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Enfermería Global

On-line version ISSN 1695-6141

Enferm. glob. vol.15 n.44 Murcia Oct. 2016

 

REVISIONES

 

Expressões da violência institucionalizada ao parto: uma revisão integrativa

Expresiones de violencia institucionalizada en el parto: una revisión integradora

Expressions of violence institutionalized the birth: an integrative review

 

 

Cassiano, Alexandra do Nascimento; Santos, Milena Gabriela dos; Santos, Flávia Andréia Pereira Soares dos; Holanda, Cristyanne Samara Miranda de; Leite, Jovanka Bitenkout Carvalho; Maranhão, Tercia Maria de Oliveira e Enders, Bertha Cruz

Universidade Federal do Rio Grande do Norte. E-mail: anc_enfa@hotmail.com Brasil.

 

 


RESUMO

Este estudo teve por objetivo sintetizar a produção científica publicada em artigos acerca das formas de violência institucionalizada que ocorrem durante o parto. Trata-se de uma revisão integrativa realizado nas bases SCIELO, SCOPUS, PUBMED e LILACS com utilização dos descritores "Childbirth AND "Parturition" AND "Obstetric" AND "Violence". Foram selecionados 13 artigos depois de atendidos os critérios de inclusão e exclusão. Da análise dos estudos emergiram cinco categorias, a saber: violência institucional nas relações de poder; violência institucional com o corpo feminino; violência institucional através da comunicação; violência institucional na forma de serviço; e a violência institucional como violação de direitos. Apesar da produção científica acerca do tema estar em ascensão, o quantitativo de estudos realizados ainda é incipiente e de baixo nível de evidência científica.

Palavras-chave: Obstetrícia; Parto; Violência.


RESUMEN

Este estudio tuvo como objetivo sintetizar la literatura científica publicada en artículos sobre las formas de violencia institucionalizada que se producen durante el parto. Se trata de una revisión integradora realizada en bases SCIELO, SCOPUS, PubMed y LILACS, utilizando los descriptores Childbirth AND "Parturition" AND "Obstetric" AND "Violence". 13 artículos fueron seleccionados tras atender los criterios de inclusión y exclusión. Del análisis de los estudios emergieron cinco categorías, a saber: violencia institucional en las relaciones de poder; violencia institucional al cuerpo femenino; violencia institucional a través de la comunicación; violencia institucional en la modalidad de servicio; y violencia institucional como una violación de los derechos. A pesar de que la literatura científica sobre el tema va en aumento, la cantidad de estudios es todavía incipiente y bajo el nivel de evidencia científica.

Palabras clave: Obstetricia; Parto; Violencia.


ABSTRACT

This study aimed to synthesize the scientific literature published in articles about forms of institutionalized violence that occur during childbirth. It is an integrative review conducted in SCIELO, SCOPUS, PUBMED and LILACS bases using the descriptors "Childbirth AND" Parturition "AND" Obstetric "AND" Violence ". 13 articles were selected after meeting the criteria for inclusion and exclusion. Five categories emerged from the studies' analysis: institutional violence in the power relationships; institutional violence to the female body; institutional violence through communication; institutional violence in the form of service; and institutional violence as a violation of rights. Although the scientific literature on the subject be improving, a number of studies is still incipient and with a low level of scientific evidence.

Keywords: Obstetrics; Parturition: Violence.


 

Introdução

Até o século XIX os partos eram em sua maioria realizados em ambiente domiciliar. No entanto, a partir do século XX, vivenciou-se a institucionalização do ato de parir, e este evento passou a ocorrer em ambiente hospitalar sob a responsabilidade médica. A partir de então, houve avanços na analgesia, no controle de hemorragias, na descoberta de antibióticos e nas técnicas cirúrgicas, fato que ampliou o saber médico na perspectiva de contribuir para a redução da mortalidade materna e fetal. Apesar disso, tais avanços não conseguiram minimizar a problemática da insatisfação feminina no que se refere a uma assistência humanizada e a promoção da autonomia sobre seu próprio corpo(1).

Nas últimas décadas, o Brasil buscou uma reorganização das políticas públicas de saúde da mulher, a fim de direcioná-las ao desenvolvimento do protagonismo da parturiente durante o parto. Dentre os avanços estão o Programa de Humanização do Pré-natal e Nascimento (PHPN); e, mais recentemente, o surgimento da Rede Cegonha (RC), como ferramenta que preza pela humanização e qualificação da assistência ao binômio, dentro do contexto do Sistema Único de Saúde (SUS)(2,3).

Mesmo com melhorias consideráveis na atenção a saúde da mulher no país, ainda se percebe que a violência institucional praticada contra parturientes e o elevado número de cesáreas são fortes indicadores de que a assistência ao parto necessita de um olhar crítico-reflexivo por parte dos governantes e dos profissionais da saúde, no intuito de possibilitar a mulher, uma experiência humanizada, satisfatória e segura(4).

A violência institucionalizada ao parto vem sendo associada à precarização do sistema de saúde, aos reduzidos investimentos em maternidades, a conduta pouco ética e desrespeitosa dos profissionais, a utilização indiscriminada da amniotomia, episiotomia, ocitocina sintética, toques vaginais repetitivos, indicação de cesáreas desnecessárias e a utilização de palavras e expressões irônicas direcionadas a mulher durante o trabalho de parto(5,6), sendo denunciada desde a década de 1980 por movimentos feministas e alvo de pesquisas acadêmicas a partir 1990(7).

Diante da problemática, o presente estudo tem o objetivo de sintetizar a produção científica publicada em artigos acerca das formas de violência institucionalizada que ocorrem durante o parto. O trabalho tem justificativa pautada na realidade de que há escassez de estudos que abordem a temática, na perspectiva de ressaltar a importância de estudos que abordem a violência institucionalizada ao parto, haja vista que a temática merece maior enfoque das produções científicas nacionais e internacionais, pois, trata-se de uma realidade cruel e cotidiana que fere o direito e a dignidade da mulher.

 

Metodologia

Estudo do tipo revisão integrativa, a qual tem o intuito de buscar, avaliar criticamente e sintetizar evidências disponíveis sobre um tema investigado. Esse Método de pesquisa contempla cinco passos, os quais sejam: 1) identificação da questão de pesquisa, 2) busca na literatura, 3) avaliação dos dados, 4) análise dos dados e 5) apresentação dos Resultados(8).

Neste estudo, a questão norteadora foi: Qual a produção científica publicada em artigos acerca das formas de violência institucionalizada que ocorrem durante o parto?.

A busca foi realizada no mês de agosto de 2014, na Scientific Eletronic Library Online (SCIELO) e nas seguintes bases de dados: SCOPUS, National Library of Medicine and Nattional Institutes of Health (PUBMED) e na Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS).

Os descritores controlados identificados no Medical Subject Headings (MESH) foram Childbirth, Parturition, Obstetric, Violence. Estes foram utilizados nos seguintes cruzamentos utilizando o booleano AND: Childbirth AND Violence; Parturition AND Violence; Obstetric AND Violence.

 

 

Os critérios para a inclusão das publicações foram: artigos que abordaram a violência institucionalizada ao parto, sendo estes artigos originais, revisões de literatura, reflexivos e de opinião; publicados nos anos 2003 a 2013, a fim de analisar a publicação científica a cerca do tema nos últimos 10 anos; disponíveis na íntegra, gratuitos, em língua portuguesa, inglesa ou espanhola. Como critérios de exclusão: trabalhos de monografia, dissertação, tese, resumos, artigos publicados em eventos científicos, editoriais e cartas ao editor. A figura a seguir apresenta as etapas de seleção dos artigos que compõe a revisão.

A qualidade dos estudos foi analisada segundo a classificação dos níveis de evidência científica, a qual correlaciona o delineamento Metodológico do estudo com a força de evidência científica da produção(9).

Através da leitura foram identificados os eventos e/ou elementos que caracterizassem as formas de violência institucionalizada que ocorrem durante o parto, os quais foram agrupados por semelhança de conteúdos, emergindo as categorias apresentadas nos resultados.

 

Resultados

Mediante a aplicação dos cruzamentos foram encontrados os seguintes artigos: Childbirth AND Violence (SCIELO=21); Parturition AND Violence (LILACS=07; PUBMED=45; SCOPUS=32); Obstetric AND Violence (SCIELO=15; LILACS=29; PUBMED=343; SCOPUS=329), totalizando 821 publicações.

Depois de concluída a etapa de coleta de dados, os autores procederam com a pré-seleção dos artigos através da leitura dos resumos de todos artigos. Posteriormente, os artigos pré-selecionados foram lidos na íntegra, sendo ainda, aplicado os critérios de inclusão e exclusão. Ao final, obteve-se uma amostra de 13 artigos, dos quais cinco eram da SCIELO, dois da LILACS, um da PUBMED e cinco da SCOPUS.

Os artigos analisados pela presente revisão integrativa estão dispostos no quadro 01, de modo a serem distribuídas as informações referentes à identificação ordinal do manuscrito, ano e local de publicação, referência, nível de evidência e tipo de estudo dos artigos.

 

 

Com a presente revisão integrativa, verificou-se que a publicação de trabalhos acerca do tema teve produção ascendente a partir do ano de 2009, com maior incidência nos anos de 2009 e 2012. Estas estão concentradas na América Latina, com número significativo de artigos no Brasil, seguido da Venezuela, Argentina e Cuba. Os estudos enquadram-se nos níveis VI e VII de evidência científica, os quais correspondem a pesquisas quantitativas descritivas, qualitativas e artigos de opinião.

Do mesmo modo, constatou-se o pequeno número de publicações referentes ao assunto e a inexistência de descritores específicos ao mesmo, além da indisponibilidade de artigos publicados em outros países de língua inglesa de forma gratuita.

O quadro 02 apresenta a categorização das violências que ocorrem no parto com seus respectivos artigos fontes, bem como o detalhamento dos principais pontos de caracterização das mesmas. Assim, a partir da análise emergiram cinco núcleos, a saber: violência institucional nas relações de poder, violência institucional com o corpo feminino, violência institucional através da comunicação, violência institucional na forma de serviço e a violência institucional como violação de direitos.

 

 

Discussão

A abordagem da violência institucional nas relações de poder teve grande destaque na presente revisão, sendo a associação entre violência e poder, um núcleo temático discutido em todos os artigos analisados.

A passividade do ser mulher construída socialmente; o baixo nível educacional; o preconceito racial, principalmente, com negras e nordestinas; e o poder aquisitivo das mulheres foram considerados por alguns estudos como condições que influenciaram a ocorrência da violência ao parto(10,11,l2,13,14,15).

Nos serviços públicos de saúde do Brasil a violência institucional ao parto é determinada pela violência de gênero, que transforma diferenças em desigualdades; e por uma relação hierárquica, na qual a paciente é tratada como um objeto e não como sujeito de seus próprios atos e decisões sobre o que lhe acontece(14). Dominação possibilitada pelo poder simbólico atribuído ao conhecimento científico da medicina.

A autoridade técnica-científica é a fonte do poder médico, a qual pauta-se em dois pilares: a legitimidade científica de seus conhecimentos e a dependência dos sujeitos em relação a estes conhecimentos. Dependência justificada pela importância da saúde para todos, e pelo fato de que a não obediência à autoridade médica pode resultar em danos à saúde(16).

O poder é uma forma de ação sobre a ação dos outros, a qual é exercida através das relações em sociedade e onde o sujeito submete-se às condutas prescritas pelos profissionais de saúde(17,18). Nesta perspectiva, a medicina moderna tem adotado tal lógica nas práticas direcionadas à mulher, principalmente no contexto hospitalar, colocando-a como sujeito passivo de suas intervenções(17).

Historicamente, a obstetrícia e a ginecologia se dedicaram ao controle do corpo feminino sob o ponto de vista androgênico, ou seja, seu saber e formas de intervenção são eminentemente masculinos(10). Além disso, a classe é exercida em sua maioria por profissionais do sexo masculino e por mulheres que tendem a incorporar atitudes e saberes da categoria a qual pertencem(10). Tal assimetria constata que as relações de gênero não existem somente entre homens e mulheres, mas, situam-se igualmente entre mulheres, igualadas na condição feminina, mas desigualadas pelo intercruzamento de raça e de classe social(10,14).

Portanto, considera-se que as mulheres estão em uma dupla relação de poder, como pacientes e como pessoas do sexo feminino, a qual soma-se a descriminação racial, socioeconômica e a tolerância da violência como uma prática que dispensa a impunidade daqueles que à cometem(14).

Outra categoria bem representada foi à violência institucional com o corpo feminino, cujas evidências foram citadas em todas as publicações. De forma geral, os relatos das mulheres que vivenciaram esse tipo de agressão, expressam sentimentos de constrangimento, falta de privacidade, dor e passividade perante a manipulação desrespeitosa do seu corpo.

Nos estudos, sobressaíram as queixas quanto ao uso do toque vaginal, feito, por vezes, sem respeito à privacidade da mulher, de forma frequente e por múltiplos examinadores, seja em um mesmo momento ou com intervalos de tempos pequenos(10,11,13,14,19,20,21). O uso indiscriminado da técnica chega ao ponto de às mulheres não conseguirem enumerar os toques recebidos durante o período do pré-parto(15).

A episiotomia e epsiorrafia desnecessárias foram citadas como intervenções traumáticas e dolorosas, mesmo com o uso da anestesia, sendo inclusive, consideradas como medidas que iatrogenizam o parto(12,13,15,22). A utilização da técnica tem sido realizada sem um enfoque seletivo e criterioso, mesmo diante de desvantagens que a prática promove como a perda sanguínea e o maior risco para infecções e lacerações perineais severas(23).

Com frequência, as mulheres referem à prescrição da "injeção de força" e relatam que os profissionais "subiram na barriga para ajudar a criança a nascer"(10,14). Ações que correspondem à utilização abusiva da ocitocina e da manobra de Kristeller(12,15). Também foram apontam a revisão uterina, o enema, e a tricotomia como práticas corriqueiras(22).

A imposição da posição litotomica durante o parto foi um achado comum dos estudos. Nessa condição a parturiente adota o sentido horizontal, mantendo-se com as pernas para cima e, por vezes, amarradas(13,22,24).

Tal imposição baseia-se na justificativa de que o decúbito de litotomia facilita o trabalho médico, ao permitir o controle os batimentos cardiofetais, administração de anestésico local, utilização do fórceps, realização da episiotomia, revisão placentária e a prestação da assistência às complicações obstétricas(13,24). A custa de tais benefícios, as mulheres que tentam levantar-se para ficar em uma posição verticalizada são identificadas como praticantes de atos rebeldes e são contidas na mesa de parto(10).

A realização da cesariana e da esterilização através da laqueadura tubária, quando executadas sem o prévio planejamento familiar, também foi considerada como uma prática que naturaliza a dominação masculina sobre o corpo da mulher(19).

Considerando a dimensão subjetiva, as mulheres que vivenciam a violência de seu corpo sofrem um tipo de rito, onde seus órgãos sexuais podem ser vistos e vasculhados sem que haja qualquer constrangimento por parte daqueles que estão aptos a fazê-los, e muito menos, respeito à dignidade e a privacidade das mesmas(19).

Não há o respeito à dor, nem tão pouco são pleiteadas estratégias que visem amenizá-la, pois, no imaginário dos profissionais, a mulher deve aguentar o sofrimento como algo que é biologicamente inerente a sua feminilidade e como o preço a ser pago pelo ato sexual que deu origem a gestação(14).

As práticas citadas são consideradas como condutas proscritas e recriminadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS), desde 1996, de acordo com a classificação das práticas de atenção ao parto e nascimento, baseada em evidências científicas concluídas através de pesquisas no mundo todo. Tal documento deve orientar a condução do parto normal, atentando para o que deve e o que não deve ser feito no processo do parto(25). Contudo, estas persistem na realidade dos serviços de saúde, fato que desqualifica a assistência ao parto.

A violência institucional através da comunicação foi relatada na maioria dos estudos com a particularidade de ser compreendida não só como agressão verbal, mas, também, como a ausência de uma comunicação qualificada entre profissional e usuária.

Um estudo quantitativo realizado na Venezuela com 425 puérperas verificou que a prática de se dirigir à mulher através de comentários irônicos, piadas depreciativas, apelidos no diminutivo e de realizar críticas diante do choro e da dor no momento do parto, consubstanciam-se como um tratamento desumano e violento(15).

Não obstante, na realidade dos serviços, é frequente a utilização de jargões semelhantes ao que segue: "Na hora de fazer não reclamou, achou foi bom..., mas agora reclama que doí"(5:11,12,13,14,19).

O uso de frases jocosas repleta de preconceitos e falso moralismo são justificadas como "brincadeiras de humor", não sendo identificado por seus executores como um tipo de violência. Concepções dessa natureza acabam possibilitando que a prática da violência verbal seja aceita, tolerada e socializada no cotidiano da assistência, tornando-a um ato banalizado(5,26).

Assim, o momento que seria o mais delicado e importante na vida da mulher acaba percorrendo um caminho traçado por tratamentos grosseiros, pela impaciência, falas de cunho moralista, ameaças, gritos, humilhação intencional e repressão(14).

Ainda sobre a relação entre médicos e parturientes, percebe-se que as falhas de comunicação condiciona a mulher à espera de explicações que nunca chegam. Elas nunca sabem o que os médicos fazem com seu corpo, desconhecem Resultados de exames e pouco sabem sobre o estado de saúde do bebê(19,22). Não são consultadas quanto as suas opiniões(22). Nessa perspectiva, a não-informação, informação negada, fragmentada, confusa e uso de terminologias técnicas ininteligíveis para a clientela reforça o sistema de dominação e de sujeição das mulheres nos serviços de saúde(10,14).

O poder simbólico da prática médica diz que não é preciso informar sobre o que se faz, quando se está fazendo uma coisa para beneficiar outrem, nem tão pouco a relação entre os sujeitos deva se dá através de diálogos horizontais, com ênfase na escuta à usuária(19). Diante o exposto, é imprescindível que os profissionais estejam dispostos a reorientar suas práticas com base na escuta qualificada, considerando que o estabelecimento de uma boa relação interpessoal, envolta ao respeito e a coparticipação da parturiente, é capaz de produzir efeitos favoráveis sobre a vivência da maternidade(27).

A categoria violência institucional na forma de serviço concentra seis publicações nacionais, cujos elementos correspondem às falhas na organização do sistema de saúde e na prestação direta dos serviços.

Dessa forma, constituem-se como nuanças da violência incorporada à rotina das instituições, condições como o acesso dificultado; idas e vindas do hospital para a residência; espera prolongada para o atendimento; inexistência de acolhimento; baixa resolutividade da rede de atenção; precariedade dos recursos; péssimas condições estruturais e ausência de recursos humanos necessários a uma assistência de qualidade. Ainda são citadas a negligência intencional, ao ser deixada sozinha na sala de parto como punição por "mal comportamento" e, até mesmo, a estratificação da qualidade da assistência ao parto a partir de critérios socioeconômicos, considerando as distintas realidades do serviço público e privado(5,10,12,13,14,19,21).

Compreendem, ainda, as ações ou omissões de autoridades, funcionários, diretores ou órgãos públicos que têm a intenção de atrasar, dificultar ou impedir, as mulheres, o acesso a políticas públicas e a possibilidade de exercer os direitos previstos por lei(13,15).

Merece destaque a inferência sobre as diferenças na assistência a mulheres, usuárias do serviço público ou privado, aquelas que forem pagantes ou não. No serviço privado, a prestação da assistência ganha contornos de um cuidado cauteloso, o qual se faz permeado por condutas previamente esclarecidas e bem executadas, por ser este um produto pago(19).

Já no contexto do serviço público, a assistência dita como "gratuita", configura-se como um gesto generoso que deve ser acolhido sem explicações ou questionamentos, por ser a única opção para aquelas que não podem pagar(19). Há, portanto, uma estreita relação entre o tipo de serviço e a existência, ou não, da violência institucional ao parto.

Outra interface foi apresentada em uma pesquisa realizada com profissionais acerca da percepção dos mesmos quando a violência durante o parto. Estes citaram como condicionantes para o evento, as condições precárias de trabalho, seja em termos de estrutura física dos hospitais ou de recursos humanos, além da excessiva demanda por uma rapidez na produção de serviço. As consequências vão desde a falta de profissionais, desqualificação do serviço diante da exigência por alta produtividade, até a proibição de acompanhantes tendo em vista a falta de espaço físico que garanta a privacidade das demais pacientes(5).

Por fim, a violência institucional como violação de direitos foi citada em quatro estudos, dos quais, um foi realizado no Brasil e os demais na Venezuela e Cuba. A categoria apresenta a Discussão sobre a negligência do direito ao acompanhante durante o trabalho de parto, parto e pós-parto e a não promoção do contato precoce entre mãe e bebê sem causas clinicamente justificáveis.

O direito a presença de um acompanhante, eleito pela família, durante o trabalho de parto, parto e pós-parto imediato é uma recomendação preconizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), desde 1985(28).

No Brasil, tal recomendação ganha força legal através da Lei Federal 11.108/2005, com o intuito de obrigar as instituições públicas e privadas a permitirem a presença de um acompanhante de escolha da parturiente durante o pré-parto, parto e pós-parto imediato(29). Contudo, a existência de legislação específica não tem garantido a efetivação do direito.

Nos trabalhos analisados foram identificadas realidades onde, nas instituições públicas da Venezuela, as mulheres e adolescentes não tinham direito a permanência de parceiros ou familiares durante sua estadia hospitalar(13). Em outros contextos, apesar das parturientes e puérperas terem a possibilidade de manter um acompanhante consigo durante todo o parto e pós-parto, ainda há proibições quanto presença de homens na sala de parto e nas enfermarias, sob a justificativa de falta de espaço físico que garanta a privacidade das demais usuárias(14,).

De forma geral, estudos correlacionam a negligência do direito ao acompanhante à percepção dos profissionais sobre a importância desse sujeito e a inadequação estrutural das instituições(30). Quando ao contato precoce entre mãe e bebê, estudo realizado com puérperas verificou que 23,8% do total da amostra da pesquisa relataram que tiveram o contato precoce com o recém-nascido não realizado(15).

As razões de tal privação giram em torno de complicações neonatais, mas, na maioria das vezes, encontra desculpa na rotina do atendimento médico e dos primeiros cuidados(31), realidade que nega a possibilidade de iniciar o aleitamento materno na primeira hora de nascimento, assim como recomenda a OMS. Assim como, o atraso no contato entre puérpera e recém-nascido pode se configurar como uma fonte de ansiedade e frustação para a mulher(13,22). A recomendação da aproximação precoce baseia-se na evidência de que na primeira hora o neonato apresenta maior aptidão em executar o estímulo de busca alvéolo-mamilar, bem como, a sucção imediata promove a produção de prolactina e ocitocina(32).

O risco para a falência do aleitamento materno vem a ser mais relevante consequência decorrente do atraso no contato entre mãe e bebê, visto que, o início da amamentação na primeira hora de vida está associado a maior duração do aleitamento(32).

 

Considerações Finais

Apesar da produção científica acerca da violência institucional ao parto estar em ascensão nos últimos 10 anos, o quantitativo de estudos realizados ainda é incipiente, considerando a complexidade do tema e a sua relevância social. Além disso, as publicações existentes têm baixo nível de evidência científica, compreendendo, apenas, estudos descritivos, qualitativos e artigos de opinião.

As expressões da violência institucional ao parto se perfazem através de práticas multifacetadas. No presente estudo, destacaram-se a violência exercida através da comunicação, das relações de poder e da manipulação do corpo feminino.

Destarte, faz-se necessário que haja mudanças práticas na realidade dos serviços, com adoção de uma assistência qualificada, humanizada e centrada no protagonismo da mulher, a fim de proporciona-la a experiência do parto como um evento impar de sua vida. Espera-se que o presente trabalho possa instigar a produção de novos conhecimentos sobre a temática, perspectivando a elaboração de estudos com maior nível de evidência.

 

 

Recebido: 09 de setembro de 2015
Aceito: 24 de novembro de 2015

 

 

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