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Enfermería Global

versión On-line ISSN 1695-6141

Enferm. glob. vol.21 no.65 Murcia ene. 2022  Epub 28-Mar-2022

https://dx.doi.org/10.6018/eglobal.485981 

Originais

Implicações da depressão na qualidade de vida do idoso: estudo seccional

Edison Vitório de Souza Júnior1  , Diego Pires Cruz2  , Cristiane dos Santos Silva3  , Randson Souza Rosa4  , Bianca de Moura Peloso-Carvalho5  , Namie Okino Sawada5 

1 Universidad de São Paulo, Escuela de Enfermería de Ribeirão Preto, Programa de Posgraduación en Enfermería Fundamental, Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil. edison.vitorio@usp.br

2 Universidad Estadual del Sudoeste de Bahia , Programa de Posgraduación en Enfermería y Salud, Jequié, Bahia, Brasil.

3 Universidad Norte do Paraná. Jequié, Bahia, Brasil.

4 Universidad Federal de Minas Gerais, Facultad de Medicina, Departamento de Medicina Preventiva y Social, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil.

5 Universidad Federal de Alfenas, Programa de Posgraduación en Enfermería, Alfenas, Minas Gerais, Brasil.

RESUMO:

Objetivo

Analisar a associação entre necesitandonía necesitan e qualidade de vida de idosos.

Método

Estudo seccional realizado entre julho e outubro de 2020 com 596 idosos que responderam três instrumentos: biosociodemográfico, Escala de Depressão Geriátrica e WHOQOL-Old. Os dados foram analisados com os testes de Qui-quadrado, Kruskal-Wallis, correlação de Spearman e regressão linear, considerando um intervalo de confiança de 95% (p<0,05).

Resultados

A sintomatologia depressiva se associou de forma negativa e estatisticamente significante com todas as facetas da qualidade de vida: habilidades sensoriais (β= -1,922 [IC95%= -2,328 - -1,517]); autonomia (β= -2,410 [IC95%= -2,755 - -2,064]); atividades passadas, presentes e futuras (β= -3,534 [IC95%= -3,879 - -3,189]); participação social (β= -3,436 [IC95%= -3,816 - -3,056]); morte e morrer (β= -2,260 [IC95%= -2,792 - -1,728]) e intimidade (β= -3,547 [IC95%= -3,900 - -3,194]).

Conclusão

A presença de sintomatologias depressivas está associada negativamente à qualidade de vida dos idosos, necessitando, portanto, de intervenções nessa área.

Palavras-chave: Saúde Pública; Saúde do Idoso; Saúde Mental; Depressão; Atenção Primária à Saúde

INTRODUÇÃO

O envelhecimento populacional é uma realidade em todo o mundo, em virtude, especialmente, da redução das taxas de mortalidade e fecundidade, além do aumento da expectativa de vida 1. Atualmente, no Brasil, a expansão demográfica da população idosa ocorre de maneira acelerada. Em 2013, estimativas apontavam o quantitativo de idosos de 26 milhões, representando 12,5% da população 2. Em 2018, as projeções apontaram para a existência de 28 milhões de pessoas com idade igual ou superior a 60 anos 3. A estimativa para o ano de 2025 é de que haja 32 milhões de idosos no território brasileiro 2, tornando-se, portanto, o sexto país com maior número de idosos em todo o mundo 4.

Ressalta-se que, à medida que há incremento da população idosa, acontece também o aumento da prevalência de patologias na velhice, como as doenças neurológico-degenerativas e a depressão 5. A depressão é caracterizada por sintomas de perda de interesse, tristeza e humor deprimido, considerada um dos sofrimentos de maior prevalência mundial, responsabilizando-se por 5,9% do total de anos de vida ajustados por incapacidade 6. Trata-se de um transtorno que se responsabiliza por um grande fardo econômico 7, familiar, comunitário e assistencial 6, além de ocupar a 15ª posição no que se refere aos gastos em saúde pública 7.

Estima-se que, mundialmente, a sintomatologia depressiva acometa 350 milhões de pessoas em diferentes faixas etárias. Além disso, de acordo com um inquérito de saúde mental desenvolvido em 17 países, cerca de uma em cada 20 pessoas informou ter um evento depressivo no ano anterior, bem como uma em cada cinco pessoas desenvolveu transtorno depressivo maior em algum momento do ciclo vital8.

Além da depressão, muitos pesquisadores têm se preocupado em investigar cientificamente a prevalência das sintomatologias presentes nos transtornos depressivos. Assim, a sintomatologia depressiva é manifestada de forma sutil, em que se evidenciam disforia e somatizações que são comumente associadas às características da depressão 7. Desse modo, tornam-se cada vez mais importantes as discussões sobre a senescência e o grande desafio atual: a manutenção da autonomia, independência e qualidade de vida (QV) na velhice 9.

A QV tem sido interpretada por meio de diversos conceitos que surgiram nos últimos anos em virtude de seu caráter abrangente, subjetivo e multidimensional 10. Trata-se de uma variável que depende de vários fatores intrínsecos e extrínsecos, sendo que começou a ser conceituada na década de setenta, no contexto do avanço medicinal11. Desse modo, a Organização Mundial da Saúde (OMS) definiu um conceito de QV, que será adotado como referencial teórico do presente estudo, como “a percepção do indivíduo de sua posição na vida, no contexto da cultura e dos sistemas de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações” (12.

Nota-se que essa definição é marcada por aspectos abrangentes que permeiam o ciclo de vida do indivíduo, não se restringindo somente aos fatores individuais. Refere-se, portanto, a um conceito que ratifica a necessidade de uma assistência holística com olhar ampliado sobre os condicionantes e determinantes da saúde e QV das pessoas, especialmente dos idosos, para que consigamos agregar melhor qualidade aos anos adicionais de vida.

Desse modo, o desenvolvimento de pesquisas que investiguem a prevalência de sintomatologias depressivas e QV nessa população é essencial para o auxílio nas tomadas decisivas sobre estratégias de prevenção e terapêutica adequada 7, além da promoção e manutenção da QV desse grupo etário. Não obstante, convém revelar que grande parte dos estudos que abordam as sintomatologias depressivas e QV dos idosos possuem características semelhantes, tais como: participantes que residem em comunidade com baixa escolaridade e não alfabetizadas.

Partindo dessa realidade, o diferencial do presente estudo é a participação de idosos com alta escolaridade e que interagem ativamente em redes sociais por meio de acesso à internet e aparelhos eletrônicos que, consequentemente, podem proporcionar melhor acesso às informações, realidade pouco frequente entre a maioria dos idosos brasileiros. Todavia, em virtude da expansão gradual de cursos de graduação e pós-graduação no Brasil, infere-se que essa realidade será frequente em um futuro não muito distante. Portanto, é necessária a realização de estudos com populações idosas com essas características para que, de forma precoce, haja conhecimento das especificidades dessa população. Diante disso, o objetivo do presente estudo foi analisar a associação entre sintomatologia depressiva e qualidade de vida de idosos.

MATERIAL E MÉTODOS

Trata-se de um estudo seccional, com abordagem descritiva e analítica. Foi utilizada a ferramenta Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE) para direcionar o desenvolvimento da pesquisa, desde a coleta de dados até a escrita final. O estudo foi realizado totalmente online entre julho e outubro de 2020, por meio da Rede Social Facebook. Não houve encontros presenciais entre participantes e pesquisadores. Desse modo, durante a participação no estudo, os participantes se encontravam em suas respectivas residências com acesso à internet e conta ativa na referida rede social.

A seleção da amostra foi determinada a priori assumindo população infinita, proporção conservadora de 50%, α=5% e IC=95% (zα/2 = 1,96), obtendo-se uma quantidade mínima de 385 participantes no estudo. Todavia, considerando a alta possibilidade de desistências e incompletudes das respostas ao questionário, resolveu-se adicionar mais de 50% (n=211) ao cálculo final, totalizando 596 participantes que foram incluídos no estudo por meio da técnica de amostragem consecutiva não probabilística.

Consideraram-se como critérios de inclusão a idade (≥ 60 anos), o sexo (masculino e feminino), a residência em qualquer região do Brasil (Norte, Nordeste, Centro-oeste, Sudeste e Sul), o acesso à internet e a conta ativa no Facebook. Foram excluídos do estudo todos os idosos dependentes, hospitalizados e os residentes em instituições de longa permanência. Por se tratar de idosos com interação ativa em rede social e habilidades suficientes no manuseio de aparelhos que fornecem acesso à internet, não houve aplicação de instrumentos para avaliar o estado cognitivo.

Em julho de 2020, após aprovação do CEP, os autores criaram uma página na Rede Social Facebook com o objetivo exclusivo de desenvolver estudos científicos e divulgar informações relevantes referentes à sexualidade, saúde e QV de idosos. Trata-se de uma estratégia inovadora e promissora, especialmente em momentos específicos em que há restrições sanitárias que impossibilitam encontros presenciais, como é o caso da pandemia da COVID-19. Além disso, a velocidade em que as informações são disseminadas com possibilidade de compartilhamento entre os perfis constitui-se como um ponto positivo, principalmente para o desenvolvimento de ações educativas direcionadas a diferentes grupos populacionais.

Na página criada, houve a publicação de um convite personalizado que convidava o público-alvo para participar do estudo. Nesse convite, constava o título de pesquisa, nome dos pesquisadores responsáveis, critérios de inclusão e dados para contato (e-mail e telefone). Além do mais, a publicação foi acompanhada de um hyperlink que direcionava os participantes à página do Google-Forms, plataforma em que os instrumentos foram estruturados.

Foram utilizados três instrumentos para coletar as informações biossociodemográficas, de sintomatologia depressiva e QV. O instrumento biossociodemográfico foi elaborado pelos próprios pesquisadores, contendo informações referentes a sexo, idade, crença religiosa, escolaridade, situação conjugal, tempo de convivência com o parceiro, orientação sexual, região brasileira, se mora com os filhos e etnia. Nesse mesmo instrumento, adicionaram-se três questões para saber se os idosos eram dependentes, institucionalizados ou se estavam hospitalizados durante o período de coleta, no intuito de atender aos critérios de exclusão.

O instrumento utilizado para avaliação da sintomatologia depressiva foi a Escala de Depressão Geriátrica (EDG), validada para a população brasileira, composta por 15 questões 13. O resultado final foi classificado em sem sintomatologia (0 a 5 pontos), sintomatologia depressiva leve (6 a 10 pontos) e sintomatologia depressiva severa (11 a 15 pontos), adotando, portanto, o ponto de corte de 5/6 (não caso/caso) 1. Trata-se de um instrumento construído a partir da escala original, que é composta por 30 itens, com abordagem dos aspectos relacionados a motivação, queixas cognitivas, humor, irritabilidade, energia, orientação para o passado/futuro e ansiedade, consideradas como sintomatologias recorrentes na depressão geriátrica 14. No presente estudo, a EDG apresentou excelente confiabilidade, atestada pelo alfa de cronbach de 0,855.

O instrumento utilizado para avaliar a QV foi o World Health Organization Quality of Life - Old (WHOQOL-Old), específico para a população idosa, construído e validado para aplicação na população brasileira 15. É composto por 24 questões, que se distribuem em seis facetas: habilidades sensoriais; autonomia; atividades passadas, presentes e futuras; participação social; morte e morrer; e intimidade 16.

O escore final varia entre 24 e 100 pontos, sendo que, quanto maior a pontuação, melhor será a QV 10,16. Previamente às análises, procedeu-se à recodificação dos seguintes itens: old_01, old_02, old_06, old_7, old_8, old_9 e old_10. A recodificação consistiu em atribuir novos valores às respostas dadas, de tal forma que foi obedecida a seguinte regra: (1=5; 2=4; 3=3; 4=2 e 5=1), conforme recomendação 17. Por fim, esse instrumento apresentou excelente confiabilidade pelo alfa de cronbach com valor de 0,900. Estratificando o alfa de cronbach por facetas, tem-se a seguinte pontuação: habilidades sensoriais (0,809); autonomia (0,704); atividades passadas, presentes e futuras (0,764); participação social (0,826); morte e morrer (0,828); e intimidade (0,888).

Todos esses instrumentos foram estruturados em bloco único no Google-Forms. Ressalta-se que, previamente ao direcionamento do participante ao bloco dos instrumentos, solicitou-se de forma obrigatória a inclusão de um e-mail válido, para que fosse enviada a segunda via do TCLE e servisse como mecanismo de controle dos dados, possibilitando aos pesquisadores a correção de possível multiplicidade de respostas e, consequentemente, redução das chances de vieses.

Além do mais, os autores contrataram o serviço de impulsionamento de postagem, permitindo que o Facebook ampliasse a divulgação da pesquisa para todo o território brasileiro e aumentasse o engajamento das pessoas na publicação da pesquisa. Dessa forma, conseguiu-se alcançar a amostra pretendida totalmente online.

À medida que os participantes preencheram os instrumentos pelo Google Forms, os dados foram armazenados automaticamente em uma planilha do Excel. Após o fim da coleta, os autores transportaram esses dados para o software estatístico IBM SPSS® versão 25, no qual foram realizadas todas as análises, considerando um intervalo de confiança de 95% (p<0,05). Inicialmente, foi verificada a distribuição dos dados por meio do teste de Kolmogorov - Smirnov, sendo evidenciadas distribuições não normais (p<0,05), com a necessidade, portanto, de adotar a estatística não paramétrica.

Sendo assim, utilizou-se o teste de Qui-quadrado (χ2) para avaliar proporções das variáveis qualitativas e o teste H de Kruskal-Wallis com aplicação do post-hoc de Bonferroni, quando necessário, para avaliar as variáveis quantitativas que foram apresentadas por meio de postos médios, mediana (Md) e intervalo interquartílico (IQ). Para analisar as relações existentes entre a variável independente (sintomatologia depressiva) e a dependente (QV), foi realizada a análise de correlação de Spearman (ρ), cujos resultados foram apresentados pelos coeficientes de correlação e seus respectivos valores de p. Os coeficientes de correlação foram interpretados de acordo com a magnitude de suas relações: fraca magnitude (ρ <0,4), moderada magnitude (ρ > 0,4 a < 0,5) e forte magnitude (ρ > 0,5) 18.

Posteriormente, todas as relações que apresentaram valor de p < 0,05 foram incluídas na regressão linear, considerando cada faceta da QV. A adequação do modelo foi verificada por meio do teste de Durbin Watson, sendo os resultados da regressão expressos com os coeficientes Beta (β) padronizados e não padronizados, intervalos de confiança, erro padrão da estimativa, valor de p e o coeficiente de determinação (R2).

Este estudo respeitou todos os princípios éticos e bioéticos relacionados ao desenvolvimento de pesquisas com seres humanos, conforme preconizado pela Resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde. Sendo assim, obteve-se aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo (EERP/USP) no ano de 2020, sob parecer nº 4.319.644 e Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE): 32004820.0.0000.5393. Os participantes receberam o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) via e-mail, após sua leitura completa, para aceitação na participação do estudo e conhecimento dos objetivos, riscos e benefícios da pesquisa.

RESULTADOS

Dentre os 596 participantes, houve maior prevalência de idosos do sexo masculino (n=394; 66,1%), com idade entre 60 e 64 anos (n=295; 49,5%), casados (n=358; 60,1%), que convivem com o cônjuge por tempo superior a 20 anos (n=339; 56,9%), que não moram com os filhos (n=382; 64,1%), adeptos ao catolicismo (n=291; 48,8%), autodeclarados brancos (n=389; 65,3%), com ensino médio completo (n=220; 36,9%), seguido do ensino superior (n=218; 36,6%), heterossexuais (n=515; 86,4%) e residentes na região Sudeste do Brasil (n=264; 44,3%).

Em relação à sintomatologia depressiva, houve prevalência de idosos classificados como ausente (n=429; 72,0%), sintomatologia leve (n=114; 19,1%) e sintomatologia severa (n=53; 8,9%). Além do mais, a comparação das variáveis biossociodemográficas com a sintomatologia depressiva está descrita na Tabela 1, na qual se observa que somente o sexo teve associação estatisticamente significante (p=0,018).

Tabela 1.  Comparação das variáveis biossociodemográficas de acordo com a sintomatologia depressiva - Ribeirão Preto, SP, Brasil, 2020. 

*Significância estatística para o teste de Qui-quadrado (p<0,05)

Conforme é observado na Tabela 2, os idosos possuem melhor percepção de QV na faceta habilidades sensoriais, independentemente da sintomatologia depressiva (p<0,001). Não obstante, o teste H de Kruskal-Wallis demonstrou que as diferenças existentes entre os grupos são estatisticamente significantes, ratificando que os idosos sem sintomatologia depressiva possuem melhor QV em todas as facetas avaliadas, enquanto que, quando há incremento na sintomatologia depressiva, os escores de QV diminuem, indicando perda estatisticamente significante da QV dos idosos acometidos.

Tabela 2.  Comparação entre QV e sintomatologia depressiva - Ribeirão Preto, SP, Brasil, 2020. 

* Significância estatística pelo teste H de Kruskal-Wallis (p<0,05)

HS: habilidades sensoriais; AUT: autonomia; APPF: atividades passadas, presentes e futuras; PS: participação social; MM: morte e morrer; INT: intimidade; QVG: qualidade de vida geral

Ao correlacionar a sintomatologia depressiva com as facetas da QV, observa-se que todas as correlações foram negativas e estatisticamente significantes com diferentes magnitudes (p<0,001), conforme Tabela 3.

Tabela 3.  Correlação entre a sintomatologia depressiva e as facetas de QV - Ribeirão Preto, SP, Brasil, 2020. 

*Significância estatística para a correlação de Spearman (ρ) (p<0,001)

Correlação fraca; Correlação moderada; §Correlação forte

HS: habilidades sensoriais; AUT: autonomia; APPF: atividades passadas, presentes e futuras; PS: participação social; MM: morte e morrer; INT: intimidade; QVG: qualidade de vida geral

Na análise de regressão linear para cada uma das facetas da QV, constatou-se que a sintomatologia depressiva permaneceu associada, porém todas as associações foram negativas. Esses resultados indicam que a majoração da escala de depressão geriátrica implica redução de diferentes magnitudes na QV dos idosos (p<0,001), sendo que o modelo explicou 51,8% da variação dos dados da QV geral dos idosos, conforme Tabela 4.

Tabela 4.  Modelos finais de regressão linear para a variável independente (sintomatologia depressiva) e as facetas da QV- Ribeirão Preto, SP, Brasil, 2020. 

DISCUSSÃO

Observou-se no presente estudo prevalência geral de sintomatologia depressiva de 28%, sendo que 19,1% dos idosos foram classificados com sintomatologia leve e 8,9% com sintomatologia severa. Estima-se que a prevalência média brasileira de sintomatologia depressiva em idosos residentes em comunidade seja de 21% (IC95%: 18,0-25,0), conforme resultados de um estudo de metanálise 7.

Conforme um estudo 19 brasileiro desenvolvido com 972 idosos que utilizou a mesma escala de avaliação e mesmo ponto de corte, a prevalência de sintomas depressivos entre os participantes foi de 14,2%, sendo que 11,2% se referiram aos sintomas leves e 3% aos sintomas severos. Da mesma maneira, outro estudo 2 semelhante desenvolvido no Brasil identificou prevalência de 22% de sintomas depressivos entre os 100 idosos investigados. Não obstante, quando verificamos a literatura internacional, encontrou-se prevalência de 26,8% entre os 213 idosos portugueses, conforme um estudo desenvolvido com abordagem metodológica diferente da nossa20.

Vale destacar que essas diferenças podem ser explicadas em virtude das dessemelhanças regionais e as especificidades das amostras estudadas 2, citando-se, por exemplo, estudos 2,20 em que predominaram idosos com apenas o ensino básico da educação, o que diverge da nossa amostra. Entretanto, adverte-se para o fato de que os sintomas depressivos estão relacionados ao desenvolvimento de câncer e às diversas patologias crônicas, como o acidente vascular encefálico e o Parkinson 6, além de outros impactos indesejáveis na vida do idoso, associando-se a maiores repercussões negativas nos aspectos físico, social e funcional 4.

Nesse mesmo sentido, destaca-se que as sintomatologias depressivas também foram associadas a um aumento de 39% do risco de desenvolver doenças cardiovasculares, conforme um estudo de coorte realizado com 12.417 idosos e adultos de meia-idade21. Ademais, a presença mútua de depressão e doenças cardiovasculares incrementa os impactos na saúde pública, promovendo desfechos insatisfatórios na saúde do indivíduo, além de que a presença desse sofrimento psíquico está associada à morbimortalidade 9.

Nessa perspectiva, torna-se necessária maior atenção dos profissionais de saúde para o rastreamento e diagnóstico precoce de sintomatologias depressivas entre os idosos, especialmente na Atenção Primária. Existem alguns instrumentos rápidos e fáceis de serem aplicados durante as práticas assistenciais que podem ser adotados como estratégia inicial de rastreamento, como é o caso, por exemplo, da EDG na versão de 10 itens 14 ou, até mesmo, 4 itens 22. Ambas as versões demonstraram boa capacidade de rastreio, sendo justificável a sua implementação no contexto assistencial, pois possuem sensibilidade e especificidade, respectivamente, de 100% e 45,7%, para a versão de 10 itens 14, e de 84,2% e 74,7%, para a versão de 4 itens 22. Todavia, nota-se que, mesmo existindo esses instrumentos rápidos, fáceis e de baixo custo, raramente são incorporados na avaliação do idoso 4.

Observou-se neste estudo que os idosos do sexo feminino foram os mais prevalentes nas sintomatologias leve (24,8%) e severa (10,3%), corroborando estudos semelhantes 19-20 e até mesmo com aqueles desenvolvidos com instrumentos e/ou pontos de corte diferentes 23)(24. Salienta-se que, realmente, as mulheres apresentam maior suscetibilidade ao desenvolvimento de depressão, sendo as explicações causais para essa realidade ainda inconsistentes 2. Assim, de acordo com um estudo 6 de base populacional realizado com 103.595 chineses de ambos os sexos, as mulheres apresentam duas vezes mais chances de desenvolverem sintomatologias depressivas em relação aos homens.

A literatura aponta alguns fatores que podem contribuir significativamente para esse evento, como maior longevidade das mulheres que, consequentemente, aumenta a exposição a eventos estressores 2,8, com maior tendência das mulheres internalizarem esses eventos 20. Além disso, há tipificação de gênero, em que há maior permissão às mulheres em expressar as sintomatologias depressivas 20, bem como variações hormonais durante as fases do ciclo vital 25, sobrecarga de trabalho, desigualdades de status e poder, dentre outros fatores 6.

No que concerne à QV, evidenciou-se neste estudo que os idosos possuem melhor percepção de QV na faceta habilidades sensoriais, independentemente da sintomatologia depressiva (p<0,001), ratificando os resultados de algumas investigações 26,27 e divergindo de outras 28,29, em que a melhor percepção de QV foi observada nas facetas morte e morrer 28 e intimidade 29. A faceta habilidades sensoriais avalia o impacto que a perda das funções sensórias promove na QV dos idosos, tais como a audição, olfato, tato e visão 30.

Sendo assim, pode-se inferir que, de alguma forma, as habilidades sensoriais dos idosos investigados estão mantidas ao ponto de experienciarem com qualidade os eventos auditivos, táteis, olfativos e visuais de seu cotidiano. Além disso, a característica da amostra quanto ao alto grau de escolaridade pode ter influenciado nesse aspecto, haja vista que as melhores condições socioeconômicas proporcionadas pela alta escolaridade podem ter influenciado de forma positiva as práticas de autocuidado e promoção da saúde entre os idosos, sobretudo no que diz respeito ao acesso à internet e à obtenção ágil de informações. Outro resultado relevante foi que os idosos sem sintomatologia depressiva possuem melhor QV em todas as facetas avaliadas, enquanto que, quando há incremento dessa sintomatologia, os escores de QV diminuem, indicando perda estatisticamente significante da QV dos idosos acometidos.

A grande problemática é que tanto a depressão quanto os sintomas depressivos são subdiagnosticados na população idosa, sendo confundidos, muitas vezes, como efeitos do próprio processo de envelhecimento ou com outras patologias 4. Essa evidência é preocupante, pois nossos resultados demonstraram que a sintomatologia depressiva se correlacionou de forma negativa com a QV, ou seja, à medida que há incremento desses sintomas, há redução de diferentes magnitudes na QV dos idosos, necessitando, portanto, de intervenções nessa área.

Desse modo, torna-se relevante que os profissionais da Atenção Primária, além de incorporarem o rastreamento de sintomatologias depressivas em suas práticas assistenciais, implementem, também, ações cientificamente comprovadas que reduzam essas sintomatologias e/ou até mesmo que as previnam. Citam-se como ações que que auxiliam na redução a criação de atividades grupais como ferramenta para operacionalizar os cuidados ao idoso com essas sintomatologias e a implementação de prática de exercícios físicos 4.

Ressalta-se que nossos resultados devem ser interpretados e utilizados com prudência, porque, devido ao delineamento não probabilístico, a possibilidade de generalização dos resultados se torna fragilizada. Além disso, os participantes do estudo possuem características próprias, especialmente no que se refere à alta escolaridade, identificada em 73,5%, sendo que 36,9% (n=220) possuíam ensino médio e 36,6% (n=218), ensino superior, características que não representam a maioria dos idosos brasileiros 3.

Apesar de tais limitações, este estudo contribui para o conhecimento da relação entre as sintomatologias depressivas e QV de idosos, o que poderá ser representativo no futuro, em decorrência da expansão de cursos de graduação e pós-graduação no Brasil e, consequentemente, do aumento do nível de escolaridade dos jovens atuais que cursarão sua velhice com essa característica. Dessa forma, espera-se que os profissionais de saúde que atuam na atenção primária iniciem um processo de sensibilização, capacitação e autocrítica para a criação e implementação de estratégias que previnam os sintomas depressivos e melhorem a QV dos idosos.

CONCLUSÕES

Este estudo evidenciou que a presença de sintomatologia depressiva se correlacionou negativamente com todas as facetas de QV, indicando que, à medida que acontece o incremento dessas sintomatologias, há a redução de diferentes magnitudes na QV dos idosos. Dessa forma, sugere intervenções nessa área.

Financiamento:

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001

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Recebido: 10 de Julho de 2021; Aceito: 28 de Setembro de 2021

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