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Enfermería Global

On-line version ISSN 1695-6141

Enferm. glob. vol.13 n.33 Murcia Jan. 2014

 

CLÍNICA

 

Terapia tópica no tratamento de feridas crônicas

Terapia tópica en el tratamiento de las heridas crónicas

Topical therapy in the treatment of chronic wounds

 

 

Da Silva, Priscilla Nicácio*; de Almeida, Onislene Alves Evangelista** e Rocha, Izabella Chrystina***

*Enfermeira professora temporária da Universidade Federal de Mato Grosso. E-mail: priscillanic@hotmail.com
**Enfermeira pós graduada em Gestão e Vigilância da Saúde da Família e Docência Superior, técnica administrativa pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul em exercício no Centro de Diálise do Hospital Universitário de Brasília.
***Enfermeira Mestre em Enfermagem, professora Assistente da Universidade Federal de Mato Grosso. Brasil

 

 


RESUMO

O tratamento de feridas retoma a Antiguidade, quando o homem objetivando melhores resultados cicatriciais em menores intervalos de tempo fazia uso de diversos métodos e substâncias na terapêutica de lesões1,2. Atualmente a terapêutica empregada em feridas ainda suscita discussões, pois esta deve atentar para a lesão e seu portador, de modo a contemplar o planejamento e efetivação do cuidado3.
Trata-se de um estudo descritivo, exploratório com abordagem quantitativa não probalística, cujo objetivo central foi conhecer a terapia tópica empregada no tratamento de feridas abertas e crônicas por usuários das Unidades Básicas de Saúde da Família (UBSFs) em cidade do interior do Estado de Goiás, Brasil. Participaram da pesquisa 19 pessoas de ambos os sexos, com idade média de 56,5 anos, portadores de feridas abertas com tempo de existência superior a 3 meses. Para a coleta de dados foi realizada a observação direta da lesão e utilizado um instrumento dirigido semiestruturado, com perguntas sobre dados socioeconómicos do portador e relativos à terapêutica da ferida.
Os resultados apontaram que os produtos tópicos mais utilizados foram antibióticos, os antissépticos, sendo o principal o polivinilpirrolidona iodo tópico (PVPI) e antifúngicos. Verificou-se também o emprego de substâncias impróprias a cicatrização, como o produto creolina. Houve divergência entre os dados encontrados pela pesquisa e o sugerido pela literatura, já que os produtos tópicos mais utilizados na terapia das feridas estarem em dissonância com o indicado pela literatura pesquisada.

Palavras chave: Ferimentos e lesões; cicatrização de feridas, cuidados de enfermagem.


RESUMEN

El cuidado de la heridas retorna a la Antigüedad, cuando el hombre buscando mejores resultados en la cicatrización en menores intervalos de tiempo, hacía uso de diversos métodos y sustancias en el tratamiento de lesiones1,2. Actualmente, la terapéutica empleada en las heridas aún da lugar a discusiones, ya que debe atender a la herida y a su portador, con el fin de incluir la planificación y la realización de su cuidado.
Se trata de un estudio descriptivo, exploratorio, con abordaje cuantitativo no probabilístico, cuyo objetivo central fue conocer la terapia tópica empleada para el tratamiento de heridas abiertas y crónicas por los usuarios de Unidades Básicas de Salud de la Familia (UBSFs) en el estado de Goiás, Brasil. Participaron en esta encuesta 19 personas de ambos sexos, con una edad media de 56,5 años, con heridas abiertas más de 3 meses. Para la recolección de datos se realizó la observación directa de la lesión con un instrumento dirigido semiestructurado, con preguntas sobre datos socioeconómicos del portador y relativos a la terapéutica de la herida.
Los resultados mostraron que los productos tópicos más utilizados fueron antibióticos, antisépticos, siendo el principal la polivinilpirrolidona yodo (PVPI) y antifúngicos. También se verificó el empleo de sustancias impropias para la curación, como el producto creolina. Hubo desacuerdo entre los datos encontrados en la encuesta y lo sugerido por la literatura, ya que la mayoría de los productos tópicos utilizados en el tratamiento de heridas está en disonancia con lo indicado por la literatura investigada.

Palabras clave: Heridas y lesiones; cicatrización de heridas, cuidados de enfermería.


ABSTRACT

The treatment of wounds resumes antiquity when man aiming better results in scarring smaller time intervals was using various methods and substances in therapy injuries1-2. Currently employed in wound therapy is still debatable, as this should be aware of the injury and the patient, in order to include the planning and execution of care3.
This is a descriptive, exploratory study with a quantitative approach is not probabilistic , whose main objective was to topical therapy used in the treatment of open wounds and chronic users of Basic Units for Family Health (UBSFs) in the city in the state of Goiás, Brazil. Participants were 19 people of both sexes, with a mean age of 56.5 years, with open wounds to their age more than 3 months . For data collection was carried out direct observation of the lesion and used an instrument directed semistructured questionnaire about socioeconomic data carrier and on the therapeutic wound.
The results showed that the products were the topics most widely used antiseptic, being the main topic polyvinylpyrrolidone iodine (PVP), antibiotics and antifungals. It was also the employment of improper wound healing substances such as cresol product. There was disagreement between data found by the survey and suggested in the literature, since most topical products used in the therapy of wounds are at odds with the indicated by the literature.

Keywords: Wounds and injuries; wound healing; nursing care.


 

Introdução

O tratamento de feridas retoma a Antiguidade, quando o homem objetivando melhores resultados cicatriciais em menores intervalos de tempo fazia uso de diversos métodos e substâncias na terapêutica de lesões, utilizando muitas vezes produtos empíricos, ineficazes e mesmo prejudiciais a processo cicatricial1,2

Com os avanços tecnológicos muitos estudos acerca do assunto têm sido desenvolvidos, o que levou a um grande avanço no conhecimento dos diferentes tipos de lesões, do processo de reparação do tecido lesado, bem como de todos os fatores nele envolvidos2,3.

Nos dias atuais a terapia tópica empregada em feridas gera muitas discussões, principalmente para profissionais da área de saúde, pois a terapêutica implantada deve atentar para a lesão e seu portador, com sensibilidade e planejamento holístico, de modo a contemplar o ser humano em sua plenitude3.

Uma ferida é definida como o rompimento da integridade cutâneo mucosa, podendo ter causas intencionais, traumáticas ou por isquemia4. Desta forma, a ferida é considerada uma deformidade ou solução de continuidade, que pode atingir desde a epiderme, até estruturas mais profundas5.

O processo de cicatrização é um fenômeno local do qual participam elementos comuns a vários setores do organismo, sendo fácil imaginar que fatores ambientais e fisiológicos exerçam grande impacto na evolução da cicatrização, podendo exercer influência na qualidade da cicatriz, no tempo de cicatrização e na presença ou não de complicações4,6.

Neste aspecto, tratar feridas torna-se um desafio, principalmente feridas consideradas crônicas, já que estas, não progridem através de um processo ordenado e oportuno para promover a integridade anatômica e funcional, perduram por muitos meses ou mesmo anos, e possuem reincidivas frequentes4.

Diante da sua cronicidade e da possibilidade de recidiva em maior ou menor período de tempo, essas lesões podem gerar repercussões psicossociais aos pacientes, na medida em que podem provocar mudanças no estilo de vida, prolongar o tempo de afastamento do convívio familiar, provocar alteração da autoimagem, o que afeta diferenciadamente cada indivíduo, em menor ou maior intensidade, além de ser um limitante para o exercício de atividades diárias7.

Portanto, a utilização de produtos tópicos que visem auxiliar o processo de reparação tecidual tem grande valor, uma vez que, é por meio da terapia tópica que as condições ideais a cicatrização podem ser alcançadas8.

Deve ser explicitado que o tratamento tópico de uma ferida não emite apenas a implantação de produto no leito de uma lesão, e sim a compreensão de que esse é um processo sistematizado, que envolve a avaliação da ferida quanto ao estágio de cicatrização, tecido presente no leito, exsudato, como também, a possibilidade de acesso do portador ao produto, para que a partir de então se estabeleça a limpeza adequada e o produto tópico apropriado9,10

Ao se analisar que a pele, que além de ser o cartão de apresentação, é o maior órgão do ser humano, torna-se evidente a responsabilidade, principalmente do profissional enfermeiro, em promover e cooperar com o organismo para uma perfeita reconstrução tecidual, porém, entender a cicatrização como um processo endógeno não implica em descuidar do tratamento tópico9.

Observando as etapas de avaliação da lesão, entra a decisão sobre o tipo de curativo a ser aplicado, já que este é um termo que abrange desde a avaliação sistematizada da lesão, a limpeza, desbridamento, e a indicação de produto tópico adequado4,10.

Ao considerar esses fatores, o profissional da saúde deve entender que produto tópico corresponde a um medicamento de ação local aplicado no leito e adjacências da ferida, com intuito de proporcionar situação favorável à cicatrização, sendo, portanto, uma cobertura4,8.

Existe no mercado uma diversidade de produtos com essa finalidade, sabe-se da existência de uma gama de aproximadamente 2.000 itens que se destinam ao tratamento de feridas, desde as coberturas mais simples até os mais complexos tipos de curativos, que interferem de forma ativa nas diversas fases do processo cicatricial, dos vários tipos de feridas9,11.

Tendo em vista essa enorme diversidade de produtos tópicos com diferentes indicações e mecanismos de ação estes recebem classificações, conforme as características apresentadas pela ferida em produtos epitelizantes, absorventes, desbridantes, antibióticos e antissépticos4,8.

No entanto, percebe-se que essa diversidade de produtos pode provocar insegurança nos profissionais de saúde, sobre qual opção é mais indicada, já que o sucesso do tratamento depende da criteriosa escolha e da adequada utilização dos produtos selecionados12.

Outro fator referente ao surgimento de novas drogas destinadas a recuperação cicatricial nas últimas décadas tem haver com o valor econômico destes produtos, que muitas vezes é elevado, além de ser necessário treinamento pessoal adequado para o manuseio13.

Logo, ao selecionar o tipo de tratamento a ser utilizado em uma ferida, é preciso reconhecer os benefícios, indicação, contra indicação, e o custo de cada produto, de forma a ponderar essas implicações e selecionar o mais adequado para cada etapa do processo terapêutico11.

Assim, objetivou-se com esse estudo, conhecer a terapia tópica utilizada por portadores de feridas crônicas em cidade do interior do Estado de Goiás, Brasil.

 

Metodologia

Trata-se de um estudo transversal, quantitativo, descritivo e exploratório, com amostragem não probabilística, que obteve as informações por meio da aplicação de instrumento dirigido.

O método de investigação foi realizado através da avaliação direta da lesão, sendo a coleta efetivada por meio de um questionário semiestruturado, em que foi identificado o perfil socioeconômico do portador de lesão, realizada anamnese, verificado a aparência do leito da lesão, a classificação da ferida, o tipo de cicatrização, as substâncias/fluídos empregados na limpeza da ferida e produtos tópicos utilizados na terapia.

A pesquisa foi realizada no Município de Aragarças/ GO, sendo utilizada a área de abrangência de seis Unidades Básicas de Saúde da Família (UBSFs) presentes no município.

As visitas à população amostral foram agendadas com as enfermeiras responsáveis pelas UBSFs, com posterior repasse por estas e por Agentes Comunitários de Saúde (ACS) dos endereços dos portadores de lesão, concretizando-se então a coleta de dados.

A amostra distinguiu-se por grupo de 19 pessoas de ambos os sexos, que possuíam feridas crônicas, aberta, com tempo de permanência maior que três meses, sendo a coleta efetivada no período de novembro de 2009 a setembro de 2010.

Os dados coletados foram analisados por meio de estatística descritiva com tabelas de frequência simples.

A pesquisa foi desenvolvida respeitando a privacidade e voluntariedade dos participantes que colaboraram com a coleta de dados, sendo que estes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido no qual concordavam com a pesquisa. O estudo obteve a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa número de protocolo 704/CEP HU JM/09 que atende a Resolução CNS 196/96 do Ministério da Saúde para pesquisa envolvendo seres humanos.

 

Resultados e discussão

A população amostral foi caracterizada com média de idade de 56,5 anos, em que o mínimo foi de 24 anos e o máximo de 89 anos. Os dados socioeconômicos como sexo, escolaridade e renda familiar estão descritos na tabela 1, sendo entrevistadas 19 pessoas, destas 9 (47,36%) eram do sexo feminino e 10 (52,64%) do sexo masculino.

 

 

Na categoria escolaridade, 1(5,9%) participante relatou possuir o ensino médio completo, 4 (23,5%) disseram não serem alfabetizados, 6 (35,3%) possuíam o ensino fundamental incompleto, e 6 (35,3%) pessoas possuíam o ensino fundamental completo. Neste item 2 (10,6%) participantes não informaram sua escolaridade.

Em relação à renda familiar os participantes foram classificados conforme o índice de salário mínimo em 2010. Nesse contexto, 7 (36,9%) disseram possuir renda de até 1 salário mínimo, 7 (36,9%) pessoas referiram uma renda entre 1 a 2 salários, 1 (5,2%) integrante relatou ter renda entre 2 a 3 salários, 2 (10,6%) participantes mencionaram renda de 3 a 4 salários, 1 (5,2%) informou renda de 4 a 5 salários e 1 individuo (5,2%) possuía renda superior a 5 salários mínimos.

Os dados revelaram que a população em estudo se caracterizava em maioria por pessoas idosas, de baixa escolaridade, aposentados, com renda familiar entre 1 a 2 salários mínimos. Estudos apontam maior prevalência de feridas crônicas em pessoas que estão na terceira idade e possuem baixa renda familiar12.

A totalidade de feridas observadas foi de 34 (100%) lesões crônicas, com tempo de duração variante entre 3 meses e 18 anos, média de 9,2 anos, sendo que 90% da amostra possuíam mais de uma ferida, com frequentes reincidivas.

Por se tratarem de feridas crônicas, verificou-se que, geralmente os portadores da lesão utilizavam a mesma terapia tópica anteriormente usada para tratar a ferida, e quando esta reincidia, não havia uma nova avaliação da pessoa e da lesão propriamente dita, e a implementação de nova terapêutica.

Nesse sentido, a utilização excessiva de certos produtos sem uma nova avaliação da ferida que reincidiu propicia um tratamento ineficaz, que pode interfere no tempo de permanência da lesão4,8.

Limpeza da ferida

Outro fator indispensável é a limpeza da ferida, sendo este o momento em que os corpos estranhos e micro organismos devem ser retirados, o excesso de exsudato removido, os resquícios de produtos anteriormente aplicados extraídos e a promoção de um meio mais propício à cicatrização pode ser alcançada8. Nesse momento podem ser observadas as características da lesão quanto à extensão, profundidade, tecido presente no leito e presença ou não de exsudato4.

Os fluídos utilizados na limpeza da ferida foram divididos entre água da torneira com 3 (15,8%) usuários, água e sabão utilizados por 7 (36,9%) pessoas, água, sabão e solução fisiológica 0,9% (SF) usados por 3 (15,8%), água e outros com 2 (10,5%) usuários, soro fisiológico (SF) citado por 3 (15,8%), e preparados fitoterápicos utilizados por 1 (5,2%), de acordo com a tabela 2.

 

 

Predominou entre os participantes da amostra a utilização de água e sabão na limpeza das feridas. Esse fato pode ser justificado pelo custo benefício, já que os curativos eram realizados em maioria nos domicílios.

Sabe-se hoje que para a maioria das feridas apenas a água em temperatura ambiente é suficiente para lavá-las, não sendo necessária a utilização de soluções isotônicas, como a solução fisiológica 0,9%, já que o tempo de permanência da solução na ferida é reduzido8,13.

Embora a água de torneira não possua contra indicações para a limpeza de feridas, devem ser observados fatores como a qualidade de tratamento da água, quantidade de flúor e cloro presentes na mesma, sendo mais adequada a utilização da água fervida13.

O fundamental ao se limpar uma ferida é compreender que a limpeza deve agredir o mínimo possível o leito da lesão e que a presença de certos produtos químicos na água pode desfavorecer o reparo tecidual4,8.

A Solução Fisiológica (SF) 0,9% possui grande disseminação na limpeza de feridas fechadas e abertas, principalmente por ser isotônica, com propriedades que não agridem o tecido da ferida. A SF pode ser utilizada na limpeza mecânica, através do jato de soro, e na aplicação simples da solução sem o jato na ferida, sendo que em feridas abertas com cicatrização por segunda e terceira intenção com presença tecidos desvitalizados recomenda-se o uso de jato de soro5.

Percebeu-se que a SF possuiu baixa utilização pela população amostral, fato que pode ser explicado pelo custo, já que a solução era comprada pelos usuários, e no tempo que efetivou-se a pesquisa, esta solução não era disponibilizada pelas UBSFs. Verificou-se também a utilização de fluídos não recomendados, a limpeza de feridas, como o álcool iodado e o cloreto de magnésio, ambos utilizados por 2 (10,5%) participantes da amostra. O álcool iodado conforme bula do produto, em contato prolongado com a pele íntegra causa irritação moderada, portanto, impróprio à limpeza de tecidos danificados. O cloreto de magnésio não possui comprovação científica de eficácia cicatrizante, sendo este indicado conforme bula a pessoas que possuem deficiência do micronutriente magnésio.

Produtos tópicos utilizados pela amostra

Quanto à utilização de produtos tópicos, os dados demonstraram situação preocupante que infere a utilização de produtos não adequados conforme a características da ferida, e uma possível deficiência na avaliação da lesão por parte do cuidador.

Foi constatada a utilização de 20 (100%) produtos tópicos diferentes, sendo que destes, 1 (5%) era produto absorvente, 2 (10%) epitelizantes, 2 (10%) desbridantes, 7 (35%) antibióticos (ATB) e/ou antifúngicos, 3 (15%) antissépticos, 2 (10%) fitoterápicos e 3 (15%) produtos de outras categorias, (Tabela 3).

 

 

Constatou-se que 65% da população amostral fazia uso de mais de um produto tópico no tratamento das lesões, não havendo, porém, uma interação adequada desses produtos, sendo utilizados produtos desbridantes com epitelizantes, antibióticos com desbridantes e antimicóticos com antissépticos.

A terapia tópica pode favorecer e promover condições locais ideais para viabilizar o processo fisiológico da cicatrização, remover corpos estranhos, proteger a ferida, reaproximar as bordas separadas, diminuir a intensidade da dor, induzindo o fechamento da ferida8. No entanto com a grande diversidade de produtos tópicos existentes, a avaliação da ferida torna-se indispensável, juntamente com a terapia tópica adequada, sendo respeitado assim as características da lesão e de seu portador4,8,11.

Na categoria do produto utilizado, de acordo com o nome das substâncias usadas pelos participantes foram encontrados os seguintes produtos, tabela 4:

 

 

O Alginato de Cálcio é um produto absorvente indicado no tratamento de feridas sangrantes, com exsudato, esfacelo, com ou sem infecção1, fator que se aplicou nesse estudo já que o participante que fazia uso desse produto possuía ferida com essas características. Entretanto, esse tópico não era disponibilizado na UBSF, e o portador da lesão tinha que compra-lo, sendo o custo benefício elevado.

Os produtos epitelizantes AGE e TCM utilizados por 2 (10,6%) participantes, são tópicos destinados ao tratamento de feridas isquêmicas ou diabéticas, lesões com tecido de granulação, com desbridamento prévio, com ou sem infecção e na prevenção de úlceras de pressão14-15. Desta forma, os indivíduos que faziam uso desses produtos possuíam feridas com indicação adequada, pois possuíam feridas com tecido de granulação, sem infecção. Esses membros da amostra compravam os produtos tópicos.

Já os produtos desbridantes indicados para feridas com tecido desvitalizado com ou sem infecção que necessitam de desbridamento10, foram utilizados por 6 (31,6%) membros da amostra. A pomada Colagenase é mais eficaz no desbridamento suave e não invasivo de lesões e a Papaína 2% é mais recomendada na terapia de feridas com tecido de granulação16-17. Assim, os usuários desses produtos não tinham lesão com características apropriadas para a indicação da pomada colagenase, pois prevalecia nestas, o tecido de granulação, no qual seria mais apropriado o uso da papaína, o que não era o caso, já que a papaína 2% estava sendo utilizada em ferida com prevalência de esfacelo. Salienta-se que a pomada Colagenase era fornecida pelas UBSFs.

Na classe dos fitoterápicos foi observado o uso da pomada ou creme Pandermin®, que conforme bula, apresenta-se na forma de creme, com ação cicatrizante, composto predominantemente de ácido hialurônico, indicado apenas o uso cutâneo uma vez ao dia. Também foi citado o uso de um extrato de ervas. O usuário deste não possuía informações sobre as ervas presentes na infusão, já que estas foram indicadas e manipuladas por terceiros.

A fitoterapia é uma terapia alopática incentivada e que esta em estudo por diversas organizações de pesquisa, sendo que esta é a pratica de tratamento que melhor possibilita a participação ativa da comunidade, além de embasar-se no conhecimento tradicional e popular16.

O uso de fitoterápicos na última década expandiu-se globalmente, tornando-se tão popular, que a OMS elaborou uma série de guias e protocolos com o objetivo de definir as metodologias e avaliação da medicina tradicional18.

Porém, deve ser observado que uma mesma planta possui propriedades diferentes, de acordo com o principio ativo que produz em cada uma de suas partes, sendo indispensável conhecer bem a planta antes de sua utilização e imprescindível a orientação de um profissional de saúde especializado16,18.

Entre os produtos antissépticos, foram mencionados o polivinilpirrolidona tópico (PVPI tópico) e o Merthiolate®, que são produtos indicados na desinfecção de pele e mucosas, na inserção de cateteres, introdutores e fixadores externos, com a intenção de prevenir a colonização, sendo contra indicado seu uso em feridas abertas de qualquer etiologia4-5-19. Os antissépticos podem ter efeitos tóxicos e seu uso precisa ser ponderado, pois dependendo da lesão não há vantagens em sua utilização, causando malefícios a cicatrização4.

Os usuários dos tópicos antissépticos foram 3 (15,7%) pessoas, que possuíam feridas com presença de tecido de granulação e áreas com esfacelo, sendo que segundo literatura acima ocorre a inadequação destes produtos para as características das lesões. E, ainda vale ressaltar, que o PVPI tópico era disponibilizado nas UBSFs.

Entre os antibióticos utilizados estão à neomicina, a gentamicina, rifocina e o metronidazol. A neomicina e a gentamicina são aminoglicosídeos ativos contra micro organismos Gram negativos19, indicados para feridas contaminadas4-16. O uso indiscriminado desses produtos deve ser evitado, já que podem promover sensibilizações e resistência do micro organismo4,19.

Entre os 4 (21,0%) participantes que faziam uso de antibióticos apenas um possuía ferida contaminada, com tecido necrótico, sendo que os demais apresentavam feridas com tecido de esfacelo e granulação, o que torna a utilização desses produtos pelos outros usuários impróprios.

A neomicina é um aminoglicosídeo bactericida, que inibe a síntese proteica de bactérias Gram negativas. Apresenta-se na forma de comprimidos, suspensão e pomada tópica. É indicada na prevenção de infecção no trato gastrointentinal e tecidos cutâneos20. A pomada, conforme bula, é indicada para a terapia de uma ampla variedade de infecções locais, causadas por micro organismos, incluindo dermatoses infectadas, queimaduras, infectadas, cortes, úlceras cutâneas, impetigo, furúnculos e otite externa.

A gentamicina é um antimicrobiano que inibe a síntese proteica. Indicada para infecções com Psedomonas aeruginosas, E. coli, Enterobacter, Staphylococcus20. Conforme bula apresenta-se na forma injetável e como pomada oftálmica, indicada para infecções no globo ocular. Não há indicação para tratamento tópico de feridas.

Já a rifocina é um bactericida que pode ser injetável ou de uso tópico. A utilização tópica é indicada para o tratamento de infecções de superfície causadas por micro organismos sensíveis a rifamicina, ou seja, ferimentos infectados, queimaduras, furúnculos, dermatoses infectadas, curativos de feridas pós-cirúrgicas infectadas19. Na classe de antimicrobianos também está o metronidazol, um quimioterápico disponível em solução injetável e tópica, comprimidos, suspensão e gel. Indicado no tratamento de amebíase, giardíase, e trichomoníase, sendo adequado no tratamento de infecções simples e múltiplas19,20,21.

Atualmente o metronidazol tópico é recomendado em feridas oncológicas com esta mesma finalidade, pois seu mecanismo de ação ocorre sobre as bactérias anaeróbicas responsáveis pela produção de ácidos voláteis, causadores do odor, sem as reações adversas do uso oral21.

Um estudo atual feito com metronidazol solução 4% administrado na dose de 50m/Kg/dia em ratos com feridas por cicatrização em segunda intenção sugeriu que talvez o metronidazol tópico não interfira na colonização normal das feridas abertas, não sendo este o mecanismo de ação sobre as feridas com cicatrização por segunda intenção. No estudo citado, o metronidazol facilitou a epitelização periférica precoce, não interferiu na contração da ferida e atrasou o aparecimento dos miofibroblastos. Porém, há poucas pesquisas sobre o emprego do metronidazol tópico em feridas benignas em cicatrização por segunda intenção21.

Os antifúngicos eram usados por 3 (15,7%) integrantes da amostra. No entanto, a indicação desses produtos para a terapia de feridas é controversa, sendo estes produtos inadequados à terapia tópica de feridas abertas e não infectadas por fungos19. Os produtos pertencentes a essa classe citados foram o cetoconazol e a nistatina.

O cetoconazol está disponível na forma de bisnagas, comprimidos, frascos e creme. É indicado para infecções micóticas na pele, couro cabeludo e unhas. Também é eficaz no tratamento da candidíase vaginal, infecções micóticas sistêmicas e candidíase e na forma de xampu para o tratamento da dermatite seborreica19,20.

A nistatina apresenta-se em drágenas, frascos de suspensão é adequada no tratamento e creme vaginal. Esta é indicada para infecções fúngicas no trato gastrointestinal, infecções causadas por Candida albicans oral e vaginal20, não há indicação ao tratamento tópico de feridas abertas.

Outros produtos eram utilizados por 3 (15,7%) participantes, sendo estes o sebo de carneiro, a creolina e a infiltração por corticoide.

O sebo de carneiro, conforme bula de creme que possui esse produto em sua constituição é recomendado na realização de massagens musculares.

Já o produto creolina é utilizado, segundo rótulo de solução que possui este constituinte, para dissolver outros produtos químicos, como desinfetante e na produção de corantes e inseticidas.

A infiltração é um procedimento em que o médico injeta algum medicamento em determinada região do corpo. É muito utilizada em ortopedia, principalmente quando relacionada ao tratamento dos tendões, no tratamento da dor. A mais comum é a infiltração por corticoide e anestésico. Corticoides são inibidores da inflamação e são úteis como injeções intra-articulares (infiltrações), na terapia da artrite reumatoide, gota e bursites22,23. No entanto não há indicação para na terapêutica de feridas abertas e crônicas.

Os produtos antibióticos e antimicóticos eram comprados por seus usuários, já que as UBSFs não dispunham desses produtos.

Sabe-se que existe no mercado uma grande variedade de produtos tópicos destinados ao tratamento de feridas, porém, essa variedade, e os inúmeros fatores que afetam o reparo tecidual, podem dificultar a escolha do produto correto, já que esta depende não só de uma boa investigação semiológica do cliente e da lesão, mas do conhecimento amplo acerca de cada produto pelo profissional de saúde8.

 

Concluções

A utilização predominante e muitas vezes indiscriminada de produtos como antibióticos, antifúngicos e antissépticos leva a ilações preocupantes, já que estes inadequados ao tratamento de feridas crônicas e abertas como o PVPI tópico, o possuía indicações precisas a sua utilização, como os antibióticos.

Compreende-se, portanto, a ocorrência possível de dois fatores: por um lado, pode estar sendo realizada a automedicação pelos portadores de feridas crônicas; ou os profissionais de saúde não souberam por desconhecimento do produto mais adequado ou por inabilidade, indicar a correta utilização dos tópicos.

Esse fator pode ser agravado pela deficiência das UBSFs em disponibilizar os produtos tópicos, já que nestas, verificou-se a distribuição apenas da pomada desbridante Colagenase e do PVPI tópico, o que obrigou 78,5% dos participantes a comprar o produto tópico destinado ao tratamento.

A partir do exposto no estudo percebe-se que muitos dos portadores de lesões crônicas, não estavam fazendo uso adequado dos produtos tópicos conforme as características apresentadas pela ferida, sendo utilizados mais de um produto com associação inapropriada (75%). Assim ressalta-se ser imprescindível haver um conhecimento atualizado por parte do profissional de saúde ao se indicar um produto destinado à terapia de um ferimento.

 

 

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