INTRODUÇÃO
(Introduzca las Tablas o Figuras donde considere, de manera que queden señalado el lugar del texto en el que desea que se encuentren…). Tenga en cuenta la redacción, según formato APA 6ª EDICION, en cuanto al orden y formato tanto para texto, tablas y figuras.
Ao longo das últimas décadas, o desenvolvimento positivo dos jovens (DPJ) tem sido utilizado como enquadramento teórico, de modo a facilitar uma transição bem-sucedida dos jovens para a vida adulta (Lerner, Almerigi, Theokas, & Lerner, 2005). Neste contexto, o DPJ centra-se nas qualidades dos indivíduos e assume a importância de ensinar competências para a vida a todos os jovens, de modo a que possam contribuir para as suas comunidades e ultrapassar os desafios associados à vida adulta. Os programas de intervenção sustentados nos pressupostos pedagógicos do DPJ centram-se no ensino de competências como por exemplo o respeito, liderança e perseverança, consideradas essenciais para a vida em sociedade (e.g., Fraser Thomas, Côté, & Deakin, 2005; Hernández-Mendo & Planchuelo, 2014; Lamoneda Prieto, Huertas Delgado, Córdoba Caro, & García Preciado, 2015). Os programas de intervenção com o objetivo do DPJ têm recorrido a diversos contextos como por exemplo o teatro (e.g., Dutton, 2001) e o desporto (e.g., Hellison, 2011). Diferentes modelos pedagógicos como por exemplo o modelo de desenvolvimento da responsabilidade pessoal e social (Hellison, 2011) e o modelo de educação desportiva (Meroño, Calderón, & Hastie, 2015) têm sido utilizados para promover o DPJ através do desporto.
O desporto apresenta-se também como um contexto que pode contribuir para o DPJ, dependendo do modo como é orientado, especificamente do clima criado e das estratégias utilizadas (Fraser-Thomas et al., 2005; Santos, Côrte-Real, Regueiras, Dias, & Fonseca, 2016). Em certos casos em que o DPJ não é considerado, verifica-se que o desporto pode originar comportamentos antidesportivos (Sallán, Moreno, Ceacero, & Díaz-Vicario, 2014). Contudo, caso o desporto seja orientado de modo a existir um clima intrinsecamente motivante, o DPJ pode ser alcançado. Neste contexto, o desporto reúne um conjunto de características que podem também facilitar a criação de um clima propício ao DPJ como por exemplo a necessidade de trabalhar em equipa, estabelecer relações com os outros e respeitar um conjunto de regras e normas que tornam possível a participação neste tipo de atividades (Blanco, Delgado-Noguera, & Escartí-Carbonell, 2013). Especificamente, o futebol apresenta-se como uma modalidade extensivamente praticada em diversos contextos, socialmente relevante e com o potencial necessário para promover o DPJ. A utilização de estratégias com o objetivo do DPJ e a criação de um clima adequado podem contribuir para a promoção deste tipo de resultados de aprendizagem, bem como para a concretização do potencial presente em atividades desportivas como é o caso do futebol (Blanco, 2015; Escartí, Gutiérrez, Pascual, & Wright, 2013; Gozzoli, D´Angelo, & Confalonieri, 2014).
De modo a compreender os processos relacionados com a promoção do DPJ, torna-se necessário reconhecer os desafios colocados aos treinadores, assim como os objetivos dos clubes desportivos (Petitpas, Cornelius, Raalte, & Jones, 2005). Os treinadores desportivos lidam com uma realidade complexa, caracterizada pela necessidade de atingir resultados desportivos e ao mesmo tempo suprir as necessidades de desenvolvimento dos jovens (Camiré, 2015). Coakley (2016) refere que a valorização de uma perspetiva de 'desempenho desportivo a todo o custo' juntamente com a falta de conhecimento e estratégias associados ao DPJ podem comprometer a promoção deste tipo de resultados de aprendizagem e originar experiências desportivas negativas. A título de exemplo, McCallister, Blinde e Weiss (2000) analisaram qual a importância atribuída por 22 treinadores de jovens ao DPJ através do desporto, sendo que constatou-se que consideravam esta abordagem essencial. Contudo, os participantes neste estudo apresentaram dificuldades em identificar estratégias para promover o DPJ.
Diversos estudos apontam para o facto dos treinadores de jovens valorizarem o DPJ no âmbito do desporto escolar, bem como em contextos de recreação e elite (Forneris, Camire, & Trudel, 2012; Lacroix, Camiré, & Trudel, 2008; Strachan, Côté, & Deakin, 2011; Vella, Oades, & Crowe, 2011). Apesar disso, em certos casos, verifica-se a existência de dificuldades em identificar objetivos, estratégias e atividades utilizadas para promover deliberadamente o DPJ. Recentemente, Holt et al. (2017) efetuaram uma meta-análise dos estudos qualitativos publicados na área do DPJ através do desporto, sendo que apresentaram um modelo teórico composto por cinco hipóteses, de modo a apresentar as condições necessárias para que o DPJ ocorra. Uma dessas hipóteses salienta que, caso exista um clima positivo aliado a uma abordagem intencional ao DPJ, os resultados de aprendizagem alcançados serão mais significativos. Isto é, a utilização de uma abordagem deliberada para promover o DPJ parece ser mais eficaz (Turnnidge, Côté, & Hancock, 2014).
Todavia, verifica-se a escassez de estudos acerca das filosofias e estratégias utilizadas por treinadores inseridos em contextos desportivos que envolvem jovens em risco de exclusão social (Flett, Gould, Griffes, & Lauer, 2013a; Flett, Gould, Griffes, & Lauer, 2012), pese embora a necessidade e urgência do ensino de competências para a vida e do DPJ nestes ambientes. A filosofia de treino integra as preocupações, prioridades e competências pessoais e sociais consideradas essenciais pelos treinadores e tem sido considerada relevante para compreender as suas conceções (Gilbert & Rangeon, 2011). Shields (2010) refere que os treinadores desportivos devem desenvolver uma filosofia e estratégias, com o objetivo de ensinar competências para a vida a jovens em risco de exclusão social que possam contribuir para a sua integração na sociedade. Gould e Carson (2008) realçaram também a necessidade de considerar a especificidade de contextos que envolvem jovens em risco de exclusão social, pois sugerem a existência de inúmeros desafios associados ao modo como o desenvolvimento desportivo é conciliado com o DPJ. Flett, Gould, Griffes e Lauer (2012) realizaram entrevistas semi-estruturadas e observações etnográficas a treinadores de jovens inseridos em comunidades desfavorecidas, sendo que verificou-se que os treinadores considerados menos eficazes adotavam estratégias negativas de ensino como o castigo. Apesar dos treinadores envolvidos neste estudo valorizarem o DPJ, verificou-se que não utilizavam estratégias, com o objetivo de gerar este tipo de resultados de aprendizagem. Outros investigadores constataram também a importância que treinadores envolvidos com comunidades desfavorecidas atribuem ao DPJ nas suas filosofias de treino (Marques, Sousa, & Feliu, 2013; Whitley, Bean, & Gould, 2011). Verifica-se também a necessidade de explorar diferentes sistemas desportivos e realidades que podem influenciar a intervenção de treinadores de jovens em risco de exclusão social (Esperança, Regueiras, Brustad, & Fonseca, 2013), sendo que a informação acerca da filosofia de treino e as estratégias utilizadas por treinadores de jovens em risco de exclusão social, bem como acerca dos desafios encontrados neste processo ainda é escassa.
O contexto em que os jovens estão inseridos influencia igualmente a intervenção dos treinadores com o objetivo do DPJ. A falta de suporte parental pode condicionar a promoção de resultados de aprendizagem coerentes com o DPJ, pelo inexistência de continuidade pedagógica (i.e., manutenção dos objetivos de DPJ definidos no desporto) fora do contexto desportivo. O desporto e o treinador, em certos casos, representam os únicos elementos significativos para um série de jovens em risco de exclusão social, sendo este último considerado o agente não parental mais importante (Petitpas et al., 2005). Apesar de diversos estudos (e.g., Pérez-López, Morales-Sánchez, Anguera, & Hernández-Mendo, 2015) reconhecerem a importância da relação treinador-atleta na promoção do DPJ, torna-se necessário aprofundar as perceções de treinadores desportivos acerca das suas filosofias de treino, das estratégias utilizadas e dos desafios encontrados na promoção de experiências de desenvolvimento positivo em contextos desfavorecidos. Decorrendo do exposto, este estudo teve como objetivo analisar as perceções de treinadores de jovens em risco de exclusão social em relação à sua filosofia de treino, bem como às estratégias utilizadas para promover o DPJ e o ensino de competências para a vida e desafios encontrados neste processo.
MATERIAIS E MÉTODOS
Tenga en cuenta cuestiones comunes en el formato (puntos en las numeraciones decimales en lugar de comas, cursiva en los indicadores estadísticos,…).
Participantes
Os participantes foram 10 treinadores de jovens em risco de exclusão social (ver Tabela 1 para uma descrição detalhada dos participantes) do sexo masculino a exercer funções em clubes desportivos situados em comunidades desfavorecidas do norte de Portugal. Foram selecionados para participar no estudo treinadores que estavam envolvidos em clubes desportivos com jovens em risco de exclusão social, sendo que este foi o critério de inclusão (Denzin & Lincoln, 2011). Foram recrutados apenas treinadores da zona norte do país, de modo a possibilitar a recolha de dados, pela impossibilidade dos autores em deslocarem-se a outras zonas. A zona norte de Portugal caracteriza-se pela prevalência de clubes desportivos inseridos em comunidades desfavorecidas, o que permitiu atingir os objetivos deste estudo.
Os participantes tinham treinado apenas equipas de futebol de formação compostas por jovens com idades compreendidas entre os 10 e 17 anos. O diretor técnico de uma associação desportiva local forneceu uma lista de 10 treinadores que cumpriam este critério (Silverman, 2000). Em média, os participantes tinham oito anos de experiência como treinadores de jovens em risco de exclusão social. Todos os treinadores estavam habilitados para exercer a função de treinador, sendo que todos possuíam o grau I dos cursos de treinadores promovidos pela Federação Portuguesa de Futebol (UEFA, 2015). Os treinadores estavam inseridos em equipas de futebol em que pelo menos 90% dos atletas encontravam-se em risco de exclusão social.
Instrumentos
Os dados foram recolhidos através de entrevistas semi-estruturadas (Silverman, 2000). Assim, foram realizadas duas entrevistas piloto com treinadores que apresentavam características semelhantes, de modo a testar o guião de entrevista. Estes treinadores encontravam-se inseridos em equipas compostas por jovens em risco de exclusão social da zona norte do país. Estas entrevistas piloto serviram o propósito de treinar o entrevistador e verificar se as questões elaboradas adequavam-se à natureza do estudo, bem como às características dos participantes. Este processo não originou quaisquer alterações, sendo que verificou-se que o guião cumpria os requisitos necessários. O guião (ver apêndice para a versão completa do guião) baseou-se em investigações anteriores (Vella et al., 2011; Whitley et al., 2011) e foi estruturado em quatro partes de acordo com as indicações dadas por Rubin e Rubin (2012). A primeira parte do guião era composta por questões de ordem sociodemográfica, a saber: a) sexo; b) idade; c) faixa etária dos atletas; d) formação académica; e) anos de experiência como treinador de jovens em risco de exclusão social. O entrevistador apresentou uma definição de DPJ, com o objetivo de orientar os participantes ao longo da entrevista. O DPJ foi definido como uma abordagem que visa "ensinar competências pessoais e sociais que facilitem uma transição bem-sucedida para a sociedade no futuro" (Lerner et al., 2005). As restantes partes do guião centravam-se na filosofia de treino dos participantes (e.g., Qual o papel do desporto no DPJ em risco de exclusão social?; Como é que as competências que os jovens desenvolvem no futebol podem ser utilizadas em outras áreas da vida?), nas estratégias utilizadas para promover o DPJ (e.g., Que estratégias utiliza para promover o DPJ e ensinar competências para a vida?) e nos desafios encontrados neste processo (e.g., Quais os desafios que encontra no DPJ e no ensino de competências para a vida?). Em média, as entrevistas tiveram a duração de aproximadamente 20 minutos.
Procedimento
Antes do processo de recolha de dados, este estudo foi aprovado pelo comitê de ética da universidade (i.e., código CEFADE 08.2015) e os treinadores foram contatos pelos autores do estudo, sendo explicados os objetivos do trabalho, a extensão da colaboração, bem como assegurou-se a confidencialidade e anonimato dos participantes. Todos os participantes contatados aceitaram participar do estudo.
Análise de Dados
O processo de análise de dados sustentou-se em diversas etapas (Anguera, Portell, Chacón-Moscoso, & Sanduvete-Chaves, 2018; Pérez-López, Morales-Sánchez, Anguera, & Hernández-Mendo, 2014). Primeiro, as entrevistas foram transcritas verbatim, revistas em cinco ocasiões pelo primeiro autor e inseridas no software NVivo11, de modo a facilitar a análise. Aquando da inserção das entrevistas no software Nivivo 11, não foram efetuadas quaisquer alterações ao conteúdo das mesmas. Posteriormente, cada segmento de texto foi codificado pelo primeiro autor, de modo a iniciar-se o processo de categorização aberta. Assim, todos os segmentos de texto (e.g., 'Em alguns jogos os atletas ameaçam o árbitro...') foram organizados em categorias (e.g., contexto) que por sua vez foram enquadradas em subcategorias (e.g., comportamentos desviantes). As categorias e subcategorias obtidas foram revistas diversas vezes, com o propósito de assegurar que eram mutuamente exclusivas e objetivas (Anguera et al., 2008). Adicionalmente, recorreu-se a uma análise dedutiva e indutiva (Fereday & Muir-Cochrane, 2006), sendo que procurou-se utilizar a literatura existente na área do DPJ para interpretar o material (e.g., desafios no DPJ; categoria que surgiu dedutivamente), assim como gerar categorias a partir das perceções dos participantes (e.g., formação e experiência; subcategoria que surgiu indutivamente). De modo a apresentar os resultados, selecionaram-se citações que representassem cada categoria, sendo que estas foram editadas, com o intuito de remover erros gramaticais e facilitar a leitura.
De modo a aumentar a qualidade da investigação (Smith & McGannon, 2017), o processo de categorização foi realizado pelo primeiro autor e monitorizado pelos restantes autores, especialistas na área do DPJ, sendo que eventuais discordâncias foram alvo de discussão até se atingir as categorias finais (e.g., optou-se por criar as subcategorias 'clima' e 'relação treinador-atleta', com o objetivo de refletir as perceções dos participantes acerca de cada um destes conceitos). Neste contexto, um investigador envolvido na área do DPJ, externo a esta investigação, codificou uma entrevista autonomamente e apresentou sugestões alternativas que foram discutidas pelos autores. A percentagem de acordo foi de 88% (i.e, fiabilidade inter-observador), o que pode ser considerado um valor positivo, sendo que Murphy, Dingwall, Greatbatch, Parker e Watson (1998) consideram uma percentagem de acordo acima dos 80% satisfatória. Por fim, na apresentação dos resultados procurou-se retratar as perceções dos participantes de modo claro e transparente, incluindo informação relevante para a interpretação dos resultados (e.g., apenas dois treinadores afirmaram a relevância de desenvolver a liderança dos seus atletas).
RESULTADOS
O processo de análise de dados gerou três categorias (i.e., contexto, componentes da filosofia de treino e estratégias e desafios no DPJ) e nove subcategorias. A Tabela 2 integra uma descrição detalhada das categorias, subcategorias, bem como do número de treinadores que reportaram o conteúdo de cada categoria (i.e., fontes) e do número de referências por categoria (i.e., segmentos de texto associados a cada categoria). A categoria 'contexto' integrou as perceções dos participantes em relação às características dos jovens e ao potencial do desporto no DPJ, sendo que a categoria 'componentes da filosofia de treino e estratégias' representa as perceções dos participantes acerca da sua filosofia de treino e das estratégias utilizadas para promover o DPJ. Por fim, a categoria 'desafios' retrata os desafios encontrados na promoção do DPJ.
Contexto
Famílias desestruturadas. Todos os participantes mencionaram que os jovens se encontravam inseridos em famílias desestruturadas, situação que os colocava em risco de exclusão social pela ausência de suporte parental e de um ambiente psicologicamente e fisicamente seguro: "Eu trabalho com miúdos com muitos problemas que vivem em bairros complicados e que estão habituados todos os dias a ver situações muito difíceis que envolvem polícia, pais que estão presos e são traficantes." (T1). Outro treinador reportou o seguinte: "Temos jovens com muitas dificuldades económicas e várias carências sociais, inclusive temos um atleta que viu o pai matar a mãe e estamos a tentar ajudá-lo." (T4).
Comportamentos desviantes. Foram também identificados inúmeros comportamentos desviantes evidenciados pelos jovens: "Em alguns jogos os atletas ameaçam o árbitro que tem medo e às vezes acaba por ceder, por exemplo marcar uma falta e fazer o que eles querem." (T8). Outro treinador retratou a mesma realidade: "Por exemplo temos um atleta que tem trazido muitos problemas. Procuro alertá-lo que se for para uma instituição perde o futebol, os amigos e basicamente tudo até aos 18 anos." (T3).
Desporto como fator de inclusão. O desporto foi encarado como um meio que afastava os jovens de cenários de exclusão social e promovia o DPJ:
Eu acho que uma das coisas boas que o futebol tem é que para jogares num clube não precisas de ter possibilidades financeiras e isso não impede que possas ter um bom relacionamento com os outros. O futebol é um veículo de interação social, desenvolvendo o esforço e o trabalho em equipa, ajudando também no desempenho escolar. O DPJ pode ser alcançado no futebol!. Quem não tem dinheiro pode jogar e são todos iguais (T10).
Outro treinador mencionou: "Atualmente integramos jovens que abandonaram a escola no clube para que possam sentir-se incluídos e voltar à escola. O DPJ pode ser conseguido através do futebol e é uma necessidade para os nossos atletas." (T9).
Componentes da filosofia de treino e estratégias
Clima positivo. Quando convidados a descrever a sua filosofia de treino, diversos treinadores mencionaram que procuravam criar um clima positivo, com o intuito de facilitar experiências de desenvolvimento positivas. Um dos participantes afirmou: "Temos atletas que faltavam às aulas e tratavam mal os pais. Contudo, o ambiente que criamos ajudo-os a ver a vida em sociedade de uma forma mais saudável e a ser melhores pessoas." (T4). Outro treinador acreditava que o clima existente pode propiciar o DPJ:
Os jovens adoram o futebol e estão sempre ansiosos que os dias de treino cheguem. As amizades que criam entre eles também são importantes. Com este ambiente os jovens podem aprender a viver em sociedade e uma série de valores essenciais para o seu desenvolvimento. Sem dúvida que com o desporto ficam menos revoltados (T8).
Competências desenvolvidas. O desporto foi perspetivado como um contexto em que os jovens podiam adquirir inúmeras competências para a vida como o trabalho em equipa e o esforço: "O desporto permite desenvolver várias competências como o trabalho em equipa e o esforço, sendo decisivo no desenvolvimento positivo dos jovens. Por isso os jovens que não praticam desporto não conseguem desenvolver estas competências." (T7). Outro treinador acrescentou: "A entreajuda, o trabalho em equipa e o esforço são competências para a vida que podem ser aprendidas no desporto e se forem bem assimiladas são utilizadas na vida deles." (T10). A relação estabelecida com os atletas foi apontada como um aspeto decisivo para a promoção do DPJ e ensino de competências para a vida.
Relação treinador-atleta. Os treinadores indicaram a necessidade de adotar o papel de um amigo, mas ao mesmo tempo serem disciplinadores com os atletas: "Tento ter uma boa relação com eles e que vejam a nossa preocupação com o seu bem-estar. Sou uma mistura de uma pessoa dura com um amigo." (T5). Outro treinador mencionou: "Acima de tudo tento ser um segundo pai para eles, ensinar-lhes que há coisas mais importantes na vida do que fumar e beber álcool. Às vezes os atletas parecem zangados e a melhor maneira é sermos duros com eles." (T1).
Estratégias. Os treinadores referiram utilizar a conversa individual e em grupo como estratégias importantes para promover o DPJ, reportando o seu efeito positivo nos jovens. Dois treinadores reportaram: "Através de conversas conseguimos ensinar-lhes competências para a vida. Eu tinha um jogador que não respeitava ninguém e com as conversas individuais melhorou muito." (T9) e "Eu procuro dizer-lhes que precisam de aprender a ser melhores pessoas para atingirem os seus objetivos. Dou o exemplo de jogadores conhecidos, falando dos bons exemplos que eles devem seguir." (T4). A necessidade de estabelecer regras e desenvolver o respeito pelos outros apresentaram-se como prioridades para os treinadores: "No início falamos com os atletas sobre as regras e estabelecemos expetativas acerca do comportamento que devem ter no clube." (T3). Outro treinador indicou: "Nos primeiros momentos temos que criar regras para que eles possam perceber logo no início que têm de respeitar os outros para serem respeitados." (T7).
Os participantes mencionaram o esforço como uma competência que pode ser desenvolvida através da criação de um clima de suporte em que as ações positivas dos jovens são valorizadas: "Criei o prémio do jogador do mês que é dado ao jogador que mais se esforçou e que foi mais participativo." (T2). Outro treinador afirmou: "Procuro definir objetivos com eles, de modo a que possam esforçar-se ao máximo para chegar lá." (T5).
Os treinadores não foram capazes de articular outras estratégias que utilizavam para facilitar o DPJ, sendo que apresentaram uma visão restrita acerca do DPJ e das implicações desta abordagem para a sua intervenção. Um dos treinadores referiu: "Agora de momento não me ocorre nenhuma estratégia que use ou tenha usado com os jovens, mas o que faço é muito em função da situação." (T9). Outro participante indicou: "Não há nenhuma estratégia em concreto, existem é ideias do que eu quero para os atletas. Quero que se respeitem e que sejam melhores pessoas." (T5). Apenas dois treinadores afirmaram a relevância de desenvolver a capacidade de liderança dos seus atletas.
Desafios no DPJ
Formação e experiência. Relativamente aos desafios encontrados no DPJ e no ensino de competências para a vida, os treinadores salientaram o facto de utilizarem apenas a sua experiência empírica, o que condicionava a intervenção:
Não conheço nem aplico nenhum programa desportivo para trabalhar com jovens em risco de exclusão social o desenvolvimento positivo dos jovens, embora possam ajudar. A minha intervenção no desenvolvimento deles como pessoas baseia-se somente no que vou aprendendo na minha prática como treinador. Outras ferramentas podiam ser úteis e melhorar a minha intervenção (T6).
Outro treinador acrescentou: "Mediante as situações que eu já vivi como treinador aproveito essas experiências para intervir. Contudo, não conheço programas que possam ser utilizados no DPJ, o que poderia ajudar." (T5). Foram também apontadas lacunas nos cursos de treinadores, em específico a escassez de conteúdos ligados ao DPJ nestes contextos, o que representava um desafio para os treinadores desenvolverem estas competências. A este respeito, dois treinadores reportaram: "Nos cursos de treinadores tivemos disciplinas como a psicologia do desporto e do desenvolvimento dos jovens em que falamos alguma coisa. Contudo, não foi o suficiente para influenciar a forma como trabalho com os jovens a este nível" (T7) e "Não, se quer que lhe diga não abordamos o DPJ nos cursos de treinadores. Eu tenho o segundo nível e se há coisas que nunca falamos foi sobre isso." (T1).
Relação com os pais. A relação com os pais foi identificada como um desafio complexo, pela influência negativa destes agentes: "Tenho que deixar muitas vezes os pais de fora, ou seja, não comunico com eles, porque infelizmente prejudicam o nosso trabalho ao nível do desenvolvimento pessoal e social." (T10). Dois treinadores também referiram: "Às vezes os pais são terríveis, são piores que os miúdos, uma pessoa ensina de uma maneira e eles querem ensinar de outra. Isto é negativo para a aprendizagem deles. É um bocado complicado termos sucesso." (T1) e "Tinha um atleta que não tinha apoio nenhum dos pais e não havia um trabalho conjunto. Chegou ao ponto de tomar comprimidos, tentou suicidar-se e não conseguia integrar-se na sociedade." (T7). Contudo, apesar do carácter conturbado da relação estabelecida com os pais, os treinadores afirmaram que existe uma necessidade destes agentes em recorrer ao treinador para solucionar problemas vivenciados no processo de desenvolvimento dos jovens: "Os pais pedem-nos ajuda, falam connosco para que possamos melhorar certos aspetos do comportamento dos seus filhos." (T9).
DISCUSSÃO
Este estudo teve como objetivo analisar as perceções de treinadores de jovens em risco de exclusão social em relação à sua filosofia de treino, bem como às estratégias utilizadas para promover o DPJ e o ensino de competências para a vida e desafios encontrados neste processo. Tornou-se evidente a importância atribuída pelos treinadores à prática de futebol, pelo fato de afastar os jovens, mesmo que momentaneamente, de comportamentos de risco. O futebol pode apresentar-se como um contexto capaz de envolver os jovens, pela sua relevância cultural e social, sendo que isto, por si só, pode não ser suficiente para promover o DPJ. A relação direta, estabelecida pelos participantes neste estudo, entre a participação no futebol e o DPJ tem vindo a ser contrariada por diversos investigadores que sugerem a necessidade de implementar estratégias que promovam de modo explícito o DPJ (DeBusk & Hellison, 1989; Fraser-Thomas et al., 2005; Petitpas et al., 2005). Por exemplo, no modelo proposto por Petitpas (2005) é dada importância à existência de um clima de suporte positivo e de relações significativas com os jovens. Pérez-López, Morales-Sánchez, Anguera, e Hernández-Mendo (2016) num estudo conduzido com 74 participantes, incluindo crianças, pais, monitores e outros agentes educativos, com o objetivo de analisar a qualidade emocional dos programas desportivos destinados a crianças, realçaram o carácter fundamental da empatia, compreensão autêntica e iniciativa proporcionada pelos líderes adultos. O facto dos treinadores neste estudo considerarem a existência de uma relação direta entre a prática do futebol e o DPJ pode dever-se ao desconhecimento acerca do que é o DPJ e das implicações desta abordagem para as suas práticas. Estudos anteriores sugerem que uma visão restrita acerca do que é o DPJ pode enviesar este tipo de trabalho (e.g., Santos, Camiré, & Campos, 2016).
Os treinadores realçaram a relevância de um clima positivo, no sentido de fomentarem o DPJ e o ensino de competências para a vida como o trabalho em equipa e o esforço em concordância com estudos anteriores (Forneris et al., 2012; Gould, Collins, Lauer, & Chung, 2007; Holt et al., 2017). Neste contexto, os treinadores foram capazes de articular algumas estratégias pedagógicas para desenvolver o respeito e o esforço, como dialogar com os atletas e definir objetivos associados ao DPJ. Estas estratégias têm sido consideradas relevantes por diversos investigadores (Camiré, Forneris, Trudel, & Bernard, 2011; Santos, Corte-Real, Regueiras, Dias, & Fonseca, 2016), permitindo tornar claras as expetativas e motivar os atletas. As perceções dos participantes neste estudo sugerem que o respeito e esforço eram desenvolvidos deliberadamente por se tratarem de uma necessidade pedagógica (i.e., de manter o controlo disciplinar e promover o envolvimento nas sessões de treino) em contextos que envolvem jovens em risco. Hellison (2011) indica a relevância de adquirir competências para a vida como o respeito e o esforço, no sentido de avançar progressivamente para o ensino de outras competências consideradas mais complexas, em específico a autonomia, liderança e transferência para a vida. A dificuldade evidenciada pelos treinadores em perspetivar estratégias para desenvolver outras competências associadas ao DPJ poderá estar também relacionada com os desafios encontrados pelos treinadores no âmbito do trabalho com jovens em risco (Camiré, Trudel, & Forneris, 2012; Vella et al., 2011). Torna-se relevante conduzir mais estudos suportados numa abordagem qualitativa que utilizem múltiplos métodos como entrevistas e observações, no sentido de comparar as perceções com as práticas dos treinadores.
Os participantes neste estudo identificaram como um desafio o facto de dependerem unicamente da sua experiência para facilitar o DPJ. Camiré, Trudel e Forneris (2014) apontaram para a importância da reflexão e da experiência como fatores que influenciam o modo como os treinadores facilitam o DPJ. Contudo, os mesmos autores realçaram a relevância de outros instrumentos como livros, internet, mentores e formação de treinadores. Todos os contextos referidos foram considerados importantes para o ganho de competências essenciais no domínio da promoção do DPJ, sendo que a formação de treinadores é, em muitos sistemas desportivos, obrigatória e deve satisfazer as necessidades dos treinadores e criar condições para que possam 'aprender a aprender'. Neste estudo, foram mencionadas diversas lacunas nos cursos de treinadores, em específico o fato de não fornecerem um maior conjunto de ferramentas para suprir os desafios associados ao trabalho com jovens em risco (Vella, Oades, & Crowe, 2013). Sugere-se a presença de conteúdos ligados ao DPJ nos cursos de treinadores, de modo a que sejam partilhados modelos como o de Petitpas (2005) ou de Hellison (2011), entre outras ferramentas úteis para desenvolver positivamente jovens em risco de exclusão social. Assim, é necessário desenvolver estudos que possam avaliar a eficácia de programas de formação de treinadores centrados no DPJ (Santos et al., 2017). Outro desafio identificado pelos treinadores foi o fato de existir uma relação conturbada com os pais, o que, na sua perspetiva, leva ao insucesso das estratégias implementadas com o objetivo do DPJ, pois não existe continuidade do trabalho desenvolvido no clube em outros domínios da vida (Knight & Holt, 2012). Os treinadores referiram também a existência de uma dependência dos pais na intervenção do treinador, no sentido de solucionar problemas e/ou comportamentos desviantes, bem como contribuir para o DPJ. Neste contexto, torna-se fundamental que exista uma articulação entre pais e treinadores, de modo a que estes agentes possam alinhar objetivos, estratégias e avaliar o sucesso da intervenção no futebol e em outros domínios da vida (Gómez-Espejo, Aroca, Robles-Palazón, & Olmedilla, 2017; Marholz, 2017). Iniciativas recentes como é o caso do projeto SCORE (2018) têm procurado facilitar a articulação entre treinadores e pais, quanto às estratégias e objetivos utilizados no domínio do DPJ.
LIMITAÇÕES
Torna-se necessário considerar a existência de diversas limitações associadas ao presente estudo. Neste contexto, os participantes neste estudo refletem um contexto específico composto por jovens em risco de exclusão social provenientes de clubes situados no norte de Portugal, o que sugere a presença de particularidades culturais que podem ser distintas de outras realidades e/ou zonas do país. Adicionalmente, não foram considerados neste estudo quaisquer treinadores do sexo feminino e/ou inseridos no futebol feminino. Finalmente, não foram realizadas observações sistemáticas (i.e., com recurso a sistemas de observação sistemáticos) ao comportamentos dos treinadores, de modo a relacionar as suas perceções com as suas práticas, o que permitiria uma análise mais profunda desta problemática.
IMPLICAÇÕES PRÁTICAS
O desporto pode ser um contexto fundamental para a inclusão de jovens em risco, contribuindo para a promoção do DPJ e ensino de competências para a vida. Contudo, os treinadores, apesar de serem todos certificados pelas entidades que regulam a prática desportiva em Portugal, referiram apenas um conjunto limitado de competências que podiam ser desenvolvidas através do desporto, centrando-se essencialmente nas necessidades imediatas dos jovens em cumprirem regras e envolverem-se nas atividades. Neste contexto, os cursos de treinadores e as universidades podem desempenhar um papel de maior preponderância e devem proporcionar oportunidades para que os treinadores possam adquirir competências para ultrapassarem os desafios encontrados na promoção do DP. Sugere-se assim a inclusão destes conteúdos no currículo de instituições universitárias e nos programas de formação contínua de treinadores promovidos por federações e associações desportivas, assim como a integração de uma componente teórica e prática nesses contextos que permita aos treinadores compreender: i) o que é o DPJ; ii) que modelos pedagógicos podem servir o propósito do DPJ (e.g., modelo de DRPS; Hellison, 2011); iii) quais as estratégias pedagógicas que podem ser utilizadas neste domínio; iii) e como podem ultrapassar os desafios presentes neste tipo de intervenções. Caso os treinadores não sejam capazes de compreender as implicações do DPJ para a sua intervenção, este processo pode ser enviesado. Por outro lado, caso estes agentes sejam expostos a conteúdos associados ao DPJ e desenvolvam programas de intervenção que procurem suprir as necessidades de desenvolvimento dos jovens verifica-se que a probabilidade das intervenções serem bem-sucedidas aumenta (Holt, 2017).
Apesar da importância dos cursos de treinadores, existem outros contextos através dos quais os treinadores podem aprender a desenvolver positivamente os seus atletas. Assim, caso sejam criadas oportunidades nos clubes desportivos para que os treinadores possam partilhar conhecimentos e estratégias e sejam estimulados a refletir continuamente através das suas experiências, independentemente do contexto desportivo em que tal acontece, as diferenças entre a importância dada ao DPJ e a prática serão também atenuadas. Todavia, é necessário que as instituições desportivas, como é o caso dos clubes, valorizem o DPJ, no sentido de os treinadores serem influenciados por essas preocupações e desenvolvam esforços no sentido de fomentar a promoção deste tipo de competências (Coakley, 2016). Neste sentido, o papel desempenhado pelos treinadores deve também ser apoiado pelos clubes, sob pena de o DPJ poder ser descurado pela valorização exclusiva de outros objetivos (e.g., desempenho desportivo). Isto é, existindo uma preocupação nos clubes desportivos em facilitar o DPJ, expressa na intervenção dos agentes decisores, os treinadores poderão ter o suporte necessário para desenvolver este tipo de trabalho com maior eficácia.