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Enfermería Global

versão On-line ISSN 1695-6141

Enferm. glob. vol.20 no.62 Murcia Abr. 2021  Epub 18-Maio-2021

https://dx.doi.org/10.6018/eglobal.448521 

Originais

A auriculoterapia no controle da ansiedade e do estresse

Renata Dantas Jales1  , Francisca Vilena da Silva1  , Ivoneide Lucena Pereira1  , Anna Luiza Castro Gomes1  , Jordana de Almeida Nogueira1  , Sandra Aparecida de Almeida1 

1Universidade Federal da Paraíba-UFPB. João Pessoa, Paraíba, Brasil.

RESUMO:

Introdução:

A pós-modernidade requer do indivíduo uma consciência crítica e consequentemente mudanças no setor educacional, favorecendo o desencadeamento de agravos de saúde mental nos professores, principal contribuinte na formação dessa consciência. A auriculoterapia é uma prática de fácil aplicação que pode atuar nesses agravos.

Objetivo:

Analisar o efeito da auriculoterapia nos escores de ansiedade e estresse dos professores do ensino fundamental I e II e do programa Educação de jovens e adultos de uma escola municipal de Ensino Fundamental em João Pessoa, capital do estado da Paraíba.

Método:

Estudo de intervenção do tipo antes e depois, aprovado pelo Comitê de ética e pesquisa da Universidade Federal da Paraíba sob CAAE: 16803119.3.0000.5188. Foram aplicados cinco instrumentos de coleta de dados, três questionários semiestruturados e duas escalas (escala de ansiedade de Hamilton e escala de estresse percebido). Ao aplicar os critérios de exclusão foram analisados os dados de 11 professores, os quais foram organizados em planilhas estatísticas e analisados através da análise descritiva, teste de Tukey, ANOVA e Wald.

Resultados:

A auriculoterapia obteve efeito estatisticamente significativo na ansiedade entre a primeira e quarta sessão de auriculoterapia, e para o estresse, entre a primeira e nona sessão, sendo que para a ansiedade esse efeito foi intensificado nos professores que lecionavam em duas instituições de ensino.

Conclusões:

A auriculoterapia atuou com êxito na redução dos escores de estresse e ansiedade, contribuiu na melhora dos principais sintomas desses agravos e atuou na promoção da auto percepção.

Palavras-chaves: Terapias Complementares; Auriculoterapia; Ansiedade; Estresse Ocupacional; Docentes

INTRODUÇÃO

A sociedade da pós-modernidade tem sido marcada pelo consumismo, individualismo, excesso de informações e tecnologias e pela diversidade sociocultural. Tal contexto requer dos indivíduos o desenvolvimento de uma consciência crítica, reflexiva, dinâmica e atualizada que implica mudanças no setor considerado capaz de revolucionar o modo como essa sociedade se relaciona e produz: o setor da educação. Portanto, diferentes programas educacionais foram inseridos nas escolas públicas para que houvesse a ressignificação do conhecimento e a criação de novas formas de produzi-lo e utilizá-lo1)(2)(3)(4.

Nesse cenário, destaca-se o professor (a) como ator principal para promover as mudanças necessárias, pois além de conduzir o estudante no processo de aprendizagem, realiza articulações entre o mundo escolar e o mundo pós-moderno, atende algumas demandas familiares e atua também no aspecto relacional. No entanto, apesar das responsabilidades assumidas, as políticas educacionais não têm valorizado a atuação de educadores e a precarização das condições de trabalho desses profissionais tem contribuído para que o sofrimento mental seja o agravo de saúde mais prevalente nessa população3)(5)(6)(7.

Considerando tais evidências, bem como o fato de o Brasil ser o país que mais utiliza medicamentos antidepressivos e ansiolíticos, evidencia-se a necessidade de implementar outras maneiras de assistência à saúde mental, como por exemplo, a utilização das Práticas Integrativas e Complementares (PIC´s). As PIC’s constituem um conjunto de práticas que objetivam fortalecer os princípios do Sistema Único de Saúde através da prevenção de agravos, promoção da saúde e tratamento do indivíduo, tendo como base o modelo biopsicossocial; com a implementação de tais práticas foi possível ofertar de forma gratuita outras racionalidades médicas que só eram disponíveis nas instituições privadas, dentre essas práticas, encontra-se a auriculoterapia, modalidade da Medicina Tradicional Chinesa (MTC) que estimula pontos do pavilhão auricular, anexo bastante inervado que ao ser estimulado provoca reações no sistema neurovegetativo em órgãos ou regiões devido aos meridianos, restabelecendo o equilíbrio homeostático6)(8)(9)(10)(11.

Reconhecendo os benefícios da auriculoterapia enquanto uma PIC´s de aplicação simples e econômica com pouco ou nenhum efeito colateral, que atua também, em problemas de ordem emocional/psíquica, defende-se que a oferta sistemática de sessões desta PIC´s pode além de diminuir os níveis de ansiedade e estresse, promover saúde mental na população beneficiada11)(12)(13.

Considerando o contexto apresentado, esta investigação foi norteada pelos seguintes questionamentos: quais os escores de ansiedade e estresse dos professores do ensino fundamental I e II e do programa de Educação de Jovens e Adultos (EJA)? Qual o impacto da auriculoterapia nos escores de ansiedade e de estresse desses professores? Qual o efeito da auriculoterapia nos principais sintomas de ansiedade e estresse?

Sendo assim, o estudo objetivou: Analisar o efeito da auriculoterapia nos escores e nos sintomas de ansiedade e estresse dos professores do ensino fundamental I e II e do EJA de uma escola municipal de Ensino Fundamental em João Pessoa, capital do estado da Paraíba.

MATERIAL E MÉTODO

Trata-se de um estudo de intervenção do tipo antes e depois, realizado com professores do ensino fundamental I e II e do programa Educação de Jovens e Adultos de uma escola municipal de Ensino Fundamental em João Pessoa, capital do estado da Paraíba.

Participaram os professores que estavam na função há no mínimo 6 meses, que não estavam de licença no período da coleta dos dados e realizaram voluntariamente as nove sessões de auriculoterapia. Foram excluídos da pesquisa os que faziam uso de outras terapias complementares, os que referiram litíase renal (o ponto auricular do rim pode estimular a eliminação de pedras renais) e os que pontuaram, na primeira entrevista, menos de 20 pontos na escala de avaliação da ansiedade de Hamilton14. Ao longo das sessões ocorreu a perda de 09 participantes por faltarem em duas ou mais sessões consecutivas, sendo considerados para fins de análise os dados de 11 docentes.

Fonte: dados da pesquisa, 2020

Figura 1:  Fluxograma da seleção dos sujeitos. João Pessoa, Paraíba. 2020. 

Foram aplicados cinco instrumentos para a coleta dos dados, sendo três deles questionários semiestruturados utilizados a fim de: caracterizar os participantes; identificar os sintomas característicos da ansiedade e estresse e as mudanças ocorridas na semana anterior às sessões, tanto as relacionadas à auriculoterapia (dor nos pontos auriculares e retirada dos mesmos), como também, as que poderiam influenciar nos escores obtidos através das escalas; e verificar a autopercepção dos professores no que diz respeito ao efeito da auriculoterapia nos sintomas relatados, sendo que para cada sintoma investigado foi atribuído os seguintes resultados da auriculoterapia: “sem efeito” caso não observasse nenhum efeito, “melhorou”, “piorou“ e ”não se aplica” caso não percebesse a existência do sintoma indagado. Os outros instrumentos foram as escalas de avaliação da ansiedade de Hamilton e a do estresse percebido- PSS-10.

A escala de avaliação da ansiedade de Hamilton é um instrumento de avaliação da ansiedade neurótica, considerada uma escala confiável de fácil aplicabilidade, adaptada para a realidade brasileira, bastante utilizada em pesquisas terapêuticas para ansiedade e depressão. Composta por 14 itens, sendo que os itens de 1 a 6 e 14 estão relacionados à ansiedade psíquica e os de 7 a 13, relacionados à ansiedade somática. Para cada item é designado um valor em likert que pode variar de zero a quatro a depender da intensidade que os sintomas aparecem no cotidiano do participante, a soma desses valores resulta em um escore total com valor entre zero e 5613,14.

A escala do estresse percebido-PSS foi desenvolvida em 1983 por Cohen, Kamarck e Mermelstein com a finalidade de identificar o grau em que as situações do cotidiano são avaliadas como estressantes pelos indivíduos. A PSS-10 é uma versão adaptada da PSS-14, caracterizada como sendo a mais recomendada, por possibilitar a utilização combinada com outros instrumentos e por apresentar indicadores satisfatórios. As respostas são em forma de likert que variam de zero (nunca) a quatro (sempre) pontos e se divide em itens considerados negativos e positivos15.

Com a autorização dos participantes, iniciou-se o primeiro momento da coleta de dados, preenchimento do questionário semiestruturado de caracterização dos sujeitos, do questionário semiestruturado utilizado de forma prévia a cada aplicação de auriculoterapia e a aplicação das escalas de Hamilton e PSS-10, nessa ordem. Durante a aplicação das duas escalas foi observado e anotado no diário de Campo da pesquisadora o comportamento dos participantes (pernas inquietas, verbalização de pensamentos, expressão facial e outros).

Finalizada a etapa de aplicação dos instrumentos de coleta dos dados foi realizada a aplicação das sementes de mostarda nos pontos auriculares previamente determinados pela pesquisadora com a finalidade de tratar os principais sinais e sintomas da ansiedade e do estresse elencados de acordo com a literatura (Shenmen, simpático, rim, coração, fígado, vesícula biliar, relaxamento muscular e ansiedade). A técnica de aplicação consistiu na higienização do pavilhão auricular com algodão embebido em álcool etílico a 70% e a aplicação das sementes com fita micropore nos pontos auriculares acima mencionados.

Ao final da sessão, os participantes foram orientados a estimular os pontos auriculares de três a quatro vezes ao dia, retirar o ponto auricular caso estivesse causando uma dor insuportável e praticar a autopercepção durante a semana, anotando no diário de campo do participante as queixas e mudanças no comportamento, sono e corpo.

Nas sessões subsequentes (2a, 3a, 4a, 5a, 6a, 7a, 8a e 9a) foi utilizado como instrumento de coleta de dados o questionário semiestruturado utilizado de forma prévia a cada sessão e diário de campo da pesquisadora respectivamente; na 4a e 9a sessões, também foi aplicada escala de ansiedade de Hamilton e a PSS-10, acrescentando o questionário que objetivava avaliar a auto percepção dos professores sobre o efeito da auriculoterapia nos sintomas da ansiedade e estresse na 9a sessão.

Os dados que caracterizam os sujeitos juntamente com os escores de ansiedade e estresse, obtidos através das escalas, foram dispostos em frequência absoluta e percentual e analisadas através da estatística descritiva e inferencial.

A fim de identificar a sessão na qual o efeito significativo da auriculoterapia se iniciou, foi utilizado o modelo de medidas repetidas não paramétricas. Para tanto, foi utilizado inicialmente, o teste Shapiro-Wilks multivariado para confirmar a normalidade multivariada. Em seguida, aplicou-se o teste de Mauchly (utilizado para avaliar a hipótese de esfericidade) e por fim o teste de Tukey para realizar as comparações múltiplas entre as sessões. Estes últimos resultados foram obtidos com o auxílio do software livre Past 4.0.

O modelo de medidas repetidas também foi utilizado para avaliar o efeito da auriculoterapia nos escores de ansiedade e estresse considerando o fator escola, as respostas obtidas ao longo do tempo correspondendo início (sessão zero), após quatro semanas (sessão quatro) e no final (sessão nove) foram processadas aplicando a library nparLD do software R, dessa forma, duas estatísticas foram calculadas, a de Wald e a ANOVA nível de significância ≤0,05 .

Para a obtenção do gráfico 3 analisou-se o questionário semiestruturado utilizado de forma prévia a cada aplicação de auriculoterapia a fim de identificar a sintomatologia característica do estresse e da ansiedade e o instrumento que avaliou a auto percepção dos professores sobre o efeito da auriculoterapia nesses sintomas, as respostas foram dispostas em frequência absoluta e representadas no gráfico 3 em ordem decrescente dos sintomas que apresentaram maior frequência de melhora com a auriculoterapia.

RESULTADOS

Ao aplicar pela primeira vez a escala de estresse percebido (PSS-10), classificaram-se 4 professores (36,3%) no nível baixo de estresse, 4 professores (36,3%) no nível normal, 1 professor (9,1%) no nível moderado e 2 professores (18,2%) no nível alto.

Na quarta sessão, quando foi aplicada a escala pela segunda vez, observou-se um aumento do quantitativo de participantes classificados em nível baixo de estresse, uma vez que foram acrescentados 2 professores que estavam no nível normal, contabilizando assim 6 professores (54,5%) no nível baixo e 2 (18,2%) no nível normal; os níveis moderado e alto continuaram com o percentual de 9,1% e 18,2% respectivamente, contudo um professor que estava com nível alto de estresse desceu para o nível moderado e o que estava classificado em nível moderado subiu para o nível alto.

Na última aplicação, nona sessão, contabilizaram-se 5 participantes (45,4%) no nível baixo de estresse, porque um participante passou para o nível normal, o qual foi representado por 4 professores (36,3%), tendo um professor também advindo do nível alto; os demais participantes, 2 professores (18,2%), foram classificados em nível moderado de estresse, no qual um deles era do nível alto. A Figura 2 demonstra o quantitativo de professores classificados em cada nível de estresse durante as aplicações da escala PSS-10.

Fonte: dados da pesquisa, 2020

Figura 2:  Quantitativo de professores classificados em cada nível de estresse durante as aplicações da escala PSS-10. João Pessoa, Paraíba. 2020 

Ao aplicar a escala de ansiedade de Hamilton pela primeira vez foi possível classificar 2 professores (18,2%) em ansiedade moderada e 9 (81,8%) em ansiedade intensa ou severa. Na segunda aplicação da escala, 3 professores (27,3%) que estavam classificados em ansiedade severa ou intensa contabilizaram escores compatíveis com ansiedade leve; 5 (45,4%) classificaram-se em ansiedade moderada e 3 (27,3%) permaneceram em ansiedade severa ou intensa.

O número de participantes classificados em ansiedade leve aumentou na terceira aplicação da escala de Hamilton totalizando 6 professores (54,5%), sendo 3 deles advindos da ansiedade moderada, dessa forma a ansiedade moderada passou a ser representada por 2 professores (18,2%) advindos do nível de ansiedade severa ou intensa, esse por sua vez foi representado por 3 participantes (27,3%), sendo que 2 (18,2%) deles eram do nível moderado. A Figura 3 permite compreender melhor essas reclassificações dos escores de ansiedade.

Fonte: dados da pesquisa, 2020

Figura 3:  Quantitativo de professores classificados em cada nível de ansiedade durante as aplicações da escala de Hamilton. João Pessoa, Paraíba. 2020. 

Não é possível evidenciar nível leve de ansiedade na primeira aplicação da escala de Hamilton, porque a pontuação menor que 20 foi utilizada como um critério de exclusão.

Comparando as Figuras 2 e 3 é possível observar que dos 8 professores (72,7%) classificados em nível baixo e normal de estresse, na primeira aplicação da PSS-10, 6 (75%) apresentaram nível de ansiedade severa ou intensa na primeira aplicação da escala de ansiedade de Hamilton, além disso há um rápido efeito da auriculoterapia nos níveis de ansiedade quando comparados aos de estresse, o qual pode ser confirmado através da duplicação do quantitativo de professores que saíram dos estágios de ansiedade moderada e grave para o de ansiedade leve. Esse fenômeno está demonstrado na Tabela 2 que compara os níveis médios de ansiedade e estresse entre as aplicações das escalas (primeira, quarta e nona sessões).

Tabela 2:  Comparação dos níveis médios de ansiedade e estresse entre as aplicações das escalas. João Pessoa, Paraíba, 2020. 

*Diferença ao nível de significância 5%

Fonte: dados da pesquisa, 2020.

Outra diferença é observada quando analisado o efeito da auriculoterapia na ansiedade e estresse considerando a quantidade de vínculos empregatícios, tal achado é representado nos gráficos 1 e 2.

Fonte: dados da pesquisa, 2020

Gráfico 1:  Efeito da auriculoterapia nos níveis de estresse avaliados na primeira, quarta e nona sessão considerando a quantidade de vínculos empregatícios. João Pessoa, Paraíba, 2020. 

Evidencia-se que o valor-p = 0,026 válido para as duas estatísticas (Wald e ANOVA), não apresentou diferenças para quem trabalha em uma escola, 5 participantes (45,4%), ou em duas escolas, 6 participantes (54,5%). De forma análoga ocorreu com os resultados do gráfico 2, ao utilizar os mesmos programas de análise, dessa vez para a ansiedade e fator escola, obteve-se resultado significativo (valor-P < 0,05), no qual a ansiedade se modifica ao longo do tempo de forma diferenciada para indivíduos que trabalham em uma única escola e os que trabalham em mais de uma, com maior efeito para esse último.

Fonte: dados da pesquisa, 2020

Gráfico 2:  Efeito da auriculoterapia nos níveis de ansiedade avaliados na primeira, quarta e nona sessão considerando a quantidade de vínculos empregatícios. João Pessoa, Paraíba, 2020. 

Os resultados referentes à auto percepção dos professores sobre o efeito da auriculoterapia nos sintomas que caracterizam a ansiedade e o estresse foram representados no gráfico 3.

Fonte: dados da pesquisa, 2020

Gráfico 3:  Ordem decrescente dos sintomas de estresse e ansiedade que apresentaram maior frequência de melhora ao ser utilizada a auriculoterapia. João Pessoa, Paraíba, 2020. 

DISCUSSÃO

Sobre a predominância do nível baixo de estresse em todas as aplicações da PSS-10, correlaciona-se com o suporte social obtido pelo professor no ambiente familiar e laboral16,17, no que diz respeito ao ambiente laboral, os participantes dessa pesquisa citaram o aluno como sendo o sujeito responsável pela satisfação, principalmente quando o mesmo reconhece o valor social da profissão, demonstra interesse em aprender e confia ao ponto de expor suas angustias.

Outra situação relacionada aos níveis de estresse foi a carga horária de trabalho, a mesma pode ser utilizada tanto para justificar a predominância do nível baixo de estresse na primeira aplicação da PSS-10, já que a maioria dos participantes classificados trabalhava em apenas um turno, como também a permanência de alguns professores em escores consideráveis ou a reclassificação em escores mais altos (moderado e grave). A carga horária excessiva de trabalho justificada pela baixa remuneração e pelo exercício da profissão que atualmente tem uma diversificação nas suas funções laborais, ultrapassando o processo ensino-aprendizagem e o ambiente de trabalho, resulta em consequências no aspecto físico, mental e social do individuo 18,19.

Contudo, a carga horária não é um fator determinante, mas sim contribuinte ao estresse, quando se considera também a organização laboral, que devido aos papeis pouco esclarecidos, relações de poder, responsabilidades além das atividades atreladas a formação, desencadeia ou potencializa os agravos de saúde mental6,20,21.

A existência de correlação entre os agravos aqui investigados foi questionada quando alguns participantes apresentaram no mesmo momento de aplicação das escalas escores compatíveis com o nível baixo de estresse e ansiedade severa ou intensa. Tendo conhecimento que indivíduos classificados em nível baixo de estresse podem apresentar sintomas relacionados a todas as fases do modelo quadrifásico do estresse16 e que o desencadeamento da ansiedade-traço está associado ao estresse do dia a dia22, acredita-se que a exposição frequente dos participantes aos agentes estressores, mesmo que com pouca intensidade, desencadeou no organismo um processo de resposta permanente.

De fato, nem todos os participantes que apresentaram nível de ansiedade severo na primeira aplicação da escala de Hamilton se queixaram, naquele momento, de uma situação estressante atípica (além do cotidiano), mas sim de alguns sintomas comum à ansiedade e ao estresse (sono alterado, dor muscular, irritabilidade e fadiga), indicando que o cortisol, hormônio produzido e liberado pelo córtex da glândula suprarrenal para estimular respostas ao agente estressor a fim de neutraliza-lo, manteve-se no organismo proporcionando desgaste e saturação, contribuindo para a presença da ansiedade, mesmo na ausência de uma situação estressora, classificando-a em ansiedade-traço, agravo caracterizado pela pouca estabilidade, percepção de um maior número de eventos como ameaçadores e resposta intensa a situações que realmente são ameaçadoras16)(23)(24)(25.

Frente a impossibilidade de eliminação dos fatores desencadeadores de estresse e ansiedade, há a necessidade de reduzir a quantidade de cortisol na corrente sanguínea, dessa forma, torna-se possível inserir a auriculoterapia no conjunto de atividades capaz de atuar no controle do estresse e da ansiedade, apresentando efeito significativo para a ansiedade entre primeira e quarta sessão de auriculoterapia, e para o estresse, entre a primeira e nona sessão, esse achado está relacionando com o fato de a ansiedade ser intrínseca a personalidade dos participantes, dessa forma, a redução significativa dos níveis de ansiedade, resulta na percepção menos intensa dos fatores estressores, fazendo com que o efeito também seja significativo para o estresse 11,26,27.

A correlação entre auriculoterapia e sobrecarga de trabalho/quantidade de vínculos empregatícios (principal fator desencadeador da ansiedade e estresse) representada de forma simétrica para o estresse e assimétrica para ansiedade, justifica-se pela exposição frequente aos fatores estressores laborais e pelo fato do desgaste ser maior quando se passa muito tempo no mesmo ambiente laboral28), dessa forma, entende-se que a exposição aos fatores estressores independe da quantidade de instituições e depende da quantidade de turno, porém, ao considerarmos a ansiedade como uma resposta a esses fatores, compreendemos que a mesma depende da quantidade de escolas que lecionam, sendo assim, quando o professor permanece por pouco tempo no mesmo ambiente de trabalho a resposta aos agentes estressores será menor e o efeito da auriculoterapia maior6,18) .

Da mesma forma que o indivíduo vivencia a ansiedade e o estresse de um modo singular, o efeito da auriculoterapia sobre os sintomas também é subjetivo. O sono em alguns participantes regularizou e em outros intensificou, tornando-se uma queixa, o mesmo aconteceu com o cansaço e outros sintomas, apesar disso, essa prática também é capaz de atuar no âmbito coletivo por meio do equilíbrio emocional, redução da irritabilidade e melhor relação com o trabalho29,30.

Vale destacar que poucos foram os participantes que correlacionaram esses sintomas com a ansiedade ou estresse, o que já era esperado, porque geralmente eles são considerados comuns no cotidiano da docência. Salienta-se que a ausência dessa auto percepção dos desencadeantes do estresse e ansiedade, bem como da sua sintomatologia, contribui para o surgimento ou intensificação de agravos físicos e mentais18)(29)(30.

Ao direcionar o olhar para além do que está exposto, identifica-se mais um beneficio proporcionado pela aplicação dessa PIC, o estimulo a auto percepção dos professores, o qual foi incentivado na primeira sessão quando foram orientados a atentarem às prováveis mudanças físicas e emocionais ou incômodo nos pontos auriculares estimulados, isso os possibilitou dedicar maior atenção às respostas do organismo aos agentes estressores, identificar o sintoma e/ou ponto auricular dolorido e o correlacionar com alguma situação vivenciada naquela semana, bem como, perceber a importância de ser o sujeito ativo no autocuidado.

No intuito de contribuir com o desenvolvimento de pesquisas futuras, torna-se válido citar as limitações desse estudo, como por exemplo, a realização de algumas sessões na presença de outros profissionais da escola, uma vez que a sala não poderia ser desocupada para ser utilizada exclusivamente pela pesquisadora; a necessidade de ter alguém da escola disponível para chamar o professor e ficar na sala de aula enquanto ele participava das sessões de auriculoterapia; o desabafo dos participantes, que não atendia ao tipo de abordagem da pesquisa e prolongava a duração das sessões; o tamanho da amostra e a utilização de um protocolo fechado e das sementes de mostarda.

Acredita-se que se houvesse a valorização profissional e a disponibilização de outras atividades de promoção da saúde mental, bem como, a aplicação da auriculoterapia estimulando pontos auriculares de acordo com as queixas dos participantes e utilizando agulhas semipermeáveis, as quais dispensam a necessidade do participante estimular de duas a três vezes por dia os pontos auriculares selecionados, a fase de coleta dos dados teria menor duração e o efeito da auriculoterapia seria mais significativo.

CONCLUSÕES

A análise do efeito da auriculoterapia nos escores e sintomas de ansiedade e estresse dos professores do ensino fundamental I e II e do EJA demonstrou que a auriculoterapia obteve êxito na redução dos escores de estresse e ansiedade, apresentando efeito estatisticamente significativo para a ansiedade entre a primeira e quarta sessão, sendo maior nos professores que trabalhavam em duas instituições de ensino, e para o estresse entre a primeira e nona sessão, não apresentando diferença significativa entre os que trabalhavam em uma ou duas instituições de ensino; além disso, contribuiu na melhora dos principais sintomas desses agravos de saúde mental, principalmente no que diz respeito ao sono, dor, irritabilidade, relação com o trabalho e equilíbrio emocional, atuando também na promoção da auto percepção, contudo, assim como os benzodiazepínicos o seu efeito também é temporário, diferentemente dos agentes estressores que estão presentes diariamente no ambiente laboral.

Sendo assim, evidencia-se a necessidade de implementar soluções que melhorem as condições de trabalho e reduzam sua sobrecarga, tais como, politicas públicas educacionais que assegurem salários dignos, bem como, estratégias individuais e coletivas de redução do estresse e da ansiedade e de promoção da saúde mental que repercutem na qualidade de vida; a implementação dessas soluções deve ocorrer através dos gestores das três esferas de governo, das instituições de ensino e da comunidade cientifica.

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Recebido: 01 de Outubro de 2020; Aceito: 13 de Janeiro de 2021

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