INTRODUÇÃO
A falta da prática de exercício físico regular constitui-se ainda, nos dias de hoje, um problema de saúde pública. Embora exista profusa literatura dos benefícios associados à prática regular de atividade física (Janssen & LeBlanc, 2010), 68% da população portuguesa é fisicamente inativa, taxa esta que tem vindo a aumentar ao longo dos últimos anos (Eurobarómetro, 2018). Consequentemente, o número de pessoas portadoras de doenças crónicas não transmissíveis (e.g., hipercolesterolemia, enfarte do miocárdio, obesidade) tem aumentado, afetando os sistemas nacionais de saúde com despesas públicas amplificadas (Organização Mundial de Saúde - OMS, 2018), assim como a qualidade de vida e longevidade da população mundial (Arem et al., 2015).
Como forma de combater esta tendência, muito foco se tem dado à prática de exercício físico em instalações apropriadas e supervisionadas por profissionais, tais como em ginásios e health clubs (Teixeira et al., 2020). O exercício físico define-se como a prática regular e estrutura de atividade física (Caspersen et al., 1985). Assim sendo, assume-se que quem pratica exercício físico, que o faça semanalmente de forma regular, dentro dos padrões estruturados tais como aulas de grupo ou treino de força e resistência. Em 2018, registaram-se aproximadamente 539.000 praticantes inscritos, sendo que destes, 340.000 eram novos sócios (Associação Empresarial de Ginásios e Academias em Portugal - AGAP, 2018). Ou seja, assume-se que 37% dos praticantes inscritos no ano anterior se mantiveram na prática, mostrando que a taxa de abandono possa ter atingido aproximadamente 63%. Estes números demonstram bem a elevada taxa de desistência da prática de exercício físico em ginásios e health clubs e como o estudo do comportamento do praticante se torna uma necessidade essencial (Rodrigues et al., 2018; 2020a). Contudo, é de salvaguardar que não existem estudos que indiquem a transição da prática de exercício físico de forma estruturada em ginásios para uma vertente mais autodidata tais como caminhadas e ou programas de atividade física comunitários.
Olhando para a perspetiva individual, aproximadamente 50% dos novos praticantes de exercício físico abandonam o comportamento nos primeiros 6 meses (Radel et al., 2017). De acordo com Gardner (2015), a introdução de um comportamento novo no quotidiano de uma pessoa constitui-se como um processo complexo que necessita de tempo até se tornar habitual. Hagger (2018) reforça esta afirmação, constatando o facto de que a formação do comportamento habitual ou rotineiro é fortalecida pela realização repetida desse mesmo comportamento. Por outras palavras, quanto maior for a frequência (a repetição) do comportamento, maior será a probabilidade de esse comportamento vir a ser reiterado no futuro. Neste sentido, a execução de um comportamento habitual requer menos esforço e menos atenção consciente comparativamente a um comportamento não habitual (Brickell et al., 2006). De acordo com Barg e Ferguson (2000), um comportamento habitual parece estar sob o controle inconsciente da pessoa, sendo assim a sua realização um processo repetido e facilitado.
A literatura é consensual no que diz respeito ao impacto que o comportamento passado tem no comportamento futuro (Sommers, 2011) inclusive em estudos empíricos no contexto do exercício físico (Rodrigues et al., 2019a; Rodrigues et al., 2020b). Ou seja, a repetição de um comportamento pode vir a tornar-se habitual, fazendo parte do registo quotidiano de uma pessoa, caso este comportamento seja repetido ao longo do tempo. Tomando em consideração o exemplo de subir um lanço de escadas, indivíduos que usaram no passado regularmente o elevador para chegar de um piso ao outro, estão mais predispostos a repetirem o comportamento num próximo momento. Igualmente, pessoas que usam as escadas optam por manter esse comportamento no futuro. Não obstante, pessoas que usam frequentemente o elevador estão menos propensas a usarem as escadas e vice-versa. Este exemplo tem vindo a ser usado por investigadores para mostrar a automaticidade do comportamento e como a repetição de um comportamento específico reforça a sua repetição, dificultando o processo de mudança para outro comportamento (Nomura et al., 2009). Adicionalmente, parece inegável que a natureza da experiência passada (de natureza subjetiva), seja de particular relevo para a definição da sua relação com o comportamento futuro, motivo pelo qual se eleva a necessidade de os profissionais de exercício físico estarem devidamente preparados para lidar com os clientes nas diferentes fases desta mudança comportamental (Rodrigues et al., 2019b; Teixeira et al., 2020).
Considerando os pressupostos teóricos anteriores, o estudo do comportamento humano e o seu valor preditor é uma área de investigação decisiva (Gardner, 2015). Embora a literatura afirme consistentemente que o comportamento realizado no passado prediz fortemente a sua realização no futuro, este tipo de análise no contexto do exercício físico é escasso (Rodrigues et al., 2020b). Investigadores têm-se focado na análise de variáveis preditoras não-observáveis (e.g., motivação, bem-estar) colocando de lado o estudo do comportamento mensurável per se. Estudos anteriores têm demonstrado que determinantes cognitivas (Gomes et al., 2017) e motivacionais (Hagger & Chatzisarantis, 2017) pouco poder explicativo têm na formação do comportamento futuro. Aliás, os dados recolhidos através de questionários autoadministrados relativamente à adesão e frequência ao exercício físico parecem apresentar viés nos resultados (Liu et al., 2016). Tal premissa, parece estar relacionada com o facto de as pessoas não terem a certeza da quantidade ou se terem esquecido das vezes que realizaram o comportamento no passado, como por exemplo as vezes que treinaram no ginásio ou health club (Brennder & DeLamater, 2016).
No entanto, a investigação que estuda a frequência da prática de exercício físico e a sua associação com o comportamento é, ainda, escassa e os resultados dos estudos revelam alguma inconsistência (Rodrigues et al., 2020a). Por um lado, o estudo de Rodrigues et al. (2020b) demonstrou que o comportamento passado é o preditor mais significativo do comportamento futuro. Por outro lado, no estudo de Gardner (2015) uma maior experiência na realização do comportamento não estava significativamente associada à formação do hábito e na realização do comportamento. Adicionalmente, pretende-se explorar as limitações propostas por Teixeira et al. (2020) no que diz respeito à falta de dados e estudos que quantifiquem adequadamente a prática de exercício físico a longo prazo em ginásios e health clubs, de forma a os profissionais possam estar munidos do panorama atual da prática de exercício físico em operadores fitness. Os resultados poderão dar a conhecer a realidade nacional no que diz respeito à frequência por parte dos utilizares, permitindo, por exemplo, uma aferição externa da qualidade das práticas por parte dos profissionais para que os operadores de fitness possam ser reconhecidos como locais adequados na promoção da saúde (Teixeira et al., 2020).
Assim, o objetivo deste estudo consistiu em analisar comportamento dos praticantes de exercício físico em ginásios e health clubs ao longo de dois anos, considerando a frequência passada como preditor da frequência futura. De acordo com estudos prévios, especula-se que: a) os primeiros 6 meses são um período “crítico”, em que a taxa de abandono poderá rondar os 50% (Radel et al., 2017); b) praticantes com mais de 1 ano de experiência e comportamento regular mantém-se na prática, sendo que, o valor preditivo seja mediado pelo comportamento passado (Rodrigues et al., 2020b; Verplanken, 2006); e c) a frequência (i.e., entradas no ginásio ou health club) regular sem episódios de desistência prediz a manutenção do comportamento no futuro (Lally et al., 2011).
MÉTODOS
Participantes
Participaram neste estudo 4788 indivíduos (feminino = 2556; masculino = 2232) com idades compreendidas entre 18 e 45 anos (M = 25.21; DP = 5.23). Estes indivíduos eram praticantes de exercício físico em ginásios e health clubs em Portugal em diversas atividades fitness, tais como aulas de grupo, personal training e musculação. A amostra era principalmente constituída por trabalhadores (65%), sendo a restante amostra constituída por estudantes (12%) e por indivíduos reformados (23%). A amostra é relativa de ginásios e health clubs do território português, sendo a maioria da amostra residente em grandes cidades tais como Lisboa (30%), Porto (28%) e Braga (21%).
Como critérios de inclusão, os participantes tinham de ter idade igual ou superior a 18 anos, serem novos clientes no ginásio e terem todas as quotas mensais pagas durante o período em análise. Foram excluídos da análise todos os indivíduos que tivessem abandonado a prática e/ou que não tivessem retomado à prática, dentro do período de 2 anos estabelecidos neste estudo.
Procedimentos
Após aprovação pela Comissão de Ética (nº de registo CE-UBI-pJ-2018-044:ID683), foram contactados por conveniência gestores de ginásios e health clubs. Os objetivos do estudo foram explicados e o consentimento foi obtido de todos os gestores de ginásios e health clubs para a recolha dos dados. Foram considerados os registos eletrónicos dos clientes de ginásio para fins desta investigação. Este estudo é considerado um estudo de coorte prospetivo. Assim sendo, este estudo é observacional na sua natureza, ao qual não houve intervenção nem randomização da amostra em grupos. Os investigadores recolheram os dados de acesso ao ginásio e health club, bem como variáveis para a caracterização da amostra tais como idade e sexo. Nenhum cliente de ginásio e/ou health club foi abordado, dado que os dados terem sido recolhidos através dos sistemas eletrónicos. Foi garantida a confidencialidade e anonimato a todos os gestores de ginásios e health clubs.
Os investigadores iniciaram a recolha de dados a setembro de 2017 e terminaram em janeiro de 2020. Foi recolhida a informação dos acessos ao ginásio e health clubs dos novos praticantes de exercício durante 2 anos. Esses acessos foram recolhidos através dos registos eletrónicos de todos os ginásios e health clubs de forma individual. Posteriormente, dividimos os acessos em quatro momentos: 1) primeiros 6 meses (T1); 2) 6º até ao 12º mês (T2); 2) 12º até ao 18º mês (T3); e 4) últimos 6 meses (T4). Para análise, cada período compreendeu 26 semanas em que a frequência foi somada para um valor total. Usamos o valor de referência dos 6 meses de acordo com os pressupostos de estudos anteriores: a) a curva do abandono estabiliza a partir dos 6 meses (7); b) aproximadamente 50% dos praticantes abandonam a prática nos primeiros 6 meses (Buckworth & Dishman, 2002; Radel et al., 2017); e c) de acordo com a fase da manutenção do modelo Transteórico (Prochaska & DiClemente, 2005), o indivíduo faz o esforço de manter o comportamento após a sua realização durante 6 meses.
Análise Estatística
Todas as análises estatísticas foram realizadas com recurso ao programa Mplus 7.4 (Múthen & Múthen, 2010). Como análise preliminar, foram calculadas as estatísticas descritivas (e.g., médias, desvio padrão, assimetria e curtose) bem como as correlações bivariadas. Dado as entradas nos ginásios e health clubs terem sido recolhidas como variáveis observáveis e considerando ser de interesse para este estudo os efeitos diretos e indiretos, seguimos as linhas orientadoras de modelos de equações estruturais, saturando o modelo definido como path analysis tal como proposto por Hair e colaboradores (2019). Nesse sentido, os índices tradicionais e incrementais não foram considerados dado o modelo proposto ser pré-especificado e totalmente saturado, exibindo um ajuste perfeito (Byrne, 2016). Para uma maior compreensão dos efeitos diretos e indiretos entre os quatro momentos, realizou-se um modelo de mediação em série. O modelo foi estimado de forma a obter o impacto dos diferentes períodos nos momentos seguintes, considerando T2 e T3 como mediadores entre T1 e T4. Mediação total será espectável caso o coeficiente dos efeitos indiretos totais seja superior e significativo face ao efeito direto entre T1 e T4 (Hayes, 2017). Os efeitos diretos, indiretos e totais foram analisados de acordo com as recomendações de Williams e Mackinnon (2008), reportando os coeficientes estandardizados e o Intervalo de Confiança (IC) a 95%, sendo a estimativa considerada significativa caso o IC não englobe o valor de 0.
RESULTADOS
Relativamente à taxa de abandono: 39% (n = 1867) abandonaram a prática de exercício físico entre T1 e T2, 25% (n = 1197) abandonaram a prática entre T2 e T3 e 10% (n = 479) abandonaram a prática entre T3 e T4. A média das entradas semanais apresenta um valor de aproximadamente duas sessões de treino por semana, em que o T4 apresenta a média mais elevada (M = 2.31; DP = .92). A Tabela 1 evidencia os valores de uma distribuição normal da frequência no ginásio durante os quatro momentos, dado os valores de assimetria e curtose estarem contidos dentro dos limites pré-estabelecidos. Todas as correlações são significativas entre os momentos analisados, sendo que a associação entre T3 e T4 apresenta o valor mais elevado.
De acordo com os resultados do modelo de equações estruturais (Figura 1), todos os efeitos diretos são positivos e significativos (ver Tabela 2), sendo que o efeito entre o período T3 para o período T4 apresenta a predição mais significativa. Igualmente, os coeficientes dos efeitos indiretos entre o período T1 para o período T4 e o período T2 para o período T4 são positivamente significativos. Nesse sentido testamos um modelo de mediação traçando regressões entre todos os momentos em análise. De acordo com os resultados do modelo de mediação (Figura 2), é possível de observar que o efeito direto é significativo. Igualmente, os efeitos indiretos são significativos entre todos os momentos (ver Tabela 2). Os resultados mostram a existência de mediação total entre o período T1 para o período T4, dado o efeito indireto total apresentar um coeficiente (β = .91 [.82, 1.02]) superior e significativo comparativamente ao efeito direto entre o período T1 para o período T4. Nesse sentido, podemos assumir que o período T2 e T3 são mediadores entre o período T1 para o período T4.
DISCUSSÃO
Este estudo analisou o impacto do comportamento de praticantes de exercício físico em ginásios e health clubs em momentos consequentes ao longo de 2 anos. O modelo de mediação em série demonstra que o valor preditivo entre o período T1 para o período T2 é o mais forte e que o período T2 e o período T3 são mediadores entre os primeiros 6 meses de prática e os últimos 6 meses. Os resultados corroboram com os pressupostos do valor significativo do comportamento passado no comportamento futuro e serão discutidos com base na literatura disponível.
Os resultados realçam que a frequência de exercício físico em ginásio nos primeiros 6 meses constitui-se como um momento crucial para os 6 meses seguintes. De facto, sensivelmente 40% dos novos praticantes de ginásio e health clubs abandonaram a prática durante este período. Estes dados corroboram com estudos anteriores (Buckworth & Dishman, 2002; Prochaska & DiClemente, 2005; Radel et al., 2017), onde se explica que a taxa de abandono de um comportamento nos primeiros 6 meses é aproximadamente de 50%. Ultrapassando a barreira dos primeiros 6 meses de prática, o valor preditivo mantém-se significativo, mostrando que o comportamento atual (i.e., T3) é explicado pelo “comportamento passado” T2 e indiretamente por T1. Isto reforça as evidências de Gardner (2015) e de estudos no contexto do exercício físico (Rodrigues et al., 2020), mostrando que o praticante de exercício está menos consciente do comportamento, dado este já fazer parte da sua rotina quotidiana. Além disso, tal como descrito por Prochaska e Diclemente (2005), o praticante já ultrapassou o período crítico dos primeiros 6 meses, estando mais predisposto a fazer o esforço de continuar a realizar o comportamento no futuro. De acordo com Sommers (2011) indivíduos que repetem o comportamento com maior frequência estão mais predispostos a repetirem o mesmo comportamento no futuro, ou seja, os resultados suportam a afirmação “diz-me o que fizeste no passado e dir-te-ei o que farás no futuro”.
Interessantemente, no modelo de equações estruturais, T2 e T3 têm um efeito significativo indireto e direto respetivamente, com o período T4. Não obstante, de acordo com o modelo de mediação, T1 tem o efeito indireto significativo com T4 mediado por T2 e T3, mas não tem um efeito direto significativo. Estes resultados reforçam a ideia de que, os primeiros 6 meses constituem-se como sendo um período de adaptação e mudança comportamental, tal como descrito pela fase da ação do modelo Transteórico (Prochaska & DiClemente, 2005). Isto é, o indivíduo está a realizar o comportamento de forma a que se torne habitual, não estando totalmente interiorizado como um comportamento rotineiro. O praticante tem a intenção de mudar, passando de um comportamento fisicamente inativo para a prática regular de exercício, no entanto, não garante que a mudança se mantenha ao longo do tempo. Nesse sentido, a frequência regular sem episódios de desistência no T2 e T3 são fundamentais para que o praticante de exercício físico interiorize o comportamento como sendo parte deste.
De acordo com estes resultados, os instrutores de fitness devem focar-se na promoção de um conjunto de atividades moderadamente exigentes e desafiantes, que possibilitem o desenvolvimento das capacidades técnicas do praticante, de forma a satisfazer as necessidades psicológicas básicas, diretamente relacionadas com a motivação mais autodeterminada (Rodrigues et al., 2020b). Paralelamente, os instrutores de fitness devem igualmente incentivar o envolvimento ativo dos praticantes no seu progresso, permitindo-lhes escolher quais os exercícios a realizar, dando-lhes liberdade para propor novos desafios e incutindo-lhes autonomia para serem responsáveis pelo próprio progresso, principalmente neste período crítico (T2 e T3), para que os praticantes possam continuar a internalizar o comportamento como fazendo parte integrante do seu quotidiano.
Os resultados mostram que a taxa de abandono foi de 39%, entre T1 e T2; 25% entre T2 e T3, e 10% entre T3 e T4. A percentagem de desistências nos primeiros 6 meses está ligeiramente abaixo das descritas por vários autores (Radel et al., 2017). Não obstante, abandonaram no total 3543 praticantes de exercício físico ao longo de 2 anos sem retorno à prática, confirmando a tendência atual da elevada taxa de abandono (AGAP, 2018), principalmente nos primeiros meses, diminuindo a taxa de abandono ao longo do tempo (Sperandei et al., 2016). Os números de abandono podem estar relacionados com diversos indicadores sociodemográficos (e.g., mudança de zona de residência) e temporais (e.g., mudança da estação). Nesse sentido não se pode inferir que as pessoas tenham desistido da prática de exercício físico, apenas que tenham abandonado a sua prática em contexto de ginásio e health club. Futuros estudos deverão avaliar a continua prática (ou total desistência) de exercício físico em espaços verdes ou de outra forma regular, tais como atividades comunitárias.
A frequência rondou as 2 vezes por semana, aumentando ligeiramente ao longo dos quatro momentos. Estes resultados são semelhantes aos obtidos por Hooker (2016), mostrando que a frequência de 2 vezes por semana, parece ser o estímulo mínimo para que o comportamento se possa tornar habitual. Acresce ainda o facto de que quem praticou exercício físico sem episódios de desistência manteve-se mais tempo na prática. De acordo com Lally e colaboradores (2011) não basta apenas realizar o comportamento, mas sim ser consistente e repeti-lo para reforçar a sua automaticidade. Caso o praticante se tenha comprometido a frequentar o ginásio/health clube pelo menos duas vezes por semana, sem interrupção nos primeiros 6 meses, a probabilidade de continuar a praticar exercício físico nos meses seguintes é maior.
Limitações
Apesar de esta investigação apresentar avanços científicos relevantes para o contexto em questão, é fundamental perceber as limitações existentes. O desenho prospetivo com um acompanhamento do comportamento ao longo de dois anos limita a interpretação de inferência, sugerindo que se devem criar intervenções que possam reduzir o número de pessoas que abandonaram a sua prática ao longo dos dois anos. A literatura existente tem comprovado que o recurso a técnicas de mudança comportamental pode levar a uma melhoria na comunicação do instrutor de fitness, facilitando a relação praticante-instrutor e assim aumentar a adesão à prática de exercício físico (Ntoumanis et al., 2017).
Por último, só foi possível recolher dados de alguns ginásios e health clubs em Portugal, sendo que os dados não poderão ser generalizados para toda a operacionalização do fitness a nível nacional. Acrescido, não se analisou com detalhe a possibilidade de haver um efeito moderador de algumas variáveis sociodemográficas (e.g., idade, sexo), bem como na escolha das atividades de fitness (e.g., musculação vs. aulas de grupo). Nesse sentido, este estudo abre portas para mais estudos que possam examinar o fenómeno da prática de exercício físico, bem como a compreensão das causas e consequências do comportamento ao longo do tempo.
CONCLUSÃO
Cabe aos gestores de ginásios/health clubs estarem em constante processo de alerta do comportamento dos novos praticantes de forma a conseguirem traçar o desfecho (i.e., abandono ou persistência) num período de 2 anos. Tal como reportado neste estudo, os praticantes que frequentaram o ginásio/health club pelo menos duas vezes por semana sem interrupção foram aqueles que mais tempo tiveram na prática e/ou que continuaram após os 2 anos de acompanhamento. Pelo contrário, praticantes com episódios de interrupção/com uma frequência inferior a 2 vezes por semana desistiram do comportamento durante o período em análise. Isto demonstra que indivíduos que falham a oportunidade de irem ao ginásio poderão estar em risco de abandonar o comportamento.
Identificar as variáveis determinantes para a formação do comportamento padrão torna-se crucial. Variáveis como os níveis de motivação poderão determinar a realização de exercício físico no futuro (Rodrigues et al., 2020b). Cada praticante de exercício físico em ginásio ou health club deve ser visto como um todo, pelo qual deve ser acompanhado constantemente de forma individual, procurando satisfazer as necessidades deste. Os dados aconselham uma atenção nos novos praticantes, especialmente aqueles com menos de 6 meses de experiência em exercício físico, dado estarem mais suscetíveis a abandonarem a prática de exercício físico. A análise da frequência semanal constitui-se como indicador a ser tido em consideração pelos gestores de ginásios e health clubs aquando do acompanhamento por parte dos técnicos profissionais. Uma “falta” por parte do praticante sem aviso pode constituir-se como um sinal de alerta.
Concluindo, após apresentação, análise e discussão dos resultados, é importante refletir sobre a importância do presente trabalho. A análise da frequência dos praticantes de exercício físico em ginásio e health club irá permitir, por exemplo aos gestores e diretores técnicos de um operador fitness, ter indicações acerca do trabalho desenvolvido pelos instrutores de fitness e intervir de forma a melhorar os indicadores de qualidade como forma de melhorar as componentes técnicas destes profissionais na retenção dos utilizadores (Teixeira et al., 2020); ou aos instrutores, retificar e/ou orientar a sua intervenção profissional de acordo com a perceção dos seus praticantes, adequando a prescrição de acordo com as necessidades dos mesmos, dado os comportamentos interpessoais por parte dos instrutores desempenharem um papel crucial (Rodrigues et al., 2019c). Estes exemplos remetem-nos para o problema inicialmente apresentado, focado na necessidade de os ginásios implementarem estratégias para diminuição do abandono e/ou aumento da prática de exercício físico regular a longo prazo (Rodrigues et al., 2020b). Sabendo que os comportamentos interpessoais entre os praticantes e os instrutores antecede a intenção e que, a esta, está associada a persistência (Rodrigues et al., 2020b), esta análise do comportamento poderá ser um indicador útil de forma a melhorar a qualidade do serviço prestado pelos instrutores no âmbito das atividades de grupo de fitness.