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Enfermería Global
On-line version ISSN 1695-6141
Enferm. glob. vol.19 n.59 Murcia Jul. 2020 Epub Aug 10, 2020
https://dx.doi.org/10.6018/eglobal.411311
Revisões
Fatores relacionados à resiliência de adolescentes em contextos de vulnerabilidade social: revisão integrativa
1 Enfermera. Alumna de Maestría del Programa de Posgraduación en Enfermería. Universidad Federal de Pernambuco. Recife-PE, Brasil. E-mail: belvanderley@hotmail.com
2 Estudiante del Curso de Pedagogía. Centro de Educación. Universidad Federal de Pernambuco. Recife-PE, Brasil.
3 Enfermero. Alumno de Maestría del Programa de Posgraduación en Enfermería. Universidad Federal de Pernambuco. Recife-PE, Brasil.
4 Doctor en Psicología. Profesor del Departamento de Enfermería Psiquiátrica y Ciencias Humanas. Escuela de Enfermería de Ribeirão Preto. Universidad de São Paulo. São Paulo-SP, Brasil.
5 Doctor en Salud del Niño y del Adolescente. Profesor Adjunto de la Facultad de Enfermería Nossa Senhora das Graças de la Universidad de Pernambuco. Recife-PE, Brasil.
6 Doctora en Enfermería. Profesora Adjunta del Departamento de Enfermería y miembro permanente del Programa de Posgraduación en Enfermería. Universidade Federal de Pernambuco. Recife-PE, Brasil.
Introdução:
A resiliência pode ser compreendida como um processo de persistência e superação contra as fragilidades vivenciadas. Adolescentes inseridos em contextos de vulnerabilidade social encontram obstáculos no desenvolvimento de sua resiliência, o que compromete a visibilidade de estratégias de enfrentamento/resposta as adversidades do cotidiano.
Objetivo:
Analisar as evidências científicas disponíveis na literatura sobre os fatores relacionados à resiliência de adolescentes em contextos de vulnerabilidade social.
Método:
Revisão integrativa de artigos publicados em português, inglês ou espanhol, de 2014 a 2018, nas bibliotecas/bases Medline/Pubmed, Scopus, LILACS, Web of Science, IBECS, Cochrane, BDENF, CINAHL e PsycINFO. Foram utilizados os descritores "Psychological Resilience", "Social Vulnerability", "Adolescent" e "Adolescent Health", resultando em 17 artigos. A pergunta norteadora foi: quais os fatores relacionados à resiliência de adolescentes em contextos de vulnerabilidade social?
Resultados:
Foram formadas cinco classes que retratam os fatores que concorrem para a resiliência em adolescentes em situação de vulnerabilidade social, nomeadas como: as aspirações para o futuro, fatores de risco, entraves institucionais, exposição e o apoio social.
Conclusão:
Os fatores que fortalecem a resiliência são o apoio social provido pela família, amigos, professores, aspectos culturais e religiosos e os fatores de risco são violência, abuso de substâncias, falta de segurança e apoio institucional precário. O entendimento de resiliência e as especificidades que delineiam as condições de saúde de adolescentes em situação de vulnerabilidade social precisam ser consideradas para reorientar ações intersetoriais e interdisciplinares de promoção à saúde deste grupo populacional.
Palavras-chave: Resiliência Psicológica; Vulnerabilidade Social; Adolescente; Saúde do Adolescente; Fatores de Proteção; Enfermagem em Saúde Comunitária
INTRODUÇÃO
A adolescência é uma fase da vida caracterizada como uma transição entre ainfância e a vida adulta, marcada por uma complexidade de mudanças no desenvolvimento biopsicossocial1. Frente às mudanças vivenciadas, adolescentes estão mais suscetíveis às situações de vulnerabilidade social que aumentam os desafios a serem superados em seu curso de vida. A vulnerabilidade social refere-se a todos os aspectos de adversidades relacionados ao contexto no qual o indivíduo está inserido, traduzindo-se em fatores socioeconômicos, raciais/étnicos, religiosos e de gênero. A situação de vulnerabilidade denota caminhos individuais ou grupais que podem desencadear fins não desejados ou fragilizar o desenvolvimento do indivíduo. A habilidade do ser humano para reconhecer e enfrentar as situações decorrentes de vulnerabilidade social, enquanto componentes inerentes à vida, é conceituada como resiliência2.
Diferentes posicionamentos epistemológicos e áreas de aplicação concorrem para os vários conceitos propostos para resiliência, entretanto constitui como alicerce, a concepção de que a resiliência consiste na persistência contra as fragilidades vivenciadas, com a visibilidade de estratégias de superação de adversidades e eventos estressores. Envolve um processo intersubjetivo desencadeado para alcançar uma resposta diante de uma situação de trauma, assegurando peculiaridades que concorrem para o desenvolvimento do indivíduo3.
O comportamento resiliente do indivíduo pode ser desenvolvido por meio de interações entre os vários níveis, integrando aspectos moleculares, ecológicos e sociais. Essas interações incluem fatores ligados à família, escola, amizades e comunidade, refletindo o contexto ao qual o indivíduo pertence4.
Adolescentes inseridos em um ambiente vulnerável e socioeconomicamente desfavorável detêm fatores e comportamentos de risco que podem comprometer sua capacidade de resiliência. A pobreza, a presença de violência e o abuso de substâncias psicoativas, por exemplo, são aspectos presentes nesse grupo vulnerável que tendem a prejudicam a saúde mental do adolescente e dificultar o desenvolvimento de sua resiliência5.
Não obstante, a presença de fatores de proteção pode predizer um bom desenvolvimento do ponto de vista da resiliência por meio da presença de mecanismos individuais e sociais. Os mecanismos individuais estão relacionados aos aspectos específicos para lidar com as adversidades, como a presença da auto eficácia e o otimismo em relação ao futuro. As relações sociais são essenciais no enfrentamento das dificuldades, com destaque para o papel protetor de uma rede social de apoio, a qual pode ser composta pela família, amigos, comunidade e profissionais de saúde6. A inserção dos adolescentes em um contexto de vulnerabilidade social pode fragilizar os fatores de proteção existentes e atravancar o desenvolvimento de sua resiliência.
O desenvolvimento de pesquisas para apreender como o desenvolvimento resiliente na adolescência oscila ao longo do tempo e os fatores envolvidos nesse processo são importantes para uma maior compreensão das especificidades desta faixa etária4)(5. Além disso, poderão embasar medidas e políticas públicas relevantes que possam dirimir as adversidades presentes e os possíveis aspectos traumáticos vivenciados7. Compreender e promover uma prática crítico-reflexiva das percepções dos adolescentes e sua relação com o contexto sociocomunitário conFigura-se como um grande desafio para os profissionais que atendem este público1.
A enfermagem desempenha um papel fundamental no cuidado ao adolescente com enfoque no seu protagonismo, podendo contribuir no reconhecimento dos fatores de risco e protetores à resiliência e no desenvolvimento de estratégias que possam fortalecer uma atitude resiliente e saudável dos adolescentes inseridos em um contexto de vulnerabilidade social. A partir do panorama exposto, o objetivo do presente estudo foi analisar as evidências científicas disponíveis na literatura sobre os fatores relacionados à resiliência de adolescentes em contextos de vulnerabilidade social.
MATERIAL E MÉTODO
A revisão integrativa da literatura permite a síntese de conhecimentos e a reunião de um conjunto de evidências significativas para o aperfeiçoamento da prática profissional8. Para a condução desta revisão, foram seguidas etapas para uma melhor organização, descrição e discussão dos resultados, as quais compreenderam: identificação da temática e do problema de pesquisa; definição dos critérios de inclusão e exclusão; seleção dos estudos; categorização dos estudos encontrados; análise dos resultados e síntese dos conhecimentos apreendidos8.
A questão norteadora foi desenvolvida com auxílio da estratégia mnemônica PICO (P: adolescentes; I: resiliência). A estratégia PICO objetiva elucidar o significado que uma intervenção, processo, estados, procedimentos ou condições de saúde têm para os indivíduos em um determinado contexto não clínico9. Desta forma, formulou-se a seguinte pergunta norteadora: Quais os fatores relacionados à resiliência de adolescentes em contextos de vulnerabilidade social?
A seleção dos estudos foi composta por artigos obedecendo aos seguintes critérios de inclusão: artigos originais, publicados entre os anos de 2014 e 2018, nos idiomas português, inglês e espanhol, que sejam pesquisas que abranjam adolescentes com idade entre 10 e 19 anos de acordo com a faixa etária proposta pela OMS e que respondam à pergunta norteadora da revisão. Os critérios de exclusão estabelecidos foram produções como teses, dissertações, editoriais, capítulos de livros, revisões da literatura e relatos de experiência.
A coleta dos dados ocorreu no período de 16 de julho a 20 de novembro de 2018 por dois juízes independentes nas seguintes bibliotecas/bases de dados: Medline/Pubmed, Scopus, LILACS (Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde), Web of Science, IBECS (Cumulative Index to Nursing & Allied Health Literature), Cochrane, BDENF (Base de Dados de Enfermagem), CINAHL (Cumulative Index to Nursing & Allied Health Literature) e psycINFO, por meio da utilização dos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) e no idioma inglês do Medical Subject Headings (MeSH): Psychological Resilience, Social Vulnerability, Adolescent e Adolescent Health, sendo realizados cruzamentos duplos e triplos e combinados com o descritor Psychological Resilience com o booleano AND. Foi encontrado um total de 8587 publicações.
O rigor metodológico foi verificado por meio do Critical Appraisal Skills Programm (CASP), que divide os estudos nas seguintes categorias: boa qualidade metodológica (categoria A - 6 a 10 pontos) e qualidade metodológica satisfatória (categoria B - no mínimo 5 pontos)10. O nível de evidência também foi avaliado de acordo com Stleter et al11 de acordo com a seguinte categorização: I - estudos de metanálise de múltiplos estudos controlados e randomizados; nível II -estudos individuais com desenho experimental; nível III - estudos quase-experimentais, séries temporais ou caso-controle; nível IV - estudos descritivos (não experimentais ou abordagem qualitativa); nível V - relatos de caso ou de experiência; nível VI - opiniões de comitês de especialistas, incluindo interpretações de informações não baseadas em pesquisas, opiniões reguladoras ou legais.
O processamento dos dados utilizou o recurso do software Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires (IRaMuTeQ, versão 0.7 alpha 2). O IRaMuTeq trata-se de um programa informatizado ancorado ao software R que possibilita diferentes formas de análises estatísticas sobre corpus textuais. O corpus foi composto pela síntese dos artigos incluídos na revisão. O programa permite a realização da Classificação Hierárquica Descendente (CHD), que leva em consideração os Segmentos de Textos (ST) do corpus do estudo e o registro dos contextos das classes12.
RESULTADOS
A partir da busca de estudos por meio dos cruzamentos duplos e triplos, foram encontrados 8587 artigos nas bases de dados utilizadas. De acordo com o seguimento das etapas de desenvolvimento da presente revisão, 8108 artigos foram excluídos de acordo com a leitura dos títulos e 360 artigos excluídos após a leitura dos resumos por não estarem em consonância com a temática ou por não responderem à questão norteadora. Dos 119 artigos restantes, procedeu-se com a leitura dos estudos na íntegra, restando assim, 17 estudos que demonstraram afinidade com o tema proposto no presente estudo (Figura 1).
Dos 17 estudos recuperados, todos se encontraram no nível de evidência IV, denotando estudos descritivos quantitativos e qualitativos. Todos os estudos foram desenvolvidos de 2014 a 2018 e apresentaram-se no idioma inglês. Os países onde os estudos foram desenvolvidos foram Rússia, Austrália, Estados Unidos (EUA), Índia, África do Sul, Espanha, Moçambique, Uganda e Turquia. Uma síntese dos artigos está apresentada nos quadros 1 e 2.
Autores / Ano | Título | Método / Nível de evidência |
---|---|---|
Ulturgasheva14, 2014 | Attaining khinem: Challenges, coping strategies and resilience among Eveny adolescents in northeastern Siberia | Estudo descritivo qualitativo / IV |
Hopkins et al15, 2014 | Resilience amongst Australian Aboriginal Youth: An Ecological Analysis of Factors Associated with Psychosocial Functioning in High and Low Family Risk Contexts | Estudo transversal/ IV |
Rasmus et al16, 2014 | "Where I have to learn the ways how to live:" Youth resilience in a Yup'ik village in Alaska | Estudo descritivo qualitativo/ IV |
Narayanan17, 2015 | Predictors of resilience among adolescents of low socio-economic status in India | Estudo transversal/ IV |
Ernestus; Prelow18, 2015 | Patterns of risk and resilience in african american and latino youth | Estudo de coorte/ IV |
Chapin19, 2015 | Mexican-American Boys' Positive Outcomes and Resilience: Importance of Social Support and Individual Attributes | Estudo descritivo qualitativo/ IV |
Mosavel et al20, 2015 | South African, urban youth narratives: resilience within community | Estudo descritivo qualitativo/ IV |
Hills et al21, 2016 | The lived experiences of street children in Durban, South Africa: Violence, substance use, and resilience | Estudo descritivo qualitativo/ IV |
Moreno et al22, 2016 | Characterization of Vulnerable and Resilient Spanish Adolescents in Their Developmental Contexts | Estudo transversal/ IV |
Theron23, 2016 | Toward a Culturally and Contextually Sensitive Understanding of Resilience: Privileging the Voices of Black, South African Young People | Estudo descritivo qualitativo/ IV |
Aitcheson et al24, 2017 | Resilience in Palestinian Adolescents Living in Gaza | Estudo transversal/ IV |
Hiller et al25, 2017 | Post-trauma coping in the context of significant adversity: a qualitative study of young people living in an urban township in South Africa | Estudo descritivo qualitativo/ IV |
Namy et al.26, 2017 | Gender, violence and resilience among Ugandan adolescents | Estudo transversal/ IV |
Bulut et al27, 2018 | Living in difficult conditions: an analysis of the factors associated with resilience in youth of a disadvantaged city | Estudo transversal/ IV |
Taylor et al28, 2018 | Effortful Control as a Mediator Between Contextual Stressors and Adjustment in Midwestern Latino Youth | Estudo transversal/ IV |
Herbst et al.29, 2018 | "They Were Going to Kill Me": Resilience in Unaccompanied Immigrant Minors | Estudo descritivo qualitativo/ IV |
Theron; Rensburg30, 2018 | Resilience over time: Learning from school-attending adolescents living in conditions of structural inequality | Estudo descritivo qualitativo/ IV |
Artigo | País | Objetivos |
---|---|---|
Ulturgasheva16 | Rússia | Examinar as estratégias utilizadas para lidar com situações de dificuldade. |
Hopkins et al17 | Austrália | Avaliar os preditores da função psicossocial positiva para os jovens em contextos de alto e baixo risco familiar. |
Rasmus et al18 | EUA | Descrever os estressores juvenis e estratégias de resiliência. |
Narayanan19 | Índia | Examinar os preditores de resiliência em adolescentes com baixo nível socioeconômico. |
Ernestus; Prelow20 | EUA | Identificar subgrupos de adolescentes de minorias étnicas de baixa renda e examinar diferentes desfechos após seis anos. |
Chapin21 | EUA | Analisar o gênero e o contexto cultural à resiliência de adolescentes. |
Mosavel et al.22 | África do Sul | Compreender os desafios dos jovens sul-africanos e as estratégias de enfrentamento. |
Hills et al23 | África do Sul | Explorar qualitativamente as experiências vividas de jovens que vivem nas ruas de Durban - África do Sul. |
Moreno et al24 | Espanha | Caracterizar a resiliência e vulnerabilidade em uma amostra de adolescentes. |
Theron25 | África do Sul | Investigar como os processos de resiliência caracterizam um ajuste positivo em meio a um contexto economicamente desfavorecido. |
Aitcheson et al26 | Moçambique | Examinar a prevalência de depressão e ansiedade e preditores de resiliência em um grupo de adolescentes. |
Hiller et al27 | África do Sul | Compreender as redes de apoio e estratégias de enfrentamento de jovens em um contexto de adversidades e riscos significativos. |
Namy et al.28 | Uganda | Explorar as dimensões de resiliência e associações com experiências de violência entre adolescentes. |
Bulut et al29 | Turquia | Avaliar as diferentes dimensões da resiliência psicológica na juventude. |
Taylor et al30 | EUA | Examinar os efeitos de estressores multiculturais individuais e familiares de jovens latinos. |
Herbst et al. (31) | EUA | Compreender as experiências vividas pelos jovens menores imigrantes desacompanhados no contexto da migração. |
Theron; Rensburg(32) | África do Sul | Investigar os recursos que os adolescentes identificam como promotores de resiliência. |
Na a análise dos artigos por meio da Classificação Hierárquica Descendente (CHD), o corpus foi dividido em 267 seguimentos de textos (ST's), com 203 segmentos classificados (76,03%). A partir disso, originaram cinco classes, conforme o dendograma (Figura 2). Cada classe foi representada pelas palavras mais significantes por meio do X2 e p-valor (<0,05), com suas associações de acordo com as classes.
O dendograma demonstra o corpus delimitado em função da ocorrência e co-ocorrência das palavras mais significantes, subsidiando a composição das seguintes classes: a classe 1 contribuiu com 17,2% do total dos ST's das Unidades de Contexto Elementares (UCE's) e foi nomeada como "Aspirações para o futuro"; a classe 2 trouxe uma contribuição de 28,6% do total de ST's, sendo nomeada como "Fatores de Risco"; a classe 3, "Entraves Institucionais" abrangeu 20,7% do total dos ST's; a classe 4, "Exposição" representou 13,3% e por fim, a classe 5 trouxe uma contribuição de 20,2% , sendo denominada como "Apoio Social".
DISCUSSÃO
Os fatores relacionados à resiliência de adolescentes em contextos de vulnerabilidade social perpassam pelas dimensões da vida do adolescente, conFigurando-se como ameaçadores ou fortalecedores da resiliência dos jovens. Atributos individuais, apoio familiar e social e aspectos institucionais são fatores que podem contribuir ou estorvar o desenvolvimento resiliente dos adolescentes.
Na classe 1, Aspirações para o futuro, foi evidenciado um foco nos aspectos relacionados ao futuro que os adolescentes consideravam importantes. Sucesso, emprego, faculdade e dinheiro são palavras que indicaram aspirações de um futuro promissor e que promoviam uma mudança de vida desses jovens. Em um estudo qualitativo com adolescentes mexicanos que moram nos EUA19, os jovens relataram o desejo de concluir o ensino médio e ingressar em uma faculdade para a mudança da realidade vivenciada, almejando conseguir um bom emprego e poder ser um bom provedor para a família.
Estudos desenvolvidos na Austrália13, EUA17)(27 e África do Sul18)(21 demonstraram que dinheiro e emprego são questões importantes para reverter as situações de vulnerabilidade as quais os jovens estão expostos e fortalecerem sua resiliência. Cabe ressaltar que nos estudos com adolescentes nos EUA, o perfil dos jovens refere-se a indivíduos que emigraram dos seus países de origem em busca de oportunidades, reforçando as aspirações futuras de melhoria das condições de vida.
A esperança de um futuro promissor confere um propósito na vida dos jovens e pode tornar-se aliada no processo de resiliência dos mesmos. Em meio a um cenário nefasto, os adolescentes alimentam seus desejos e desenvolvem estratégias que possam favorecer uma mudança no status socioeconômico, que, mesmo na presença de negação de direitos, fortalecem seu otimismo e facilitam o enfrentamento das adversidades vivenciadas.
A escola foi uma variável citada na maioria dos estudos14)(15)(16)(17)(18)(19)(20)(22)(23)(25)(26)(27)(29)(30. Apesar de estudos desenvolvidos em uma aldeia da Rússia14, nos EUA16 e na Índia17 indicarem o ambiente escolar como um estressor, principalmente pela prática do bullying, a escola foi relatada na maioria dos estudos como um fator de proteção para os adolescentes. O jovem que se encontra em situação de vulnerabilidade e de privação de direitos, o ambiente escolar conFigura-se como um espaço de interação social e de promoção de bem-estar, com um grande potencial de mudança das práticas sociais ao contribuir para o desenvolvimento do adolescente enquanto ser biopsicossocial e cultural, contribuindo com o processo de resiliência dos mesmos.
A classe 2 (Fatores de Risco) deu origem a todas as outras classes e é referente as palavras que estão associadas a aspectos psicossociais que obstaculizam o desenvolvimento resiliente dos adolescentes. Alguns estudos destacaram a importância da família como um fator de proteção aos riscos presentes no contexto vivenciado16)(18)(24. Embora muitas vezes a família seja considerada uma fortaleza para os jovens, estudos indicam que um desajuste familiar pode ocasionar prejuízos no desenvolvimento da resiliência desses adolescentes24)(25)(28. Fatores de risco relacionados ao desajuste familiar15)(17)(18 e baixo nível socioeconômico são aspectos que caracterizam a situação de vulnerabilidade social vivenciada pelos adolescentes, como demonstrado em vários estudos que investigam este fenômeno.
A presença de uma base familiar capaz de fornecer condições favoráveis ao desenvolvimento do adolescente pode ser uma grande colaboradora no fortalecimento da resiliência. Todavia, um contexto de vulnerabilidade social pode interferir na estrutura da família e desajustar as relações entre os membros familiares. Nesse cenário, é essencial as relações familiares saudáveis, que mesmo em meio a condições adversas, são capazes de acolher e estimular o adolescente no enfrentamento das intempéries da vida.
Os contextos de pobreza são evidenciados em todos os estudos da presente revisão, diferindo em níveis e características inerentes dos locais de pesquisa. Os estudos realizados em ambientes urbanos descrevem os desafios dos adolescentes dentro de um contexto de marginalização e supressão de alguns tipos de recursos. Estudos desenvolvidos na Rússia14, na Austrália15 e nos EUA16 com adolescentes que moram em tribos e aldeias demarcaram um cenário de escassez de recursos e relataram os desafios encarados pelos jovens no enfrentamento de situações adversas.
Dois estudos realizados na Índia17) e na África do Sul23 descreveram um contexto rural desfavorecido e as estratégias de adaptação dos jovens frente aos fatores de risco presentes. Os diferentes painéis revelam que a vulnerabilidade social está estritamente ligada ao baixo desenvolvimento socioeconômico em diferentes realidades e as estratégias de resiliência variam de acordo com os recursos disponíveis nos cenários urbanos ou rurais.
Um estudo desenvolvido na Austrália15 encontrou a ocorrência de racismo como um fator de risco à resiliência dos adolescentes. As questões étnicas/raciais perpassam as situações de vulnerabilidade social e conFiguram uma barreira no desenvolvimento da formação identitária e da autoestima, impactando no comportamento resilente dos jovens.
A classe 3, nomeada por Entraves Institucionais, apresenta palavras que fazem referência à precariedade de recursos e investimentos governamentais para prover as necessidades básicas dos adolescentes. Quatro estudos apontaram a falta de segurança como um fator estressor presente no cotidiano dos jovens. Em um estudo desenvolvido em uma aldeia da Rússia14, a falta de segurança é descrita como um evento constante na vida do jovem, exigindo o aprimoramento de estratégias para driblar os acontecimentos e garantir sua resiliência e sobrevivência.
Três estudos desenvolvidos na África do Sul20)(21)(25 denunciaram a preocupação com a falta de segurança, condições precárias de moradia (ou ausência dela) e frequente demonstração de agressão/violência. Nos EUA29, em estudo realizado com adolescentes imigrantes, destacou-se a falta de recursos básicos como segurança, alimentação e moradia como motivações para sua emigração. Em um estudo africano21 com adolescentes em situação de rua, os jovens relataram a violência policial como um acontecimento constante que eles experienciam.
A parca assistência institucional oferecida aos adolescentes compromete sua capacidade resiliente e adelgaça seus direitos enquanto cidadãos. É importante refletir para além da insuficiente disposição de recursos, revelando limitações de serviços que deveriam minimizar os riscos dos jovens e que acabam se conFigurando como propagadores de medo e insegurança constante na juventude.
Ainda sobre os estudos desenvolvidos na África do Sul20)(21, as narrativas dos adolescentes destacaram a ocorrência do estupro em meninas. A violência sexual desferida contra adolescentes do sexo feminino perpassa pelas questões de gênero e de dominação masculina, o que traz a tona o machismo arraigado na sociedade que é direcionado com mais força aos indivíduos que se encontram em situação de vulnerabilidade social e de privação de direitos.
A classe 4 (Exposição) possui uma grande proximidade com a classe 3 por referir outros fatores de risco que os adolescentes estão expostos. O consumo de álcool e outras substâncias14)(15)(19)(20)(21)(22)(25)(27 foi descrito em vários estudos. Embora o uso de substâncias denote um fator de risco e exposição para jovens em situação de vulnerabilidade social, algumas situações se conFiguram como um escape para enfrentar os estressores21)(25.
Além disso, os jovens estão expostos a diversas situações que comprometem seu desenvolvimento resiliente, como: envolvimento com o crimes20)(21)(24)(27) e presença de doenças18)(23)(27. A inserção em um contexto socioeconômico desfavorável compromete a integridade dos jovens e põe em risco não somente seu desenvolvimento, mas se conFigura como uma ameaça à vida dos mesmos. O debate acerca do envolvimento de jovens em situação de vulnerabilidade social com o crime reforça a urgência de ações intersetoriais que promovam um acesso justo e igualitário à educação e ao mercado de trabalho. A pobreza condena o adolescente a viver em condições sanitárias precárias que favorecem o aparecimento de doenças necessitando de políticas públicas de proteção e uma assistência eficaz à saúde dos jovens.
Por fim, a classe 5, Apoio Social, refere-se aos recursos disponíveis e utilizados pelos adolescentes para enfrentamento de situações estressoras e o desenvolvimento de resiliência. A identidade e as práticas culturais foram descritas em vários estudos15)(16)(17)(21)(23)(24)(28)(29 e referiram-se à importância do senso identitário proveniente do contexto sociocultural dos adolescentes, como uma ferramenta de enfrentamento às adversidades. Os diferentes cenários dos estudos demonstram uma variedade de culturas que são bastante significativas para fornecer motivações aos jovens e que auxiliam no processo de resiliência.
Outro aspecto citado nos estudos baseiam-se na fé e religião dos jovens20)(21)(23)(25)(29)(30, trazendo as crenças como promotoras de esperança em um futuro melhor e com menos dificuldades. A fé surge como um recurso que auxilia os jovens a lidarem com difíceis contextos sociais em que vivem, conservando a esperança em um futuro auspicioso.
A amizade também foi citada como um apoio para encarar os momentos difíceis da vida dos adolescentes na maioria dos estudos14)(15)(16)(19)(21)(22)(23)(25)(29)(30, como também o apoio do professor19)(22)(23)(25)(30 e das relações familiares14)(16)(19)(23)(24)(25)(26)(29. O estabelecimento de uma rede de apoio provido pelos amigos, pela família e pelo professor reforça a importância de fortalecer o processo resiliente dos jovens que vivem em contextos de vulnerabilidade social.
A resiliência abarca todas as estratégias de superação continuamente desenvolvidas e renovadas que os adolescentes se utilizam para lidarem com uma sociedade por muitas vezes excludente. Todavia, por meio dos apoios supracitados da dimensão social da vida dos adolescentes, os jovens podem buscar e renovar suas fontes de resiliência, mesmo em meio a contextos bastante vulneráveis.
CONCLUSÃO
Os fatores relacionados à resiliência dos adolescentes no contexto da vulnerabilidade social envolvem todas as dimensões do cenário sociocultural ao qual estão inseridos. Os principais fatores que fortalecem a resiliência dos jovens são o apoio social provido pela família, amigos, professores e pelos aspectos culturais e religiosos. O convívio em contexto socioeconômico desfavorável concorre para os adolescentes enfrentam diversos fatores de risco e exposição, como, por exemplo, a violência, o abuso de substâncias e a falta de segurança, além da assistência institucional precarizada.
Os estudos demonstraram que a resiliência de adolescentes em situação de vulnerabilidade social proporciona uma postura proativa no enfrentamento dos desafios e busca por seu desenvolvimento, mesmo em meio a condições desvantajosas. O entendimento de resiliência e das especificidades que delineiam os requisitos de saúde de adolescentes em situação de vulnerabilidade social precisam ser considerados para reorientar ações intersetoriais e interdisciplinares de promoção à saúde deste grupo populacional, que representa as potencialidades de um futuro exitoso.
É mister, que a Enfermagem esteja em consenso com a literatura produzida, alicerçando sua prática baseada em evidências científicas, a fim de identificar e avaliar os fatores que podem ser riscos ao desenvolvimento da população adolescente, bem como recursos existentes e estratégias que podem ser desenvolvidas para responder aos cenários de vulnerabilidade social, potencializando a emergência da resiliência como mecanismo de proteção e superação para um crescimento e desenvolvimento saudável.
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Recebido: 23 de Janeiro de 2020; Aceito: 17 de Fevereiro de 2020