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Enfermería Global

versão On-line ISSN 1695-6141

Enferm. glob. vol.19 no.58 Murcia Abr. 2020  Epub 18-Maio-2020

https://dx.doi.org/eglobal.389551 

Originais

Análise de falhas e efeitos na preparação e dispensação de quimioterápicos

Priscila Cumba de Abreu Costa1  , Vilani Medeiros de Araújo Nunes1  , Isac Davidson Santiago Fernandes Pimenta1  , Thiago da Silva Bezerra1  , Grasiela Piuvezam1  , Zenewton André da Silva Gama1 

1Departamento de Saúde Coletiva. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Natal/RN, Brasil.

RESUMO

Objetivo

Realizar uma Análise Multimodal de Falhas e Efeitos para identificar prospectivamente os riscos relacionados à fase do preparo e dispensação de medicamentos quimioterápicos em uma unidade ambulatorial de um centro de referência em oncologia.

Métodos

Foram utilizadas as seis primeiras etapas da Análise Multimodal de Falhas e Efeitos: identificar as situações perigosas e montar uma equipe; definir o processo a ser analisado descrevendo graficamente; aplicar chuva de ideias buscando identificar modos de falhas; priorizar os modos de falhas e realizar análise dos riscos; identificar causas potenciais dos modos de falha e redesenhar o processo.

Resultados

Foram identificados dezessete modos de falha, sendo dois classificados como de alto risco: trocar a janela de saída do medicamento e cálculo errado da dose de medicamento intratecal.

Conclusões

Foram identificados os possíveis modos de falha que se relacionavam ao processo analisado, além disso, foi possível definir causas potenciais para a existência desses riscos.

Palavras-chave: Análise do Modo e do Efeito de Falhas na Assistência à Saúde; Segurança do Paciente; Erros de Medicação

INTRODUÇÃO

Nos últimos anos os serviços de saúde aumentaram sua preocupação com os erros relacionados à assistência em saúde. Várias iniciativas surgiram relacionadas à segurança do paciente, porém o marco principal ocorreu em 1999 com a divulgação do relatório “To err is Human: building a safer health system”, pelo Institute of Medicine (IOM) dos Estados Unidos da América (EUA). De acordo com o IOM foram estimados que erros associados à assistência à saúde causavam aproximadamente 44.000 a 98.000 mortes a cada ano nos hospitais americanos1. Tal relatório trouxe à tona a quantidade de erros e eventos adversos (EA) que ocorrem nos serviços de saúde. Esses eventos ocasionam vários danos aos pacientes aumentando a permanência hospitalar, custos sociais e, até mesmo, resultando em morte prematura2.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) segurança significa “redução, a um mínimo aceitável, do risco de dano desnecessário associado ao cuidado de saúde3. A segurança no uso de medicamentos visa redução de erros no processo de medicação que se divide em várias etapas com alto risco de falha.

O erro de medicação pode ser definido como um evento de natureza evitável que levou ou pode potencialmente levar ao uso inadequado de medicamento. O erro pode estar relacionado à prática profissional, produtos usados na área de saúde, procedimentos, problemas de comunicação, incluindo prescrição, rótulos, embalagens, nomes, preparação e dispensação (sendo estes o foco do presente estudo), distribuição, administração, educação, monitoramento e uso de medicamentos4. Apesar da potencial gravidade destes eventos, acredita-se que muitos ainda são subnotificados5. Um estudo conduzido no Brasil demonstrou que cerca de 20% dos eventos adversos ocorridos em centros de saúde estão relacionados com a medicação6.

Os medicamentos antineoplásicos são considerados potencialmente perigosos e os erros decorrentes de sua utilização podem ocasionar lesões permanentes ou até a morte7. Soma-se a isso o fato de que esses medicamentos apresentam baixo índice terapêutico, isto é, o valor da dose tóxica é muito próximo do valor da dose eficaz, possuindo alto potencial para causar eventos adversos. O tratamento com quimioterápicos envolve o uso simultâneo de vários medicamentos adjuvantes com o intuito de obter efeito terapêutico sinérgico com menor toxicidade possível7.

Estudos apontam que os erros relacionados a medicamentos antineoplásicos ocorrem numa taxa de 1 a 4 em cada 1000 pedidos de medicação, afetando cerca de 1 a 3% dos pacientes oncológicos tanto adultos como pediátricos e além disso, ocorrem em todas as etapas do processo de utilização desse tipo de medicamento8.

A literatura destaca muitos erros na fase de prescrição e administração9 10 11, porém na fase de preparo e dispensação há pouca ênfase. O Instituto para Práticas Seguras no Uso dos Medicamentos (ISMP) recomenda a aplicação de ferramenta de gerenciamento de risco como Failure Mode and Effects Analysis(FMEA) para minimizar falhas em todo processo da medicação12.

Esta ferramenta é utilizada pela indústria para avaliar proativamente potenciais falhas em um determinado processo13 14. Desde então passou por diversas atualizações, sendo amplamente utilizada em diversos setores tais como aeroespacial, automobilístico dentre outros. O Healthcare Failure Mode and Effects Analysis(HFMEA) é uma forma simplificada e adaptada da Análise Multimodal de Falhas e Efeitos (AMFE) aos serviços de saúde. Possibilita a identificação, de forma proativa, de vulnerabilidades em um sistema de cuidados assistenciais em saúde. Baseia-se no conceito de que um risco não está relacionado somente com a probabilidade de que uma falha ocorra, mas com a gravidade de suas consequências13 14. Após a identificação e análise dos modos de falha, seus efeitos e causas, são estabelecidas prioridades de intervenções e recomendações com o intuito de identificar as mudanças necessárias para eliminar ou diminuir os riscos de eventuais falhas. É realizada a análise de um processo do início ao fim a partir de um grupo de especialistas na área avaliada. Atualmente há poucos estudos com descrições estruturadas de AMFE ou HFMEA no Brasil, particularmente na análise e prevenção de riscos associados a medicamentos quimioterápicos e uma evidente necessidade de aplicação do AMFE como avaliação prospectiva dos modos de falhas e seus efeitos, nas atividades de dispensação e preparação dos medicamentos quimioterápicos, corroborando para uma melhora na qualidade e segurança do paciente.

Portanto, o presente estudo teve como objetivo realizar uma Análise Multimodal de Falhas e Efeitos para identificar prospectivamente os riscos relacionados à fase do preparo e dispensação de medicamentos quimioterápicos em uma unidade ambulatorial de um centro de referência em oncologia.

MATERIAL E MÉTODOS

Trata-se de um estudo descritivo da aplicação da metodologia de Análise Multimodal de Falhas e Efeitos (AMFE), realizado em uma unidade ambulatorial de um centro de referência em oncologia, filantrópico, da cidade de Natal - Rio Grande do Norte, Brasil. A AMFE é composta por oito etapas: 1- identificar as situações perigosas e montar uma equipe; 2- definir o processo a ser analisado descrevendo graficamente; 3- aplicar chuva de ideias buscando identificar modos de falhas; 4- priorizar os modos de falhas e realizar análise dos riscos; 5- identificar causas potenciais dos modos de falha; 6- redesenhar o processo; 7- analisar e testar o novo processo; 8- elaborar intervenções e indicadores 15. No presente estudo reportamos somente as etapas de 1 a 6, as quais foram viáveis para realização no serviço em questão.

Etapa 1: identificar as situações perigosas e montar uma equipe

A AMFE foi aplicada na fase de preparo e dispensação de quimioterápicos pelo serviço de farmácia de uma unidade onde são realizadas sessões de quimioterapia ambulatorial. O serviço de farmácia da referida unidade realiza em média 3000 preparações de quimioterápico parenteral/mês ou aproximadamente 125 preparações/dia, 1700 hormonioterapias, além de entrega de quimioterápico oral.

O processo a ser avaliado foi selecionado por ter um risco ou vulnerabilidade potencialmente alto16 17. Observando o grande volume de quimioterápicos manipulados (125 preparações/dia) e administrados no hospital de referência, definiu-se o erro de medicação como proposta para aplicação da AMFE.

Para a aplicação da ferramenta foi composta uma equipe multidisciplinar, formada por colaboradores envolvidos diretamente no processo de preparo e dispensação de medicamento quimioterápico. Os critérios de seleção dos participantes da equipe foram: ter experiência na área de quimioterapia de pelo menos 2 anos, aceitar participar do processo de desenvolvimento da AMFE e ter disponibilidade para participação das reuniões.

Constituíram a equipe quatro farmacêuticos com experiência na área variando de três a doze anos, dois enfermeiros especialistas com tempo de experiência entre cinco e vinte e três anos, um técnico de enfermagem com quatro anos de experiência e a pesquisadora como mediadora, que possui doze anos de experiência na área de enfermagem oncológica. Posteriormente a equipe foi apresentada a todas as etapas que constituem a aplicação da AMFE e seus objetivos através de folder explicativo. Todas as reuniões da equipe foram realizadas durante o horário de trabalho dos participantes.

Etapa 2: definir o processo a ser analisado descrevendo graficamente

O processo do medicamento se inicia pela avaliação médica do paciente, bem como resultados de exames laboratoriais para então avaliar possível liberação ou não da medicação quimioterápica. Em seguida o médico realiza a prescrição digital pelo computador e a imprime anexando a cópia ao prontuário do paciente. O paciente é encaminhado para o setor de administração de quimioterapia juntamente com seu prontuário, onde é cadastrado o atendimento, digitada a dose e confeccionada a etiqueta do medicamento. Dentro do processo do medicamento foi selecionado o subprocesso “Preparação e dispensação” do medicamento.

O fluxograma do subprocesso de preparação da medicação foi definido baseado no conhecimento da equipe envolvida e elaborado na primeira reunião. Tal conhecimento foi de suma importância, pois facilitou a identificação de modos de falha em cada uma das etapas do preparo e dispensação de medicação que envolve, tanto profissionais da farmácia, quanto da enfermagem conforme a Figura 1.

Fonte: Autoria própria

Figura 1. Descrição do subprocesso de preparo e dispensação de medicação. 

Etapa 3: aplicação da chuva de ideias para identificação dos modos de falhas

Foram realizadas quatro reuniões com duração aproximada de uma hora e meia cada e participação de toda a equipe. Na primeira reunião foi explicado em que consistia a ferramenta AMFE, bem como os instrumentos auxiliares para sua aplicação. Foram fixadas regras para casos de divergências nos resultados das análises de risco, sendo estabelecido o consenso para as tomadas de decisões. Após definição do processo a ser analisado e o subprocesso escolhido foram identificados os possíveis modos de falha para cada uma das etapas utilizando-se o método brainstorming.

Etapa 4: priorização dos modos de falhas e análise dos riscos

Os modos de falha citados foram agrupados em uma Tabela e em seguida, para cada modo de falha foi aplicada a Matriz de Pontuação de Risco como forma de determinar a severidade do risco versusprobabilidade de ocorrência.

O resultado da Matriz de Pontuação de Risco se dá pela multiplicação da probabilidade de ocorrência da falha (Frequente, Ocasional, Pouco comum, Remota) com a gravidade de suas consequências (Catastrófico, Importante, Moderado, Menor). Modos de falhas com valores maiores ou iguais a oito são falhas com risco de ocorrência onde devem ser identificadas as causas potenciais. Com intuito de diminuir a subjetividade de cada critério quanto à gravidade do efeito e probabilidade de ocorrência, utilizou-se a classificação proposta pelo Veteran Affair National Center for Pattient Safety(VA) apresentada no Quadro 1 16.

Quadro 1: Critérios para classificar a gravidade das falhas analisadas com AMFE 

Fonte: DeRosier J, et al 16 e adaptado pelos autores.

Para os modos de falha que obtiveram pontuação ≥ 8 aplicou-se a Árvore de Decisão para HFMEA (Figura 2), que considera dois critérios adicionais: criticidade (se a falha é fundamental para o processo) e possibilidade de detecção (se seu aparecimento é óbvio e pode ser modificado a tempo)16. Após aplicação da Árvore de Decisão foi possível determinar quais modos de falha deveriam prosseguir para a etapa seguinte. A partir dos resultados obtidos foi elaborada e encaminhada ao responsável técnico pela farmácia uma proposta com ações de melhoria para prevenção de riscos.

Fonte: DeRosier J, et al. 16 e adaptado pelos autores.

Figura 2. Árvore de decisão para AMFE 

Aspectos éticos

Por tratar-se de pesquisa que objetiva o aprofundamento teórico de situações que emergem na prática profissional e que não revelam dados identifiquem os sujeitos participantes, o presente estudo atende as orientações do artigo VII da Resolução nº 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde do Brasil, estando relacionado aos protocolos inseridos nos setores da instituição participante tendo como objetivo contribuir com a segurança dos pacientes nas etapas de preparação e dispensação de medicamentos quimioterápicos.

RESULTADOS

Foram identificados 17 modos de falha na fase de preparação e dispensação de medicação conforme Quadro 2.

Quadro 2: Modos de falha segundo Matriz de Priorização 

Fonte: Autoria própria

Dentre os 17 modos de falha, três obtiveram valor > 8 e foram, portanto, analisados com a árvore de decisão para HFMEA: Trocar a janela de saída de medicação já preparada, Cálculo errado da dose de medicação intratecal e Aspirar volume errado de medicação na hora do preparo. O modo de falha “Aspirar o volume errado de medicação na hora do preparo” teve indicação de ser interrompido pela Árvore de Decisão, pois pode ser detectado no momento em que ocorre. Com isso tivemos dois modos de falha potencial que seguiram para a etapa seguinte do HFMEA, para propor medidas e ações de melhorias.

Etapa 5: identificação das causas potenciais dos modos de falha

Diversas causas potenciais foram identificadas junto à equipe, permitindo visualizar possíveis falhas antes não percebidas, como descrito no Quadro 3.

Quadro 3: Causas potenciais dos modos de falha 

Fonte: Autoria própria

Quanto às causas potenciais do modo de falha relacionados à “Troca da janela de saída de medicação já preparada” podemos descrever como possíveis causas: falta de atenção, sinalização da janela e de conhecimento do processo por parte dos profissionais. Se tal falha ocorresse poderia ocasionar uma nova administração de medicação em um soro já preparado acarretando sobredose de medicação, trazendo riscos para o paciente dependendo da medicação em questão.

Em relação ao modo de falha "Cálculo errado da dose de medicação intratecal”, se tal erro ocorrer pode ocasionar danos graves ao paciente, por vezes fatais 18. As possíveis causas potenciais para esta falha seriam a calculadora com defeito, mudança na apresentação da medicação ou sobrecarga de trabalho.

Etapa 6: redesenho do processo

A partir da identificação dos possíveis modos de falha relacionados à "Troca da janela de saída de medicação pela janela de entrada", o processo foi redesenhado da seguinte forma: em relação a "falta de atenção", foi estipulado um limite de medicações a serem manipuladas por vez e como indicador a verificação de diária de medicações manipuladas por hora. Quanto à "falta de sinalização nas janelas", as mesmas serão sinalizadas (tanto na parte interna como na parte externa) contendo instruções de trabalho. Em relação à "falta de conhecimento do processo" serão oferecidos treinamentos sistemáticos com base nos protocolos já existentes no setor.

No que se refere ao modo de falha "Cálculo errado da dose de medicação intratecal", foram sugeridas as seguintes alterações: para a causa "calculadora com defeito", foi recomendado o cálculo da dose de medicação utilizando calculadoras distintas. Na causa "mudança na apresentação da medicação" foi sugerida a utilização de rotulagem em impresso próprio. A falha "sobrecarga de trabalho" teve como sugestão de redesenho a dupla checagem às cegas dos medicamentos a serem dispensados.

DISCUSSÃO

A aplicação da ferramenta AMFE na unidade de farmácia possibilitou identificar os possíveis modos de falhas que até então eram imperceptíveis, demonstrando algumas vulnerabilidades potenciais no processo de preparo e dispensação do medicamento quimioterápico.

Segundo revisão integrativa os principais fatores de risco identificados para ocorrência de erros relacionados ao preparo de medicamentos estão associados a fatores psicológicos, como sobrecarga de trabalho; os fatores relacionados ao ambiente de trabalho e ao déficit de atualização em educação em saúde19.

No que se refere ao excesso de trabalho por parte dos profissionais de saúde, este é um dos fatores de riscos mais citados como desencadeante de estresse e falta de atenção, facilitando desta forma a ocorrência de erros20 21. Outros estudos também apresentam como causa de falhas o acúmulo de trabalho22 23. Devido à quantidade de medicamentos manipulados serem alta e observando que muitos profissionais possuem jornadas duplas de trabalho, sugeriu-se um limite de medicações a serem manipuladas por vez pelo farmacêutico.

Em relação às falhas relacionadas ao ambiente de trabalho, já existem no Brasil resoluções que orientam que o ambiente de preparo de medicação deve possuir boa iluminação e ventilação, e que o acesso deve ser restrito aos profissionais diretamente envolvidos no processo para minimizar distrações24. A estrutura física da farmácia onde o estudo foi aplicado é adequada, possui boa iluminação e barreiras físicas entre os setores, porém faltam algumas sinalizações quanto aos processos que são realizados em cada local.

Quanto à educação continuada, esta visa levar o conhecimento dos protocolos já existentes no setor, para o máximo de colaboradores envolvidos no processo do medicamento quimioterápico, garantindo a qualidade da formação dos profissionais da instituição. A educação em saúde é uma das ferramentas que busca a adesão da equipe de forma participativa e dinâmica podendo ser realizada por meio de aulas, rodas de conversa ou momentos do saber, prática já difundida na farmácia em questão.

Algumas limitações foram identificadas, a primeira está relacionada à dificuldade de reunir a equipe completa para todas as reuniões que foram propostas, devido disponibilidade de tempo dos próprios colaboradores. A quantidade de reuniões pode ter restringido a possibilidade de explorar de forma exaustiva outros modos de falhas não identificados. Outra dificuldade encontrada está relacionada ao consenso dos participantes quanto à gravidade dos efeitos das falhas identificadas. Mesmo disponibilizando o quadro explicativo quanto à gravidade das falhas, estas variavam consideravelmente entre um colaborador e outro. Tal fato pode se dar pelo tempo de experiência dos funcionários, ou as realidades de trabalho distintas.

Uma das limitações encontradas na AMFE refere-se à tendência de superestimar ou subestimar a gravidade do efeito da falha, por se tratar de uma possibilidade prospectiva25. Essa tendência foi perceptível em nossa aplicação da AMFE, onde ao final da avaliação, os modos de falha recebiam pontuação muito abaixo do “esperado” ao ser decido por consenso.

Outras limitações do estudo, tendo em vista que o mesmo foi realizado em uma única farmácia, especializada em quimioterapia, que possui características locais específicas. Portanto, os resultados obtidos podem não ser comuns a outras farmácias especializadas em quimioterapia. O presente estudo propôs a aplicação da AMFE para identificar modos de falhas prospectivos e sugerir intervenções. A realização de um estudo posterior possibilitaria a avaliação da efetividade das medidas tomadas contemplando as etapas 7 e 8 descritas pela metodologia da AMFE.

Durante o desenvolvimento do presente estudo, percebeu-se que a análise prospectiva de um processo circunscrito permite uma ampla avaliação de possíveis modos de falha. O estudo contribuiu para demonstrar a necessidade de gestão de riscos em instituições que priorizam a qualidade da assistência prestada, preocupação esta emergente em nosso contexto.

Portanto, com a crescente e atual busca pela qualidade e segurança do paciente, a AMFE deve ser considerada um método válido para melhorar o gerenciamento de risco, pois permite uma análise prospectiva no processo do medicamento quimioterápico na fase de preparo e dispensação, com o objetivo de identificar falhas potenciais e suas causas associadas, e formular estratégias para a correção de tais vulnerabilidades. Além disso, o envolvimento dos colaboradores no processo de segurança do paciente estimula uma cultura de segurança institucional e uma gestão mais adequada do processo de trabalho, consequentemente melhorando a qualidade da assistência prestada ao usuário dos serviços de saúde.

CONCLUSÃO

O presente estudo teve como objetivo realizar uma Análise Multimodal de Falhas e Efeitos para identificar prospectivamente os riscos relacionados à fase do preparo e dispensação de medicamentos quimioterápicos em uma unidade ambulatorial de um centro de referência em oncologia. Dentro do contexto proposto, foram identificados os possíveis modos de falha que se relacionavam ao processo de preparo e dispensação dos quimioterápicos, além do que possibilitou a definição das causas potenciais para a existência desses riscos.

No que se refere ao contexto local, este estudo foi de fundamental importância para se identificar possíveis oportunidades de melhoria na identificação, preparo e dispensação dos medicamentos quimioterápicos da instituição, a partir da aplicação do instrumento AMFE. Tais contribuições minimizarão os riscos atuais expostos aos pacientes, além de proporcionar aos colaboradores envolvidos no processo do medicamento o conhecimento das possíveis falhas e estratégias de controle visando contenção de riscos.

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Recebido: 13 de Julho de 2019; Aceito: 17 de Outubro de 2019

Isac Davidson Santiago Fernandes Pimenta: isacdavidson29@gmail.com

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