1. Introdução
Não há dúvidas: a Medicina evoluiu muito nas últimas décadas. No entanto, para além do conhecimento médico (biológico), um novo componente a ela se agregou: as diversas tecnologias1. A presença das tecnologias tem sido tão determinante nas novas conquistas do setor, que alguns autores chegam a afirmar que boa parte delas estão mais relacionadas à atuação das diferentes Engenharias no desenvolvimento de soluções médicas, do que contam com a presença de médicos2.
O presente estudo parte da premissa de que a confiança na relação médico-paciente, antes depositada fielmente no profissional, parece ter sido transferida para as tecnologias hoje utilizadas e sua eficiência. E isso tende a contribuir para aprofundar, muitas vezes, a assimetria comunicacional e o distanciamento tão indesejado nas relações de saúde. Como verdadeiro paradoxo, o uso de meios tecnológicos pode, por outro lado, auxiliar na aproximação entre médico e paciente, facilitando o diálogo e a confiança que devem preponderar.
Busca-se analisar, neste texto, a relação médico-paciente intermediada pela telemedicina e como a tecnologia assistiva pode (e deve) contribuir para que o atendimento seja satisfatório, respeitando-se todas as dimensões do paciente, a sua individualidade e sua autodeterminação.
Considera-se que delegar o destino do paciente à tecnologia, sem a devida atenção e respeito às suas limitações e características individuais, seria retroceder aos vetustos ideais paternalistas. E entende-se que a tecnologia assistiva pode emergir como recurso ao atingimento do esperado respeito às limitações próprias da idade, do corpo ou mesmo do intelecto e se apresentar como possível solução aos problemas derivados do uso de tecnologias de informação e comunicação.
Conclui-se que a integralidade dos serviços de saúde somente é atingida se igualdade e equidade forem observadas. E não há integralidade apenas com o uso puro e simples de novas tecnologias, entregas dos sistemas informatizados e implementação de sofisticados modelos telemáticos. Todos devem estar conectados à realidade social dos pacientes, à busca da equidade, sempre com olhar atento às complexidades próprias das relações interpessoais estabelecidas nos serviços de saúde.
Para a pesquisa aqui trazida, foi utilizada a metodologia exploratória, mediante levantamento de dados e informações doutrinárias sobre o objeto de estudo, seguindo-se a sistematização dos dados e informações sobre o tema em caráter triplo (coleta, organização e conservação de documentos), com o fim de estabelecer fontes seguras para a análise proposta.
2. A relação-médico paciente intermediada por tecnologias
Desde que a Medicina se estabeleceu como Ciência se reconhece a relação médico-paciente se firma a partir das mais diferentes interações e complexidades. Recentemente, um novo e desafiador elemento foi acrescentado: as tecnologias digitais da informação e comunicação (TDICS)3, cerne de tantas transformações sociais das últimas décadas4.
Se na era do paternalismo médico (séculos XVIII-XX) adorava-se a técnica, hoje a adoração dirige-se à tecnologia. Pacientes e profissionais de saúde unem-se em vozes uníssonas que proclamam os benefícios das mais diferentes tecnologias que acabam trazendo consigo a ideia de um poder capaz de resolver todos os males que afligem os doentes.
Nesse cenário, em que a confiança já não mais se deposita no profissional, mas nas tecnologias que ele adota, enfatizam-se as virtudes dos novos hardwares softwares, numa verdadeira retomada do comando paternalista que determina que o foco da ação esteja na doença e não no doente, o que acaba conduzindo a uma indesejada despersonalização da relação médico-paciente que agora cede espaço à eficiência dos dispositivos tecnológicos e aprofunda, muitas vezes, a assimetria comunicacional.
Mas nem tudo são trevas, há tecnologias que podem auxiliar na reaproximação do médico e do paciente. E é aqui que reside o verdadeiro paradoxo desse início do século XXI, tecnologias que poderiam afastar a pessoalidade da relação médico-paciente, podem, se bem empregadas, auxiliar na sua aproximação, (re)estabelecendo verdadeira relação de confiança e diálogo5.
Para que a interação comunicativa aconteça é necessário que médico e paciente tenham plena consciência de que a relação entre eles estabelecida, ainda que possa estar sendo intermediada por dispositivos tecnológicos, é antes de tudo uma relação humana tomada por diversas complexidades (inclusive as induzidas pela própria doença) e experiências6 - que não são facilmente compreendidas e apreendidas por algoritmos.
No entanto, quando a Medicina privilegia a técnica, ao invés da pessoa, o resultado pode ser desolador e, até mesmo, perturbador. Relações médicas sem cooperação, tendem ao fracasso, não só porque o doente se sentirá apenas mais 'um prontuário' cujos valores pessoais serão absolutamente ignorados, mas também porque o médico passa a ver aquele ser humano apenas como mais um objeto da sua intervenção. A Medicina volta a ser meramente instrumental, limitada ao orgânico que fragmenta o doente em especialidades cartesianas. As interações valorativas são substituídas por relações de dominação e de subordinação em nome de uma autoridade técnico-científica não mais imputada ao médico, mas a algoritmos.
Quando se empregam meios telemáticos para a prestação de serviços de saúde é preciso considerar que a forma e a qualidade da informação prestada pelo médico em razão da capacidade de compreensão do paciente e prestada pelo paciente ao profissional, precisa ser qualificada, em razão da distância física. Por isso, é importante promover além de graus mínimos de instrução de uso dos dispositivos, algum letramento em saúde7, ou seja, o sujeito além de ter habilidades mínimas de manuseio de tecnologias, precisa ser capaz de compreender informações de saúde, de ler as instruções que lhe forem encaminhadas, de entender as prescrições e tomar decisões adequadas.
A informação dada ao paciente ou a quem por ele é responsável deve ser clara, objetiva e compreensível, sendo importantíssimo que o médico documente todo esse processo, não só para sua própria segurança, mas como garantia das opiniões dadas ao paciente e da adequada prestação dos serviços contratados.
A comunicação entre o médico e paciente precisa se concentrar na compreensão dos valores, desejos e preferências do paciente e a tomada de decisões - apoiadas pela tecnologia8. A tecnologia, portanto, é apenas mais um meio para a realização de práticas médicas, não se confundindo com o conteúdo da relação ou com a própria opinião médica. A questão que aqui se coloca é que estes novos meios de comunicação e de práticas médicas podem ser hostis e intimidadores para algumas pessoas. Daí porque a comunicação precisa ser ajustada, seja em design, seja em cuidado e proteção.
A relação médico-paciente, ainda que intermediada por diferentes tecnologias, precisa ser dialogada. Dialogar exige necessariamente que se compreenda o receptor da mensagem, para que a linguagem a ele possa ser adaptada. A ênfase deve ser dada no paciente e não na doença ou no problema clínico, uma vez que o atendimento deve levar em consideração todas as dimensões da pessoa, respeitando-se a sua individualidade e autodeterminação9. A interação comunicativa, ainda que intermediada pela telemedicina, deve permitir a aproximação, o conhecimento e o respeito ao outro, uma que se realiza nos escopos: informativo, terapêutico e decisório.
Por isso, o ato médico, quando intermediado por diferentes tecnologias, exige além da coleta de diversos dados pessoais e clínicos, um diálogo participativo que deve levar em consideração a especial vulnerabilidade do paciente (muitas vezes resultantes do meio utilizado para a consulta), identificando-o como um ser autônomo, capaz de tomar decisões e realizar escolhas10.
As condutas adotadas a partir de dispositivos tecnológicos devem ser sempre pautadas pela racionalidade e pelo respeito à pessoa, pela consciência quantos aos riscos e assunção de responsabilidade quanto às consequências. Não se pode simplesmente delegar o destino do paciente à tecnologia, porque isso caracterizaria um retrocesso com claro retorno aos ideais paternalistas.
3. Telemedicina e o uso de tecnologia assistiva como garantia de acesso e inclusão
A Telemática11 em Saúde caracteriza-se pela utilização de meios de telecomunicação e informática para a prática de atividades sanitárias que tenham por objetivo promover, prevenir ou recuperar a saúde individual e coletiva.
Didaticamente, pode-se dividir as finalidades da Telemática em Saúde em dois grandes grupos (espécies) que reúnem uma multiplicidade de técnicas de Medicina à distância que variam conforme o seu objetivo. Adotando-se essa orientação didática tem-se, então, dois grandes grupos: a Telessaúde que engloba todas as ações voltadas para a prevenção de doenças (Medicina Preventiva), educação e coleta de dados e, portanto, direcionadas a uma coletividade, a políticas de saúde pública e disseminação do conhecimento. E o segundo grupo que é denominado Telemedicina e abarca toda a prática médica à distância voltada para o tratamento e diagnóstico de pacientes individualizados (identificados ou identificáveis) 12.
Assim, são exemplos de Telessaúde: a teledidática; a telefonia social; as comunidades; bibliotecas virtuais e videoconferências; os aplicativos didáticos para smartphones. Já os procedimentos mais utilizados pelas redes de Telemedicina (Resolução n. 2.314/22, CFM) são: teleconsulta ou consulta em conexão direta; teleatendimento; teletriagem; telepatologia; telerradiologia (Resolução n. 2.107/2014, CFM); telemonitoramento ou televigilância (homecare); telediagnóstico; telecirurgia (Resolução n. 2.311/2022, CFM); teleterapia; sistemas de apoio à decisão; aplicativos de atendimento para smartphones13.
Diante de tantas possibilidades de uso, muito se afirma que o futuro da Medicina está nas novas14 tecnologias e talvez a assertiva se confirme em médio prazo. Mas de nada adianta pensar em aparatos tecnológicos caros, extravagantes, fantásticos, se antes não se analisar o contexto em que estão sendo inseridos e mais, as pessoas que irão utilizá-los.
A telemática em saúde é uma promessa de melhoria de acesso a sistemas de saúde e de garantia de qualidade dos serviços em que se aplicam. Mas não basta aderir ou incorporar as diversas modalidades de telemedicina ou de telessaúde15. Há um passo anterior: definir qual é o objetivo a ser alcançado com o emprego de determinada tecnologia e compreender quem será o usuário (profissional de saúde e paciente). Essas precauções são necessárias para garantia da eficácia e eficiência dos dispositivos tecnológicos.
Assim, por exemplo, se o médico é um Geriatra, ao aderir à teleconsulta ele deve compreender que seu paciente às vezes sequer é um imigrante digital, mas é sim um quase-analfabeto digital que mal conhece o básico da operação com smartphones. A dificuldade de comunicação terá início já no acesso ao software utilizado para realização da teleconsulta. E mais, ainda que o idoso consiga utilizar com presteza o software, o médico precisará se certificar de que o idoso consegue acessar e ler eventual receituário e que conseguiu bem ouvir as explicações.
A preocupação também se dá no atendimento direcionado a pessoas com deficiência física e/ou intelectual. Essas pessoas conseguem fazer operações em sistemas telemáticos disponíveis? Os equipamentos e programas estão devidamente adaptados às suas necessidades?
Outro bom exemplo é do uso de teleconsulta para atendimento de pacientes de baixa renda. A dificuldade começará no acesso ao hardware e uma rede de Internet que permita uma boa troca de dados. De nada adianta o sistema público de saúde adotar, por exemplo, aplicativos para agendamento de consultas e de teletriagem se o público-alvo do serviço não tem sequer o acesso aos dispositivos para utilização das ferramentas16.
Desses breves exemplos fica evidente a necessidade de se pensar que o simples emprego de tecnologias de saúde, sem análise prévia do usuário, pode agravar a situação de vulnerabilidade de alguns grupos, já que o acesso ao sistema de saúde, em algumas situações, dependerá do auxílio de terceiro para o uso das tecnologias ofertadas.
É preciso ainda considerar que a telemedicina (desde o procedimento tecnológico mais simples ao mais complexo) coloca o usuário como corresponsável pela operação e, por isso, precisa ele estar apto a usar os equipamentos para fazer a transmissão de dados e imagem. Daí se pensar como interessante e até mesmo obrigatória adoção de tecnologia assistiva associada às diferentes práticas de telemedicina, não só porque no Brasil as realidades sociais são diversas, mas também porque muitas vezes, não somente a deficiência, mas a própria ausência de educação digital irá dificultar ou até mesmo inviabilizar o uso do serviço.
Partindo da definição trazida pela American with Disabilities Act (ADA), Cook e Hussey utilizam a expressão tecnologia assistiva como "uma ampla gama de equipamentos, serviços, estratégias e práticas concebidas e aplicadas para minorar os problemas funcionais encontrados pelos indivíduos com deficiência"17.
No Brasil, o conceito migrou da doutrina para a legislação, fruto de um debate iniciado em 2006, por ocasião do surgimento do então denominado Comitê de Ajudas Técnicas (CAT), grupo de especialistas da área, oriundos da sociedade, somados a representantes do Poder Público, provenientes de órgãos governamentais. O referido grupo foi instituído mediante Portaria da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República (SEDH/PR)18, tendo como principal intuito propor políticas públicas na área de tecnologia assistiva. Daí a necessidade de construir um conceito para a expressão que pudesse subsidiar as propostas, o que desencadeou vasta e profunda revisão do tema no referencial teórico internacional.
Assim, como fruto dos trabalhos desenvolvidos, o conceito de tecnologia assistiva foi delimitado por meio da Ata VII do Comitê, de 14 de dezembro de 2007, nos seguintes termos: "uma área do conhecimento, de característica interdisciplinar, que engloba produtos, recursos, metodologias, estratégias, práticas e serviços que objetivam promover a funcionalidade, relacionada à atividade e participação, de pessoas com deficiência, incapacidades ou mobilidade reduzida, visando sua autonomia, independência, qualidade de vida e inclusão social".
O Comitê propôs, também, o uso da expressão como sinônimo de "ajudas técnicas" (terminologia que vinha sendo largamente utilizada, inclusive pela legislação) mas que Tecnologia Assistiva fosse empregada no singular, porquanto define uma área do conhecimento e não uma coletânea determinada de produtos, a qual seria denominada como Recursos da Tecnologia Assistiva, também prevendo a adoção da locução Serviços e Procedimentos de Tecnologia Assistiva para referir tais elementos19.
Naquele mesmo ano o Brasil já havia assinado a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência20 de, posteriormente ratificada pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo n. 186, de 9 de julho de 200821, e que entrou em vigor no plano jurídico interno por meio do Decreto Executivo n. 6.949, de 25 de agosto de 200922.
Na referida Convenção, é possível encontrar a temática da Tecnologia Assistiva em vários dispositivos. Como obrigações gerais dos países signatários da Convenção, as alíneas 'g' e 'h' do item 1 do art. 4º determinam o dever de "realizar ou promover a pesquisa e o desenvolvimento, bem como a disponibilidade e o emprego de novas tecnologias, inclusive as tecnologias da informação e comunicação, ajudas técnicas para locomoção, dispositivos e tecnologias assistivas, adequados a pessoas com deficiência, dando prioridade a tecnologias de custo acessível" bem como "propiciar informação acessível para as pessoas com deficiência a respeito de ajudas técnicas para locomoção, dispositivos e tecnologias assistivas, incluindo novas tecnologias bem como outras formas de assistência, serviços de apoio e instalações". E no art. 32, que trata da Cooperação Internacional, vem prevista a adoção, dentre outras medidas, de "propiciar, de maneira apropriada, assistência técnica e financeira, inclusive mediante facilitação do acesso a tecnologias assistivas e acessíveis e seu compartilhamento, bem como por meio de transferência de tecnologias."
Nenhum dos dispositivos convencionais define a expressão tecnologia assistiva e ela não consta do art. 2º, que trata das definições.
A elucidação da expressão, no campo normativo, somente adveio por meio do art. 3º, III da Lei nº 13.146, de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), que definiu tecnologia assistiva (usando-a, inclusive, como sinônima de ajuda técnica) como "produtos, equipamentos, dispositivos, recursos, metodologias, estratégias, práticas e serviços que objetivem promover a funcionalidade, relacionada à atividade e à participação da pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida, visando à sua autonomia, independência, qualidade de vida e inclusão social"23.
Tomada no seu sentido mais abrangente, a tecnologia assistiva deve ser entendida como um auxílio que promoverá a ampliação de uma habilidade funcional deficitária ou possibilitará a realização da função desejada e que se encontra impedida por circunstâncias como uma deficiência ou envelhecimento24.
No que se referem às NTIC [novas tecnologias de informação e comunicação], estas podem ser utilizadas como ou por meio de TA. São utilizadas como TA, quando a ajuda técnica para se alcançar determinado objetivo é provida pelo uso do computador, a citar, o uso do computador como caderno eletrônico para o indivíduo que não consegue escrever no caderno de papel. Porém, utilizam-se as NTIC por meio da TA, quando se almeja utilizar o próprio computador, necessitando dessa forma de algumas ajudas técnicas especificas que permitam ou facilitem tal tarefa. Por exemplo, adaptações de teclado, de mouse, software especiais. Neste sentido, no ambiente computacional a TA pode ser utilizada com a finalidade de permitir a interação humano-computador por pessoas com diferentes graus de comprometimento motor, sensorial e ou de linguagem (UNESCO, 2007).
Para Bersch "o objetivo maior da TA é proporcionar à pessoa com deficiência maior independência, qualidade de vida e inclusão social, através da ampliação de sua comunicação, mobilidade, controle de seu ambiente, habilidades de seu aprendizado e trabalho"25. A tecnologia assistiva surge com esta característica, de respeitar as limitações próprias da idade, do corpo, do intelecto e oferecer uma possível solução aos problemas para interagir com as novas tecnologias de informação e comunicação.
A discussão, portanto, passa a ser não apenas o acesso à tecnologia em si e o treinamento para seu uso, mas assegurar-se o pleno exercício da autonomia do paciente nestes novos ambientes informacionais de prestação de serviços de saúde.
Está-se aqui a afirmar o princípio da equidade, mas com a visão que o aproxima do princípio da justiça que exige que além das escolhas institucionais (especialmente para as políticas públicas), também se considere o papel dos indivíduos e sua capacidade de buscar os seus objetivos de vida. Trata-se de se ter na desigualdade de oportunidade e na iniquidade o ponto central de preocupações dos sistemas de saúde. A adoção da telemedicina como prática clínica deve ter por pressuposto a análise de condicionantes e determinantes de saúde que irão impactar diretamente no uso que se fará dessas modalidades telemáticas.
O multifacetado conceito de equidade na saúde permite afirmar que,
A equidade em saúde, então, deve ter o enfoque em como a saúde se relaciona com outras características por meio da distribuição de recursos e acordos sociais. Como conceito multidimensional, a equidade em saúde inclui: aspectos que dizem respeito a alcançar uma boa saúde (e não apenas com a distribuição da atenção sanitária); promover a justiça nos processos prestando atenção na ausência da discriminação da prestação da assistência; sanitária; integração entre as considerações sobre a saúde e os temas mais amplos da justiça social e da equidade global26.
E é dessa compreensão que surge a necessidade de se pensar como a tecnologia assistiva deve ser incorporada em práticas telemáticas. Não basta pensar em distribuição de cuidados de saúde, é preciso avaliar a justiça de processos e incorporar à pauta diferenças e diversidades próprias de um país de dimensões continentais como o Brasil.
4. Considerações finais
A telemedicina é uma promessa que tem por objetivo dar conta de diversas iniquidades na saúde, reduzindo ou até acabando com os problemas de acesso (tanto o acesso geral quanto o acesso a especialidades); promovendo o desenvolvimento de pesquisas e tratamentos para pessoas com doenças raras; aproximando profissionais de grandes centros aos profissionais de saúde e pacientes de áreas remotas ou isoladas; levando à Medicina a locais onde hoje ela ainda não consegue chegar.
Mas para alcançar suas anunciadas promessas, a telemedicina deve antes se preocupar em resolver nós que dificultam o acesso aos próprios serviços telemáticos e de saúde. Só assim, pode-se afirmar sua verdadeira vocação: ser instrumento de promoção de justiça social direcionado à promoção, prevenção e recuperação da saúde.
Se igualdade e equidade devem fundir-se para a promoção da integralidade dos serviços de saúde é certo que a esta não se realiza apenas na adoção de novas tecnologias e nas entregas dos sistemas. A integralidade se revela na garantia de que essas entregas são efetivas e eficazes para os fins estabelecidos com a implementação de modelos telemáticos em saúde intimamente conectados à realidade social em que serão inseridos.
Não há fórmulas prontas para as decisões que devem ser tomadas por sistemas de saúde. Mas alguns dos principais desafios já são conhecidos e não podem ser simplesmente ignorados em nome de uma utópica promessa de que a tecnologia tudo resolverá. As escolhas para a implementação da telemática em saúde devem levar em consideração as complexidades próprias das relações interpessoais que se estabelecem nos serviços de saúde.
A telemedicina não pode conduzir a agravos de saúde ou aprofundar iniquidades. Nesse cenário, no seu sentido mais amplo, a tecnologia assistiva revela-se como mecanismo de equidade, apto a garantir o acesso e a prestação de serviços de saúde eficientes e eficazes. A educação digital é um importante instrumento para a inserção social e o alcance do objetivo máximo da telemedicina: a promoção da saúde em suas diversas dimensões.