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Enfermería Global

versão On-line ISSN 1695-6141

Enferm. glob. vol.22 no.72 Murcia Out. 2023  Epub 04-Dez-2023

https://dx.doi.org/10.6018/eglobal.553891 

Originais

Fatores associados à sintomas de distúrbios osteomusculares em professores da rede pública municipal de Cuiabá-MT

Fabiola da Cruz-Teles1  , Mariano Martínez-Espinosa2  , Ediálida Costa-Santos3 

1Mestranda em Saúde Coletiva- ISC/UFMT. Brasil

2Professor Titular. Curso de Estatística e do Programa da Pós-Graduação em Saúde Coletiva da pela Universidade Federal de Mato Grosso-UFMT. Brasil

3Professora Adjunto. Curso de Enfermagem da UFMT. Brasil

RESUMO:

Introdução

Os distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho são lesões relacionadas a danos do uso excessivo do sistema musculoesquelético. O objetivo foi analisar os sintomas osteomusculares e os fatores associados em professores do ensino fundamental da rede pública municipal na cidade de Cuiabá, Mato Grosso.

Metodologia

Estudo transversal, a amostra foi de 326 professores. Para coleta de dados foram utilizados os instrumentos: Condição de Produção Vocal, Self-Reporting Questionnaire e o Nordic Musculoskeletal Questionnaire. A variável dependente foi à presença ou não de sintomas osteomusculares. Foi realizada uma análise bivariada, utilizando teste qui-quadrado e razões de prevalências com intervalos de confianças 95% e uma análise múltipla com o modelo de regressão de Poisson.

Resultados:

Na análise múltipla, foi evidenciado que a presença de sintomas osteomusculares, foi significativamente associada (p<0,05) com os seguintes fatores de risco: possuir transtornos mentais comuns (RPa=1,45), carregar peso com frequência (RPa=1,26) e realizar esforço físico intenso (RPa= 1,22). Além disso, foi identificada associação significativa, entre estes sintomas e professores contratados (RPa= 0,82), assim como para a interação realizar esforço físico intenso e carregar peso com frequência (RPa=0,75), sendo estes, fatores de proteção para a presença de sintomas.

Conclusão:

Conclui-se que as características de trabalho demostraram ser importantes fatores de risco para o acometimento dos sintomas osteomusculares nos últimos doze meses. E acredita-se que, os resultados deste estudo podem subsidiar gestores e responsáveis para ações preventivas no ambiente laboral destes professores.

Palavras- chaves: Saúde Ocupacional; Sintomas osteomusculares; professores

INTRODUÇÃO

O trabalho faz parte de uma dinâmica social que atua na participação e construção da sociedade e permite ao indivíduo, por meio da profissão, tornar-se socialmente produtivo. É por meio do trabalho que o indivíduo pode obter relações e vínculos indispensáveis para as condições de sobrevivência (1). A atividade desempenhada pelo professor requer conhecimento sobre o que e como ensinar, consiste na sistematização dos saberes mediante a apropriação de conhecimentos específicos que exigem uma formação especializada e criteriosa, que demandam de uma tarefa complexa que envolve domínios técnicos e didáticos para execução do trabalho profissional (2).

No entanto, determinadas condições de exposição ao trabalho, como a sobrecarga de atividades é um fator importante de exposição desses profissionais aos riscos ocupacionais (3). Essas condições de exposição associam-se com as mudanças no cenário da educação a partir da ampliação do acesso ao ensino e consequentemente o aumento do número de turmas e alunos. Nesse contexto, as condições de trabalho as quais o professor está exposto podem representar um fator de adoecimento, em consequência das demandadas organizacionais, jornadas excessivas de trabalho, baixa remuneração, entre outras e, dessa maneira, prejudicando a sua saúde, desencadeando doenças (4), além de problemas psíquicos como os Transtornos Mentais Comuns (TMC), que são caracterizados por um conjunto de sintomas não psicóticos, como insônia, fadiga, irritabilidade, esquecimento, dificuldade de concentração e queixas somáticas, os quais, podem indicar um sofrimento mental (5). Todas estas condições podem diminuir a produtividade e podendo causar até a morte(4,5).

Assim, as demandas de trabalho e as condições ambientais de atuação do docente podem levar ao desenvolvimento de diversas complicações de saúde, dentre elas, as lesões por esforços repetitivos (LER) e os distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT). Essas lesões são consequências de um fenômeno relacionado diretamente a danos do uso excessivo do sistema musculoesquelético em um curto prazo de recuperação. As LER/DORT caracterizam-se pela ocorrência de vários sintomas como: dor, fadiga e cansaço que surgem na maioria das vezes em estágios avançados da doença e atingem principalmente membros superiores (6,7).

Nos últimos anos, o número de distúrbios musculoesqueléticos tem aumentado, representando um grave problema de saúde pública em vários países. Esses distúrbios representam o grupo de doenças ocupacionais mais frequentes em trabalhadores e são responsáveis por causar incapacidade funcional e, no Brasil, são as causas mais frequentes de afastamento das atividades laborais (8,9).

A presença de sintomas osteomusculares em professores é motivo de grande preocupação, uma vez que estes causam graves problemas à qualidade de vida, decorrentes de doenças na coluna e tecido moles, articulares e tramas de ligamentos e tendões (10).

Os distúrbios osteomusculares são reconhecidos como um dos problemas ocupacionais mais comuns e de custo elevado, tanto em países em desenvolvimento, quanto desenvolvidos. E, em muitos casos, o grupo de professores escolares fazem parte da categoria ocupacional que apresenta alta prevalência para esses distúrbios(11).

De acordo com os dados do Saúde Brasil 2018, uma análise de 2007 a 2016 demostrou um crescimento de 184% de trabalhadores atingidos pelas doenças de LER e DORT, sendo estas as condições que mais acometem trabalhadores brasileiros, principalmente mulheres entre 40 a 45 anos de idade. Além disso, em 2019, cerca de 39 mil trabalhadores se afastaram das suas atividades em decorrência destas doenças (12).

No Estado de Mato Grosso, em Cuiabá, professores da rede pública de ensino foram identificados com a qualidade de vida prejudicada de forma significativa devido a presença de sintomas osteomusculares (13).

Visto que os distúrbios osteomusculares constituem um grande problema de saúde pública e um dos mais graves relacionados particularmente com o trabalho docente, com grande impacto social, econômico e de saúde. Assim, constata-se a relevância de identificar os principais fatores de riscos associados aos sintomas osteomusculares entre esses trabalhadores, possibilitando uma abordagem voltada à prevenção da saúde de maneira mais eficiente para esses profissionais.

Assim, o objetivo do presente estudo foi analisar os sintomas osteomusculares e os fatores associados em professores do ensino fundamental da rede pública municipal na cidade de Cuiabá, Mato Grosso.

METODOLOGIA

Trata-se de estudo de corte transversal, analítico, que faz parte de uma pesquisa matricial realizada no ano de 2017 com professores do ensino fundamental regular da rede pública municipal da cidade de Cuiabá, capital do estado de Mato Grosso. Realizado com os dados da população registrado pelo Censo Escolar de 2017 que indicou 75 escolas do ensino fundamental e 1.317 professores que atuavam neste ano (14). Para a amostra foram incluídos os professores em pleno exercício profissional no momento da coleta de dados, e excluídos aqueles em licença, afastados ou em desvio de função. Nesta pesquisa foi utilizada uma amostragem do tipo probabilística considerando os métodos de amostragem aleatória simples, sistemática e estratificada proporcional ao tamanho dos estratos.

O tamanho da amostra foi estimado considerando uma população de 1317 professores, com uma confiança de 95% (zα/2 = 1,96), uma proporção de 50% para uma prevalência desconhecida e um erro amostral de estimação de 5%. Assim, nesse projeto, obtiveram uma amostra mínima de 298, mais 35% para possíveis perdas, o que totalizou aproximadamente 403 professores. Neste aspecto, também foi considerado estudo com metodologia semelhante, entre professores de educação básica do município de Florianópolis (SC), no qual a recusa esteve em torno de 40% dos participantes que não devolveram os questionários preenchidos (15).

Uma vez que existiam quatro regiões administrativas (Norte, Sul, Leste, Oeste) (16), com tamanhos diferentes de população, as mesmas foram consideradas como estratos (17), constituídos por regionais, Norte, Sul, Leste e Oeste. Assim, o tamanho de amostra por estrato foi composto por 80, 133, 110 e 80 participantes, respectivamente. Posteriormente foi realizado um sorteio aleatório nas unidades escolares participantes do estudo, por meio de um sorteio aleatório simples, estabelecendo a primeira escola, as demais foram selecionadas sistematicamente.

Foi realizado um teste piloto após a aprovação Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), em uma escola que não faria parte no sorteio final, o que possibilitou testar o questionário compilado e a operacionalização da pesquisa. Depois do teste, foi realizado o sorteio aleatório das escolas, as quais foram procuradas mediante agendamento prévio e contato com a direção/coordenação. Após o agendamento, procedeu-se a coleta dos dados da pesquisa, a qual ocorreu entre os meses de setembro a dezembro de 2017. Os professores que participaram da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, e foi disponibilizado aos mesmos um questionário auto aplicável.

No presente estudo foram considerados três instrumentos, Condição de Produção Vocal (CPV) do professor, consolidado e validação para utilização em estudos epidemiológicos (18); Self-Reporting Questionnaire (SQR-20) traduzido e validado no Brasil em estudos na atenção primária à saúde (19) e Nordic Musculoskeletal Questionnaire (NMQ) traduzido e adaptado culturalmente por Barros e Alexandre (2003) (20).

No presente estudo foi considerado como principal instrumento o NMQ, o qual foi desenvolvido com a finalidade principal de padronizar a mensuração das respostas referidas, sobre os sintomas osteomusculares, com o propósito de facilitar a comparação dos resultados obtidos entre os estudos. O NQM é representado por uma Figura humana dividida em nove regiões anatômicas, e o participante deve relatar a ocorrência dos sintomas osteomusculares considerando os doze meses e os sete dias precedentes à entrevista, consulta a algum profissional da área da saúde nos últimos 12 meses e afastamento das atividades rotineiras no último ano (20,21). O mesmo é composto por questões específicas, que abordam dor, formigamento/dormência ou desconforto musculoesquelético em nove regiões do corpo: pescoço, ombro, parte superior das costas, cotovelo, punho / mão, baixo costas, quadril / coxa, joelho, tornozelo / pé) (22).

A variável dependente ou desfecho, neste estudo, foi a presença ou não de sintomas osteomusculares, referida nos últimos 12 meses, independente da região corporal afetada, avaliada por meio do NMQ. Neste instrumento, esta variável categórica considera duas respostas (sim ou não). Os escores desta variável são calculados pelo total de escores que variam de 0 a 9. Valores maiores ou iguais a 1 (sim), indica presença do sintoma, como dor, formigamento/dormência e um valor de zero representa a ausência (não). Basicamente, escores altos representam pior situação e escores baixos melhor situação dos sintomas (21).

As variáveis independentes analisadas foram: sociodemográficas, situação funcional, organização do trabalho e condição de saúde consideradas a partir do CPV. Para avaliar a ocorrência de Transtorno Mental Comum (TMC), foi utilizado o instrumento SQR-20, o qual consiste de vinte questões com repostas do tipo sim/não, codificadas com valores numéricos 1 e 0 respectivamente. Como ponto de corte foi considerado 7/8 independente do sexo, sendo considerado como presença de sintomas de TCM no último mês, a somatória maior ou igual a 8 respostas sim e ausência para a somatória menor que 8 (23).

Os dados no estudo matriz foram processados no programa Epi Info 6.04 e as análises estatísticas dos dados do presente estudo foram realizadas pelo programa SPSS - “Statistical Package for the Social Sciences” versão 17.0. Inicialmente, para a análise descritiva foram consideradas frequências absolutas e relativas e para analisar a associação entre a variável dependente e as variáveis independentes foi realizada uma análise bivariada e múltipla.

Na análise bivariada foi utilizado o teste qui-quadrado e razões de prevalências brutas com seus respectivos intervalos de confianças de 95%. Posteriormente, foi realizada uma análise múltipla considerando o modelo de regressão múltiplo de Poisson com variância robusta. Neste modelo, foram introduzidas as variáveis independentes que apresentaram valor de p menor que 0,20 (p<0,20) na análise bivariada, considerando o método stepwise backward e permaneceram no modelo final todas as variáveis que apresentaram valores de p<0,05 na análise múltipla. Em todas as inferências foram considerados níveis de significância menores que 5% e intervalos de confiança de 95%.

Este projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Júlio Muller (CEP-HUJM) (CAAE: 59503916.7.0000.5541).

RESULTADOS

Neste estudo, dos 403 participantes, 332 professores responderam os questionários e desses, 326 (80,9%) instrumentos estavam adequadamente preenchidos, os quais foram analisados. Os dados sociodemográficos indicaram que a maioria dos professores era do sexo feminino (87,12%), com idade média de 43,01 anos, casado (a) ou em união (62,70%) e com nível de escolaridade em pós-graduação (73,93%), observar que estas três últimas variáveis não foram apresentadas em Tabela.

A análise bivariada evidenciou associação significativa entre a variável dependente e o vínculo, na categoria professores contratados (RPb=0,84; p=0,005), mostrando ser um fator de proteção, para a presença de sintomas osteomusculares, ao ser comparados com os professores efetivos.

A presença de sintomas osteomusculares nos professores também demonstrou associação estatisticamente significativa com as variáveis da organização de trabalho: ritmo de trabalho estressante, material de trabalho suficiente, trabalho repetitivo, realizar esforço físico intenso, carregar peso com frequência e estresse em seu trabalho, conforme Tabela 1.

Também houve associação significativa entre o desfecho e a variável transtornos mentais comuns das condições de saúde, na qual professores com escore sugestivo para presença de transtorno mental comum, demostrou maior risco (RPb=1,41; p<0,001) para presença de sintomas osteomusculares nos últimos doze meses de acordo com a Tabela 1.

Tabela 1: Análise bivariada entre variáveis sociodemográfica, situação funcional, organização de trabalho e condição de saúde com presença ou não de sintomas osteomusculares, referida nos últimos 12 meses, independente da região corporal afetada, em professores do ensino fundamental. Cuiabá, Mato Grosso, 2017. 

RPb:Razão de prevalência bruta.

IC 95%:Intervalo de confiança de 95%.

p:Valor de p considerando a distribuição de Qui-Quadrado.

*:Significativo ao nível del 5%.

Nota-se que não houve associação estatisticamente significante entre a presença de sintomas osteomusculares e as variáveis independentes, sexo, horas com o aluno, tempo para realizar as atividades na escola e levar trabalho para casa. No entanto, estas variáveis na análise bivariada apresentaram um valor de p menor que 0,20, sendo assim todas as variáveis da Tabela 1 foram testadas no modelo de regressão múltipla.

Na Tabela 2 são apresentados os fatores que apresentaram associação, com o desfecho, após análise ajustada pelo modelo de regressão múltipla de Poisson com variância robusta. A presença de sintomas osteomusculares, referida nos últimos 12 meses foi um fator de proteção quando os professores eram contratados (RPa= 0,82; p=0,003) e na interação realizar esforço físico intenso no trabalho e carregar peso com frequência (RPa=0,75; p=0,031). E fator de risco quando possuíam transtornos mentais (RPa=1,45; p<0,001), carregavam peso com frequência (RPa=1,26; p=0,017) e docentes que realizavam esforço físico intenso no trabalho (RPa= 1,22; p=0,045).

Tabela 2: Fatores associados à presença de sintomas osteomusculares, referida nos últimos 12 meses, independente da região corporal afetada, em professores do ensino fundamental. Cuiabá, Mato Grosso, 2017. 

RPa: Razão de prevalência ajustada pelo modelo de regressão múltipla de Poisson com variância robusta; IC95%: intervalo de 95% de confiança; p: Valor de p;

*:significativo ao nível de 0,05.

DISCUSSÃO

As análises evidenciaram associações estatisticamente significativas entre a presença de sintomas osteomusculares nos últimos doze meses com as variáveis da situação funcional, organização de trabalho e condições de saúde.

Na variável vinculo, os professores contratados apresentaram associação para o acometimento de sintomas osteomusculares. Na análise múltipla, a categoria permaneceu com forte associação (p=0,003) para presença de sintomas, sendo neste caso um fator de proteção em relação à professores efetivos. Esta associação pode ser pertinente, se considerada que os professores efetivos, muitas vezes em regime exclusivo, demandam de uma maior carga horária de trabalho, quando comparados com os professores contratados. Esses resultados vão ao encontro com o estudo de CESAR-VAZ et al. (24), os quais afirmaram que, maior tempo de atividade e carga horária docente estão associados com o surgimento de sintomas osteomusculares.

Neste estudo, evidenciou-se que o ritmo de trabalho estressante foi um fator de maior prevalência (82,24%), referido pelos professores com sintomas osteomusculares. De modo similar, o estudo de Rocha et al. (25), também encontrou uma alta prevalência (41,6%) de estresse causada pelo trabalho, sendo este, um dos aspectos que contribuem para alterações osteomusculares.

A não existência de material de trabalho suficiente apresentou associação estatística significativa na análise bivariada e pode contribuir para surgimento de distúrbios osteomusculares. Uma vez, que entre a falta de materiais podem estar presentes: mobiliário planejado adequadamente e ergonomicamente e escassez de material básico para as aulas, pois em geral o professor vivencia esta situação cotidianamente, principalmente nas escolas públicas (26). Essa situação pode ser prejudicial e preocupante tanto financeiramente, como para sua saúde, já que muitas vezes o docente precisa comprar os itens básicos para lecionar, enquanto estes materiais deveriam ser fornecidos pelas instituições de ensino e órgãos responsáveis(27). Estes problemas, conforme Barros e Gradela (28) podem caracterizar uma situação preocupante vivida pelo professor e representar problemas de desmotivação ou de saúde, o que pode favorecer no surgimento de doenças ocupacionais.

Referente ao trabalho repetitivo foi verificado associação significativa com a presença de sintomas osteomusculares em análise bivariada. Pode-se destacar que esta característica do trabalho é umas das principais causas de acometimentos por distúrbios osteomusculares. Resultados semelhantes demonstrados em outro estudo que evidenciou associação entre este fator e as lesões musculoesqueléticas, uma vez que, movimentos repetitivos ao longo do tempo realizado pelo docente pode ser um fator determinante no surgimento de distúrbios osteomusculares, por ser um dos fatores biomecânicos que participa nas demandas físicas do trabalho (29).

A ocorrência de sintomas esteve presente entre os professores que realizavam esforço físico intenso no seu trabalho. Na análise múltipla, após regressão, esta variável manteve-se associada aos sintomas osteomusculares (p=0,045), demostrando ser um importante fator risco que corrobora com o que é identificado na literatura. Segundo Cardoso (30), o esforço físico pode ser intelectual ou emocional e representa o esforço utilizado para realizar uma quantidade de trabalho em determinado tempo e intensidade. Ainda, de acordo com o autor, a intensificação do trabalho pode ser na forma de participação e/ ou movimentação do corpo, que consequentemente pode ocasionar desgastes musculoesqueléticos. Outros estudos como os de Mango et al. (4) e Ribeiro et al. (26) também afirmam que o esforço físico intenso realizado por docentes é considerado como um fator relevante para presença de sintomas osteomusculares.

Conforme a análise, quem carregou peso com frequência nos últimos doze meses também apresentou sintomas osteomusculares e esse resultado se manteve significativamente associado após o modelo múltiplo de regressão (p=0,017). Desta forma, nota-se que altas cargas durante a atividade laboral, resultam em maior desgaste da musculatura esquelética e reforça o surgimento de sintomas, em uma rede de fatores que contribuem para complicações (31). De forma similar, resultados foram demonstrados no estudo de Jegnie e Afework (32) que identificaram associação significativa entre lombalgia e levantamento de peso relacionado ao trabalho em outras áreas profissionais, porém o fator se manteve associado quando relacionado à saúde do trabalhador em geral e entre os docentes.

Ainda a análise múltipla ajustada, evidenciou-se associação entre realizar esforço físico intenso e carregar peso com frequência no trabalho e a interação entre estas variáveis, a qual foi estatisticamente significativa (p=0,031) e representou um fator de proteção (RPa= 0,75), com a presença de sintomas osteomusculares entre esses professores. Embora atualmente não existam trabalhos que discutam esta interação, a mesma poderia ser explicada, considerando que o esforço físico, em condições favoráveis, pode auxiliar ao carregar peso. Uma outra possibilidade para elucidar esta interação encontrada, seria considerar outras variáveis que não fizeram parte deste estudo, sendo assim, recomenda-se novos estudos a fim de explicar melhor esta interação.

Outra característica, em que se observou também a associação significativa com os sintomas osteomusculares foi presença de estresse no trabalho. Muitos estudos identificam que a alta prevalência de estresse pode levar ao desgaste mental e consequentemente prejuízos nas condições físicas do trabalhador, pode-se observar que a existência de estresse no trabalho é um fator relevante para determinar saúde mental. Implicações similares foram identificadas em vários países e mostraram resultados significativos para o estresse relacionado ao trabalho, atuando com grande importância na etiologia dos sintomas osteomusculares, principalmente em educadores de infância. Esses resultados demostram que, estresse físico ou psicológico no trabalho entre professores são fatores associados significativamente aos distúrbios osteomusculares e transtornos depressivos (25,33).

Para as condições de saúde, os professores com presença de sintomas sugestivos de transtornos mentais comuns também demonstraram acometimento por sintomas musculoesqueléticos e essa associação também apresentou significância estatística no modelo final de regressão (p<0,001). Esse resultado pode ser justificado pelo fato de que as questões mentais são temas de principais destaques, quando relacionados às condições de trabalho e saúde do professor. Assim, é importante frisar que a saúde mental é crucial para esses profissionais, uma vez que tais transtornos podem levar à necessidade de afastamento do trabalho, em decorrência, principalmente, das limitações impostas pelos distúrbios osteomusculares. Além disso, as condições de estresse podem ser fatores determinantes na maioria dos casos de absenteísmo, podendo evoluir para futuros problemas mentais mais severos. Como pode ser afirmado por Corbière et al ((34) que observaram entre os sintomas mais apontados por trabalhadores afastados das atividades laborais por depressão, que em quase sua totalidade, são sintomas semelhantes ao do estresse.

Diante das análises apresentadas, nota-se que saúde e trabalho são indissociáveis. Portanto, se faz necessário proporcionar ao trabalhador, condições de trabalho adequadas e ambiente laboral que contribuam para melhores condições de saúde desses profissionais, a fim de evitar altas prevalências de sintomas osteomusculares em professores.

Os resultados deste estudo, considera algumas limitações como possíveis viés de medidas simultâneas quando utilizado questionários autoaplicáveis e possíveis fatores não controlados, além de possíveis viés de seleção em estudos ocupacionais, pois os investigados em pleno exercício da profissão tendem a estar mais saudáveis em relação aqueles que estão em desvio de função no momento da pesquisa. Podemos citar ainda, que o questionário NMQ utilizado como principal instrumento para a variável desfecho não possibilita a identificação das possíveis causas dos sintomas, o qual precisa ser aplicado junto a outros instrumentos com objetivo de obter outros dados e variáveis para verificar esta associação.

Entretanto, ressalta-se que os resultados deste estudo foram representativos para população de professores da cidade de Cuiabá, uma vez que foi considerada uma amostra aleatória. Além disso, os resultados poderão ser importantes para subsidiar melhorias nas políticas públicas de intervenção em saúde do trabalhador a fim de garantir condições de trabalho adequadas e necessárias para os profissionais docentes. Uma vez que, esses fatores são modificáveis e com o conhecimento dos mesmos, poderão prevenir a ocorrência destes sintomas e o adoecimento por distúrbios osteomusculares.

Além disso, recomenda-se novas pesquisas sobre a temática, a fim de fomentar e aprofundar as discussões sobre os sintomas osteomusculares entre os professores, visando corroborar ou confrontar os resultados desta pesquisa, visto que são poucos estudos encontrados com essa classe profissional.

CONCLUSÃO

No presente estudo, verificou-se prevalência elevada na ocorrência de sintomas osteomusculares nos últimos doze meses, independente da região corporal afetada, em professores da rede pública, e que as variáveis, ritmo de trabalho estressante, material de trabalho insuficiente, trabalho repetitivo, esforço físico intenso, carregar peso com frequência e apresentar sintomas sugestivos para transtornos mentais comuns, associaram-se de maneira estatisticamente significativa com esse desfecho. Porém, os professores contratados demostraram uma razão de prevalência de proteção entre este fator e o desfecho com significância estatística.

Quando analisadas as variáveis em conjunto, na análise múltipla ajustada, evidenciou-se que, permaneceram no modelo final como fatores de risco, as variáveis: realiza esforço físico intenso, carregar peso com frequência e transtorno mentais comuns, todas estatisticamente significativas e associadas à presença de sintomas osteomusculares. Observou-se que, a variável vínculo também ficou no modelo final e a interação entre as variáveis realizar esforço físico intenso e carregar peso com frequência, porém como fatores de proteção, para a presença de sintomas osteomusculares. Este último achado, do presente estudo é inédito, sugerindo novas pesquisas com esta população, a fim de explicar melhor esta interação dos sintomas osteomusculares entre professores.

Conclui-se que as características de trabalho analisadas demostraram ser importantes fatores de risco para o acometimento dos sintomas osteomusculares nos últimos doze meses independente da região corporal afetada. Assim, acredita-se que, os resultados deste estudo podem subsidiar gestores e responsáveis para ações preventivas em locais de trabalho, no que se refere à melhores condições de saúde dos professores.

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Recebido: 13 de Janeiro de 2023; Aceito: 24 de Maio de 2023

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