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Index de Enfermería

versão On-line ISSN 1699-5988versão impressa ISSN 1132-1296

Index Enferm vol.31 no.2 Granada Abr./Jun. 2022  Epub 21-Nov-2022

 

Originais

Coordenação do cuidado: uma análise na perspectiva do enfermeiro da atenção básica

Gabriela Marcellino de Melo Lanzoni (orcid: 0000-0001-5935-8849)1  , Ianka Cristina Celuppi (orcid: 0000-0002-2518-6644)1  , Fernanda Karla Metelski (orcid: 0000-0001-7833-0438)1  2  , Carine Vendruscolo (orcid: 0000-0002-5163-4789)2  , Veridiana Tavares Costa (orcid: 0000-0001-5168-4383)1  , Betina Hörner Schlindwein Meirelles (orcid: 0000-0003-1940-1608)1 

1Departamento de Enfermagem, Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal de Santa Catarina, Campus Universitário - Trindade. Florianópolis, SC, Brasil

2Departamento de Enfermagem, Centro de Educação Superior do Oeste, Universidade do Estado de Santa Catarina, Campus Universitário - Centro. Chapecó, SC, Brasil

Resumo

Objetivo:

analisar a coordenação do cuidado nos serviços de Atenção Primária à Saúde da rede de atenção à saúde na perspectiva dos enfermeiros das equipes de Saúde da Família.

Metodologia:

estudo transversal, desenvolvido em 97 municípios do estado de Santa Catarina, Brasil. Um questionário do tipo survey foi aplicado aos enfermeiros entre maio e agosto de 2019. Os dados foram analisados por meio de cálculos paramétricos e quantificação de frequência absoluta e relativa.

Principais resultados:

os fluxos definidos para o encaminhamento dos usuários aos serviços foram relacionados ao uso de manuais (p = 0,041), protocolos operacionais padrão (p = 0,001) e Telessaúde (p = 0,036), como suporte à tomada de decisão. Destacou-se o uso de tecnologias de gestão, como mapas de território e sistemas de informação.

Conclusão principal:

para a coordenação do cuidado quanto ao fluxo definido, os enfermeiros utilizam manuais, protocolos de ação padronizados e Telessaúde para tomada de decisão. O cuidado compartilhado e os projetos terapêuticos singulares também são práticas adotadas pelos enfermeiros. É preciso avançar no uso efetivo dos registros na história clínica e no conhecimento do perfil dos usuários, como também nos motivos de procura pelo serviço de saúde.

Palavras-chave: Atenção Primária à Saúde; Enfermagem; Atenção à Saúde; Gestão da Saúde da População

Introdução

A Atenção Primária à Saúde (APS) no Brasil, norteada pela Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), é considerada a principal porta de entrada das pessoas ao Sistema Único de Saúde (SUS) e o centro de comunicação da Rede de Atenção à Saúde (RAS), bem como coordenadora e organizadora do cuidado.1 Para que a APS seja efetiva no Brasil, a Estratégia Saúde da Família (ESF) busca reorganizar os serviços a partir de elementos estruturantes: acesso no primeiro contato, integralidade, longitudinalidade, coordenação, orientação familiar e comunitária e competência cultural.1-3 A coordenação de atenção consiste na capacidade do prestador de APS de garantir a continuidade do cuidado na rede de serviços, por meio de ações articuladas que favoreçam sua efetividade.

Na literatura existem diferentes definições de coordenação do cuidado. Envolvem elementos que integram os serviços com os profissionais de saúde, utilizando mecanismos e instrumentos específicos para planejar a assistência à população; definição de fluxos de comunicação e encaminhamentos; troca de informações e orientações sobre e com os usuários; e acompanhamento dos planos terapêuticos e necessidades de saúde do território. Esses elementos facilitam a prestação de cuidados contínuos no local e hora certos.4-6

Para colaborar com essa organização, o processo de trabalho da enfermagem aponta para uma perspectiva de atuação em três dimensões: cuidado, ensino/pesquisa e gestão.7 Dentre as funções específicas do enfermeiro na APS/ESF, na área de coordenação assistencial, o destacam-se a consulta de enfermagem e o encaminhamento dos usuários para outros serviços, observado o disposto na Lei do Exercício Profissional de Enfermagem.1

No cenário brasileiro, há a necessidade de implementação de estratégias que fortaleçam a coordenação do cuidado na RAS, devido ao seu potencial de impactar positivamente na resolutividade do cuidado.3 Dentre essas estratégias, podemos citar a Planificação da Atenção à Saúde (PAS), proposta que vem desenvolvido pelo Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS) desde 2007. Trata-se de um instrumento de gestão e organização da APS e da Atenção Ambulatorial Especializada (AAE) que adota uma metodologia voltada à organização dos serviços nas RAS,8 permitindo o estabelecimento de fluxos com outros pontos da rede, comunicação direta entre as equipes, prontuário eletrônico, protocolos de referência e outros serviços de apoio à clínica, como a telemedicina.3

Nesse sentido, estudos apontam desafios para a consolidação da coordenação do cuidado: fragmentação da rede de atenção, má comunicação entre os diferentes pontos ou descontinuidade dos processos de comunicação, disponibilidade limitada de atendimento especializado, falta de integração do prontuário eletrônico, participação incipiente dos usuários no processo de coordenação do cuidado e a falta de mecanismos de referência e contrarreferência na rede de atenção.4,9-11

O profissional enfermeiro tem papel decisivo na identificação das necessidades de cuidado, principalmente na coordenação do cuidado. É necessário que esses profissionais reconheçam os elementos que constituem a coordenação do cuidado para garantir a integralidade do cuidado e a funcionalidade da RAS.12-13

Considerando o contexto supracitado e a necessidade de consolidação de ações de saúde que desenvolvam a integralidade do cuidado centrado na pessoa, questiona-se: Como os enfermeiros caracterizam a coordenação do cuidado em APS na RAS? Portanto, o objetivo deste estudo foi analisar a coordenação do cuidado nos serviços de Atenção Primária à Saúde da rede de atenção à saúde na perspectiva dos enfermeiros das equipes de Saúde da Família.

Método

Trata-se de um estudo multicêntrico, transversal, desenvolvido em duas Macrorregiões de Saúde do Estado de Santa Catarina, a saber: 1) Macrorregião Grande Oeste, composta pelas Regiões de Saúde Extremo Oeste, Oeste e Xanxerê; e 2) Macrorregião Centro-Oeste, que inclui as Regiões de Saúde Alto Uruguai Catarinense, Centro-Oeste e Alto Vale do Rio do Peixe. No total, participaram do estudo 97 (74,04%) municípios dos 131 municípios que compõem as duas Macrorregiões.

Os participantes do estudo foram enfermeiros atuantes em equipes de saúde da família (eSF). Para isso, foi realizado um cálculo amostral considerando os enfermeiros que compunham as 440 eSF das Macrorregiões em abril de 2019, 14 com proporção de 50%, margem de erro de 5% e intervalo de confiança de 95%. Foram estimados 205 participantes.

Para participar do estudo, os enfermeiros deveriam atuar na eSF há um ano ou mais, período considerado importante para a apropriação do processo de trabalho, sendo este o critério de inclusão. Foram excluídos aqueles que estavam afastados ou afastados do serviço por qualquer motivo durante o período de coleta de dados. A amostra final foi composta por 216 participantes.

Para a coleta de dados, foi utilizado um questionário do tipo survey, estruturado por meio da ferramenta Google Forms®, com variáveis que incluíam o perfil sociodemográfico, o processo de trabalho e as práticas desenvolvidas pelos enfermeiros na APS. O questionário foi enviado por e-mail a todos os enfermeiros da amostra, em conjunto com a Associação Brasileira de Enfermagem - Seção Santa Catarina (ABEn/SC) e as Gerências Regionais de Saúde. A coleta de dados foi realizada entre os meses de maio e agosto de 2019.

O termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) foi anexado ao conteúdo do e-mail. O acesso e a resposta ao inquérito formalizaram o seu consentimento em participar. Para convidá-los diretamente a participar da pesquisa, os enfermeiros foram contatados por telefone, momento em que também foi utilizado o aplicativo de mensagens WhatsApp® para envio do link que dava acesso ao TCLE e ao questionário, de acordo com a preferência de cada participante.

Para análise dos dados, foi utilizado o software Statistical Package for Social Sciences® 21.0. Para as variáveis quantitativas, foram utilizados cálculos paramétricos e, para as qualitativas, quantificação de frequência absoluta e relativa. Para a análise da associação das variáveis, foi utilizado o teste Qui-quadrado ou teste exato de Fisher.

Este estudo faz parte do macroprojeto de pesquisa intitulado “Cuidado e gestão de enfermagem como saberes no campo da atenção básica: propostas de boas práticas”. A pesquisa respeitou os aspectos éticos recomendados pela Resolução nº. 466/12 e 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade do Estado de Santa Catarina, sob parecer nº. 2.380.748, em novembro de 2017.

Resultados

A média de idade dos enfermeiros que participaram do estudo foi de 36 anos, com predomínio de 94% (n=203) do sexo feminino em relação ao masculino (n=13; 6%). Em relação à escolaridade, 80,6% (n=174) dos participantes concluíram curso de especialização, 0,5% (n=1) concluíram residência e 5,6% (n=12) concluíram mestrado.

O tempo de trabalho dos enfermeiros nas eSF teve mediana de 8,5 anos (intervalo interquartil: 4; 13), enquanto o tempo mediano de trabalho na equipe a que estavam vinculados no momento da coleta de dados foi reduzido para 4,5 anos (interquartil intervalo: 2, 9).

Além dos dados que caracterizam o perfil dos enfermeiros entrevistados, foram coletados outros dados sobre a coordenação do cuidado na APS. No que se refere ao planejamento do cuidado, quanto ao conhecimento que possuíam sobre o perfil dos usuários atendidos em sua área de abrangência, pouco mais da metade (n=120; 55,6%) afirmou conhecer totalmente. Em relação ao território, 69,4% (n=150) dos participantes afirmaram possuir mapa do território na Unidade Básica de Saúde (UBS), com delimitação de áreas de risco, 27,3% (n=59) possuíam mapa sem delimitação de áreas de risco e 3,2% (n=7) não possuíam mapa. Os sistemas de informação são utilizados pela maioria dos enfermeiros (n=117; 54,2%) para planejar e avaliar conjuntamente as ações desenvolvidas pela equipe multiprofissional, seguido por 41,7% (n=90) que afirmaram utilizar apenas em alguns casos específicos e 4,2% (n = 9) que relataram não utilizar.

Quanto à definição de fluxos para encaminhamento de pessoas para outros pontos da rede de atenção, 88,4% (n=191) dos enfermeiros responderam afirmativamente, 80,6% (n=174) afirmaram receber informações sobre pessoas que vieram de outros pontos, enquanto 94,4% (n=204) afirmaram que prestam informações a outros pontos da rede de atenção à saúde.

A troca de informações com os usuários sobre as orientações a respeito da continuidade do cuidado é realizada pelos enfermeiros das eSF, 76,4% (n=165) afirmaram que sempre orientam os usuários, enquanto 23,6% (n=51) os orientam quando necessário.

Em relação ao acompanhamento dos planos terapêuticos, foram considerados os dados sobre o cuidado compartilhado, onde 92,1% (n=199) dos enfermeiros afirmaram que o realizavam em conjunto com outros profissionais da eSF ou Nasf-AB, e nos Projetos Terapêuticos Singulares (PTS), que são realizados por 64,9% (n=140) dos enfermeiros. Destes, 30,6% (n=66) o fazem em conjunto com outros profissionais e com usuários, e 34,3% (n=74) os desenvolvem com outros profissionais da equipe, sem a participação do usuário. Pouco mais de um terço dos entrevistados (n=76; 35,2%) afirma não realizar essa atividade em sua rotina de trabalho.

Os enfermeiros foram questionados sobre os motivos pelos quais os usuários procuraram a UBS em busca de atendimento, as condições crônicas foram a principal causa (n=127; 58,8%), seguidas das situações agudas (n=82; 38,0%), e em menor percentual foram as consultas agendadas (n=9; 4,2%), encaminhamento para outros serviços (n=7; 3,2%) e saúde mental (n=5; 2,3%).

A análise paramétrica das variáveis do estudo mostrou que a existência de fluxo definido para encaminhamento dos usuários a outros pontos da rede de atenção esteve significativamente associada ao uso de manuais (p=0,041), POP (p=0,001) e Telessaúde (p= 0,036) como fonte de informação para tomada de decisão pelos enfermeiros. A Tabela 1 mostra as associações entre os fluxos de encaminhamento e os instrumentos de gestão e tomada de decisão que influenciam a continuidade do cuidado.

Tabela 1. Associações relativas entre a existência de fluxos definidos para a gestão de usuários na rede de atenção e o uso de fontes de informação para tomada de decisão, segundo enfermeiros das eSF pertencentes às microrregiões do Grande Oeste e Centro-Oeste de SC e o uso de fontes de informação para decisão fabricação, 2019. (n=216). 

Variáveis Existência de fluxos definidos para o encaminhamento de usuários na Rede de Atenção à Saúde p-valor

Sim Não
n (%) n (%)
Manuais 0,041*
Sim 131 (60,6) 12 (5,6)
Não 60 (27,8) 13 (6,0)
Telessaúde-SC 0,036*
Sim 111 (51,4) 9 (4,2)
Não 80 (30,7) 16 (7,4)
Procedimento Operacional Padrão 0,001*
Sim 133 (61,6) 9 (4,2)
Não 58 (26,9) 16 (7,4)

Discussão

O território, espaço geográfico de produção de saúde, com características variadas de aspectos sociais, políticos, demográficos, geográficos e epidemiológicos,15 é um conceito fundamental para a coordenação do cuidado às eSF e para a implementação da PNAB no Brasil. O processo de territorialização busca compreender como as ações sociais se organizam territorialmente, a fim de promover os vínculos e as relações de pertencimento entre a população e os profissionais que atuam nos serviços.16 A atribuição do território pode ser facilitada por meio do uso de algumas ferramentas, como a construção de mapas que delimitam as zonas de risco e vulnerabilidade, proporcionando a visualização das necessidades e, consequentemente, a programação das ações de saúde. Os resultados deste estudo confirmam que a maioria das equipes utiliza essa tecnologia em seu processo de trabalho.

Conhecer o perfil dos usuários atendidos pelos profissionais de saúde na APS é um elemento importante para a coordenação do cuidado. Nesse contexto, destaca-se o processo de comunicação, escuta, observação e interação entre o usuário e o profissional de saúde. Os dados desta pesquisa indicam que aproximadamente metade dos participantes não conhece esse perfil, o que pode fragilizar alguns elementos da coordenação do cuidado, como o planejamento do cuidado. Sabe-se que existem alguns entraves como falta de tempo, altas demandas e falta de compreensão da importância do trabalho em equipe, que levam à adoção de comportamentos de má resolutividade e prejudicam a relação entre o usuário e o profissional de saúde. É preciso repensar essa situação, pois para coordenar o cuidado é imprescindível conhecer as pessoas que pertencem ao território.6,15 O desconhecimento do perfil dos usuários indica que as decisões institucionais sobre o que merece atenção são baseadas em fatores biológicos, e sugere uma condição de subordinação do enfermeiro que só reconhece sua identidade profissional quando alinha seu trabalho a esses fatores.17

A utilização de sistemas de informação para planejar e avaliar conjuntamente as ações realizadas pela equipe de saúde também é uma estratégia de coordenação do cuidado na APS. As experiências da América Latina mostram que o uso de sistemas de informação pode favorecer o compartilhamento do cuidado nas RAS. O governo chileno avançou na padronização de um prontuário único, que é comunicado por meio de sistemas informatizados,4 porém ainda é necessário avançar na integração dos prontuários, permitindo o acesso a comportamentos, resultados de exames e diagnósticos realizados em outros serviços.9,18 O setor saúde faz uso intensivo da informação e é altamente influenciado por ela, pois a prática clínica gira em torno de dados, informação e conhecimento.19 No contexto estudado, a maioria dos enfermeiros utiliza esses sistemas apenas quando necessário ou não os utiliza, isso pode se refletir na organização do processo de trabalho e no enfraquecimento da coordenação do cuidado, ou ainda refletir a falta de estrutura dos serviços para implantação de sistemas informatizados.

O governo brasileiro está investindo no compartilhamento de dados clínicos como ferramenta para facilitar a continuidade do cuidado com a criação da Rede Nacional de Dados de Saúde (RNDS). É um repositório nacional que busca reunir dados clínicos enviados por serviços de saúde de diferentes níveis de complexidade, sejam eles públicos ou privados. No momento, a RNDS está em fase de implantação e está focada no recebimento de dados relacionados à vacinação e testes de Covid-19.20

A APS desempenha um papel fundamental na coordenação do cuidado, pois atua como porta de entrada preferencial para outros serviços da RAS. O processo de comunicação e compartilhamento do cuidado entre diferentes atores pode ser estruturado a partir da definição de fluxos e mecanismos de troca de informações, da mesma forma que é feito nas Macrorregiões estudadas. No Canadá, foi implantada uma intervenção para facilitar a coordenação do cuidado nas equipes de saúde, por meio do estabelecimento de protocolos e linhas de comunicação entre os serviços da rede de atenção.21

Observou-se a utilização de fluxogramas como ferramenta de direcionamento de pessoas na RAS, o que fortalece a comunicação e a troca de informações entre profissionais de saúde e usuários, fator determinante para a continuidade do cuidado, principalmente no que diz respeito às orientações assistenciais e encaminhamentos entre os serviços. A falta de orientação contribui para que os usuários se sintam frustrados e inseguros quanto à continuidade do seu cuidado.22 Estudos mostram que o enfermeiro tem papel fundamental na transição do cuidado entre os serviços de saúde, atuando no planejamento, reabilitação/reintegração social, educação em saúde e acompanhamento longitudinal. acompanhamento.23-24

O trabalho da enfermagem visa o cuidado, de forma holística, com abordagens centradas na pessoa e foco na promoção da saúde, cura de doenças e reabilitação. Na equipe multiprofissional, esse conhecimento se soma ao de outros profissionais para prestar um cuidado pautado nos valores do indivíduo, com objetivos, preferências e necessidades de cuidado específicas.25-26 Para isso, é fundamental o acompanhamento do PTS e o cuidado compartilhado. Apesar de os enfermeiros afirmarem que realizavam essas atividades, observou-se que, no que se refere ao PTS, pouco é compartilhado com a equipe e com os usuários, isso implica em um cuidado fragmentado, o que não coincide com as premissas do PTS , que propõe comportamentos articulados e discutidos pela equipe. Nesse sentido, haverá uma prática colaborativa desde que haja troca de experiências entre os diferentes profissionais de saúde, com os usuários, seus familiares e a comunidade, com vistas ao cuidado integral.26-27 Na mesma perspectiva, a proposta metodológica de Formação e Apoio Paidéia também opera, para a cogestão das redes de trabalho e saúde, como possibilidade democrática de compartilhamento de poder em espaços coletivos.28

Outro estudo que analisou a coordenação do cuidado na APS mostra que há especificidades quanto ao trabalho das categorias profissionais, onde o médico e o enfermeiro são responsáveis pelas articulações com os serviços fora da UBS, enquanto os Técnicos de Enfermagem e os Agentes Comunitários de Saúde participam da coordenação do cuidado dentro da unidade, o que auxilia na definição de condutas, fluxos e encaminhamentos, no cuidado compartilhado e nas reuniões de equipe.9

Compreender os motivos pelos quais os usuários procuram a UBS em busca de atendimento é essencial para promover a integralidade e a continuidade do cuidado. As condições crônicas predominam na APS, o que marca a necessidade de planejar ações educativas que afetem comportamentos e condições de saúde relacionadas aos fatores de risco, melhorando assim seu estilo de vida, cuidado com a saúde e autocuidado.29

Esse fato reforça a necessidade de fortalecimento da RAS tendo a APS como organizadora dessa rede. Um sistema fragmentado e preparado para atender a condições crônicas agudas e exacerbadas reflete a inconsistência existente entre a situação de saúde que se apresenta e a resposta dos sistemas de saúde. É preciso promover mudanças no sistema de saúde, com o fortalecimento da RAS e a construção de um modelo de atenção às condições crônicas e gestão baseada na população. A proposta da APS traz uma solução para esse problema como importante instrumento para a gestão da RAS.8 Além disso, existem redes de apoio que podem ser consideradas como elementos essenciais para a adesão, tratamento e bem-estar dos usuários com a mesma doença, uma vez que envolvem grupos sociais como grupos de usuários, nos quais se sentem acolhidos e favorecem o desenvolvimento de intervenções para melhorar a qualidade de vida.30

Este estudo apresenta aspectos inerentes a uma dada realidade, buscando contribuir para a identificação de questões que se destacam ou que podem levar à construção de um cuidado integral e contínuo, baseado na APS, apresentando fatores importantes para o fortalecimento da coordenação do cuidado. Apesar disso, admite-se que a abrangência territorial pode ser considerada uma limitação do estudo.

Conclusão

A análise da coordenação do cuidado nos serviços de APS na perspectiva dos enfermeiros que atuam nesses serviços de saúde permitiu inferir que medidas como o conhecimento do perfil dos usuários e a definição de fluxos na RAS são recursos importantes, articulados ao uso de gestão de tecnologia como mapas do território com delimitação de zonas de risco e vulnerabilidade, sistemas de informação para planejar e avaliar ações e acompanhamento do PTS. Estratégias como consultas compartilhadas também parecem favorecer o desempenho da equipe.

Conforme demonstrado em outras pesquisas realizadas no contexto latino-americano e em outros países que possuem sistemas públicos que atuam na APS, por meio de equipes multiprofissionais, é preciso atentar para os itens de pauta, demandas e até mesmo a falta de reconhecimento profissional quanto à importância do trabalho em equipe, o que pode resultar em comportamento pouco resolutivo e prejudicar o vínculo profissional-usuário-família.

É necessário avançar no uso efetivo dos prontuários, principalmente os eletrônicos, que permitem aos profissionais da rede acessar comportamentos e dados clínicos, para qualificar a coordenação do cuidado. Além disso, a inter-relação e alinhamento entre os motivos dos usuários irem à APS em busca de atenção e a utilização de instrumentos, estratégias e fontes de informação é essencial para contribuir na organização da continuidade e integralidade do cuidado.

O uso de tecnologias na atenção à saúde na APS, com a superação das limitações existentes nesse contexto, tem potencial de qualificação relevante que deve ser incentivado.

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Financiamiento

Bolsa de Doutorado do Programa UNIEDU/FUMDES Pós-graduação.

Bolsa de Doutorado Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPESPROEX).

Recebido: 22 de Setembro de 2021; Aceito: 14 de Novembro de 2021

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