa. Estudo anterior aponta que algumas pessoas estomizadas, para driblarem o estigma, utilizam de estratégia de normalização e encobrimento, que consiste no esforço de se sentir normal, para não serem excluídas do convívio social e possivelmente para evitar perguntas de curiosos 2. Isso ocorre quando o estigma está relacionado a partes do corpo que devem ser escondidas em público, para não chamar atenção, assim o encobrimento é inevitável, quer desejado ou não17.

Dessa forma, há que se refletir sobre a percepção do cônjuge quanto à aparência física do seu companheiro estomizado, quando considerou que não mudou. Houve respondentes que afirmaram que seu companheiro estava mais atraente fisicamente. Com esse resultado, é possível pensar que a percepção de imagem corporal construída pelo indivíduo ao longo do tempo não seja alterada imediatamente pelo dano físico sofrido, exigindo uma lenta reestruturação perceptiva, pois as mudanças psicológicas ocorrem mais lentamente18.

Quanto à percepção do cônjuge acerca da estabilidade da convivência marital, os entrevistados dos dois grupos manifestaram que há estabilidade na união do casal e a maioria respondeu que não há riscos de rompimento do vínculo conjugal. Diante dessa afirmação dos cônjuges, parece que a estomia não torna vulnerável a união do casal. Assim, a discussão das variáveis da estabilidade da convivência marital, limitou-se ao encontrado neste estudo devido à escassez na literatura.

Na avaliação da relação afetiva dos casais, a maioria, nos dois grupos, afirmou que não houve mudanças, sendo que o Grupo Caso apresentou frequência maior em comparação ao Grupo Controle. Outro dado que chama atenção é que o cônjuge do estomizado teve menor frequência relativa à variável de ocorrência de mudanças na relação afetiva quando comparado ao cônjuge do não estomizado, o que demonstra que a estomia não é motivo de mudanças na relação afetiva do casal.

A convivência contínua com transtorno à saúde suscita sentimento de acomodação com a situação vivida e acaba por desenvolver nessas pessoas a tranquilidade e a confiança necessárias para continuar lutando e dar seguimento ao tratamento19. A convivência dos cônjuges e manutenção dos laços afetivos, compartilhando sentimentos, desapontamentos, diferenças e proximidades, pode ser um fator de satisfação conjugal 20.

Este estudo apresenta algumas limitações. A primeira delas é a escassez de literatura, estudos voltados para o entendimento das repercussões da estomia na vida do cônjuge, que limita a discussão dos resultados. A segunda relaciona-se ao tipo de estudo que aborda questões de foro íntimo e que pode ter influenciado os resultados, no que se refere ao desejo de tornar público informações de caráter pessoal. A terceira e última, a falta de informações dos hábitos sociais dos cônjuges antes da estomia do parceiro.

Por outro lado, o método de emparelhamento dos participantes pode sanar dúvidas quanto aos resultados quando comparados os dois grupos, considerando que os participantes possuíam as mesmas condições econômicas e sociais, ou seja, a mesma idade, renda familiar e grau de escolaridade.

CONCLUSÃO

Os cônjuges de estomizados, em sua maioria, têm o hábito de frequentar restaurantes, participar de eventos coletivos e de atividades de lazer, entretanto, quando comparado aos cônjuges de não estomizados, participam menos dessas atividades sociais. Mas os resultados não deixam claro se a estomia intestinal do companheiro é o motivo da baixa frequência aos eventos sociais citados. Contudo, ficou evidente que, nos casos estudados, apesar de perceber uma grande mudança em sua vida conjugal, o cônjuge mostrou-se solidário e presente no enfrentamento dessa nova situação juntamente com seu parceiro estomizado.

A escassez de estudos voltados para o entendimento das repercussões da estomia intestinal no cotidiano do casal prejudica a assistência ao estomizado e seu cônjuge que não recebem a devida atenção da equipe de saúde. Por isso, a análise e a compreensão dessa situação podem contribuir para melhorar a qualidade do atendimento de todos os envolvidos no processo da convivência marital do cônjuge e seu parceiro estomizado.

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Recebido: 29 de Março de 2017; Aceito: 11 de Junho de 2017

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