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Enfermería Global

versão On-line ISSN 1695-6141

Enferm. glob.  no.15 Murcia Fev. 2009

 

ADMINISTRACIÓN-GESTIÓN-CALIDAD

 

Acidentes na infância: local de ocorrência e condutas dos familiares no âmbito domiciliar

Accidentes en la infancia: el lugar de ocurrencia y la conducta de los familiares en el ámbito domiciliario

 

 

*De Lima, R.P.; **Barbosa Ximenes, L.; ***Silva Joventino, E.; ****Vieira, L.J.E. de S.; **Oriá, M.O.B.

*Enfermera del Programa de Salud de la Familia de Itapipoca.
**Doctora en Enfermería. Profesora Adjunta del Departamento de Enfermería de la Universidad Federal del Ceará (UFC).
***Enfermera. Prestadora de servicios del Hospital General de Fortaleza (HGF).
****Doctora en Enfermería de la UFC. Profesora de la Universidad de Fortaleza (UNIFOR). Ceará. Brasil.

 

 


RESUMO

O objetivo deste estudo foi conhecer os principais locais de ocorrência de acidentes em crianças no interior do ambiente doméstico, verificar quem estava presente no domicílio no momento de sua ocorrência e investigar as condutas dos pais e/ou responsáveis de acordo com os tipos de acidentes. Estudo descritivo-exploratório realizado por meio de entrevista estruturada a 65 famílias de pré-escolares durante visita domiciliária. Não houve associação estatística significante entre tipo de acidente sofrido pela criança e local onde eles ocorreram (p= 0,259) e tipo de atendimento buscado pelos pais/responsáveis (p=0,424). Entretanto, verificou-se associação estatística significante (p=0,000) no que diz respeito às condutas dos pais/ responsáveis e tipos de acidentes ocorridos com as crianças. O conhecimento destas variáveis possibilita a realização de estratégias de educação em saúde no âmbito familiar, minimizando as conseqüências dos acidentes domésticos na infância.

Palavras-chave: Saúde da Criança; Acidentes Domésticos; Enfermagem.


RESUMEN

El objetivo fue conocer los escenarios de accidentes de niños en sus casas, comprobar quién estaba presente en el momento del accidente e investigar las conductas de los responsables de acuerdo a los tipos de accidentes. Estudio descriptivo exploratorio realizado con 65 familias de pre-escolares por medio de visitas, a través de entrevista estructurada. No hubo asociación estadísticamente significativa entre el tipo de accidente y el lugar donde ocurrió (p = 0,259) y entre las variables tipo de asistencia solicitada por los responsables y los tipos de accidentes (p = 0,424). Sin embargo, existe asociación estadísticamente significativa (p = 0,000) en relación con la conducta de los responsables y los accidentes que afectan a los niños. Son necesarias estrategias para la educación para la salud en este campo para reducir las consecuencias de accidentes domésticos.

Palabras Clave: Salud del Niño; Accidentes Domésticos; Enfermería.


 

Introdução

A família tem sido, ao longo dos anos, responsável por promover saúde e bem-estar aos seus integrantes, desempenhando atividades de proteção, segurança, cuidados específicos e generalizados, mas, em alguns momentos, tem se surpreendido com a ocorrência de acidentes domésticos que se dão sob sua responsabilidade, mostrando-se fragilizadas para esses enfrentamentos(1).

O ambiente doméstico deveria proporcionar vantagens para a saúde e o bem-estar da criança nos aspectos físicos, psicológicos, sociais e estéticos, no entanto ao acreditarem que conhecem muito bem o ambiente domiciliar, as pessoas negligenciam os cuidados mínimos de segurança como também, a adoção de um comportamento saudável(2). Além disso, famílias que já passaram pela experiência encaram os acidentes como um fato que faz parte do aprendizado da criança e, casos mais simples, como pequenas quedas, escoriações ou lesões, não chegam a despertar um comportamento preventivo no lar(1).

No Brasil, segundo a Sociedade Brasileira de Pediatria, as causas externas são responsáveis por 19,5% da mortalidade na faixa etária até a adolescência, sendo a principal causa de morte no grupo etário de 5 a 19 anos(3). Em relação ao Ceará, em 2004, as causas externas, que incluem os acidentes, foram responsáveis por 20 óbitos em crianças menores de 1 ano, 65 em crianças na faixa etária de 1 a 4 anos e 105 mortes em crianças com idades entre 5 e 9 anos(4).

O acidente é, geralmente, resultado de um conjunto de fatores que tornam mais ou menos previsível a sua ocorrência, não acontecendo, portanto, ao acaso(5). Assim, verifica-se que os acidentes têm contribuído significativamente para elevar a taxa de morbi-mortalidade infantil, pois, além de estarem intimamente relacionados com a própria fase da infância, estes também refletem, muitas vezes, a falta de capacidade protetora da família, e o desconhecimento dos inúmeros fatores de risco que permeiam o cotidiano da criança(2).

Os fatores sociais, como o desenvolvimento de aglomerados urbanos com condições desfavoráveis de subsistência, associados ao empobrecimento progressivo e ao elevado nível de desinformação da população brasileira, são importantes variáveis relacionadas com o aumento da freqüência de ocorrências de trauma infantil(6). No entanto, não se pode afirmar que tais fatores sejam determinantes para a ocorrência de agravos em crianças.

Em média, dois terços de todos os acidentes com crianças ocorrem dentro de casa e a maioria poderia ter sido evitada(7). É oportuno salientar que não é de surpreender que a maior parte dos acidentes ocorra no domicílio, haja vista o grande período que as crianças pequenas permanecem no mesmo ou em seus limites. Isso exige que os responsáveis pelas crianças tenham conhecimento dos riscos do ambiente, tomando medidas para evitá-los ou preveni-los, pois ao mesmo tempo em que o domicílio pode propiciar a ocorrência destes agravos, ele pode funcionar também como um meio facilitador para ações preventivas e educativas, neutralizando a existência de tal risco(8).

Por esse motivo faz-se necessária a implantação de atividades voltadas para a prevenção desses agravos e promoção da saúde das crianças, sendo indispensável, para tanto, o trabalho dos profissionais de saúde para o desenvolvimento de ações de educação em saúde, pois em um estudo sobre prevenção de acidentes, foi constatado que 64,23% dos responsáveis por crianças vítimas de acidentes não receberam nenhuma informação sobre prevenção de acidentes e dos 35,67% que receberam, apenas 1,53% o fizeram por meio dos serviços de saúde(9).

A prevenção dos acidentes na infância é obrigação do profissional da saúde que, por meio de ações educativas, deve orientar os familiares quanto aos riscos de acidentes domiciliares. O enfermeiro é um educador, um agente transformador, estando apto para realizar programas educacionais que envolvam pais e crianças no que diz respeito à prevenção de acidentes e às condutas a serem tomadas nesses casos(10).

Portanto, o presente estudo teve por objetivos conhecer os principais locais de ocorrência de acidentes em crianças no interior do ambiente doméstico, verificar quem estava presente no domicílio no momento da ocorrência das injúrias e investigar as condutas dos pais e/ou responsáveis pelas crianças de acordo com os tipos de acidentes.

 

Material e método

Tratou-se de um estudo descritivo-exploratório com abordagem quantitativa, por esta visar assegurar a objetividade e a credibilidade dos achados, envolvendo uma coleta sistemática de dados numéricos mediante condições de muito controle, além da análise dessas informações através da utilização de procedimentos estatísticos(11).

O cálculo da amostra foi realizado a partir da fórmula estatística para populações finitas, resultando em 65 famílias. A seleção deu-se de forma aleatória simples, tendo sido realizada após acesso às fichas das crianças que estavam matriculadas nas creches, adotando os seguintes critérios de inclusão: crianças na faixa etária de um a seis anos e que freqüentavam as creches. É oportuno ressaltar que tais critérios resultaram em uma amostra homogênea, tendo as famílias das crianças condições socioeconômicas e culturais semelhantes.

Os dados foram coletados no período compreendido entre dezembro/2004 e julho/2005, por meio de entrevista estruturada realizada com as famílias durante visita domiciliária, através de um formulário que abordava características sociodemográficas das famílias, local de ocorrência das injúrias, pessoa presente nesse momento e modo como os pais e/ou responsáveis trataram as crianças acometidas pelos acidentes.

Os dados foram tabulados em planilha eletrônica (EXCEL) e processados no Software Statistical Package for the Social Sciences, versão 13.0 (SPSS Inc., Chicago, USA). Para a análise de proporções em tabelas de contingências, empregou-se o teste de X2 ou de maximoverossimilhança (esse quando existiam freqüências observadas muito baixas)(11). Os resultados foram considerados estatisticamente significantes quando p < 0,05 para posteriormente serem discutidos de acordo com a literatura pertinente.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Complexo Hospitalar da Universidade Federal do Ceará (UFC), sendo seguidas as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos, de acordo com a Resolução No196/96, do Conselho Nacional de Saúde(12), sob protocolo no 101/04. Todos os participantes do estudo assinaram o termo de consentimento da pesquisa.

 

Resultados

Com relação às 65 famílias do estudo, pode-se verificar o predomínio da idade materna entre 18 e 35 anos (n= 58; 89,2%). A maioria das mães entrevistadas no estudo tinha ensino fundamental incompleto (n=40; 61,5%) e dedicava-se somente às atividades do lar (n=27; 41,5%).

Das 65 famílias participantes, 17 (26,15%) apresentaram renda familiar de 1 salário mínimo e 39 (60%) tinham renda entre 1 e 2 salários mínimos (salário mínimo no Brasil é r$ 450.00 o que equivale a aproximadamente €$ 187.50).

Das crianças presentes no âmbito familiar estudado, 108 encontravam-se na faixa etária compreendida entre 1 e 6 anos, verificando-se a ocorrência de 101 acidentes envolvendo 57 crianças, sendo na sua maioria com aquelas do sexo masculino (n=73; 72,28%). No que diz respeito ao número de pessoas na residência, este variou de 2 a 11 moradores, com uma média de 4,9 pessoas por domicílio.

Os dados relacionados aos tipos de acidentes com as crianças do estudo e o local de ocorrência dos mesmos, os dados obtidos encontram-se na Tabela I.

Verificou-se que não houve associação estatística significante entre o tipo de acidente e o local onde eles ocorreram (p= 0,259). Dentre os 101 (100%) acidentes domésticos referidos, identificou-se que 36 (35,65%) deles ocorreram na sala, tendo sido 14 quedas; 27 (26,73%) na cozinha, com 8 eventos de queimaduras e 18 (17,82%) no quarto, com dez ocorrências de queda.

Em 79,21% dos acidentes ocorridos no ambiente doméstico, a mãe da criança estava presente no momento da injúria e em outros 16,83% (n=17) tinham pelo menos um adulto em casa (familiar ou babá). Somente em 3 (2,57%) casos a criança estava sozinha em casa no momento acidente.

Com o intuito de investigar as condutas dos pais e/ou responsáveis com relação à ocorrência de cada um dos agravos que ocorreu com as crianças das famílias estudadas, elaborou-se as Tabelas II (quedas e cortes), III (queimaduras e choques), IV (intoxicação/envenenamento, sufocação e aspiração) e V (mordeduras e afogamentos).

Segundo a Tabela II, identificou-se que houve associação estatística significante (p= 0,000) entre as condutas dos pais/ responsáveis e os acidentes queda e corte. Dos 41 (77,36%) episódios de quedas, observou-se que em 18 (43,9%) os pais/ responsáveis lavaram o local atingido, massagearam e aplicaram gelo, e em 8 (19,51%) deles, a medida adotada foi levar a criança ao posto de saúde/ hospital. Quanto aos cortes, observou-se em 4 (33,33%) destes a conduta foi lavar o local e aplicar pomada, bem como a conduta de lavar o local atingido apenas com água ocorreu em 4 (33,33%) injúrias. Destaca-se ainda a conduta adotada em quedas e cortes, a aplicação de açúcar, café ou sal no local atingido.

Na Tabela III, observa-se que houve associação estatística significante (p=0,000) entre as condutas dos pais/ responsáveis e os acidentes dos tipos queimaduras e choques. Quanto às condutas diante das 14 (56%) queimaduras que vitimaram as crianças do estudo, constatou-se que as mais adotadas pelas mães/ responsáveis foram: lavar o local atingido e aplicar pomada, em 5 (35,71%) delas, e passar manteiga/ margarina no local atingido, em 4 (28,57%). Em relação aos 11 (44%) casos de choque elétrico, a maior parte dos pais/ responsáveis procurou acalmar a criança, oferecendo água com açúcar, em 4 (36,37%) ocorrências.

Conforme a Tabela IV, observa-se que houve associação estatística significante (p=0,000) entre as condutas dos pais/ responsáveis e os tipos de acidentes (intoxicação/ envenenamento, sufocação e aspiração). Dentre as 10 (58,83%) ocorrências de intoxicação/ envenenamento relatadas pelos participantes da pesquisa, verificou-se que as condutas mais adotadas foram: oferecer água com açúcar (30%); levar a criança ao posto de saúde (20%); e oferecer leite à criança (20%) intoxicações/ envenenamentos. No caso das sufocações as condutas adotadas foram igualmente distribuídas entre: não realizou nenhuma intervenção, retirou o agente manualmente e sacudiu a criança, cada uma com 33,33% das ocorrências.

Segundo dados da Tabela V, identificou-se que houve associação estatística significante (p=0,000) entre as condutas dos pais/ responsáveis com relação à ocorrência de mordeduras e afogamentos. Com relação aos quatro agravos de mordeduras, a conduta mais adotada pelos pais/ responsáveis foi lavar o local atingido apenas com água, em 03 (75%) casos. No que diz respeito aos afogamentos, nos 02 (33,33%) casos ocorridos do estudo, a conduta adotada pelos pais/ responsáveis foi retirar a criança (100%), afastando-a dos agentes causadores, que nos casos ocorridos eram recipientes com água como balde, bacia ou banheira.

Os dados em relação ao atendimento buscado pelos pais e/ou responsáveis de acordo com o tipo de acidente que acometeu as crianças no ambiente doméstico encontram-se na tabela VI.

Na Tabela VI, apesar de não se verificar associação estatística significante entre as variáveis tipo de atendimento buscado pelos pais/responsáveis e tipos de acidentes (p=0,424), destaca-se que, dos 101 (100%) acidentes, 83 (82,18%) foram tratados em casa e que a busca de atendimento hospitalar foi realizada em apenas 13 (12,97%) ocorrências.

Das 41 (40,6%) quedas, observou-se que em 33 (80,49%) não houve necessidade de buscar nenhum atendimento, sendo os casos tratados no próprio domicílio. Assim como nas quedas, identificou-se, nos outros acidentes, um elevado percentual de casos tratados na própria residência da criança. Ressalta-se, ainda, que os casos em que houve procura de atendimento hospitalar, foram aqueles que geralmente são considerados mais graves, como as intoxicações/ envenenamentos, queimaduras e choques.

 

Discussão

A maioria dos acidentes com crianças ocorre no lar, atribuindo-se a isso o fato de que o ambiente domiciliar pode ser considerado perigoso às crianças, por apresentar diversos fatores de risco, como objetos pérfuro-cortantes, produtos de limpeza, janelas sem proteção, que favorecem a ocorrência dos acidentes(13).

Pesquisa realizada identificou como principais locais de ocorrência de acidentes o quintal (33,1%), o quarto (17,7%) e a cozinha (14,7%)(14), tais dados distinguem-se dos resultados encontrados no presente estudo, no qual o principal lugar de ocorrência foi a sala, lembrando-se que não houve associação estatística significante entre o tipo de acidente e o local onde eles ocorreram (Tabela I). Essa distinção do local de ocorrência dos acidentes pode estar relacionada com as diferenças da arquitetura dos domicílios onde os estudos foram realizados, pois nos domicílios deste estudo poucas casas tinham quintal.

Por outro lado, os dados aqui apresentados em relação às queimaduras são corroborados por outros estudos(15,16). Algumas situações oferecem fatores de risco para a ocorrência de trauma térmico, como, por exemplo, a manipulação de líquidos superaquecidos ou de panelas no fogão, com o cabo para fora e contato com metais aquecidos, apesar desse conhecimento, necessita-se explorar mais o assunto para se implementar programas educativos direcionados para a redução da incidência de tais injúrias(16).

Os locais onde mais se encontravam os agentes tóxicos, em um estudo sobre intoxicações, foram a sala e o quarto (23,8% em cada) e, em 66,7% dos acidentes, o agente tóxico encontrava-se no chão, ao alcance da criança(17). Entretanto, no presente estudo, observou-se que 60% das intoxicações exógenas ocorreram na cozinha, podendo ser devido ao fato de este ambiente possuir, geralmente, substâncias como alvejante, desinfetante, querosene e álcool mantidas geralmente em armários debaixo das pias (Tabela I).

A presença dos pais na residência não garante que as crianças encontram-se protegidas de acidentes, tal fato pôde ser observado neste estudo, visto que em 79,21% dos casos a mãe estava presente e apenas em 2,57% as crianças estavam sozinhas no domicílio por ocasião do acidente. Outros estudos também tem identificado a presença dos pais no momento acidente. Ressalta-se, ainda, que a presença de um adulto não impede que o acidente ocorra, pois, muitas vezes, não sabe como evitá-lo ou está realizando outras atividades, não conseguindo fazer uma supervisão direta das crianças (13).

Algumas condutas realizadas pelos pais ou responsáveis diante da ocorrência de um acidente que provocou um corte, não foram adequadas, como a aplicação de açúcar, café ou sal no local atingido, este fato demonstrou a influência da questão cultural nas práticas de saúde das famílias (Tabela II). Recomenda-se limpar a região atingida com água ou soro fisiológico e sabão; não aplicar cremes ou pomadas sobre o ferimento; em caso de sangramento, realizar compressão na região atingida e, não ocorrendo melhora, encaminhar a um serviço especializado(18).

No presente estudo, verificou-se associação estatística significante entre as condutas dos pais/ responsáveis e acidentes, no caso, queimaduras e choques. Diante de queimaduras, a conduta adotada pela maioria dos entrevistados foi lavar o local atingido e aplicar pomada (Tabela III), o que corrobora com outra pesquisa, na qual 54% das vítimas de queimaduras, a família fez tratamento local com pomadas ou produtos caseiros e, em apenas 6% dos casos, recorreu ao banho local com água(15). O uso de produtos caseiros como margarina, manteiga ou casca de banana constitui-se de um fator cultural e está relacionado à ocorrência de infecções(15).

Em casos de queimaduras pequenas ou superficiais, as condutas indicadas seriam: colocar o local afetado embaixo de uma torneira de água fria até aliviar a dor e nunca colocar sobre a área atingida pó de café, folha da bananeira, entre outros, que podem provocar infecção(19), risco observado em boa parte dos acidentes relatados pelos participantes do estudo, os quais aplicaram manteiga/margarina no local atingido.

Dos onze casos de choque elétrico, somente em um a mãe conduziu-se de maneira adequada, desligando-se a tomada. Afinal, as condutas básicas diante de choques devem ser desligar a corrente ou remover o agente condutor de energia utilizando um objeto isolante. Ressaltando-se que nos casos em que houver a necessidade, as manobras de reanimação devem ser realizadas(5).

Em caso de envenenamento/intoxicação exógena, as mães, muitas vezes, por desconhecerem a gravidade do acidente, aceitam recomendações feitas por outras pessoas da família e da comunidade, as quais sugerem oferecer leite, água morna, provocar vômito introduzindo o dedo na garganta da criança e colocá-la para dormir(20). O leite ainda é o alimento mais sugerido e oferecido à criança no caso da ocorrência de uma intoxicação por medicamento ou produto tóxico, conduta essa influenciada pela cultura popular e também encontrada nos resultados deste estudo. Em algumas situações, destaca-se que o leite pode potencializar a absorção do tóxico ingerido pelo organismo, ao entrar em contato com algumas substâncias, como os organofosforados, presentes em inseticidas(21).

A conduta correta dos familiares frente à ocorrência de mordedura seria lavar o ferimento com água e sabão e encaminhar imediatamente a vítima a um centro de saúde, para fins de tratamento imunoterápico(22), no entanto, verificou-se que a maioria dos entrevistados, cujas crianças foram vítimas de mordeduras, lavou o local atingido apenas com água, observando-se a ocorrência de associação estatística significante entre a conduta e a ocorrência desse tipo de acidente (Tabela V). Encontrou-se que em uma minoria (12,97%) dos acidentes domésticos buscou-se atendimento hospitalar, dado semelhante foi identificado em estudo, no qual esta parcela correspondeu a 10,7% dos casos(23).

No que concerne a queimaduras, identificou-se em uma pesquisa que havia diferenças entre os tipos de atendimentos realizados, os quais estiveram relacionados aos agentes causadores das mesmas. No grupo de pacientes que realizavam atendimento hospitalar, a chama foi o agente causador mais freqüente, enquanto que, nos que realizavam atendimento ambulatorial, o acidente foi provocado por escaldadura e outros agentes, como a eletricidade(15).

A maioria dos acidentes não apresenta um alto nível de gravidade, pois, em uma pesquisa sobre vítimas de acidentes atendidas em um pronto-socorro pediátrico, observou-se que em 95,7% das ocorrências a criança recebeu alta hospitalar logo após o atendimento(13). A grande maioria das lesões é de baixa complexidade, porém, muitas vezes, as crianças são levadas à unidade de emergência, enquanto poderiam ter sido tratadas em um serviço de atendimento primário(3).

Ressalta-se que, apesar dessa baixa complexidade dos acidentes, a maioria das ocorrências poderia ter sido evitada se existissem programas eficazes de prevenção dos acidentes, diminuindo, assim, os gastos hospitalares e o estresse da criança e sua família(24).

Em Fortaleza-CE, o desenvolvimento de ações de prevenção relacionadas aos acidentes e violências em crianças e adolescentes não foi ainda adotado como política pelo setor público de saúde. Das seis Secretarias Executivas Regionais (SER) existentes no município, apenas em duas são desenvolvidas atividades de prevenção de acidentes domésticos(25).

Todos os níveis de prevenção podem ser incluídos no âmbito dos acidentes domésticos, por meio da realização de atividades educativas e medidas de segurança (prevenção primária), da atuação no tratamento precoce e eficaz das lesões, reduzindo as seqüelas físicas e emocionais na criança (prevenção secundária) e na reabilitação e reintegração da criança acidentada no contexto familiar e social (prevenção terciária)(21).

 

Conclusão

De acordo com o exposto verificou-se que não houve associação estatística significante entre o tipo de acidente e o local onde eles ocorreram, sendo a sala, a cozinha e o quarto os principais ambientes residenciais onde o episódio acontece. Bem como não houve associação estatística significante entre tipos de acidentes e a pessoa que estava presente no momento da ocorrência, ressaltando-se que na maioria desses a mãe da criança estava no domicílio no momento em que aconteceu a injúria.

Houve associação estatística significante no que diz respeito às condutas dos pais/ responsáveis e os acidentes ocorridos com as crianças, são eles: queda, corte, queimaduras, choques, intoxicação/ envenenamento, sufocação, aspiração, mordeduras e afogamentos.

Não se verificou associação estatística significante entre as variáveis tipo de atendimento buscado pelos pais/responsáveis, de acordo com os tipos de acidentes. Dos 101 acidentes referidos, 83 foram tratados em casa, tendo sido o atendimento hospitalar buscado em apenas 13 ocorrências, os quais foram os acidentes considerados mais graves, como as intoxicações/ envenenamentos, queimaduras e choques.

Assim, tendo em vista que muitas das condutas dos pais/responsáveis, diante dos acidentes domésticos que vitimaram suas crianças, não eram as recomendadas pela literatura, ressalta-se que a prevenção constitui-se na maneira mais eficaz para minimizar a ocorrência de acidentes, sendo a educação em saúde ferramenta essencial para esclarecer, junto aos pais/responsáveis das crianças, as condutas indicadas para cada situação, buscando-se dessa maneira minimizar a gravidade dos acidentes domésticos e promover a saúde dessa população.

 

Agradecimentos

Agradecemos a FUNCAP - Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico, Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica- PIBIC/CNPq e ao Programa de Educação Tutorial-PET, por terem financiado este estudo.

 

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