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Enfermería Global

On-line version ISSN 1695-6141

Enferm. glob. vol.12 n.32 Murcia Oct. 2013

 

ENSAYOS

 

Promoção da saúde: a qualidade de vida nas práticas da enfermagem

Promoción de la salud: la calidad de vida en las prácticas de enfermería

Health promotion: the quality of life in nursing practices

 

 

Firmino Bezerra, Sara Taziana; Mesquita Lemos, Aline; Costa de Sousa, Sandra Maria; de Lima Carvalho, Carolina Maria; Carvalho Fernandes, Ana Fátima e Santos Alves, Maria Dalva

Universidade Federal do Ceará. Fortaleza-CE. Brasil. E-mail: saratfb@yahoo.com.br

 

 


RESUMO

Objetiva refletir acerca da qualidade de vida (QV) propiciada nas práticas de Enfermagem com vistas à Promoção da Saúde, discutida desde a I Conferência Internacional sobre Cuidados Primários em Saúde, em Alma-Ata (1978), reforçada nas Conferências de Promoção da Saúde, posteriormente, e que tem relação direta com a qualidade de vida. Esta é entendida como a percepção da pessoa sobre sua vida, no contexto cultural e social, associado com os desejos, objetivos, expectativas e influenciada pelo estado de saúde. O enfermeiro exerce importante papel em todos os níveis de atenção, sendo profissional estratégico para proporcionar mudanças no estilo de vida das pessoas que promovam à saúde, consequentemente, a qualidade de vida, por meio do seu cuidado e do "empoderamento" da pessoa e de sua família. Algumas experiências confirmam a atuação da enfermagem junto a pacientes com certas condições crônicas, individuais ou coletivas, que promovem a saúde. Conclui-se ser necessário sensibilizar cada vez mais a equipe de saúde e a Enfermagem, em especial, no sentido de promover a saúde no contexto do Sistema Único de Saúde (SUS), que colaboram para a melhoria da qualidade de vida da sociedade.

Palavras chave: Promoção da saúde; Qualidade de vida; Enfermagem; Cuidados de enfermagem.


RESUMEN

El objetivo fue reflexionar sobre la calidad de vida (CV) ofrecida en las prácticas de Enfermería con miras a la Promoción de la Salud, discutida desde la I Conferencia Internacional sobre Atención Primaria de Salud en Alma-Ata (1978), reforzada más tarde en las Conferencias sobre Promoción de la Salud y que tiene relación directa con la calidad de vida. Esta es entendida como la percepción de la persona sobre su vida, en el contexto cultural y social, asociada con los deseos, objetivos, expectativas e influenciada por el estado de salud. El enfermero desempeña papel importante en todos los niveles de atención, siendo profesional estratégico para proporcionar cambios en el estilo de vida de las personas que promueven la salud, por lo tanto, la calidad de vida, a través de su cuidado y del "empoderamiento" de la persona y su familia. Algunas experiencias confirman la intervención de enfermería con los pacientes con ciertas afecciones crónicas, individuales o colectivas, que promueven la salud. Es necesario sensibilizar cada vez más el personal de salud y de Enfermería, en particular, a promover la salud en el contexto del Sistema Único de Salud (SUS), para colaborar a la mejora de la calidad de vida de la sociedad.

Palabras clave: Promoción de la salud; Calidad de vida; Enfermería; Cuidados de enfermería.


ABSTRACT

This study aimed to reflect on the quality of life provided in nursing practices seeking Health Promotion, a discussion that happens since the International Conference on Primary Health Care in Alma-Ata (1978), later reinforced in the Conferences on Health Promotion and that is directly related to the quality of life. This is understood as the perception that someone has about their life in the cultural and social context, associated with desires, goals and expectations, and influenced by health conditions. The nurse plays an important role in all levels of care, being an essential professional to promote changes in the lifestyle of the people that promote health and consequently in the quality of life, through their care and "empowerment" of the person and their family. Some experiments confirm the health promotion of nursing practices with patients with certain chronic conditions, individual or collective. We conclude that it is necessary to increasingly sensitize the health and nursing staff, especially for health promotion in the context of SUS, who collaborate to improve the quality of life of society.

Key words: Health promotion; Quality of life; Nursing. Nursing care.


 

Introdução

A Promoção da Saúde é discutida desde a I Conferência Internacional sobre Cuidados Primários em Saúde, em Alma-Ata (1978), no Casaquistão e foi reforçada na I Conferência sobre Promoção da Saúde, em Ottawa, no Canadá (1986).

Inicialmente, compreende-se a Promoção da Saúde como proposta de "empoderamento" das pessoas, famílias e comunidades, que permita sua plena e efetiva participação na discussão e elaboração das políticas públicas, as quais colaboram para a melhoria da qualidade de vida.

O conceito amplia-se na ideia de produção de ambientes saudáveis (seja ele familiar, no trabalho, no lazer), buscando a redução das vulnerabilidades e, mais recentemente, valorizando as redes sociais que fortalecem o suporte social.

Com efeito, a Promoção da Saúde relaciona-se à qualidade de vida, no que concerne aos aspectos que influenciam as relações, o convívio e o cotidiano em que se vive. A qualidade de vida está associada a fatores objetivos (condições materiais necessárias a uma sobrevivência livre de miséria) e fatores subjetivos (relações com outras pessoas, formação de identidades sociais, sentimento de integração social e em harmonia com a natureza). A qualidade de vida ainda está associada à capacidade (combinações de potencialidades e situações em que uma pessoa está apta a ser ou fazer) e à funcionalidade (estados de uma pessoa, as várias coisas que ela faz ou é). A qualidade de vida deve ser entendida por meio das oportunidades efetivas das quais as pessoas dispõem para ser, realizações passadas e presentes (1).

Ante ao que se expôs, esta reflexão tem por objetivo exprimir a utilização pela Enfermagem, da Promoção da Saúde, dentro do enfoque da qualidade de vida. É sabido que o objeto de trabalho da Enfermagem é o cuidado ao ser humano, o qual sucede na interação enfermeiro-cliente em situações tanto de adoecimento como de saúde.

Efetivamente, a questão é importante, na medida em que busca pensar na posição que a Enfermagem assume na política de Promoção da Saúde, seu entendimento pelo enfermeiro, e como isso refletirá na qualidade de vida das pessoas.

No sentido amplo de Promoção da Saúde, a Enfermagem constitui campo de ação estratégico no Sistema Único de Saúde brasileiro. A liderança para articular a equipe de saúde, tanto na atenção primária (com os auxiliares e técnicos de enfermagem e com os agentes comunitários de saúde), como na atenção secundária e terciária (sem o segundo agente) permite ao enfermeiro a possibilidade de valorizar as competências individuais desses membros, de modo a facilitar a interação com o foco de cuidado, que é o paciente.

Sabe-se, porém, que esse modo de cuidar, embora seja constantemente discutido em ambiente de ensino aprendizagem de futuros enfermeiros, não implica que toda categoria esteja trabalhando com tais preocupações e atenção. A integralidade do cuidado à saúde por certo contribuirá para reduzir o hiato que existe entre discurso e prática de parte da categoria de enfermeiros, que diz ser o profissional que mais tempo permanece ao lado do paciente/cliente, dando-lhe cuidado integral e humanizado, mas que na prática, envolve-se mais com atividades administrativas gerenciais(2:24).

O "empoderamento" quer dizer da possibilidade de a pessoa assumir um maior controle sobre a própria vida, devendo os profissionais de saúde utilizar estratégias que buscam fortalecer a autoestima e a capacidade de adaptação ao meio, desenvolvendo mecanismos de autoajuda e solidariedade(3). Além disso, a Promoção da Saúde envolve abordagens transdisciplinares, levando em consideração a diferença, a subjetividade e a singularidade da vida, na esfera individual e coletiva(4). Esses são alguns dos determinantes sociais da saúde, que implicam as condições de vida e de trabalho das pessoas e grupos relacionados com a sua situação de saúde(5)

O interesse pela temática surgiu no decorrer da disciplina Enfermagem e as Bases Teóricas da Promoção da Saúde, do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Ceará. A disciplina instiga a necessidade de aprofundar o conhecimento acerca da área de concentração - a Promoção da Saúde - com vistas à produção da qualidade de vida.

Espera-se que esta reflexão estimule os profissionais de saúde à compreensão da complexidade da Promoção da Saúde, que exige a participação dos agentes por meio do "empoderamento", privilegiando a qualidade de vida, como objetivo a ser alcançado, mas atentando para os diversos aspetos que influenciam esse movimento na saúde coletiva.

 

Emprego da promoção da saúde pela enfermagem.

O conceito de Promoção da Saúde surgiu e se desenvolveu nos últimos 20 anos. Três importantes conferências internacionais estabeleceram bases conceituais e políticas de Promoção da Saúde, realizadas em Ottawa (1986), Adelaide (1988) e Sundsvall (1991). Nelas, o conceito de Promoção da Saúde ainda é confundido com o modelo tradicional de prevenções das doenças, ações de imunização, saúde ocupacional e controle de vetores.

A Promoção da Saúde tem um enfoque no exercício da cidadania, participação dos sujeitos com estratégia de transformações das condições de vida, atividade que promovam motivações, com planejamento e avaliação das efetividades das ações (6). O conhecimento de Promoção da Saúde vai além de aprimorar a escuta, fortalecer os vínculos, em que o modelo de intervenção é participativo e na mobilização comunitária.

Em 1992, no contexto de expansão e qualificação da atenção básica, iniciou-se o primeiro programa. Trata-se do Programa Agentes Comunitários de Saúde (PACS), sendo posteriormente transformado em política estruturada, conhecido como Programa de Saúde da Família, que se configurou como estratégia de reorientação do modelo assistencial, com o desafio de proporcionar maior acesso aos serviços e participação comunitária (6).

As concepções do enfermeiro são fundamentais à sua prática, por ser aquele que detém a competência para atuar como educador, junto à equipe e à comunidade, e isso requer um pensamento com foco nas mudanças de atitude. As ações do enfermeiro não podem estar centradas na prevenção de doenças, nos fatores de riscos, cujo objetivo é focado na doença.

As ações de Enfermagem em Promoção da Saúde são fundamentais, com a realização de grupos para a conquista da autonomia e apreensão de conhecimentos na melhoria da qualidade de vida das pessoas. Desenvolver ações de cuidar pautadas em um processo de diálogo, valorizando a individualidade de cada ser, é um cuidado mais próximo das reais necessidades dos usuários (7).

Os conhecimentos e as práticas de Promoção da Saúde desenvolvida na formação do enfermeiro são necessários para transformar as práticas de ensino, superando o modelo biológico, e criar outro modelo operacional que supere as ações preventivas, tanto na formação, quanto na atuação profissional. É fundamental que o docente seja capaz de romper com práticas tradicionais e implementar ações à luz de um novo paradigma (8).

Considera-se que o enfermeiro envolvido na assistência vivencia oportunidade de aplicar estratégias de Promoção da Saúde, pois está em contato direto com seus usuários, participantes ativos nos cuidados e manutenção da saúde. Neste aspecto, a Promoção da Saúde é descrita como o processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria de sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior participação no controle desse processo (3). Ações educativas são capazes de confirmar a autonomia perante situações de adoecimento. Usuários dos serviços, familiares e profissionais são envolvidos, estabelecendo objetivos em comum que podem ser alcançados.

Além disso, o enfermeiro interage com os outros agentes da saúde, a fim de facilitar a interdisciplinaridade, por meio da qual os diversos saberes dialogam com vistas a proporcionar assistências de qualidade nos diversos contextos de cuidados. Para a promoção da saúde no Brasil, há que se considerarem aspectos complexos como as desigualdades socioestruturais e as relações de poder injustas que afetam negativamente mais de um terço da população brasileira, aumentando o individualismo e a falta de solidariedade, prejudicando ainda mais a comunicação entre as pessoas. Isso deixa vaga a definição de responsabilidades, impossibilitando cobranças, se estas não forem assumidas.

"O mais preocupante é a grande distância e uma quase total impossibilidade de diálogo entre a elite de gestores e especialistas e a maioria da população na base da pirâmide social, usuária da saúde pública, e para quem essas práticas são supostamente desenhadas" (9:234).

A interação com o objeto de cuidado, nas situações de saúde-doença, direciona-se para um encontro entre sujeitos, em busca de satisfazer as suas necessidades, sejam elas fisiológicas, psicológicas ou sociais. Este último campo, por ser mais complexo, é um desafio ao enfermeiro, mas este, de forma incipiente, demonstra o interesse em articular os setores que existem no entorno da pessoa, com vistas a viabilizar a intersetorialidade, identificando potenciais referenciais que busquem a melhoria da qualidade de vida de sua comunidade.

Aos poucos, os enfermeiros aprendem a pensar e a fazer Promoção da Saúde, um conceito amplo e complexo de ser incorporado nas pessoas, instituições e sociedades, a fim de superar a tradicional padrão assistencial.

Não é fácil despertar no indivíduo, sem pensar nas possíveis frustrações, o interesse em identificar aspirações, satisfazer necessidades e modificar favoravelmente o meio ambiente (10), já que a própria Carta de Ottawa reconheceu que o conceito positivo de saúde e a sua promoção não é responsabilidade exclusiva do setor saúde. Esta é uma importante dimensão de vida, mas não a única.

Neste sentido, a política de promoção da saúde inclui legislação, medidas fiscais, taxações e mudanças organizacionais, o que envolve governo, setor saúde e outros segmentos sociais e econômicos, organizações voluntárias e não governamentais, autoridades locais, indústria e mídia (10).

Há uma organização do conceito de saúde, "a partir da definição da organização mundial de saúde que a considera não como a ausência de doença, mas numa perspectiva positiva e ampliada, cujo foco é o processo social de sua produção"

Para tanto, na Política Nacional de Promoção da Saúde esta é conceituada como

...uma estratégica de articulação transversal na qual se confere visibilidade aos fatores que colocam a saúde da população em risco e as diferenças entre necessidades, territoriais e culturais presente no nosso País, visando a variação de mecanismo que reduzam as situações de vulnerabilidade, defendem radicalmente a equidade e incorporem a participação e o controle sociais na gestão das políticas públicas (12).

O enfermeiro desenvolve suas ações nos três níveis de complexidade do SUS, e como tal, deve se engajar plenamente na luta pelos valores por ele preconizados, bem como na concretização do princípio da integralidade. Trata-se de um discurso presente na formação do enfermeiro de que o cuidado ao paciente ou cliente deve ser integral e de que suas ações em tal atividade devem ser de totalidade, procurando cuidar sempre de modo holístico (2).

A ênfase na atenção primária em saúde e as ações específicas destinadas à Promoção da Saúde exigem a mobilização do enfermeiro da Estratégia Saúde da Família. O vínculo criado com as pessoas na área de abrangência o torna referência para a comunidade.

Isso facilita que a sua assistência promova a reflexão quanto à necessidade de alimentação saudável, fortalecendo o estímulo ao aleitamento materno, à implantação de banco de leite, dentre outros; na escola, incentivando a prática de atividades físicas nos próprios espaços da comunidade, incluindo pessoas com deficiências; sensibilizando a comunidade para a prevenção e controle do tabagismo; investindo na educação em saúde de jovens e adultos quanto ao uso abusivo de álcool e drogas, responsáveis em grande parte pelos índices de mortalidade, por violência, acidente de trânsito; gerando uma cultura de paz e promovendo na comunidade o desenvolvimento sustentável (12).

Os objetivos não são modestos nem fáceis de alcançar, mas respondem ao objetivo da estratégia "de reorientação do modelo assistencial, operacionalizada mediante a implantação de equipes multiprofissionais em unidades básicas de saúde" (13).

Ações de promoção e proteção da saúde nas ações de Enfermagem tendem a ser relevantes na promoção da qualidade de vida de seus clientes, porém essa como decorrência da Promoção da Saúde, não é pertinente ao foco de saúde formal (13).

 

Conceito de qualidade de vida

A expressão qualidade de vida (QV) é comentada ancestralemente por vários autores e constitui por excelência um dos conceitos mais complexos a ser definido. A grande dificuldade encontrada por pesquisadores em sua definição é que a percepção de qualidade de vida está atrelada a uma subjetividade intrínseca, ou seja, é a percepção de cada ser juntamente com determinadas condições, não privilegiando um modelo padronizado (14).

A primeira vez que a expressão QV foi mencionada data de 1920, pelo autor Pigou, ao escrever seu livro que se reporta a economia e bem-estar, tendo como foco o suporte que o governo realizava para classes sociais com baixo nível, repercussão na vida destas e o orçamento do Estado (15). Outros pesquisadores revelam que a dicção foi citada pela primeira vez e começou a ser destaque, depois do ano de 1964, pelo presidente Lyndon Johnson, dos Estados Unidos, quando declarou que "os objetivos não podem ser medidos através do balanço dos bancos. Eles só podem ser medidos através da qualidade de vida que proporcionam às pessoas" (16).

Em 1995, um grupo de especialistas da Organização Mundial da Saúde (OMS) em um trabalho multicêntrico, de culturas diferentes, conceituou QV como a percepção do indivíduo sobre a sua posição na vida, no contexto da cultura e dos sistemas de valores nos quais ele vive, e em relação a seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações (17).

Muitos profissionais, e aí inclusos os da área de saúde, ligam a expressão boa saúde ou bem-estar com qualidade de vida, aliando ao significado de que ter saúde é de fato ter qualidade de vida. Isto reduz a ideia e recua ao modelo biomédico centrado na doença, na ausência de saúde. Portanto, como portador de doença, não alcançará a qualidade de vida, mas será possível ter qualidade de vida sendo portador de uma patologia?

A qualidade de vida ligada à saúde (QVLS) é definida como valor atribuído à vida, ponderado pelas deteriorações funcionais; as percepções e condições sociais que são induzidas pela doença, agravos, tratamentos; e a organização política e econômica do sistema assistencial (18).

Há três vertentes para a expressão qualidade de vida: qualidade de vida (QV) como unidade de ideia genérica de forma geral, qualidade de vida ligada à saúde (QVLS) e qualidade de vida no trabalho (QVT). Pode-se deter a uma só definição e avaliar a qualidade de vida nas coletividades ou somente no individual? Qual das três vertentes é a que trabalha melhor a qualidade de vida? Ou uma complementa a outra?

Em uma pesquisa realizada com acadêmicos de Enfermagem na cidade de São Paulo, sobre o significado de qualidade de vida e fatores que a favorecem e a comprometem, revelou que existem diferentes visões da expressão, e que, no percurso da formação, há fatores que favorecem e comprometem a qualidade de vida, como, por exemplo, o estresse. O estudo destaca o papel da Universidade, não só no ensino técnico, como também na conscientização sociocultural do enfermeiro em formação (19).

 

Como a enfermagem emprega a promoção da saúde com enfoque da qualidade de vida

A QV é incentivada em todos os níveis de atenção, em que cada vez mais as doenças crônicas e seus tratamentos são estudados, sendo analisado o impacto dessas patologias na qualidade de vida das pessoas.

O enfermeiro exerce importante papel nos cuidados relacionados à QV na Promoção da Saúde. O "empoderamento" e a Educação em Saúde permitem mudança de atitude e capacitação a pessoas/ comunidade, suporte para adesão aos tratamentos, motivação para identificar fatores que interferem no tratamento, como a prática de exercício, dieta saudável e a participação ativa, ou seja, a saúde depende da qualidade de vida.

A análise reflexiva evidenciou a escassez de trabalhos que abordem a temática. É preciso que, no período de formação acadêmica, os futuros profissionais sejam preparados, considerando indispensável que a educação transponha as considerações biológicas. Portanto, a implementação de estratégias devem emergir com base nas necessidades individuais comprometidas com a comunidade, com vistas à qualidade do serviço na qualidade de vida.

Assim, é necessário criar espaços, investir para melhorar a qualidade de vida, compreendendo os sentimentos das pessoas, para orientar condutas no enfrentamento de suas limitações, as modificações ocorridas em suas vidas, identificando as necessidades e as alterações na QV.

Os profissionais precisam aprender a lidar com situações de saúde e doença, com abordagens centradas nas pessoas. O encontro com elas ajuda a adquirir conhecimentos e facilita ações para a mudança no estilo de vida, importante influência na QV como caminhadas, alongamentos, lazer, terapia comunitária e atividades comemorativas.

Os resultados mostram a necessidade de investir em mudanças, com procedência em iniciativas como reflexões sobre o papel do profissional. É importante ressaltar que o desenvolvimento e a implementação de estratégias da Promoção da Saúde são insuficientes. O contato paciente-enfermeiro é reduzido pela sobrecarga de trabalho burocrático, necessitando de profissionais qualificados em número suficiente para atendê-los, objetivando melhorar a capacitação de pessoas no autocuidado, voltadas para a melhoria da qualidade de vida da população.

Em um estudo efetuado em uma Unidade Básica de Saúde da Família na cidade de São Paulo, acerca das práticas de Promoção da Saúde na vivência em grupos, observou-se que são realizadas práticas educativas na atenção a saúde e atividades pedagógicas, visando à elaboração do conhecimento a partir das informações vivenciadas. Os grupos realizados são de idosos, hipertensos, diabéticos e gestantes, por meio de encontros diários, em que há troca de experiência entre os participantes, socialização, pintura, canto, caminhada, dança, discussão de vários temas com teor programático, exercício de relaxamento, repercussões das doenças, alimentação saudável, teatro e brincadeiras. O grupo é um espaço onde os profissionais têm a oportunidade de constituir o "empoderamento", capacitando a pessoa e comunidade para estabelecer a Promoção da Saúde (20).

Pesquisa realizada com a equipe de Saúde da Família nos Municípios de Belo Horizonte e Contagem, sobre a prática de grupo como ação de Promoção da Saúde na Estratégia Saúde da Família (ESF) revelou as dificuldades vivenciadas no processo de capacitar a pessoa para atuar na melhoria da sua qualidade de vida. Os grupos são elaborados com centro em patologias específicas e com ações restritas e tradicionais e pouco inovadoras, utilizadas para a racionalização do trabalho, voltada para consultas coletivas. As estratégias de Educação e Saúde com ênfase no modo tradicional, e a falta de planejamento de ações de Promoção da Saúde aumentam a distância entre profissionais e os usuários. Cabe ao profissional de saúde a implantação de metodologia e a condução do grupo pelo coordenador com orientações capazes de produzir impacto sobre a saúde e a qualidade de vida (21).

Outro estudo efetuado com enfermeiros da Estratégia Saúde da Família no Município de Sobral - Ceará - buscou saber sobre as práticas dos enfermeiros no controle da hipertensão arterial. O estudo mostra que há um esforço para promover a saúde dessas pessoas, no qual os enfermeiros realizam ações de Promoção da Saúde, sejam em consultas individuais ou ação coletiva, contudo existem alguns momentos em que este esforço fica comprometido, em decorrência do excesso de demanda e da ausência de espaço físico adequado. Para haver o controle da hipertensão, não bastam apenas medidas de orientação, sendo necessário desenvolver estratégia para a mudança de atitude e adesão ao tratamento, remoção dos fatores de riscos por meio de hábitos alimentares e estilo de vida saudável (22).

 

A modo de reflexão

Como foi expresso nesta reflexão, há atualmente a necessidade de repensar os conceitos que fundamentam a prática profissional, dentre eles o de Promoção da Saúde. Este deve ser visto como base, cujo pensamento é de buscar o "empoderamento" das pessoas, sensibilizá-las para a busca constante de melhorias na qualidade de vida da comunidade.

É uma mudança de paradigma que possibilitará a viabilização efetiva dos princípios do SUS de integralidade do cuidado e de universalidade do acesso aos serviços, com articulação entre os diversos setores nos entornos da vida cotidiana das pessoas, e valorizados os saberes, aliando o cuidado profissional com a cultura e as formas de se lidar com os problemas de saúde.

Denota-se que ainda há uma cultura da prática da Enfermagem situada em cuidados curativos, hospitalocêntrica, no modelo biomédico, o que distancia a fundamentação desta pautadas em ações básicas de Promoção da Saúde (23).

A Enfermagem evolui neste sentido, mas muito há ainda a se buscar, com vistas a se tornar práxis introjetada nos profissionais e não como iniciativas individuais, cujo impacto não é visualizado pela sociedade.

 

 

Referências

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