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Enfermería Global

versión On-line ISSN 1695-6141

Enferm. glob. vol.20 no.63 Murcia jul. 2021  Epub 02-Ago-2021

https://dx.doi.org/10.6018/eglobal.460431 

Originais

Avaliação de tecnologia assistiva sobre drogas: estudo comparativo entre Brasil e Portugal

Fernanda Jorge Guimarães1  , António Luís Rodrigues Faria de Carvalho2  , Paulo César de Almeida3  , Lorita Marlena Freitag Pagliuca4 

1 Universidad Federal de Pernambuco , Vitória de Santo Antão, Pernambuco, Brasil. fernanda.guimaraes@ufpe.br

2 Escuela Superior de Enfermería de Porto, Porto, Portugal.

3 Universidad Estadual do Ceará, Fortaleza, Ceará, Brasil.

4 Universidad Federal do Ceará. Investigadora CNPQ. Fortaleza. Fortaleza, Ceará, Brasil.

RESUMO:

Objetivos:

(1) Avaliar a adequação da Tecnologia assistiva “Drogas: reflexão para prevenção” em relação aos seus “objetivos”, “acessibilidade”, “clareza”, “estrutura e apresentação”, “relevância e eficácia”, e “interatividade” na perspectiva de pessoas com deficiência visual no Brasil e em Portugal, e (2) comparar as avaliações dos participantes no Brasil e em Portugal.

Método:

Estudo descritivo e exploratório desenvolvido em associações para pessoas com deficiência visual. Sessenta e duas pessoas com deficiência visual participaram do estudo. Os dados foram coletados por meio do Questionário de Avaliação de Tecnologia Assistiva. Os dados foram descritos em média para análise dos atributos e o teste de Mann-Whitney foi usado para verificar a associação entre os resultados nos dois locais de estudo.

Resultados:

No Brasil, os participantes eram predominantemente homens, cegos, com 14,81 anos de estudo; e em Portugal os participantes eram predominantemente mulheres, cegas, com 9,58 anos de estudo. A avaliação da Tecnologia Assistiva pelos participantes foi boa em ambos os países, com uma média acima de 1,6. Não houve diferenças na avaliação entre os dois países (p>0,05).

Conclusões:

A tecnologia assistiva sobre substâncias psicoativas recebeu uma boa avaliação no Brasil e em Portugal. As diferenças entre os participantes dos dois países não interferiu com a avaliação.

Palavras-chave: Equipamentos de autoajuda; Transtornos relacionados ao uso de substâncias; Educação em Saúde; Pessoas com deficiência visual

INTRODUÇÃO

Abuso de substâncias é um problema de saúde pública no Brasil e em Portugal1,2. No Brasil, respostas voltadas para estratégias de prevenção têm se mostrado tão importantes quanto o tratamento e reabilitação3. Ademais, estratégias tais como educação em saúde e aconselhamento, frequentemente, têm menores custos do que tratamento e reabilitação em hospitais, centros de atenção psicossocial e comunidades terapêuticas. Tais estratégias de prevenção, entretanto, frequentemente excluem indivíduos com deficiência, que necessitam de recursos com baixo custo e acessíveis para lidar com o abuso de substâncias.

Pesquisas sobre o abuso de substâncias entre pessoas com deficiência são escassas. Um inquérito realizado nos Estados Unidos com adultos afirmou que o uso de drogas ilícitas é um sério problema entre pessoas com deficiência que requer pesquisa e cuidados4. Outro estudo conduzido com pessoas com deficiência intelectual na Holanda encontrou que abuso de substâncias é considerado um problema neste grupo. Este problema está relacionado a ansiedade, depressão, comportamento agressivo, transtorno de personalidade antissocial e hiperatividade5.

Um estudo sobre o uso de drogas ilícitas por pessoas com deficiência, que eram clientes ativos dos serviços estaduais de reabilitação vocacional em Ohio, Michigan e Illinois encontrou que a maconha era a substância mais usada entre os participantes. Os autores descreveram jovem, sexo masculino, baixa renda, presença de familiares ou amigos que usam drogas ilícitas, maiores sentimentos de hostilidade e comportamentos de risco, e baixa autoestima como fatores que influenciam o uso de drogas ilícitas por pessoas com deficiência6. Estes fatores identificados como risco para uso de drogas são similares entre pessoas sem deficiência em unidade de saúde da família, no qual o consumo de álcool está associado com sexo masculino, solteiro, jovem (18 a 30 anos de idade), e sem religião7.

Taggart, McLaughlin, Quinn, and McFarlane8 descreveram que as razões para o abuso de substâncias por pessoas com deficiência intelectual são automedicação, trauma psicológico, distanciamento social de suas comunidades, perdas, tristeza e confusão.

Embora as pessoas com deficiência mostrem um elevado consumo de substâncias psicoativas, serviços de tratamento e reabilitação para estas pessoas são escassos. Autores descreveram algumas barreiras para o tratamento ao abuso de substâncias entre pessoas com deficiência (deficiência visual, lesão da medula espinhal, doença mental, paralisia cerebral, deficiência de fala, artrite e neuropatia) que participaram do estudo, incluindo a falta de vontade de ser tratada, pouco suporte familiar, ausência de transporte, falta de acessibilidade física para o tratamento, indisponibilidade de equipamentos / materiais acessíveis para pessoas com deficiências sensoriais, crença de que a deficiência impede o sucesso do tratamento9. Em outro estudo, a falta de serviços e acomodações físicas para pessoas com limitações sensoriais, como alertas visuais e sonoros em elevadores e material em braile, foram identificados como barreiras nas instalações de tratamento para abuso de substâncias nos Estados Unidos10.

Como visto acima, pesquisas específicas sobre prevenção ao abuso de substâncias entre pessoas com deficiência visual são escassas. É importante criar estratégias, metodologias e tecnologias assistivas com o objetivo de informar pessoas com deficiência visual sobre substâncias psicoativas.

Tecnologias Assistivas são compreendidas como um campo do conhecimento com características interdisciplinares envolvendo produtos, recursos, metodologias, estratégias, práticas, e serviços que objetivem promover a funcionalidade e a participação de pessoas com deficiência, incluindo a promoção de sua autonomia, independência, melhor qualidade de vida e inclusão social11)(12)(13.

Variadas Tecnologias Assistivas tem sido desenvolvidas para ampliar o acesso a informação em saúde por pessoas com deficiência visual. Uma tecnologia assistiva para este grupo é a verbalização de textos escritos por meio de um sintetizador de voz de computador. O programa sintetizador de voz pode, também, ser usado por pessoas sem deficiência visual. Há muitas versões deste programa, algumas podem ser compradas enquanto outras são gratuitas, como a usada no presente estudo.

A tecnologia assistiva tem sido utilizada para disseminar informações de promoção da saúde relacionadas ao aleitamento materno no Brasil. As informações comumente acessadas por meio da literatura de cordel (ou seja, livretos da cultura popular do Brasil) foram disponibilizadas em forma de poema, por meio de um sintetizador de voz. Os versos mencionaram a composição do leite materno, posicionamento do bebê no seio materno e apoio familiar, entre outros. Essa Tecnologia Assistiva foi considerada atrativa e eficaz por pessoas com deficiência visual14.

Em um segundo exemplo, um sintetizador de voz foi utilizado para ajudar mulheres com deficiência visual a aprender como usar o preservativo feminino. Nesse caso, o texto informativo foi complementado por um modelo anatômico que simulava o canal vaginal para permitir que mulheres cegas entendessem melhor o uso do dispositivo. Pessoas com deficiência visual podem seguir a descrição escrita usando o sintetizador de voz. Essa Tecnologia Assistiva foi considerada adequada para mulheres cegas no que diz respeito a seus objetivos, relevância, estrutura e apresentação15.

Com base no sucesso das estratégias de tecnologia assistiva acima mencionadas em outras áreas da promoção da saúde, foi desenvolvido um recurso tecnológico acessível voltado para a informação em saúde sobre a prevenção do abuso de substâncias. O recurso tecnológico chama-se “Drogas: reflexão para prevenção” e foi elaborado para ser usado no Brasil por pessoas com deficiência visual com o auxílio de um leitor de tela. O recurso tecnológico foi desenvolvido a partir de referências de artigos e materiais produzidos pelo Ministério da Saúde do Brasil. Seu conteúdo incluiu os tipos comuns de drogas, os efeitos físicos, psicológicos e sociais do uso abusivo de substâncias e as estratégias de prevenção do seu uso16.

O recurso tecnológico “Drogas: reflexão para prevenção” foi escrito para atender as necessidades das pessoas com deficiência visual. O recurso tecnológico pode ser lido por pessoas com e sem deficiência. Assim, nós o consideramos como uma Tecnologia Assistiva. O recurso tecnológico se diferencia de outros materiais educativos sobre substâncias psicoativas, pois foi elaborado especialmente para pessoas com deficiência visual e foi convertido em um arquivo acessível ao sintetizador de voz. Além disso, a Tecnologia Assistiva foi avaliada por pessoas cegas. Os participantes do estudo consideraram o texto informativo, satisfatório e atende aos seus objetivos16.

Nesta perspectiva, os objetivos do estudo foram: (1) avaliar a adequação da Tecnologia assistiva “Drogas: reflexão para prevenção” em relação aos seus “objetivos”, “acessibilidade”, “clareza”, “estrutura e apresentação”, “relevância e eficácia”, e “interatividade” na perspectiva de pessoas com deficiência visual no Brasil e em Portugal, e (2) comparar as avaliações dos participantes no Brasil e em Portugal.

MATERIAL E MÉTODO

Tipo de estudo

Trata-se de um estudo descritivo e exploratório com abordagem quantitativa. O método foi escolhido por melhor atender aos objetivos do estudo.

Local do estudo

O estudo foi realizado em associações para pessoas com deficiência visual no Brasil e em Portugal. No Brasil, as associações estão localizadas nos estados da Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Ceará. Em Portugal, o estudo foi desenvolvido em associações localizadas na cidade do Porto. No Brasil, cada instituição possuía cerca de 120 usuários e no Porto, as associações possuíam cerca de 500 usuários. As associações em ambos os países ofereciam atividades sociais e recreativas tais como esportes, música, cursos de informática, treinamento para atividades de vida diária, e outros. Serviços de saúde não são oferecidos pelas instituições em nenhum dos países.

População do estudo

A população do estudo consistiu de pessoas com deficiência visual, seja, cegueira ou baixa visão. Cegueira é aqui compreendida como acuidade visual igual ou inferior a 0,05 no melhor olho, enquanto a baixa visão corresponde à acuidade visual entre 0,3 e 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica17.

Os critérios de elegibilidade foram idade a partir de 18 anos e mais. Indivíduos com deficiência múltipla foram excluídos. Os pesquisadores utilizaram amostragem por conveniência, convidando aqueles que estavam presentes nos locais de estudo a participarem da pesquisa. Assim, 31 participantes foram convidados no Brasil e 31 em Portugal.

Coleta dos dados

Um instrumento para avaliação da Tecnologia Assistiva foi utilizado para a coleta dos dados. O Questionário de Avaliação de Tecnologia Assistiva foi desenvolvido e validado pelos autores. O alpha de Cronbach do instrumento foi 0,82218. Este instrumento foi escolhido, porque foi criado para avaliar Tecnologias Assistivas de educação em saúde. Ele consiste em 18 itens que avaliam seis atributos: objetivos, acessibilidade, clareza, estrutura e apresentação, relevância e eficácia e interatividade. Os participantes avaliaram cada item em uma escala do tipo Likert de três pontos para julgá-lo inadequado, parcialmente adequado, adequado atribuindo pontuações 0, 1 ou 2, respectivamente. Os atributos são definidos a seguir.

O atributo objetivos indica se a Tecnologia Assistiva alcançou seus propósito e objetivos, em outras palavras, se a Tecnologia Assistiva informa sobre substâncias psicoativas. Acessibilidade consiste na facilidade de acesso a TA pelo participante. Clareza indica se a informação fornecida pela Tecnologia Assistiva é clara para o participante. Estrutura e apresentação do conteúdo refere-se ao modo como a informação é apresentada, incluindo sua organização geral, estrutura, estratégia de apresentação, consistência e formatação. O atributo Relevância e eficácia está relacionado ao significado do material educativo apresentado, se ele é relevante para o usuário ou não. Interatividade está relacionada ao envolvimento do participante no processo educacional.

Em Portugal, a Tecnologia Assistiva foi adaptada para o contexto Português por pesquisadores com expertise nas áreas de abuso de substâncias e informação terapêutica. Os professores leram o texto e sugeriram a modificação de dois termos que são usados no Brasil, mas não em Portugal, a saber, “maconha” e “cigarro”, substituídos por “marijuana” e “tabaco”.

Seguindo nosso processo de desenvolvimento de textos baseados em evidências e culturalmente relevantes, o próximo passo importante foi avaliar as percepções do usuário sobre os objetivos, clareza, estrutura e apresentação do texto. Esta etapa de avaliação é crucial para garantir a adequação da Tecnologia Assistiva sobre o abuso de substâncias e para a ampla aplicação das informações na região.

Em um segundo momento, pessoas com deficiência visual leram o texto “Drogas: reflexão para prevenção” usando um sintetizador de voz e, em seguida, os participantes responderam o Questionário de Avaliação da Tecnologia Assistiva. Este processo demorou cerca de 20 minutos. Este procedimento foi realizado individualmente em ambos os países.

Análise dos dados

Os dados foram analisados com auxílio de software estatístico SPSS versão 19. Adotou-se nível de confiança de 95%. Usamos média para analisar os atributos e o teste de Kruskal Wallis para verificar a associação entre os resultados nos dois locais de estudo. Para cada atributo, a média foi calculada e comparada entre os países. Nós consideramos um atributo inadequado quando a média foi igual a 0; parcialmente adequado quando a média estava entre 0,1 e um; e adequado quando a média foi de 1,1 a 2.

Considerações éticas

No Brasil, o estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Pernambuco, com o protocolo n. 928.694. Em Portugal, o estudo foi submetido à direção das instituições, que avaliou os aspectos científicos e éticos do projeto e deu permissão para sua realização. Os participantes receberam o termo de consentimento livre e esclarecido e, após compreensão dos objetivos do estudo e aceitação em participar, foram incluídos na pesquisa.

RESULTADOS

Características dos participantes

Participaram do estudo 62 pessoas igualmente distribuídas entre Brasil e Portugal. Em Portugal, houve a participação de pessoas cegas (67,7%) e pessoas com baixa visão (32,3%), enquanto no Brasil todos os participantes eram cegos. A média de idade foi de 34,94 anos no Brasil, e 51,48 anos em Portugal. Quanto ao sexo, a amostra no Brasil foi 54,8% de homens, e em Portugal foi 51,6% de mulheres. No Brasil, a média de escolaridade foi de 14,81 anos e em Portugal 9,58 anos.

Avaliação da Tecnologia Assistiva “Drogas: reflexão para prevenção”

Com relação ao processo de avaliação da Tecnologia Assistiva, a Tabela 1 mostra a avaliação em ambos os países.

Tabela 1.  Avaliação dos atributos da Tecnologia Assistiva no Brasil e Portugal, 2014 

Com relação ao processo de avaliação da Tecnologia Assistiva, a média dos atributos é mostrada na Tabela 2.

Tabela 2.  Avaliação dos atributos da Tecnologia Assistiva no Brasil e em Portugal, 2014 

Verificou-se que no Brasil o atributo objetivos foi mais bem avaliado e, em Portugal foi estrutura e apresentação. O atributo que obteve a menor média de avaliação no Brasil foi acesso, enquanto em Portugal foi relevância e eficácia.

Não houve diferenças estatisticamente significantes entre as médias dos atributos no Brasil (p = 0,121) e Portugal (p= 0,092), isto é, não houve diferenças entre os países na avaliação dos atributos, como mostrado na Tabela 3.

Tabela 3.  Comparação entre a avaliação no Brasil e em Portugal, 2014 

a Teste Kruskal Wallis

Não foi observada diferenças estatisticamente significantes entre Brasil e Portugal (p>0,05) quando se comparou a média dos seis atributos combinados (objetivos, acessibilidade, clareza, estrutura e apresentação, relevância e eficácia e interativo).

DISCUSSÃO

O acesso às informações de saúde deve estar disponível para todos os indivíduos, independentemente de sua capacidade. Isto é importante, porque Brasil e Portugal ratificaram o protocolo da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Este documento reafirmou os princípios universais de dignidade, integridade, igualdade e não discriminação e objetiva promover outras estratégias de assistência adequadas para ajudar as pessoas com deficiência e garantir seu acesso a informação19. No Brasil, a Lei 10.098 publicada em 2000 objetivou promover acessibilidade para pessoas com deficiência, especialmente com respeito a edificações, transporte e comunicação20. Portugal possui uma Lei similar, número 163 publicada em 200621. Embora a Lei garanta o acesso, é preciso garantir que as pessoas com deficiência estejam realmente incluídas, neste caso, as pessoas com deficiência visual22. Os materiais educativos devem ser acessíveis às pessoas, de acordo com suas particularidades. É, portanto, importante que a acessibilidade desses materiais seja avaliada por pessoas com deficiência. Nesse contexto, não há estudos como este, o que dificulta as comparações dos resultados.

No que diz respeito à idade dos participantes do estudo, os participantes em Portugal eram mais velhos do que no Brasil. Neste último país, deve-se atentar porque, segundo o censo brasileiro de 2010, as pessoas com deficiência visual encontravam-se na faixa etária acima de 65 anos23. Os achados deste estudo também concordam com outra pesquisa que encontrou que os participantes em Portugal eram mais velhos do que aqueles no Brasil24.

As diferenças de idade e escolaridade entre os participantes brasileiros e portugueses não afetaram os resultados. Com base na variedade de experiências educacionais dos participantes, podemos dizer que a linguagem simples usada era clara para uma ampla gama de diferentes habilidades educacionais, e compreensível para pessoas com menos anos de escolaridade e ainda atraente para aqueles com alto nível de alfabetização25. É preciso destacar que a relação entre a compreensão da informação e a aquisição de conhecimento com os diferentes níveis de literacia não foi explorada nos participantes do nosso estudo.

No que se refere ao texto sobre substâncias psicoativas, a avaliação das pessoas com deficiência no Brasil e em Portugal sobre a acessibilidade foi semelhante, apesar das diferenças culturais entre os dois países.

Com base nos resultados encontrados, o processo de adaptação utilizado no presente estudo foi semelhante a um estudo anterior que adaptou Tecnologia Assistiva sobre Amamentação em formato de literatura de cordel para pessoas com deficiência visual em Portugal. A TA foi considerada uma importante estratégia de promoção da saúde26.

No presente estudo, o atributo “objetivos” obteve a maior média no Brasil. Este atributo indica que a TA fornece informação sobre abuso de substâncias. Este resultado é semelhante a um estudo que avaliou uma Tecnologia Assistiva, do tipo texto educativo, sobre infecções sexualmente transmissíveis projetado para mulheres com deficiência visual. O estudo concluiu que a Tecnologia Assistiva contribuiu para o aprendizado e autonomia das mulheres27. Ademais, resultados similares foram encontrados em estudo que avaliou uma Tecnologia Assistiva sobre substâncias psicoativas em formato de um jogo para pessoas com deficiência visual. Esta TA permitiu que o público acessasse a informação sobre substâncias psicoativas de forma acessível e lúdica28.

Por outro lado, em Portugal o atributo “estrutura e apresentação” obteve a maior média. Este resultado indica que os participantes portugueses consideraram a TA organizada, clara e consistente.

Em ambos os países, os atributos “clareza”, “estrutura e apresentação” e “relevância” receberam avaliações similares. Estes resultados são importantes. Como afirmaram Oliveira, Carvalho, Pagliuca26, uma tecnologia educacional que objetiva a promoção da saúde deve ser adaptada à realidade cultural do público alvo e deve transmitir a informação de maneira clara. Estes resultados também corroboram com outros autores que afirmaram que para a elaboração de materiais educativos é importante verificar a clareza e relevância do texto29.

Os atributos que receberam menor avaliação foi “acessibilidade” no Brasil, e “relevância e eficácia” em Portugal. Estes resultados estão relacionados ao uso do sintetizador de voz e a informação sobre substâncias psicoativas. No Brasil, durante a coleta dos dados, nós percebemos que os participantes não utilizavam o sintetizador de voz com elevada frequência. Eles nos falaram sobre algumas dificuldades para usar o sintetizador de voz, como falta de habilidade para usar o computador e o software. Ademais, em Portugal, percebemos que os participantes não consideraram a Tecnologia Assistiva relevante, porque há muita informação sobre substâncias psicoativas.

Em geral, os escores em todos os atributos no Brasil e Portugal encontraram-se acima de 1,6. Isto significa que os atributos foram avaliados como adequado pelos participantes, e mostra como a Tecnologia Assistiva pode ser usada como instrumento de cuidado em saúde para informar sobre abuso de substâncias.

Uma das limitações do estudo foi que nós não avaliamos a aquisição de conhecimento. Em outro estudo, nós avaliamos a informação adquirida30. Outra limitação foi o número de participantes obtido por meio de amostragem por conveniência em associações para pessoas com deficiência visual. Sugere-se que novos estudos, incluindo um número maior de pessoas com deficiência visual e de diferentes organizações sejam realizados.

Recomendamos que outras Tecnologias Assistivas sobre substâncias psicoativas sejam criadas para informar pessoas com deficiência sobre este importante tema.

CONCLUSÕES

Neste estudo, identificamos que a Tecnologia Asssitiva “Drogas: reflexão para prevenção” foi avaliada com elevados escores em Portugal e Brasil. Todos os atributos avaliados pelas pessoas com deficiência visual no Brasil e em Portugal receberam avaliação que variou entre 1,65 e 1,89. Assim, os resultados sugerem que o texto “Drogas: reflexão para prevenção” sobre substâncias psicoativas em conjunto com um sintetizador de voz é adequado para uso por pessoas com deficiência visual nos dois países. Ficou evidente que as diferenças culturais nos dois cenários do estudo não influenciaram na avaliação.

A TA “Drogas: reflexão para prevenção” alcançou os objetivos para os quais foi desenvolvida. É acessível para pessoa com deficiência visual, clara, tem uma estrutura e apresentação atrativa e fornece autonomia para seus usuários. Dado o sucesso deste texto e o uso do sintetizador de voz, outros temas de educação em saúde poderiam ser desenvolvidos para serem usados de forma semelhante como Tecnologias Assistivas para pessoas com deficiência visual.

Agradecimentos

Agradecimento especial a professora Stephanie A. Nixon, Department of Physical Therapy, dalla Lana School of Public Health, University of Toronto, Canada.

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Recebido: 17 de Dezembro de 2020; Aceito: 27 de Março de 2021

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