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Enfermería Global

On-line version ISSN 1695-6141

Enferm. glob. vol.23 n.73 Murcia Jan. 2024  Epub Feb 23, 2024

https://dx.doi.org/10.6018/eglobal.571721 

Avaliações

Reabilitação no quotidiano de pessoas com sequela neurológica pós-covid-19: scoping review

Jonas Felisbino1  , Selma Maria da Fonseca-Viegas2  , Wiliam César Alves-Machado3  , Juliana Balbinot Reis-Girondi1  , Cristina Maria Alves-Marques-Vieira4  , Adriana Dutra-Tholl1 

1Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil

2Universidade Federal de São João del-Rei, Divinópolis, Minas Gerais, Brasil

3Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil

4Universidade Católica Portuguesa, Lisboa, Lisboa, Portugal

RESUMO:

Objetivo:

Mapear as evidências científicas disponíveis sobre reabilitação no quotidiano de pessoas com sequela neurológica pós-COVID-19.

Metodologia:

Trata-se de uma scoping review segundo as diretrizes do Joanna Briggs Institute. Os estudos incluídos basearam-se na estratégia mnemônica participants/ problem (pessoas adultas com sequela neurológica), concept (reabilitação no quotidiano) e context (pandemia covid-19), com espaço temporal de 2020 a 2022, disponíveis nas sete bases de dados selecionadas, nos idiomas português, inglês e espanhol, coletados e analisados segundo o PRISMA-ScR.

Resultados:

Foram recuperados 1.027 estudos, sendo que a amostra foi composta por 11 artigos que apresentaram programas de reabilitação para as sequelas: fadiga, anosmia, distúrbios cognitivos e neuropsicológicos. Dentre os principais programas de reabilitação encontrados, destacam-se: caminhada de progressão, exercícios respiratórios; treinamento olfativo usando óleos essenciais e abordagens cognitivas. A partir dos achados, o processo de reabilitação tem se mostrado eficaz para o manejo das sequelas neurológicas pós-covid-19, devendo ser iniciado precocemente.

Conclusões:

Recomenda-se que os programas de reabilitação envolvam uma equipe multiprofissional, já que a doença apresenta sintomas persistentes multissistêmicos, envolvendo uma abordagem holística, que englobe aspectos comportamentais relacionados ao autocuidado, reabilitação física, suporte emocional e educação em saúde, promovendo a recuperação e melhora da qualidade de vida dos indivíduos afetados pela doença.

Palavras-chave: Atividades cotidianas; Covid-19; Enfermagem; Pandemia; Reabilitação

INTRODUÇÃO

Diante do cenário global em que a covid-19 se tornou uma pandemia de grande impacto, é fundamental compreender as implicações da doença no sistema nervoso central e suas consequências na vida diária dos indivíduos afetados. Ela é considerada uma síndrome multissistêmica por atingir diversos órgãos, manifestando sintomas e alterando sua fisiologia(1). Suas manifestações clínicas variam desde alterações cardiovasculares, respiratórias, neuromusculoesqueléticas, psicológicas entre outras complicações sistêmicas, como alterações nutricionais, hepáticas, gastrointestinais, hematológicas, renais, endócrinas e dermatológicas, além do impacto na funcionalidade e na qualidade de vida do paciente(1).

A forma exata como o SARS-CoV-2 danifica o sistema nervoso central (SNC) ainda não é bem conhecida, contudo, parece haver fortes indícios que ocorra, tanto por via hematogênica, quanto por via neuronal retrógrada, ou seja, o vírus migra até o cérebro por meio dos nervos olfatórios, daí a anosmia, causando lesões no tecido cerebral por conta da hipóxia em razão de uma resposta imune exacerbada(2).

As complicações no SNC podem ser secundárias à hipóxia causada por uma resposta inflamatória generalizada(2), pois o SARS-CoV-2 não ataca diretamente as células cerebrais, no entanto, a falta de oxigênio pode comprometer a fisiologia cerebral, causando lesões no tecido pela interrupção da circulação sanguínea(3). Outra evidência encontrada foi a presença em grande quantidade de micróglias, células do tecido cerebral que têm a função de monitorar a entrada de agentes estranhos no tronco cerebral inferior, encarregado de controlar coração e pulmões, e no hipocampo, responsável pela memória, justificando as possíveis complicações relatadas nesses órgãos(3).

Percebe-se que os sintomas neurológicos relacionados à covid-19 mais frequentes foram: fadiga (85%), queixas cognitivas inespecíficas, relatadas como “nevoeiro cerebral” (81%), cefaleia (68%), dormência/formigamento (60%), disgeusia (59%), anosmia (55%), mialgia (55%), tontura (47%), dor (43%), visão turva (30%) e zumbido (29%), sendo que ao menos 85% dos pacientes relataram pelo menos quatro desses sintomas, resultando num declínio de sua qualidade de vida(4). Há relatos também de casos que descreveram complicações neurológicas mais graves que as supracitadas(5).

Por ser considerada uma doença multissistêmica, requer a atuação de uma equipe multidisciplinar para a reabilitação dos seus sintomas persistentes. Sempre que possível, a reabilitação deve começar precocemente, ainda nos cuidados intensivos(5). O National Institute for Health and Care Excellence (NICE) recomenda que os programas de reabilitação sejam progressivos, preferencialmente iniciados nos primeiros 30 dias (fase pós-aguda) para ter maior impacto na recuperação do paciente, devendo ser centrado no paciente e adaptado às suas necessidades individuais, levando-se em conta as comorbidades que podem afetar o progresso ou sua capacidade de participar de um programa(6). Considerando o cenário atual, reflexo, em grande parte da vacinação contra a covid-19, é essencial abordar esse tema no contexto da pesquisa sobre reabilitação no quotidiano de pessoas com sequela neurológica pós-covid-19.

A importância da imunização contra a covid-19 é crucial para prevenir as complicações sistêmicas e neurológicas causadas pelo vírus. A vacinação tem se mostrado eficaz na redução da gravidade da doença, prevenção de hospitalizações e proteção contra as variantes do SARS-CoV-2. Portanto, é fundamental que as pessoas sejam imunizadas de acordo com as diretrizes e recomendações das autoridades de saúde, além do mais, sugere-se que há uma redução no risco de doença aguda, assim como a vacinação pode ter um efeito protetor contra as sequelas da doença(7).

Nesse contexto, é fundamental compreender e mapear as evidências científicas disponíveis sobre a reabilitação no quotidiano desses indivíduos, a fim de promover intervenções eficazes que melhorem sua qualidade de vida, bem como instrumentalizar as equipes multiprofissionais de saúde para a reabilitação precoce de pessoas com sequelas neurológicas pós-covid-19, no cenário pós-agudo, visto que estes profissionais têm competências fundamentais na avaliação das necessidades funcionais, cognitivas e de saúde mental desta população, podendo contribuir para a qualidade de vida e a retomada das atividades da vida quotidiana.

Este estudo teve por objetivo mapear evidências científicas para a reabilitação no quotidiano de pessoas com sequela neurológica pós-covid-19.

METODOLOGIA

Trata-se de uma scoping review, já que se objetivou o mapeamento e a sintetização de evidências disponíveis, identificando estudos que abordem a correlação entre diferentes variáveis e determinados fatores acerca de reabilitação neurológica pós-covid-19(8). Seguiu-se as diretrizes do Joanna Briggs Institute (JBI) e as recomendações do guia internacional Preferred Reporting Items for Systematic reviews and Meta-Analyses extension for Scoping Reviews (PRISMA-ScR)(9), sendo que o protocolo de pesquisa registrado no Open Science Framework (https://osf.io/7kge4/). Os critérios de inclusão foram artigos de pesquisas de abordagens qualitativas e quantitativas, relatos de experiência, estudos empíricos e teóricos, documentos oficiais de programas nacionais e internacionais, assim como diretrizes institucionais sobre a reabilitação de pessoas com sequela neurológica pós-covid-19, nos idiomas português, inglês e espanhol. Foram excluídos da pesquisa estudos que ainda estavam em andamento no momento das buscas, que não detalhavam o processo de reabilitação neurológica de pessoas com sequela neurológica pós-covid-19 ou que não abordavam sobre reabilitação neurológica e que não eram de livre acesso.

Para a elaboração da pergunta de pesquisa usou-se a estratégia mnemônica PCC: participants/ problem, concept e context, integrando-se a essa scoping review estudos que denominaram como “participantes”, pessoas adultas com sequela neurológica; “conceito” reabilitação quotidiana; e “contexto” pandemia da covid-19, chegando-se à questão de partida: “Quais evidências científicas são utilizadas para a reabilitação de pessoas adultas com sequela neurológica pós-covid-19?”.

A estratégia de busca foi desenvolvida em três etapas. Na primeira etapa, com auxílio da bibliotecária setorial da Universidade Federal de Santa Catarina foram definidos os descritores e operadores booleanos, bem como montada a estratégia de busca e elencadas as bases de dados para a busca, sendo elas: PubMed, SCOPUS, Web of Science, Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature (CINAHL), Excerpta Medica Database (EMBASE) e, Cochrane Library. Definiu-se também, a aplicação dos filtros: texto completo, período de 2020 a 2022, nos idiomas inglês, português e espanhol.

A pesquisa considerou o espaço temporal de 2020 a 2022. A busca nas bases de dados ocorreu no dia 17 de janeiro de 2022, como nova busca feita em 15 de junho do mesmo, utilizando-se os descritores selecionados da seção Medical Subject Headings (MeSH) e Ciências da Saúde (DeCS), com os operadores booleanos “OR” e “AND” para seu cruzamento. A partir do exposto montou-se a estratégia de busca: ("Coronavirus Infections" OR "Covid-19" OR "SARS-CoV-2" OR "SARS Virus" OR "SARSCoV2" OR "SARS2" OR "covid" OR "COVID-2019" OR "COVID 2019" OR "SARS-COV-2" OR "2019-nCoV" OR "2019ncov" OR "coronavírus" OR "nCoV 2019") AND ("Neurologic Manifestations" OR "Neurologic Manifestation" OR "Neurologic Symptom" OR "Neurologic Symptoms" OR "Neurological Manifestation" OR "Neurological Manifestations" OR "Post-COVID-19 Sequelae" OR "Post-COVID-19 Syndrome" OR "Central Nervous System Diseases" OR "Anosmia" OR "Hyposmia" OR "Hyposmias" OR "Loss of Smell" OR "Smell Loss" OR "Ageusia" OR "Hypogeusia" OR "Hypogeusias" OR "Hysterical Ageusia" OR "Hysterical Ageusias" OR "Loss of Taste" OR "Taste Blindness" OR "Taste Loss" OR "Taste-Blindness") AND ("Rehabilitation" OR "Habilitation" OR "Neurological Rehabilitation" OR "Rehabilitation Services").

Na segunda etapa foi desenvolvida a leitura dos títulos e exclusão dos artigos duplicados. De forma independente, dois pesquisadores examinaram os estudos às cegas, buscando identificar artigos que correspondiam à questão de pesquisa, com base na leitura dos títulos e resumos. Na terceira etapa, os artigos pré-selecionados foram lidos na íntegra, de forma independente pelos pesquisadores, sendo excluídos os estudos que não atendiam aos critérios de inclusão. Ademais foi realizada uma busca nas referências dos artigos selecionados para encontrar estudos que não foram identificados pela estratégia de busca, tendo em vista a especificidade do tema estudado e a escassez de artigos publicados, considerando o espaço temporal pré-definido. Não houve necessidade de um terceiro investigador para alcançar um consenso quanto à elegibilidade do estudo.

Nas sete fontes de informação pesquisadas, localizaram-se 1.027 estudos; 61 foram excluídos por duplicidade, restando 966 estudos para seleção; desses, 674 foram excluídos a partir da leitura do título. Dos 292 artigos restantes, após a leitura do título e resumo, foram excluídos 221 estudos por não atenderem os critérios de elegibilidade, tais como: não abordavam estudos sobre a reabilitação de pessoas com sequela neurológica pós-covid-19 e/ou estudos em fase de projeto que não apresentavam claramente os resultados, restando 71 artigos para leitura na íntegra. Após a leitura na íntegra, foram excluídos 63 artigos por não detalhar o processo de reabilitação de pessoas com sequela neurológica pós-covid-19, resultando em oito artigos, nesses oito artigos, foi feita uma busca em suas referências, também de forma independente pelos mesmos dois pesquisadores, onde elencaram-se mais três artigos para a composição da amostra final desta revisão.

Após leitura na íntegra dos artigos selecionados, foi realizada a avaliação da qualidade de evidência dos estudos, conforme a classificação desenvolvida pela Prática Baseada em Evidência (PBE), definida como uma abordagem que associa a melhor evidência científica disponível com a experiência clínica e a escolha do paciente para auxiliar na tomada de decisão(10).

São cinco os níveis para caracterização da força de evidência: nível 1, evidência forte de, no mínimo, uma revisão sistemática de múltiplos estudos randomizados bem delineados e controlados; nível 2, evidência forte de, ao menos, um estudo randomizado com delineamento apropriado, tamanho adequado e controlado; nível 3, evidência de estudos sem randomização e bem delineados, como grupo único pré e pós-coorte, séries temporais ou caso-controle pareado; nível 4, evidência de estudos não experimentais e bem delineados, realizados em mais de um grupo de pesquisas ou centro; nível 5, opiniões baseadas em evidências clínicas de autoridades respeitadas, relatórios de comitês de especialistas ou estudos descritivos(10).

A extração dos dados foi realizada considerando o protocolo estabelecido previamente e o fluxo de seleção foi adaptado das recomendações do guia internacional PRISMA-ScR(10). Os artigos incluídos para esta scoping review foram organizados em um quadro sinóptico em planilha do Microsoft Word®, contendo as seguintes informações extraídas dos artigos selecionados: autor(es)/ base de dados/ país/ ano/ nível de evidência; título/ tipo de estudo/ amostra (se houver); sequela/programa de reabilitação; principais resultados. Tanto a síntese dos dados extraídos, quanto a análise foram realizadas de forma descritiva, com o intuito de reunir o conhecimento produzido sobre o tema explorado na revisão.

RESULTADOS

Pela estratégia de busca, foram identificados 8 artigos para a amostra final dessa scoping review e a partir da busca nas referências dos artigos selecionados, foram identificados 3 artigos que se enquadraram dentro dos critérios de elegibilidade, dessa forma, a amostra final da revisão foi composta por 11 artigos.

A Figura 1exibe o processo de identificação, seleção, elegibilidade e inclusão dos artigos recuperados:

Fonte: elaborado pelos autores, adaptado de do PRISMA-ScR

Figura 1: Fluxograma do processo de identificação, seleção, elegibilidade e inclusão dos artigos recuperados. Florianópolis, SC, Brasil, 2023(9)

O ano de maior representatividade, com oito artigos, foi 2021 e três artigos de 2020. Quanto à classificação de acordo com a PBE dois artigos se enquadraram no nível 2; um artigo no nível 3; quatro no nível 4; e cinco artigos no nível 5. Os estudos foram realizados no Reino Unido (n=4), Estados Unidos da América (EUA) (n=4), Brasil (n=1), Canadá (n=1), e Itália (n=1), sendo que todos foram publicados no idioma inglês.

O Quadro 1apresenta uma síntese descritiva dos achados da scoping review, contendo autor (es)/ base de dados/ país/ ano/ nível de evidência; título/ tipo de estudo/ amostra (se houver); sequela/programa de reabilitação; principais resultados:

Quadro 1: Quadro sinóptico da scoping review com a caracterização dos artigos segundo o(s) Autor(es)/ Base de dados/ País/ Ano/ Nível de evidência; Título/ Tipo de estudo/ Amostra; Sequela/ Programa de reabilitação; Principais resultados. Florianópolis, SC, Brasil, 2023. 

Fonte: elaborado pelos autores.

DISCUSSÃO

As sequelas neurológicas citadas nos estudos selecionados foram classificadas em distúrbios neurocognitivos, neuropsicológicos e olfativos, além da fadiga que foi preponderante na maioria dos estudos. Dentre os distúrbios neurocognitivos, houve destaque para a insônia/ hipersonia, alteração na coordenação motora, perda de memória, dificuldade de concentração e disautonomia. Os distúrbios neuropsicológicos mais frequentes foram as sequelas psicológicas que se enquadram no sofrimento emocional, ansiedade, estresse, alteração do humor e depressão. Entre os distúrbios olfativos, a anosmia foi predominante.

Nos programas de reabilitação para distúrbios neurocognitivos pós-covid-19, foram realizadas intervenções comportamentais, como Terapia Cognitivo-comportamental(19),(20)associados à exercícios físicos e mindfulness (atenção plena) para melhorar a consciência e a tolerância ao sofrimento causado pela doença(16), encorajando o paciente a estabelecer uma conexão entre mente e corpo, assim como, o encaminhamento à psicologia se mostrou eficaz(18). Orientações para a higiene do sono; estímulo à autocompreensão e autocuidado e maneiras de amenizar a causa do problema, foram efetivas para ajudar na insônia ou a hipersonia(13),(16). Para perda de memória e dificuldade de concentração, sugere-se educação em saúde com foco na autorrealibitação individualizada e continuada no domicílio(22), por meio de exercícios de treinamento cerebral (exercícios auxiliares de memória) e atividades de relaxamento(17). Para a disautonomia, o ensino de técnicas de respiração, incentivo à meditação, aumento do consumo de água, bem como a avaliação laboratorial e encaminhamento ao especialista são indicadas(18). Para a incoordenação motora, orienta-se exercícios físicos de intensidade progressivamente aumentada, com mudanças de postura, associados à exercícios de controle respiratório, com recrutamento do diafragma e exercícios de coordenação torácico-abdominal; além da mobilização passiva de membros superiores e inferiores; alongamento muscular passivo; exercícios de fortalecimento muscular de membros superiores e inferiores, tronco e músculos glúteos; exercícios de equilíbrio e coordenação como apoio unipodal, nos calcanhares e dedos do pé estático, treinamento para caminhar por distâncias progressivas(12).

Programas de reabilitação para distúrbios neuropsicológicos, incluem a Terapia Cognitiva-comportamental como suporte emocional para melhor compreensão do processo(12), sendo o mais prevalente nos estudos encontrados(12) (13) (14) (17), bem como o ensino às técnicas de relaxamento e biofeedback(14). No tocante à ansiedade e depressão, estresse e sofrimento emocional, sugere-se, desenvolver nos programas de reabilitação, a interpelação emocional com um psicólogo, a fim de diminuir os efeitos da doença no quotidiano do paciente(13) (16) (17) (18). Ademais, educação em saúde acerca de manobras de relaxamento para a redução da tensão secundária à doença(14),(17). Modificações no estilo de vida, com foco no autocuidado, como prática regular de atividade física, cuidados na alimentação e sono adequado também foram relatados(19),(20).

Para a reabilitação da anosmia, o treinamento olfativo demonstrou ser eficaz(18),(21). Recomenda-se a inalação de óleos essenciais (quatro aromas diferentes), quatro a seis gotas por 20 segundos cada, duas vezes ao dia, por 90 dias(21). Além disso, Suplemento oral de Palmitoiletanolamida (PEA) 700 mg + Luteolina 70 mg (01 comprimido oral/ dia por 30 dias) são potenciais tratamentos adjuvantes para o tratamento da disfunção olfativa pós-covid-19, quando associados à reabilitação olfativa(11).

No que tange à reabilitação da fadiga pós-covid-19, os estudos apontam os exercícios físicos de baixo impacto e com intensidade progressivamente aumentada, como: exercícios de controle respiratório, com o recrutamento do diafragma e exercícios de coordenação torácico-abdominal; mobilização passiva de membros superiores e inferiores; alongamento muscular passivo; exercícios de fortalecimento muscular de membros superiores e inferiores, tronco e músculos glúteos e exercícios de equilíbrio e coordenação. Recomenda-se de uma a duas sessões por dia, de 30 minutos cada, por seis dias na semana, devendo esses exercícios serem suspendidos na ocasião de o paciente apresentar algum sinal de alarme, como dispneia e mal-estar geral(12) (13) (16) (18) (20).

As descobertas feitas até agora sugerem que alguns sintomas da covid-19 persistem mesmo após o período da infecção aguda; mesmo em pacientes com as formas leves da doença, um terço mantém pelo menos um dos sintomas iniciais após 60 dias da infecção(23). Os resultados são consistentes com a conclusão de que se faz necessária a identificação dos sintomas e intervenção precoce, a fim de reinserir o indivíduo à vida normal, visto que esses sintomas têm impacto significativo na qualidade de vida caracterizados pela redução da capacidade laborativa e das atividades cotidianas habituais(24).

A pandemia de covid-19 criou a necessidade de serviços de reabilitação e suas recomendações nos diferentes níveis de atenção e redes de apoio à saúde. Algumas delas foram publicadas a partir de um consenso baseado em evidências para direcionar cuidados médicos e de reabilitação a partir dos sobreviventes da covid-19, assim como lições aprendidas em epidemias anteriores(5). A British Society of Rehabilitation Medicine editou uma declaração destacando a necessidade de cuidados de reabilitação e redes coordenadas de atenção pós-covid-19 individualizadas, para os diferentes sistemas como pulmonar, cardíaco, psicológico, músculo-esquelético, neurorreabilitação bem como outras demandas(25). O Defence Medical Rehabilitation Centre, de Stanford, também no Reino Unido, desenvolveu um acordo sobre a reabilitação em pessoas pós-covid-19 em parceria com especialistas nas áreas de reabilitação, esporte e medicina exercício, reumatologia, psiquiatria, psicologia entre outros, trabalhando em seu centro de reabilitação(5).

No âmbito hospitalar, um estudo com pessoas pós-covid-19 demonstrou melhora significativa na independência funcional após um programa de reabilitação multiprofissional14. Ademais, a reabilitação em pessoas pós-covid-19 deve ser iniciada ainda na fase aguda da doença e mesmo não estando institucionalizadas, devem ser orientadas sobre a reabilitação para acelerar o processo de recuperação(26).

Apoiando-se no fato de que reabilitação se faz em equipe e que o tempo é crucial para evitar a perda de funcionalidade de pessoas com sequela pós-covid-19, o olhar multiprofissional e interdisciplinar objetiva estabelecer um plano de reabilitação que atenue as sequelas apresentadas em decorrência da doença. Desse modo, o trabalho multidisciplinar é um importante elemento para o aperfeiçoamento das equipes e serviços de saúde, já que oportuniza o desenvolvimento e envolvimento das diversas categorias profissionais a partir da discussão de ideias por diferentes olhares, proporcionando uma melhora significativa na qualidade da assistência que é ofertada(27).

Na ótica da enfermagem em reabilitação, o enfermeiro desempenha um papel fundamental na equipe multiprofissional, colaborando ativamente com os demais membros, família e comunidade, a partir do processo de enfermagem, objetivando atingir níveis de excelência no processo de reabilitação, desde a sua construção à execução, além de melhorar a função e promover a independência funcional da pessoa, permitindo-lhe viver com mais qualidade(28). Portanto, é um profissional com papel de destaque na promoção das ações para a prevenção e o tratamento da doença, assim como para a educação em saúde durante os processos de readaptação/ reintegração da pessoa, dessa forma facilitando sua socialização e, essencialmente, a recuperação de sua dignidade e unicidade(29).

A educação em saúde é fundamental para o sucesso de qualquer programa de reabilitação. Como a covid-19 é uma doença nova, a educação em saúde em torno de suas implicações e possíveis consequências precisarão ser discutidas com os pacientes(30). Há uma escassez de diretrizes baseadas em evidência em relação à reabilitação de pessoas pós-covid-19. Existe, portanto, uma necessidade de mais pesquisas em torno da temática e do impacto a longo prazo que esses indivíduos podem ter, bem como os reflexos nos serviços de saúde, já que a reabilitação é uma ferramenta essencial no gerenciamento de disfunções complexas e multissistêmicas pós-covid-19(5).

CONCLUSÕES

Os estudos existentes evidenciam a eficácia dos programas de reabilitação para o tratamento das sequelas neurológicas em indivíduos pós-covid-19, sendo que é de fundamental importância que tais programas sejam desenvolvidos precocemente, com abordagem multidisciplinar, levando em consideração as comorbidades do paciente e o contexto socioambiental no qual estão inseridos. Os programas de reabilitação para distúrbios neurológicos pós-covid-19 envolvem uma abordagem holística, abrangendo aspectos comportamentais, físicos e emocionais. A combinação de intervenções comportamentais relacionada ao autocuidado, suporte emocional, reabilitação física e educação em saúde é essencial para promover a recuperação e melhorar a qualidade de vida dos indivíduos afetados pela doença.

Este estudo contribui para identificar os principais achados relacionados à reabilitação de pessoas com sequelas neurológicas pós-covid-19, fornecendo subsídios para práticas de reabilitação por equipes multidisciplinares em diferentes níveis de atenção à saúde. Além disso, destaca-se a necessidade de mais pesquisas no campo da reabilitação pós-covid-19, especificamente em indivíduos com sequelas neurológicas.

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Recebido: 28 de Maio de 2023; Aceito: 12 de Agosto de 2023

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