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Enfermería Global

versão On-line ISSN 1695-6141

Enferm. glob. vol.19 no.57 Murcia Jan. 2020  Epub 16-Mar-2020

https://dx.doi.org/eglobal.19.1.358351 

Originais

Sífilis na gestante e congênita: perfil epidemiológico e prevalencia

Giordana Maronezzi da Silva1  3  , Giovanna Brichi Pesce1  2  , Débora Cristina Martins1  3  , Cacilda Maria do Prado4  , Carlos Alexandre Molena Fernandes1  2 

1Universidade Estadual de Maringá – UEM. Brasil.

2Universidade Estadual do Paraná – UNESPAR. Brasil.

3Autarquia Municipal de Saúde de Apucarana. Brasil.

416ª Regional de Saúde de Apucarana. Brasil.

RESUMO

Objetivo

Descrever o perfil epidemiológico através das características sociodemograficas, obstétricas e do parceiro dos casos notificados de sífilis em gestantes e de sífilis congênita no período de 2012 a 2016.

Métodos

Trata-se de um estudo transversal e descritivo realizado na 16ª Regional de Saúde de Apucarana do estado do Paraná através das fichas de notificação compulsória de sífilis em gestante e sífilis congênita inseridas no Sistema de Notificação de Agravos e Doenças (SINAN).

Resultados

Foram notificados 257 casos de sífilis em gestante e 119 casos de sífilis congênita. A taxa de prevalência de sífilis gestacional foi de 0.97% e a taxa de incidência de sífilis congênita de 4.73%. As mulheres notificadas com sífilis em gestante (SG) e com recém nascido (RN) portador de sífilis congênita (SC) eram em sua maioria, brancas, jovens, com baixa escolaridade e residiam em zona urbana. Parceiros não tratados totalizaram 40,8% e 47.05% das mães foram consideradas com tratamento inadequado. Entre os nascidos vivos (NV) com SC, 69,7% não realizaram o TT aos 18 meses e 81.5% não fizeram o TNT no líquor.

Conclusão

O sistema de saúde deve ser reorganizado garantindo o seguimento e acompanhamento tanto da gestante quanto do recém-nascido.

Palavras chave: Perfil epidemiológico; Gestação; Sífilis congênita

INTRODUÇÃO

Causada pela espiroqueta Treponema pallidum, a sífilis é uma doença sistêmica, de evolução crônica e muitas vezes assintomática. Pode ser transmitida por via sexual e materno-fetal, sendo denominada de adquiria e congênita. A sífilis adquirida subdivide-se em recente se o tempo de evolução da doença for inferior a um ano (primária, secundária e latente recente) e se for mais de ano de infecção, como tardia (latente tardia e terciária). A SC classifica-se em recente quando surge até o segundo ano de vida e tardia quando surge após o segundo ano de vida1).

A infecção fetal geralmente ocorre entre a 16ª e a 28ª semanas de gestação, sendo que a taxa de transmissão vertical do Treponema palidum em mulheres não tratadas varia de 70 a 100%, considerando-se a fase primária e secundária da doença. No caso de gestantes não tratadas, a doença pode desencadear aborto espontâneo, natimorto ou morte perinatal em cerca de 40% das crianças infectadas 2.

Anualmente na América Latina e Caribe, estima-se que entre 166.000 e 344.000 crianças nasçam com SC. A sífilis afeta um milhão de gestantes por ano em todo o mundo, levando a mais de 300 mil mortes fetais e neonatais e colocando em risco de morte prematura mais de 200 mil crianças. Destaca-se ainda que 66% de todos os desfechos adversos ocorreram em mulheres que haviam sido atendidas pela assistência pré-natal 3.

Em 2009 a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) lançaram a Iniciativa Regional para a Eliminação da Transmissão Vertical do HIV e da Sífilis na América Latina e Caribe. Essa iniciativa regional, em 2010, se articulou ao Plano Global para eliminação de novas infecções pelo HIV e sífilis entre crianças até 2015 e manter suas mães vivas 4.

O boletim epidemiológico do Ministério da Saúde sobre a sífilis, em 2015, mostrou que no Brasil em 2004 a taxa de infecção era de 1,7 casos para cada 1.000 nascidos vivos e em 2013, essa taxa aumentou para 4,7, ou seja, um aumento de mais de 100%, em menos de dez anos. Acompanhando estes índices, a taxa de mortalidade infantil por sífilis também aumentou nos últimos dez anos, no Brasil, passando de 2,2 mortes por 100.000 nascidos vivos em 2004, para 5,5 em 2013 5. No ano de 2016, no Brasil, foram notificados 87.593 casos de sífilis adquirida, 37.436 casos de sífilis em gestantes e 20.474 casos de sífilis congênita totalizando 185 óbitos (6.

A sífilis congênita e a sífilis em gestantes são de notificação compulsória no Brasil desde 1986 e 2005, respectivamente. As informações sobre abortos, natimortos e nascidos vivos com sífilis congênita devem ser inseridas no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN), o monitoramento dessas infecções por meio do SINAN é de fundamental importância para a eliminação da sífilis, pois fornece subsídios para o planejamento de estratégias e definição das intervenções necessárias7.

Considerando a elevada incidência dessa doença; o tratamento eficaz e de baixo custo; o fácil acesso ao diagnóstico; o impacto dessa doença na saúde pública e a necessidade de seu controle, objetivou-se descrever o perfil epidemiológico através das características sociodemográficas, obstétricas e do parceiro dos casos notificados de SG e de SC no período de 2012 a 2016 na 16ª Regional de Saúde de Apucarana, no estado do Paraná, Brasil, buscando identificar possíveis falhas na assistência prestada à gestante para que se possa traçar estratégias junto à equipe que realiza atendimento para melhoria da qualidade dos serviços de saúde ofertados.

MATERIAL E MÉTODO

Trata-se de um estudo transversal e descritivo realizado na 16ª Regional de Saúde de Apucarana, composta por 17 municípios: Apucarana, Arapongas, Bom Sucesso, Borrazópolis, Califórnia, Cambira, Faxinal, Grandes Rios, Jandaia do Sul, Kaloré, Marilândia do Sul, Marumbi, Mauá da Serra, Rio Bom, Sabaúdia, São Pedro do Ivaí, que está localizada na região norte do estado do Paraná, contando com uma população de 346. 963 mil habitantes. O Paraná está localizado na região Sul do Brasil e conta com uma área territorial de 199.307,939 Km2, população de 10.44.526 habitantes, com rendimento nominal mensal domiciliar per capita de R$1.398,00, Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de 0,749 ocupando o quinto lugar no ranking do país8.

Foram incluídos todos os casos de SG e SC registrados no Sinan nos anos de 2012 a 2016, que atenderem ao critério de definição de caso confirmado segundo o Ministério da Saúde.

As características estudadas de acordo com as informações da ficha de notificação de sífilis em gestante e congênita:

  1. Sócio-demográficas maternas:

    • - idade (em anos: 10 a 14; 15 a 19; 20 a 34; 35 a 49).

    • - raça/cor da pele (branca; preta; amarela; parda; indígena).

    • -escolaridade: analfabeto; 1ª a 4ª série incompleta do Ensino Fundamental; 4ª série completa do Ensino Fundamental; 5ª à 8ª série incompleta do Ensino Fundamental; Ensino Fundamental completo; Ensino Médio incompleto; Ensino Médio completo; Ensino Superior incompleto; Ensino Superior completo; ignorado).

  2. Realização de pré-natal: (sim; não; ignorada/em branco).

  3. Obstétricas e de tratamento:

    • - momento do diagnóstico materno (1º, 2º, 3º trimestre ou idade gestacional ignorada).

    • - classificação clínica da doença (primária; secundária; terciária; latente; ignorada/em branco).

    • - teste treponêmico (reativo; não reativo; não realizado; ignorado/em branco).

    • - teste não treponêmico (reativo; não reativo; não realizado).

    • - esquema de tratamento prescrito à gestante (penicilina G benzantina2.400.000 UI; penicilina G benzantina 4.800.000 UI; penicilina G benzantina7.200.000 UI; outro esquema; não realizado; ignorado/em branco).

    • - tratamento do parceiro (sim; não; ignorado/em branco).

  4. Clínicas e laboratoriais do recém- nascido:

    • - titulação de VDRL (venereal disease research laboratory) em sangue periférico (reagente; não reagente; não realizado; ignorado/em branco).

    • - titulação de VDRL em líquor (reagente; não reagente; não realizado; ignorado/em branco).

    • - alteração do exame dos ossos longos (sim; não; não realizado; ignorado/em branco).

    • - evolução do caso (vivo; óbito por sífilis congênita; óbito por outras causas; aborto; natimorto).

As fichas de notificação compulsória consistem em um formulário padronizado com informações sociodemográficas e clínicas preenchidas por profissionais de saúde. A tabulação dos dados foi realizada pelo Tabwin 32. Osoftware Microsoft Excel2010 foi utilizado para entrada e análise de dados.

Para o cálculo da prevalência de SG utilizou-se o número total de notificações durante o período de 2012 a 2016 dividido pelo número total de gestações do mesmo ano e multiplicado por 100. O número de gestações foi obtido por meio da somatória do número de nascidos vivos e natimortos no período, excluindo-se os abortos.

A taxa de detecção de SG foi obtida pela razão do número de casos detectados em um determinado ano de notificação, pelo número de nascidos vivos no mesmo local e ano multiplicado por 1.0006.

A incidência de SC foi calculada por meio do número total de casos notificados no período estudado pelo número de nascidos vivos no mesmo período, multiplicado por 1.0006.

O número de nascidos vivos foi obtido do Sistema de Informações sobre nascidos vivos (Sinasc).

O estudo utilizou, exclusivamente, dados secundários de bases oficiais, os quais são de domínio público e não existe possibilidade de identificação dos indivíduos envolvidos, não havendo, portanto implicações éticas quanto à abordagem de seres humanos. No entanto, buscou-se seguir todos os princípios de confidencialidade de informações recomendados pela Resolução nº. 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde.

RESULTADOS

Na 16ª Regional de Saúde do Paraná, entre os anos de 2007 a 2016, foram notificados 257 casos de SG e 119 casos de SC no período de 2012 a 2016.

A taxa de prevalência de SG no período de 2012 a 2016 foi de 0.97% e a taxa de incidência de SC de 2012 a 2016 foi de 4.73%. Houve aumento considerável na taxa de prevalência de SG de 0.10% para 1.78%. O ano de 2016 apresentou o maior número de SG (n= 89; 34,6%), sendo a taxa de detecção de SG passou de 1,04 em 2012 para 17,9 em 2016 para cada mil nascidos vivos.

Em relação à faixa etária das gestantes com sífilis, 61,8% (n= 159) encontravam-se entre 20 e 34 anos (Tabela 1). Pertenciam a raça branca 65,3% das gestantes (n= 168) e possuíam escolaridade de 5ª a 8ª série incompleta 23,3% das gestantes (n=60). Importante salientar que 25,6% das fichas notificadas continham esse dado como ignorado/branco. Residiam em zona urbana 91,8% ( n=236) das gestantes, 6,61% (n= 17) em zona rural e em zona peri- urbana 1,55% (n=4). (Tabela 1)

Tabela 1. Distribuição das taxas de prevalência e detecção de sífilis em gestante e da taxa de incidência de sífilis congênita na 16ª Regional de Saúde do Paraná, 2012-2016. 

Quanto à classificação clínica da doença 49.8% (n= 128) foram classificadas como sífilis primária, 10,1% como secundária (n=26), 7% (n=18) como terciária e 1,55% (n=4) como latente. Ignorado/branco totalizaram 31,5% (n=81). Foi prescrito penicilina G benzatina 2.400.000 UI para 32,2% (n= 33) das gestantes, o esquema de penicilina G benzatina 4.800.000 UI para 9,72% (n=25) das gestantes, 35,7% (n=92), com 7.200.00 UI de penicilina G benzatina (n=92), outro esquema em 5.83% (n=15) e não tratadas em 9,72% (n=25). (Tabela 1)

Tiveram o TNT reativo 94,1% (n=242) das gestantes, 1,55% (n=4) não reativo e 3,89% (n=10) não realizaram. Com TT reativo 48,6% (n= 125), não reativo 5,44% (n=14), não realizaram o TT 33% (n=85) e ignorado 12,8% (n= 33). (Tabela 1)

Parceiros não tratados totalizaram 40,8% (n= 105), tratamento ignorado 21% (n=54) e os que realizaram tratamento 38,1% (n= 98). Como motivo para não tratamento do parceiro 42,8% (n=110) informaram esse campo como ignorado, 28,7% (n=74) como outros motivos, 14% (n= 36) dos parceiros não tiveram mais contato com a gestante, parceiro com sorologia não reagente 6,61% (n=17), 5,05% (n=13) dos parceiros foram convocados, porém não compareceram para realizar tratamento, 1,94% (n=5) dos parceiros não foram convocados para tratamento pela unidade de saúde, 0,77% (n=2) foram chamados pela unidade de saúde, porém recusaram tratamento. (Tabela 1)

A taxa de detecção anual de SC elevou-se de 0,41 em 2012 para 6,65 em 2016 para cada mil nascidos vivos. As mães que preencheram os critérios para definição de sífilis congênita, 78.1% (n= 93) pertenciam a raça branca, 67.22% (n= 80) estavam entre a faixa etária de 20 a 34 anos, 39.49% (n= 47) possuíam ensino médio incompleto ou completo, sendo que, 24.36% (n=29) tiveram essa informação ignorada nas notificações e 96.6% (n= 115) residiam em zona urbana.

Realizaram pré-natal 91,5% (n=109) das mães, sendo que 83.19% (n=99) foram diagnosticadas com sífilis durante o pré-natal. O TNT no momento do parto/curetagem foi realizado em 88.23% (n=105) das mulheres e o teste confirmatório treponemico não foi realizado no momento do parto em 68.06% (n=81) das gestantes.

Quanto ao tratamento materno, 47.05% (n=56) das mães foram consideradas com tratamento inadequado e 14.28% (n= 17) não realizaram tratamento. As parcerias sexuais de 50.42% (n= 60) das gestantes não foram tratadas concomitantemente.

Entre os nascidos vivos com SC, 95,7% (n=114) tiveram TNT no sangue periférico reagente, 69,7% (n=83) não realizaram o TT aos 18 meses e 81.5% (n=97) não fizeram TNT no líquor. O raio x de ossos longos não foi feito em 78.1% (n=93) dos RN, 73.9% (n= 88) obtiveram como diagnóstico final sífilis congênita recente, 31% (n=37) foram tratados com outro esquema não preconizado no protocolo do Ministério da Saúde, 97.4% (n=116) dos recém nascidos permaneceram vivos, 1.6% foram a óbito por outra causa e 0.84% tiveram a evolução ignorada na notificação.

Tabela 2. Distribuição das gestantes com sífilis (n=247), de acordo com as variáveis sociodemograficas, obstétricas e do parceiro, notificadas no Sinana na 16ª Regional de Saúde do Paraná, 2012-2016. 

aSinan: Sistema de Informação de Agravos de Notificação

bFTA-ABS: teste de absorção de anticorpos treponêmico fluorescente

cVDRL: venereal disease research laboratory

dUI: Unidades Internacionais

DISCUSSÃO

Observou-se aumento da prevalência de SG e incidência crescente de SC na 16ª Regional de Saúde do Paraná, como vem sendo notado em outras regiões do país 9)(10 e do mundo 9)(10)(11)(12)(13)(14)(15. As mulheres com sífilis são em sua maioria brancas, jovens e com baixa escolaridade e residem na zona urbana. A taxa de detecção de SG, no Brasil, no período de 2010 a 2016 aumentou cerca de três vezes, de 3,5 para 12,4 casos por mil nascidos vivos 6, resultado semelhante ao encontrado nesse estudo onde a taxa de detecção de SG no período de 2012 a 2016 passou de 1,040 para 17,96 por mil nascidos vivos. (Tabela 1)

As gestantes foram diagnosticadas, em grande parte, no primeiro trimestre de gestação, o que demonstra que a assistência pré-natal vem captando precocemente essa gestante e que a acessibilidade ao diagnóstico de sífilis na gestação foi preconizada conforme portaria estabelecida pelo Ministério da Saúde em 201116. O aumento considerável do diagnóstico de SG ao longo do tempo pode ser atribuído a considerável ampliação na oferta de testes rápidos de HIV e sífilis com a implantação da Rede Cegonha em 20114.

Aproximadamente metade das gestantes foram classificadas clinicamente com sífilis primária que se caracteriza por úlcera ou erosão no local de entrada da bactéria (vulva, vagina, colo uterino), geralmente única, indolor, com base endurecida e fundo limpo, sendo rica em treponemas, acompanhada ou não de linfadenopatia inguinal. Esse estágio pode durar entre duas a seis semanas e desaparecer espontaneamente17.

O tratamento prescrito a mais de um terço dessas gestantes é o preconizado para sífilis latente, tardia ou latente, com duração ignorada em que não se observa sinal ou sintoma clínico e sífilis terciária que é considerada rara e quando se manifesta aparece na forma de inflamação e destruição tecidual do sistema nervoso e cardiovascular17. Através desses dados podemos observar que o tratamento não condiz com a fase clínica da doença o que reflete a dificuldade dos profissionais de saúde em fazer o diagnóstico de acordo com a fase clínica e prescrever o tratamento adequado. Em um estudo realizado no Rio de Janeiro com profissionais pré-natalistas da rede pública dos serviços de saúde verificou-se diversas barreiras relacionadas ao conhecimento e a familiaridade com os protocolos assistenciais, dificuldades na abordagem as infecções sexualmente transmissíveis, questões dos usuários e contexto organizacional. Profissionais com mais acesso a treinamentos e manuais técnicos apresentaram melhor desempenho 18. Outro estudo realizado na Bolívia os profissionais de saúde relacionam como barreiras a eliminação da transmissão da sífilis a falta de informação e o pouco tempo disponível com as gestantes durante a consulta de pré-natal 14.

Quase a totalidade dessas mulheres tiveram o diagnóstico de sífilis confirmado e realizaram o TNT que apresentou-se reativo. O TT foi reativo em menos da metade das gestantes o que demonstra que essas mulheres não tiveram acesso aos dois tipos de testes necessários para o diagnóstico de SG conforme recomendado em protocolo do Ministério da Saúde 4.

Mais de um terço dos parceiros não foram tratados, resultados semelhantes em diversos estudos 10)(15)(19) e tiveram o motivo do não tratamento como informação ignorada nas notificações, observou-se falha na assistência prestada uma vez que as parcerias sexuais deveriam realizar testes imunológicos e serem tratadas com esquema de sífilis na mesma oportunidade em caso de dúvida no seguimento4.

O registro da assistência prestada e dos resultados encontrados constitui-se um efetivo instrumento de comunicação entre as equipes de saúde e permite o planejamento, a continuidade da assistência e a avaliação dos serviços prestados aos clientes. Além de subsidiar informações para questões jurídicas, de pesquisas, de educação e outras atividades relacionadas 20.

Nos últimos 10 anos, no Brasil, houve um aumento progressivo na taxa de incidência de SC, passando de 2 casos para cada mil nascidos vivos para 6,8 casos para cada mil nascidos vivos em 20166. Na 16ª Regional de Saúde de Apucarana identificou-se um aumento na taxa de incidência de SC de cerca de 16 vezes no período de 2012 a 2016, passando de 0,41 para 6.65 casos para cada mil nascidos vivos. (Tabela 1). Esse resultado está bem longe da meta de eliminação da SC proposta pela OMS em 2008 para América Latina e Caribe e incorporada pelo Ministério da Saúde de 0,5 caso ou menos para cada mil nascidos vivos até o ano de 20154,19. A escolaridade dessas mães foi em sua grande parte notificada como informação ignorada e nos casos notificados o maior percentual foi de mães com ensino médio completo, quase a totalidade reside em zona urbana.

Mais da metade das mães estavam na faixa etária de 20 a 34 anos e pertenciam a raça branca, ou seja, são mães jovens, brancas e com mais de três anos de estudo, características essas que as excluem de fatores de risco que as classificariam como sendo de risco intermediário1.

Quase a totalidade das gestantes realizaram pré-natal e mais de dois terços dessas foram diagnosticadas durante o acompanhamento gestacional, conforme encontrado em outros estudos 7)(14)(7) o que demonstra a fragilidade nos serviços de saúde que atendem esse público no que tange ao acompanhamento, seguimento e controle da sífilis em gestante. Quanto a realização de testes, o TNT com resultado reagente foi constatado em grande parte das gestantes, já o TT não foi realizado em mais da metade das gestantes, o que contraria os protocolos criados pelo Ministério da Saúde e evidencia mais uma possível falha no acompanhamento dessas pacientes 4)(16.

Aproximadamente metade das gestantes com sífilis que tiveram seu RN notificado com SC receberam tratamento inadequado e não tiveram as parcerias sexuais tratadas, o que foi verificado em vários outros estudos realizados em diferentes localidades do Brasil 10)(11)(14)(17. As parcerias sexuais devem ser convocadas até o serviço de saúde para receberem orientações, serem avaliadas clinica e laboratorialmente e receberem tratamento quando necessário. Caso as parcerias sexuais não atendam esse chamado, a receita com prescrição do tratamento deve ser enviada pela gestante. As atividades relacionadas ao diagnóstico, seguimento e controle da doença no parceiro sexual ainda são pouco estruturadas e a falta desse serviço é perceptível na transmissão da SC 12.

Tabela 3. Características sociodemográficas e clínicas das mães dos nascidos vivos com sífilis congênita (n=119) notificados no Sinana na 16ª Regional de Sáude do Paraná, 2012-2016. 

aSinan: Sistema de Informação de Agravos de Notificação

Tabela 4. Características diagnósticas dos casos de sífilis congênita (n=119) notificados no Sinana na 16ª Regional de Saúde do Paraná, 2012-2016. 

aSinan: Sistema de Informação de Agravos de Notificação

A Nota Informativa No. 2-SEI/2017- DIAHV/SVS/MS, para fins de vigilância epidemiológica, não considera como critério de definição de caso de SC, o tratamento da parceria sexual da mãe6.

Quanto ao seguimento do recém-nascido com SC, quase a totalidade, obtiveram TNT reagente em sangue periférico, já o TNT do líquor e o raio x de ossos longos não foi realizado em mais de dois terços desses recém-nascidos, o que aponta para falha na assistência prestada em ambiente hospitalar, uma vez que para a definição do diagnóstico da SC são necessários os seguintes exames: amostra de sangue (hemograma, perfil hepático e eletrólitos); avaliação neurológica (punção liquórica: células, proteínas, testes treponêmicos e não treponêmicos); Raio-X de ossos longos; Avaliação oftalmológica e audiológica16.

O TT para sífilis deve ser realizado aos 18 meses para seguimento e controle de cura da sífilis congênita 16)(21, no entanto, mais de dois terços das crianças notificadas com SC não realizaram esse exame.

Obtiveram como diagnóstico final sífilis congênita recente mais de dois terços dessas crianças e aproximadamente um terço dessas foram tratadas com outro esquema, ou seja, um tratamento diferente do proposto pelo Ministério da Saúde nos protocolos em vigência. A grande maioria dessas crianças permaneceram vivas, sendo registrados 2 óbitos por outras causas que não a SC.

CONCLUSÃO

Os resultados desse estudo demonstram um incremento nas taxas de detecção de SG e SC, sendo que essas mulheres são em sua maioria brancas, jovens, com baixa escolaridade e residentes em área urbana. O diagnóstico foi realizado em grande parte no pré-natal o que demonstra que essas gestantes estão sendo assistidas, porém não efetivamente, pois o tratamento não condiz com a classificação clínica. Outras falhas na assistência são perceptíveis nos dados como a não realização dos dois tipos de testes (treponemico e não treponemico) e o não tratamento das parcerias sexuais. Quanto ao atendimento realizado em ambiente hospitalar identificou-se falhas como a não realização do teste treponemico de liquor e do raio x de ossos de longos, exames esses essenciais para o diagnóstico de sífilis congênita. Ocorreu falha também no seguimento dessa criança aos 18 meses. O sistema de saúde deve ser reorganizado garantindo o seguimento e acompanhamento tanto da gestante quanto do recém-nascido e os profissionais de saúde devem ser sensibilizados quanto a conseqüências das falhas na assistência prestada ao binômio mãe-filho para que o Brasil possa se encaminhar para o cumprimento dos objetivos de eliminação da sífilis congênita estabelecidos pela Organização Mundial de Saúde.

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Recebido: 15 de Janeiro de 2019; Aceito: 15 de Fevereiro de 2019

Giordana Maronezzi da Silva: giordanamaronezzi@hotmail.com

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