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Enfermería Global

On-line version ISSN 1695-6141

Enferm. glob. vol.15 n.42 Murcia Apr. 2016

 

CLÍNICA

 

Avaliação antropométrica, pressórica e hematológica de população vegetariana

Evaluación antropométrica, de presión arterial y hematológica de la población vegetariana

An assessment of anthropometric and hematological parameters and blood pressure in vegetarians

 

 

Campos, Fagner Alfredo Ardisson Cirino*; Cheavegatti, Denise** e de Mora, Luiz Henrique***

*Enfermeiro do Centro Universitário Luterano. Especialista em Gestão de Pessoas. Mestre em Psicologia. Servidor Público do Estado do Acre. E-mail: fagneralfredo@hotmail.com
**Enfermeira. Mestre em Enfermagem em Saúde Coletiva. Docente do Centro Universitário São Camilo/SP
*** Biomédico. Especialista em Análises Clínicas e Gestão Hospitalar e Sistemas de Saúde. Docente das Faculdades Integradas de Bauru/SP. Brasil.

 

 


RESUMO

Objetivo: Avaliar os índices antropométricos, valores pressóricos e resultados de análise hematológica de população vegetariana do município de Ji-Paraná, em Rondônia/Brasil.
Método: Trata-se de estudo descritivo e quantitativo, de corte transversal, com amostra composta por 65 vegetarianos.
Resultados: Identificaram-se 61,6% de eutróficos, 69,2% com circunferência abdominal dentro dos parâmetros normais, 92,3% apresentaram níveis pressóricos normais e 26,2% foram classificados como anêmicos. Mais de 60% dos vegetarianos tinham níveis plasmáticos de colesterol (Total e LDL) e cálcio dentro dos parâmetros normais. O mesmo se observou em relação a triglicérides (81,4%), glicemia (96,9%), proteínas totais (93,9%) e albumina (100%).
Conclusão: A alimentação vegetariana diversificada pode proporcionar benefícios à saúde do ser humano.

Palavras chave: Dieta vegetariana; Vegetarianismo; Deficiências nutricionais; Avaliação nutricional; Nutrição de grupos de risco; Nutrição em saúde pública.


RESUMEN

Objetivo: Evaluar los índices antropométricos, los niveles de presión arterial y resultados de análisis hematológicos de la población vegetariana del municipio de Ji-Paraná, Rondônia.
Método: Se trata de un estudio descriptivo y cuantitativo, de corte transversal, con muestra compuesta por 65 personas vegetarianas.
Resultados: Se identificó 61,6% de eutróficos, 69,2% con circunferencia abdominal dentro de los parámetros normales, 92,3% presentaron niveles de presión arterial normales y 26,2% fueron clasificados como anémicos. Más del 60% de los vegetarianos presentaron niveles plasmáticos de colesterol (Total y LDL) y calcio dentro de los parámetros normales. Lo mismo se observó en relación a los triglicéridos (81,4%), glicemia (96,9%), proteínas totales (93,9%) y albúmina (100%).
Conclusión: Se concluye que la alimentación vegetariana diversificada puede proporcionar beneficios a la salud del ser humano.

Palabras clave: Dieta vegetariana; Vegetarianismo; Deficiencias nutricionales; Evaluación nutricional; Nutrición de grupos de riesgo; Nutrición en salud pública.


ABSTRACT

Objective: Evaluate the anthropometric indices, blood pressure levels and hematological analysis results vegetarian population of the municipality of Ji-Paraná, Rondônia.
Method: This descriptive and quantitative cross-sectional study has a sample size of 65 vegetarians.
Results: The results of this study showed that 61.6% of the sample was of normal weight, 69.2% had a waist circumference within normal parameters, 92.3% had normal blood pressure levels and 26.2% were classified as anemic. More than 60% of the vegetarians in this study evidenced normal plasma calcium and cholesterol levels (total and LDL). Normal levels were also observed in relation to triglycerides (81.4%), glucose (96.9%), total proteins (93.9%) and albumin (100%).
Conclusion: The conclusion of the study states that a diverse vegetarian diet can provide health benefits for humans.

Key words: Vegetarian diet; Vegetarianism; Nutritional disorders; Nutrition assessment; Vulnerable populations.


 

Introdução

A ciência não sabe precisar as circunstâncias e o momento em que o homem inseriu a alimentação vegetariana em seu contexto social. Defensores do criacionismo amparam-se no relato histórico-religioso dos livros do Pentateuco bíblico, os quais demonstram que a alimentação vegetariana seria originada com os progenitores da raça humana. Contestando, os evolucionistas defendem que a inserção de proteínas animais na dieta do homem pré-histórico (Australopithecus afarensis) que favoreceu o desenvolvimento de seu cérebro e que os ancestrais do homem moderno eram carnívoros - caçadores-coletores. Na atualidade, o vegetarianismo é caracterizado como uma dieta, ou filosofia de vida, que influencia cidadãos nos diferentes continentes(1,2,3).

É considerado vegetariano aquele que não ingere carne em sua dieta, podendo incluir ovos e derivados do leite. Conforme a inclusão ou exclusão dos ovos e produtos lácteos, os vegetarianos agrupam-se em: ovolactovegetarianos (ingerem ovos e derivados do leite), ovovegetarianos (consomem ovos), lactovegetarianos (ingerem leite e derivados) e vegetarianos estritos ou veganos (não ingerem nenhum derivado animal)(4).

Seguir um estilo de vida vegetariano pode melhorar a qualidade de vida, visto que parece ocorrer menor incidência de cardiopatias isquémicas, obesidade, diabetes mellitus tipo 2, osteoporose, acidente vascular encefálico, doença de Parkinson, hipercolesterolemia e alguns tipos de câncer, segundo estudos(5,6).

Entretanto, outros estudos apontam riscos e prejuízos à saúde, quando a alimentação vegetariana é desbalanceada ou muito restritiva em alimentos derivados de animais ou até mesmo vegetais. Dentre os riscos, estão a ocorrência de anemia ferropriva e megaloblástica, ocasionadas respectivamente, pela deficiência nutricional de ferro e cobalamina (vitamina B12) (7,3,5,8,9).

O presente estudo objetivou avaliar os índices antropométricos, valores pressóricos e resultados de análise hematológica de população vegetariana do município de Ji-Paraná, em Rondônia/Brasil.

 

Material e métodos

Tratou-se de um estudo descritivo, transversal e com abordagem quantitativa, realizado com população vegetariana de Ji-Paraná, segundo maior município do estado de Rondônia, com cerca de 116.600 habitantes, localizado na Amazônia Ocidental(10). Os participantes do estudo foram buscados entre os evangélicos adventistas, religião com cerca de 5 mil adeptos no município, distribuídos em 30 igrejas.

Em virtude da dificuldade de acesso a esse público, partiu-se da mesma lógica utilizada em outros estudos, com amostragem de conveniência, aliada à estratégia "bola de neve". Foram selecionados apenas indivíduos que não ingeriam nenhum alimento cárneo e incluídos aqueles que compareceram na data agendada para a coleta de dados, resultando em amostra de 65 vegetarianos.

Atendendo ao rigor ético, o projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do Ceulji/Ulbra, sob o protocolo 040/11 e a coleta de dados sucedeu-se após assinatura de Termo de Consentimento e Livre e Esclarecido pelos participantes ou responsáveis, no caso de menores.

Os dados foram coletados entre os meses de agosto e setembro de 2011, no Ambulatório de Enfermagem da instituição onde foi realizada a pesquisa, pela aplicação de um questionário e coleta de 8 mililitros de sangue por enfermeiros, sendo que os voluntários foram orientados a permanecer em jejum por 12 horas. O sangue foi armazenado em um tubo de ensaio seco e um tubo com EDTA (Ethylenediaminetetraacetic acid), ambos com 4 mililitros e encaminhados para a análise no Laboratório de Bioquímica da mesma instituição.

Para a coleta dos parâmetros antropométricos, fundamentou-se nas normas e orientações técnicas da Vigilância Alimentar e Nutricional(11), utilizando-se balança mecânica e calibrada, de marca Welmy, fabricada em 2004.

O IMC foi calculado conforme a fórmula IMC=P(Kg)/altura(m)2 e os valores foram classificados segundo a Organização Mundial da Saúde, para adultos(12). Para as crianças e adolescentes, utilizaram-se os parâmetros propostos pelo Ministério da Saúde Brasileiro para esse cálculo(13,14,15).

A circunferência abdominal (CA) foi obtida na menor curvatura entre a crista ilíaca ântero-posterior e última costela torácica, utilizando uma fita inelástica e flexível, graduada em 0,1 centímetros. Adotaram-se os pontos de corte preconizados por Lean e colaboradores para os adultos, de acordo com o grau de risco para doenças cardiovasculares(16). Para as crianças e adolescentes, utilizou-se o estudo americano como parâmetro para os cortes(17).

A pressão arterial (PA) foi verificada em conformidade com as normas propostas pela Organização Pan-americana da Saúde(18) e foram adotando os parâmetros propostos pela Sociedade Brasileira de Cardiologia(19), para adultos. Para crianças e adolescentes, usaram-se os cortes propostos pela Sociedade Brasileira de Pediatria(20).

Para os parâmetros hematológicos, buscaram-se fontes confiáveis para os valores de corte, avaliando-se conforme idade e sexo, quando coerente(21,22,23,24,25,26).

Para a tabulação dos dados utilizaram-se os Softwares Epidata 3.1 e SSPS 16.0, aplicando-se estatística descritiva.

 

Resultados

Caracterização dos vegetarianos

Dos 65 voluntários que participaram a pesquisa, 50,8% eram do sexo masculino (38,8±22,1 anos) e 49,2%, do feminino (38,9±17,3 anos). O tempo médio de adoção do vegetarianismo para mulheres e homens, foi respectivamente, 16,3 anos e 14,5 anos.

Quanto à religião, 52,3% dos sujeitos eram Adventistas do Sétimo Dia, 44,6% Adventistas da Reforma e os demais (3,1%) pertenciam a outras denominações religiosas.

Quanto ao subgrupo vegetariano a que pertenciam, 75,4% eram ovolactovegetarianos, 9,2% veganos e ovovegetarianos (cada um) e 6,2% lactovegetarianos.

Ainda quanto ao estilo de vida, identificou-se que 100% dos sujeitos pesquisados não eram tabagistas, 96,9% não ingeriam álcool, 73,8% realizavam atividades físicas, predominando a caminha (46,1%) e 72,3% daqueles que realizavam exercícios físicos, referiram periodicidade igual ou superior a três vezes semanais. Ademais, a maioria (86,3%) referiu dormir mais de 8h por dia.

Morbidade dos vegetarianos - Diabetes Mellitus e Hipertensão Arterial

Para levantamento da morbidade dos vegetarianos, avaliaram-se a pressão arterial, a glicemia sérica e os antecedentes mórbidos referidos pelos mesmos. Quanto à pressão arterial, a grande maioria (92,3%) apresentou níveis pressóricos dentro do padrão de normalidade.

Não foi referido diagnóstico de diabete pelos vegetarianos estudados, dado que foi confirmado pela avaliação da glicemia sérica dos mesmos, na qual 96,9% apresentaram valores abaixo de 100mg/dL e apenas dois (3,1%) apresentaram valores entre 100 e 125mg/dL (tolerância reduzida à glicose), os quais foram 101mg/dL e 102mg/dL.

Antropometria dos vegetarianos

Evidenciou-se que 61,6% dos vegetarianos foram classificados como eutróficos, 29,2% tinham sobrepeso ou excesso de peso e apenas dois eram obesos grau I. A CA foi adequada na maioria dos vegetarianos (69,2%) e 46,8% das mulheres foram classificadas com risco aumentado e muito aumentado para o desenvolvimento de doenças cardíacas.

 

 

Perfil hematológico e bioquímico dos vegetarianos

Para avaliar a anemia, utilizaram-se de indicadores hematimétricos, a partir dos quais se pode identificar que as hemácias, hemoglobinas e hematócritos, estavam abaixo do valor normal esperado em, respectivamente, 18,5%, 26,2% e 23,1% da população estudada.

Pelo volume corpuscular médio (VCM), evidenciou-se que a totalidade dos vegetarianos apresentaram boa proporção entre hematócritos e eritrócitos. A hemoglobina corpuscular média (HCM) estava dentro do padrão para 98,4% dos vegetarianos. A concentração de hemoglobina corpuscular média (CHCM) foi normal em 96,8% dos vegetarianos.

 

 

A análise do perfil lipídico da população estudada demonstrou que os vegetarianos estudados apresentaram colesterol total (67,6%) e LDL-colesterol (69,2%) dentro dos padrões normais, como também uma elevada quantidade de HDL-colesterol (78,3%). Assim como 81,4% dos vegetarianos estavam com triglicérides normais.

 

 

Também se avaliou o micronutriente cálcio, sendo que 61,5% dos vegetarianos estudados apresentaram níveis séricos dentro dos parâmetros normais. A hipocalcemia apareceu em 23,1% dos vegetarianos estudados e a hipercalcemia foi apresentada em 15,4% dos vegetarianos. As proteínas totais estavam dentro dos parâmetros normais em 93,9% dos vegetarianos e a albumina sérica foi normal em 100% dos vegetarianos.

 

 

Discussão

O presente estudo apresentou aspectos limitantes em relação à população estudada, visto que ela é bastante limitada, o que tornou necessária a utilização de amostragem por conveniência aliada à estratégia bola de neve.

A classificação dos vegetarianos quanto ao seu padrão alimentar foi outro fator limitante, pois os vegetarianos que participaram do estudo apresentaram dificuldade em definir o seu padrão alimentar, fato que precisou da intervenção dos pesquisadores e sugeriu pouco conhecimento sobre nutrição.

O presente estudo também evidenciou que a opção pelo vegetarianismo não é suficiente para mudança qualitativa na alimentação, visto que esta opção não implica, necessariamente, em uma dieta saudável(27). Apesar dos vegetarianos restringirem carnes e seus derivados não foram avaliados a predisposição desses indivíduos ao descontrole alimentar.

A predominância de adventistas entre os vegetarianos estudados é explicada, pois a seleção dos sujeitos iniciou-se dentro destas igrejas. Os evangélicos adventistas são conhecidos mundialmente por disseminarem conceitos sobre vida saudável, através de clínicas, escolas e hospitais e têm sido comumente sujeitos de pesquisas, devido ao seu estilo de vida ser diferenciado da população geral e facilidade por reunir a população vegetariana neste meio(1).

As vertentes vegetarianas mais identificadas nos estudos científicos são ovolactovegetarianos, veganos e ovovegetarianos(28). Além disso, o estudo(29) identificou maior frequência de adeptos à dieta ovolactovegetariana, o que é confirmado no presente estudo, em que 75,4% dos vegetarianos eram ovolactovegetarianos.

Alguns estudos levantam a hipótese de que o consumo da carne possa elevar a pressão arterial, visto que vegetarianos apresentam valores mais baixos de pressão arterial e menor incidência de hipertensão(28,30,31). No presente estudo, houve prevalência inferior a 7,7% de vegetarianos hipertensos, achado inferior em outro estudo, que identificou a prevalência de 13,2% de hipertensos entre 106 sujeitos vegetarianos(32). Para a literatura, o potássio é um micronutriente que pode proporcionar vasodilatação, este está presente em vegetais e frutas e que pode influenciar na prevenção ou controle da hipertensão arterial. O potássio costuma ser amplamente ingerido na alimentação vegetariana(31).

Segundo Parente(28), os vegetarianos comumente apresentam valores normais de glicemia e baixa incidência de diabetes mellitus tipo 2, devido à alimentação rica em fibras, a qual teria potencial de reduzir os índices glicêmicos. O presente estudo, que não evidenciou nenhum diabético entre os vegetarianos, reforça essa afirmação. Em vários estudos identificaram-se que o IMC médio dos vegetarianos encontrava-se dentro do padrão normal(29,33,34), de forma condizente com o presente estudo, onde houve predominância de eutróficos.

Dourado(33) demonstrou dados bastante semelhantes com os vegetarianos do estudo exposto nesse trabalho, identificando que entre os ovolactovegetarianos estudados por ela, 62% foram classificados como eutróficos, 31% acima do peso e 6,2% desnutridos.

Como no presente estudo houve o predomínio de adeptos ao ovolactovegetarianismo (que ingerem ovos e derivados do leite, ricos em gorduras saturadas e colesterol), sugere-se que estes alimentos possam estar relacionados à evidência de sobrepeso e obesidade entre os vegetarianos estudados (32,2%), junto ao fato de esse grupo ingerir maiores quantidades de energia (carboidratos) que os não-vegetarianos(33). Em outros estudos, os veganos apresentaram menores IMC, quando comparados aos demais grupos vegetarianos e não-vegetarianos(34,35). A diferença pode estar relacionada ao reduzido número de veganos na amostra.

A CA adequada na maioria dos vegetarianos é um parâmetro favorável, pois a gordura visceral está associada à possibilidade de desenvolvimento de hiperinsulismo, cardiopatias e hipertensão arterial, independente do valor obtido no IMC(18).

A anemia é uma patologia comumente relacionada ao vegetarianismo, principalmente em lacto e ovolactovegetarianos, devido à biodisponibilidade do ferro inorgânico presente nos alimentos vegetais e interação entre ele e outros micronutrientes (principalmente o cálcio e zinco) e antinutrientes(8,9).

Estudo realizado com ovolactovegetarianos e não-vegetarianos de uma instituição adventista de Minas Gerais (Brasil), os quais foram submetidos a dieta ovolactovegetariana, evidenciou alta prevalência de anemia na população estudada (56 indivíduos), na qual 70% estavam anêmicos, havendo maior frequência no sexo feminino(8). Contradizendo estes dados, no presente estudo houve maior frequência de anemia no sexo masculino (hemoglobina e hematócritos inferiores ao esperado, respectivamente, 39,3% e 33,3%), incidente não evidenciado nos estudos com população vegetariana a que se teve acesso.

Como o VCM não foi inferior ao normal esperado, no presente estudo, pois 100% dos vegetarianos tiveram esse indicador hematológico dentro da normalidade, é sugestivo que o organismo vegetariano possua decréscimo nas concentrações séricas de hemoglobinas sem comprometer as suas funções fisiológicas, sendo erroneamente classificados como anêmicos, fato que pode ser explicar pela adaptação dos organismos vegetarianos em relação ao aumento da absorção de ferro e sua menor excreção(9).

A quantidade e composição das gorduras presentes na alimentação podem interferir no perfil lipídico dos indivíduos, apesar dessa hipótese suscitar divergência entre os pesquisadores(35). Para o Conselho Federal de Nutrição(36), a gordura saturada é essencial para o funcionamento do organismo humano, desde que não consumida em abundância. Ainda, tal conselho considera perigosas à saúde as gorduras saturadas provenientes do óleo de coco, carne, leite e derivados.

Para pesquisadores da área da nutrição, há evidência científica que demonstra associação fraca entre a restrição de ovos na dieta e a possível redução de eventos cardiovasculares, não sendo necessária a restrição de tal alimento na dieta(37). Entretanto, questões acerca do consumo de ovos, ainda dividem opiniões na comunidade científica(38).

Na presente pesquisa, por haver 78,3% de vegetarianos com HDL (Lipoproteína de Alta Densidade) elevado, é sugestivo que as HDL estão efetivamente levando o colesterol ligado a elas para serem degradados no fígado(34). Fato que pode proporcionar a prevalência de resultados normais e limítrofes, em relação ao colesterol total, LDL (Lipoproteína Baixa Densidade) e triglicérides, resultando em um bom perfil lipídico dos vegetarianos.

É interessante ressaltar que como 81,4% dos vegetarianos apresentaram triglicérides dentro dos padrões normais, indica-se que não esteja sendo armazenada excessiva energia nesses organismos (em forma de triglicerídeos), o que pode decorrer dos indicadores antropométricos e da alimentação pobre em gorduras saturadas(34). Além disso, quando os triglicérides estão dentro dos limites esperados, há menor probabilidade de evento cardiovascular, posto que eles são associados a risco independente para patologia coronária, quando encontrados em valores superiores aos limites estabelecidos(25).

Em estudo(35) houve decréscimo nos níveis séricos de colesterol total e LDL, conforme a restrição alimentar nos vegetarianos.

A dieta vegetariana pode proporcionar o aporte adequado do micronutriente cálcio ao organismo humano. Os lacto e ovolactovegetarianos possuem ingestão desse nutriente semelhante à dos não-vegetarianos. Entretanto proteínas animais favorecem a perda urinária desse mineral, por serem ricas em aminoácidos sulfurados(3,31). No presente estudo, 61,4% dos vegetarianos apresentaram esse micronutriente em normalidade no plasma sanguíneo, o que é esperado para ovolactovegetarianos. Estudo europeu que comparou o cálcio sérico e outros nutrientes entre vegetarianos e não-vegetarianos, constatou que eram semelhantes, visto que vegetarianos obtiveram médias de 8,8 x 103/mm3 e não-vegetarianos, 9,0x103/mm3. Tal estudo diferencia-se dos demais por ser realizado com população idosa, mais propensa a deficiência nutricional (principalmente em micronutrientes como cálcio, ferro e B12), o que não foi constado para a variável cálcio, independente da opção alimentar(39).

A hipocalcemia pode se causada por má absorção, devido à quelagem pelo ácido fítico, oxalatos, fosfatos e fibras (componentes abundantes na dieta vegetariana)(1,9) e foi evidenciada em 23,1% dos vegetarianos estudados na presente pesquisa. A hipercalcemia, no entanto, pode estar relacionada à excreção inadequada de cálcio, ocasionada por insuficiência nas supra-renais e nas patologias renais. A ingesta excessiva desse mineral e alguns medicamentos também podem aumentar os níveis plasmáticos(25), variáveis que não foram verificadas no presente estudo.

O presente estudo denota, pela a análise da proteína total e frações, que a alimentação vegetariana é capaz de suprir as necessidades protéicas de um indivíduo, garantindo a retenção do nitrogênio no organismo humano. A soja é uma boa fonte protéica para os vegetarianos, sendo que sua proteína se aproxima à da carne e os vegetarianos adeptos das vertentes ovo e lactovegetariana ingerem proteína de alto valor biológico presente na clara do ovo(1). Sabe-se que para se obter o aporte protéico diário é necessário a combinação de vários grupos de alimentos (principalmente leguminosas e oleaginosas) durantes as refeições diárias(4).

A albumina sérica foi normal em todos os vegetarianos estudados, o que é um indicador de boa nutrição dos vegetarianos(12), o que corroborou com o IMC da maioria dos vegetarianos, classificados como eutróficos. Em relação da albumina sérica, o estudo constatou semelhança em seu estudo, onde vegetarianos obtiveram 3,9 g/dl e não-vegetarianos 3,7g/dl, valores dentro do padrão normal considerado pelos os pesquisadores(39).

 

Conclusões

Conclui-se esse trabalho notando-se que entre os vegetarianos estudados, mesmo ocorrendo sobrepeso, aumento da circunferência da cintura, do colesterol (total e LDL) e até mesmo dos triglicerídeos, houve resultados benéficos em relação a baixos níveis glicêmicos e de pressão arterial, o que não é demonstrado em estudos com não-vegetarianos, nos quais, conforme aumentam as primeiras variáveis, ocorre aumento da resistência periférica à insulina e dos níveis pressóricos.

Também, não foi evidenciada expressiva deficiência nutricional em relação aos macronutrientes e micronutrientes dosados, mas ressalta-se a importância de que profissionais da saúde prescrevam ou indiquem, além da associação correta entre os alimentos, para diminuir a possibilidade de quelagem, a utilização de panela de ferro aos vegetarianos, como medida preventiva, além de orientarem-nos quanto ao planejamento de sua alimentação de forma equilibrada, procurando o nutricionista, sempre que possível.

O estudo sugere ainda, que a alimentação predominantemente vegetariana, aliada a um estilo de vida saudável, pode proporcionar um padrão ótimo de saúde, refletindo nos indicadores antropométricos e bioquímicos. Achados relevantes para que os profissionais de saúde e formuladores de políticas públicas, possam programar ações estratégicas, com foco na prevenção de doenças e promoção da saúde, que incentivam a mudança de comportamentos nocivos relacionados ao estilo de vida, em grupos ou populações de alto risco para obesidade, cardiopatias, dislipidemias, diabetes mellitus e hipertensão arterial.

Considera-se ainda, a necessidades de realização de mais estudos com população vegetariana brasileira, os quais contribuam para contestar ou validar os resultados levantados no presente estudo.

 

 

Recebido: 02 de fevereiro de 2015;
Aceito: 17 de abril de 2015

 

 

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