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Revista de Bioética y Derecho

versión On-line ISSN 1886-5887

Rev. Bioética y Derecho  no.51 Barcelona  2021  Epub 29-Mar-2021

 

DOSSIER BIOÉTICA Y ANIMALES NO HUMANOS EN INVESTIGACIÓN

A alteração do registro civil das pessoas trangêneras sem a necessidade da cirurgia da redesignação sexual no Brasil

Cambio del registro civil de personas transgénero sin necesidad de cirugía de reasignación sexual en Brasil

Change of civil registry for transgender people without the need for sexual reassignment surgery in Brazil

Canvi del registre civil de persones transgènere sense necessitat de cirurgia de reassignació sexual al Brasil

Ricardo Oliveira Rotondano1  , Naionara Maia Souza2  , Giovanna Almeida Armentano3 

1Advogado. Doutor pela Universidade Federal do Pará (Brasil). Mestre em Direito pela Universidade de Brasília (Brasil)

2Graduada em Letras pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. Graduanda em Direito pela Faculdade de Tecnologia e Ciências (UniFTC, Brasil). (Brasil)

3Graduada em Pedagogía. Graduanda em Direito pela Faculdade de Tecnologia e Ciências (UniFTC, Brasil). Pós-graduada em Neuropedagogia e Psicanálise. Pós-graduanda em Direito Penal pelo Centro Universitário Leonardo da Vinci (UNIASSELVI). (Brasil)

Resumo

O presente trabalho realiza um estudo acerca do panorama social de opressão que a as pessoas transgêneras enfrentam na sociedade pátria. A trajetória histórica de preconceito e de discriminação perpassa não somente pela ação da sociedade, mas igualmente pelo Estado brasileiro. No caminho da superação destes entraves sociais, analisa-se a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.275/DF, na qual foi reconhecido o direito de alteração do nome e do sexo nos registros públicos das pessoas transgêneras sem a necessidade da realização da cirurgia de redesignação sexual e de decisão judicial. Mediante as técnicas de pesquisa bibliográfica, documental, comparativa, histórica e entrevista, por meio de uma pesquisa qualitativa, a partir dos métodos indutivo e dialético, o referido estudo de caso avalia os possíveis avanços da referida decisão no cenário de subalternização das pessoas transgêneras no Brasil.

Palavras-chave: pessoas transgêneras; gênero; sexualidade; nome social; Supremo Tribunal Federal

Resumen

Este artículo lleva a cabo un estudio sobre el panorama social de la opresión que enfrentan las personas transgénero en la sociedad brasileña. La trayectoria histórica del prejuicio y la discriminación impregna no solo la acción de la sociedad, sino también del Estado brasileño. Para superar estas barreras sociales, se analiza la decisión dictada por la Corte Suprema Federal en Acción Directa de Inconstitucionalidad 4.275/DF, en la que se reconoció el derecho a cambiar el nombre y el sexo en los registros públicos de personas transgénero sin la necesidad de cirugía de reasignación sexual y decisión judicial. Utilizando técnicas bibliográfica, documental, comparativa, histórica y de entrevista, a través de una investigación cualitativa, utilizando los métodos inductivos y dialécticos, el estudio de caso referido evalúa los posibles avances de la decisión referida en el escenario de subordinación de las personas transgénero en Brasil.

Palabras clave: personas transgénero; género; sexualidad; nombre social; Corte Suprema Federal

Abstract

This article conducts a study of the social landscape of oppression faced by transgender people in Brazilian society. The historical trajectory of prejudice and discrimination permeates not only the actions of society, but also of the Brazilian State. To overcome these social barriers, we analyse the decision handed down by the Federal Supreme Court in the Direct Action of Unconstitutionality 4.275/DF, which recognised the right to change the name and sex in public records of transgender people without the need for sexual reassignment surgery and judicial decision. Using bibliographic, documentary, comparative, historical and interview techniques, through qualitative research, using inductive and dialectical methods, the case study assesses the possible advances of the referred decision in the scenario of subordination of transgender people in Brazil.

Keywords: Transgender people; gender; sexuality; social name; Federal Court of Justice

Resum

Aquest article duu a terme un estudi sobre el panorama social de l'opressió que enfronten les persones transgènere en la societat brasilera. La trajectòria històrica del prejudici i la discriminació impregna no sols l'acció de la societat, sinó també de l'Estat brasiler. Per a superar aquestes barreres socials, s'analitza la decisió dictada per la Cort Suprema Federal en Acció Directa d'Inconstitucionalitat 4.275/DF, en la qual es va reconèixer el dret a canviar el nom i el sexe en els registres públics de persones transgènere sense la necessitat de cirurgia de reassignació sexual i decisió judicial. Utilitzant tècniques bibliogràfica, documental, comparativa, històrica i d'entrevista, a través d'una recerca qualitativa, utilitzant els mètodes inductius i dialèctics, l'estudi de cas referit avalua els possibles avanços de la decisió referida en l'escenari de subordinació de les persones transgènere al Brasil.

Paraules clau: persones transgènere; gènere; sexualitat; nom social; Cort Suprema Federal

1. Introdução

No dia 1 de março de 2018, o Supremo Tribunal Federal proferiu entendimento de que as pessoas transgêneras podem alterar o sexo e o nome presentes em seu registro civil, sem precisar passar pelo procedimento da cirurgia de redesignação sexual. Na Ação Direta de Inconstitucionalidade 4275, ajuizada pela Procuradoria-Geral da República, o STF assentou ainda posição no sentido de que não é preciso obter autorização judicial para a mudança no registro civil, sendo que tal ato jurídico poderá ser realizado pela pessoa transgênera em quaisquer cartórios.

Precisamos compreender a dimensão e a real importância dessa decisão, haja vista que todos os aspectos de nossa vida começam pelo nome, portanto, essa decisão perpassa não apenas por ratificar direitos já garantidos em nossa Constituição e em nosso ordenamento civil (como os direitos da personalidade) e, da mesma forma, perpassa o âmbito do processo de humanização dos indivíduos, no sentido do reconhecimento de seu pertencimento e de sua identidade de gênero. Neste sentido, discorrer sobre a capacidade de autodeterminação dos sujeitos é igualmente incorrer em uma discussão acerca da dignidade humana.

Para tanto, faz-se necessário primeiramente definir de forma bastante simples os termos que usaremos neste artigo, a fim de que possamos compreender sem lacunas as ideias aqui apresentadas. A intenção, com tais definições, não é a de limitar ou "encaixotar" os seres humanos, até porque os conceitos aqui trabalhados não conseguem dar conta, de forma plena, da pluralidade inerente à condição humana. Entretanto, podem, de alguma forma, auxiliar na (in)formação de identidades sociais e elucidação do que ainda não tem visibilidade. Para além das definições sobre gêneros, identidades e biologia, devemos também levar em consideração o que faz cada pessoa ser quem ela diz que é; como sua subjetividade faz com que ela se identifique num determinado lugar e porque este lugar a representa.

Além disso, esta configuração de identidade de gênero nos faz fomentar discussões acerca do que realmente define o feminino e o masculino, e se não estar biologicamente comportada nestes estereótipos faz com que a pessoa seja menos homem/menos mulher. Ademais, a cirurgia para redesignação de sexo requer burocracia e longa espera que pode durar anos para quem não puder financiar um cirurgião particular e, com isso, depender do Sistema Único de Saúde pátrio, envolvendo complexos e longos procedimentos cirúrgicos, tratamento hormonal e acompanhamento com psicólogo/a, psiquiatra e assistente social.

É importante mostrar também a importância da atuação dos profissionais da área da psicologia, pois eles/as fornecerão o suporte emocional do autoconhecimento no caminho do reconhecimento e pertencimento de cada indivíduo. Ter o nome com qual se identifique em seu registro civil não implica em apenas mudar a forma como a pessoa será chamada; significa, muito mais do que isso, o exercício prático de um direito que a pessoa transgênera detém. Tal garantia não deve ser violada pelo Estado ou por quaisquer particulares, sob pena de frontal desrespeito ao sujeito e, igualmente, à sociedade.

Para o desenvolvimento do presente trabalho, realizaremos uma pesquisa de caráter qualitativo, por meio do estudo de caso, aliado à pesquisa bibliográfica e documental, tendo utilizado ainda a técnica da pesquisa de entrevista - sendo esta, assim, pesquisa que abrange os caracteres empírico e teórico. Ademais, realizou-se um estudo comparado com a legislação e as decisões judiciais de países da Europa, como forma de análise adicional para entender o possível avanço do procedimento de reconhecimento das pessoas transgêneras adotado pelo Brasil. O cerne desta investigação acadêmica será a argumentação exposta na ADI 4275, julgada pelo STF, juntamente com a entrevista que fora realizada com uma pessoa transgênera acerca do panorama social de preconceito quanto à população LGBT no Brasil e sobre a sua visão acerca da referida decisão judicial. A pessoa entrevistada neste trabalho será denominada Ominira(1), tendo como objetivo proteger a identidade da referida participante da pesquisa.

A justificativa do presente escrito recai impreterivelmente na análise acerca dos direitos das pessoas em situação de vulnerabilidade jurídica, tão relevante para a construção de meios efetivos para a conquista da igualdade material no país. A subalternização e a opressão à qual as pessoas trans são submetidas cotidianamente em sua original sociedade reclamam a discussão e o debate sociojurídico sobre formatos alternativos de consecução dos direitos humanos destes indivíduos. A discussão do Supremo Tribunal Federal acerca da matéria representa, assim, um avanço na consolidação de garantias jurídicas para as pessoas transgêneras.

2. Questões de gênero

O Supremo Tribunal Federal decidiu, no dia 1 de março de 2018, que as pessoas transgêneras podem alterar o campo "sexo" e seu nome de batismo presentes em seu registro civil, sem que para isso precisem passar pelo procedimento da cirurgia de redesignação sexual.(2) As pessoas que poderão optar por essa mudança em seu registro civil também não precisarão obter autorização judicial para essa alteração; tal ato poderá ser realizado de forma menos burocrática, em cartório. Tal decisão representa um verdadeiro avanço social no que diz respeito à herança heteronormativa pátria, que associa estritamente o gênero ao sexo.

Há uma associação automática dos seres humanos a partir do sexo com o qual nascem, atribuindo-lhes prontamente determinado gênero - masculino ou feminino. Tal binarismo provém do modelo cultural hodierno, que associa a divisão biológica dos sexos às funções que os indivíduos devem ter dentro da sociedade. A construção em torno do gênero é, dessa forma, um produto histórico social, envolto em símbolos e conceitos associados à perspectiva cultural humana - e não somente biológica(3). Como um paradigma histórico-social edificado historicamente, baseado em preceitos culturais (com traços religiosos marcantes), o conceito de gênero acabou sendo revisitado, recebendo hodiernamente uma série de críticas à sua concepção original e estanque.

Nas últimas décadas, cresceu a discussão em torno de tais conceitos, opondo-se uma série de críticas ao formato estanque e conservador atribuído ao gênero. Nesse prisma, reflexões de autoras ligadas a Movimentos LGBTTT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneras), como Kristen Schilt(4), Judith Butler(5)e Berenice Bento(6), foram importantes para ampliar o conceito de gênero para além da ideia de determinismo biológico relativa ao sexo. Neste sentido, identidade de gênero diz respeito ao gênero com o qual a pessoa se identifica enquanto sujeito, o que nem sempre se coaduna com o gênero que lhe fora atribuído quando do seu nascimento.(7)

Inexoravelmente, a formação cultural da população fornece elementos concisos para que as pessoas transgêneras sejam vistas como uma ameaça ao estereótipo de ser humano ideal. A formação original da sociedade brasileira, com eminente influência cristã, propõe dogmas religiosos e sociais que delimitam estritamente os papéis tradicionais do masculino e do feminino na sociedade.(8) Tudo isto conflui para que haja uma repressão à população transgênera de modo frontal e explícito; a própria família da pessoa transgênera, em muitos casos, nega à transgênera a afetividade e o acolhimento, relegando-o a uma situação de esquecimento:

Procurei minha família, fui rejeitada pelos meus irmãos lá do Maranhão, em 2008. O preconceito começa pela própria família. Colocaram-me para fora de casa! Ninguém quer aceitar a condição de eu ser trans. Na cabeça da família da gente, você é homem e não deixa de ser homem, não tem essa mentalidade de aceitar a sua orientação sexual, fui humilhada! (Relato da participante 3)(9)

Nessa vertente, o processo de aceitação da pessoa transgênera é, também, difícil e doloroso. O contexto social no qual a pessoa transgênera vivencia as suas experiências acaba por introjetar mentalmente o ideal de correção humana associado à sinergia entre o seu sexo, o seu gênero e a sua orientação sexual. Qualquer formato que promova elementos desviantes deste prisma provoca não somente uma repressão social externa, mas igualmente a negação interna inconsciente deste contexto em grande parte dos casos - provocando sofrimento e confusão, até que o processo de autoentendimento esteja completo. A superação dos estigmas inerentes ao rompimento com o quadro normalizador(10), que cria seres humanos abjetos e que exclui e subalterniza grupos de indivíduos inteiros, é árduo e complexo. Retratando o presente quadro, a entrevistada Ominira discorre sobre sua trajetória de aceitação:

Até hoje não sei quando passei a me perceber diferente do meu sexo biológico. A grande questão foi como as pessoas me percebiam, sempre senti que o modo como elas me percebiam/percebem foi e é diferente do que quero mostrar a elas. Tive o primeiro contato com a transgeneridade aos 16 anos e neguei-a até os 19, momento de conciliação de meus desejos.

Há em evidência um quadro de violência em relação às pessoas transgêneras, que se revela não somente no contexto psicológico, mas igualmente físico. A perpetuação do viés cultural patriarcal cristão, que exclui possibilidades alternativas à heteronormatividade(11), é um elemento propulsor do impulso colonial assassino sobre os corpos das pessoas transgêneras no Brasil. Tais caracteres fazem com que o país seja líder mundial no ranking de assassinatos de pessoas transgêneras(12), evidenciando a danosidade desse contexto histórico que permanece alastrado culturalmente na contemporaneidade.

Diante deste quadro, a população transgênera sofre, inexoravelmente, uma série de ataques sociais constantes, sejam eles psicológicos e/ou físicos. Este claro retrato de violência simbólica(13) gera, entre as pessoas transgêneras, um constante temor, medo e apreensão, que se somam ao sentimento de dúvida, confusão e autoquestionamento, inerente ao conflito interno pelo qual tal população perpassa. O auxílio psicossocial é, nesse sentido, essencial para que tais sujeitos possam manter a sobriedade e o equilíbrio necessários para manter a sanidade mental em ordem. Sobre a temática, Ominira entoa:

(...) tenho sido acompanhada por uma psicóloga há quase um ano e digo... acompanhamento psicológico é fundamental pra qualquer pessoa, mas para pessoas trans a necessidade é absurda... é foda lidar com tanta coisa sozinha, uma ajuda profissional é indispensável. É importante salientar que a profissional que me acompanha não trabalha em uma perspectiva patologizante da minha condição, inclusive super me apoia na luta da despatologização trans!

Emerge, neste panorama de violência, exclusão e repressão, um profundo debate no campo jurídico acerca da legitimidade da alteração do nome e do sexo nos documentos de identificação civil, sem que seja necessária a cirurgia de redesignação sexual. É preciso, nesse contexto, avaliar os elementos que revestem a noção da transexualidade como estritamente associada ao contexto de intento de alteração corporal e genital. Além disso, há que ser analisadas as dificuldades e barreiras no processo de feitura de tal procedimento cirúrgico, diante da realidade do sistema de saúde público brasileiro.

3. A cirurgia para redesignação sexual

A decisão do Supremo Tribunal Federal se coaduna com a realidade que as pessoas transgêneras enfrentam para conseguir passar pela cirurgia de redesignação sexual. No Brasil, o SUS (Sistema Único de Saúde), regido pela Portaria 2.803 de 2013 do Ministério da Saúde, realiza o referido procedimento, oferecendo gratuitamente a cirurgia de transgenitalização; de mastectomia (retirada de mama); plástica mamária reconstrutiva (incluindo próteses de silicone); cirurgia de tireoplastia (troca de timbre de voz) e redução da proeminência laríngea presente nos homens (mais conhecida como pomo de adão). Contudo, para que todos estes procedimentos sejam eficazes, é imprescindível que o tratamento continue alinhado com uma equipe multidisciplinar em várias especialidades de profissionais (endocrinologistas, assistente social, cirurgião plástico), com terapia hormonal, acompanhamento psicológico e atendimento ambulatorial.

Em que pese a gratuidade do procedimento pelo SUS (se particular, somente a cirurgia de redesignação sexual custaria em torno de R$ 30.000,00), o que o torna desacreditado e desanimador é o longo tempo de espera. Há relatos de pessoas que, entre consultas, exames e acompanhamentos, estão aguardando a cirurgia há mais de dez anos, em filas de espera que possuem centenas de candidatas.(14)Tal quadro se acentua na medida em que se depreende que existem poucos centros no país que estão aptos a realizar tais procedimentos cirúrgicos pelo sistema público de saúde,(15) fato que possui poucas possibilidades de alteração tendo em vista os recursos escassos e limitados disponibilizados para o próprio SUS. Depreende-se o mesmo raciocínio no voto proferido pela Ministra Rosa Weber, no julgamento da ADI 4.275/DF:

Como amplamente debatido nesse Colegiado, a intervenção cirúrgica envolve complexidades de alto risco e gravidade tanto na fase do procedimento quanto na recuperação, sendo que o seu alto custo, ou limitada disponibilidade pelo Sistema Único de Saúde, inviabilizam o exercício do direito à autodeterminação e identidade, motivo pelo qual não há como exigir a submissão do recorrente a essa intervenção médica para adequação do sexo biológico ao psicossocial, como premissa necessária para obtenção da alteração do registro civil.(16)

A cirurgia de redesignação sexual se caracteriza como um procedimento demorado e delicado, que invariavelmente não se coloca como possibilidade que está prontamente à disposição da pessoa transgênera. Mais do que isso, a caracterização da pessoa transgênera não está necessariamente associada ao desejo de realização da cirurgia de transgenitalização; o conceito que abarca a pessoa transgênera inclui o eventual desejo de realização do referido procedimento, mas esta não é uma exigência para a sua caracterização. Dentro desse quadro, analisa-se a conceituação da transexualidade:

Transexualidade: contexto vivencial que se refere a um indivíduo com identidade de gênero caracterizada por uma postura afirmativa de autoidentificação, solidamente construída e confortável nos parâmetros de gênero estabelecidos (masculino ou feminino) independente e soberano aos atributos biológicos de nascença sexualmente diferenciados. Essa afirmativa consolidada traduz-se numa não identificação com esses atributos e pode, eventualmente, se transformar em desconforto ou estranheza diante dos mesmos, a partir de condições socioculturais adversas ao pleno exercício da vivência da identidade de gênero constituída. Isso pode se refletir na experiência cotidiana de autoidentificação ao gênero feminino - no caso das mulheres que vivenciam a transexualidade (que apresentam órgãos genitais classificados como masculinos no momento em que nascem), e ao gênero masculino - no caso de homens que vivenciam a transexualidade (que apresentam órgãos genitais classificados como femininos no momento em que nascem). A transexualidade também pode, eventualmente, contribuir para o indivíduo que a vivencia objetivar alterar cirurgicamente seus atributos físicos (e até genitais) de nascença para que os mesmos possam ter correspondência estética e funcional à vivência psicoemocional da sua identidade de gênero vivencialmente estabelecida.(17)

A questão acerca da necessidade da realização da cirurgia de transgenitalização para que a pessoa transgênera possa ter o seu nome e o seu sexo modificados em seu registro civil é polêmica. As cirurgias de transgenitalização já foram até mesmo consideradas como crime, caracterização essa retirada pelo Conselho Federal de Medicina em 1997(18). Tal problemática coloca em evidência a noção biológica, social e cultural do que é originalmente ser mulher em nossa sociedade. É preciso, nesse sentido, refletir criticamente acerca deste paradigma feminino, vinculado simbolicamente a determinado corpo, estética, modo de agir e órgãos genitais. Somente através da superação destes dogmas, que promovem estereótipos fechados acerca do conceito de mulher no campo social, é que será possível abraçar de modo pleno o contexto de luta política das pessoas transgêneras.(19)

Nesse cenário, a entrevistada Ominira coloca justamente em evidência tais relações de imposição estética e comportamental. A perspectiva contida em seu relato revela, por certo, a consciência de si e do mundo desenvolvida ao longo da sua trajetória de vida. Há a denúncia clara dos estereótipos excludentes criados pela sociedade em relação ao diverso, ao diferente, que foge dos padrões impostos cultural e socialmente. Nessa seara, ao ser questionada sobre o seu desejo em realizar a cirurgia de redesignação sexual, Ominira responde negativamente, indicando a necessidade de adequação da própria sociedade ao seu eu - e não o contrário:

No momento não [não penso em fazer a cirurgia]... não é algo que esteja em meus planos... como já diz Laerte [Coutinho, cartunista e chargista brasileira], as pessoas precisam se acostumar com o fato de existirem mulheres de pinto hahahaha [risos] pois é verdade. Já pensei em colocar seios, se um dia for rica coloco hahaha [risos].

É mister, portanto, desmistificarmos o comportamento de gênero que uma pessoa desempenha na sociedade, como quando atribuímos que uma mulher que não seja vaidosa e que goste de esportes violentos é, sem dúvida, lésbica e "menos mulher" que uma outra que tenha comportamento contrário. Tais estereótipos, que foram socialmente disseminados ao longo da história, são excludentes e homogeneizantes; tudo o que foge ao padrão imposto é um desvirtuamento do considerado correto(20). Levando-se tal debate para uma outra via, seria semelhante a dizer que mulheres que passaram por algum tipo de procedimento médico para retirada de partes do corpo (como a histerectomia ou a mastectomia) são "menos" mulheres do que aquelas que possuem todos os órgãos biologicamente pertencentes a uma mulher.

Assim sendo, percebe-se que a atribuição intencional de estereótipos na sociedade se converte em uma ferramenta de violência simbólica contra as pessoas transgêneras, que não se enquadram no padrão criado culturalmente. A identidade feminina transcende a matéria corpórea da mulher, existindo de modo independente aos caracteres fenotípicos que a mulher possa ter. Nesse sentido, é perfeitamente compreensível que a mulher transgênera possa se adequar aos traços que compõem o seu corpo - caracterizado socialmente como masculino -, muito embora a visão externa seja frequentemente um elemento repressor. Assim sendo, para a entrevistada Ominira:

A questão do meu sexo biológico, corpo cheio de testosterona, ombros largos, pelos, não me incomodam, desde que uma pessoa consiga me ler enquanto mulher nessas minhas características. Mas algumas pessoas, mesmo contando que sou uma mulher, não conseguem me perceber como tal (justamente por esses traços identificados enquanto "masculinos"). Esse meu corpo acaba por me incomodar. Mas, ao mesmo tempo, meu cabelo, minha voz, minha barba, meus músculos, minha alma, minha delicadeza bruta, meu desajeito, meus ombros largos, minha falta de silhueta, minha mão, o meu amor... principalmente o meu amor por cada parte de mim me fazem ser mulher. Sobre o fato de não ter útero, isso não me incomoda, muito menos me dá um sentimento de ser menos mulher que alguém. Compreendo que nós, mulheres trans experimentamos a feminilidade de um modo diferente das mulheres cis, pois passamos por diferentes opressões, sofremos de coisas diferentes, até a misoginia que sofremos é diferente, pelo menos em meu ponto de vista - de uma pessoa que não tem passabilidade cis, claro.

Desta feita, depreende-se que a decisão do Supremo Tribunal Federal foi acertada, ao desvincular a existência de uma pessoa transgênera à cirurgia de redesignação sexual. Muito embora haja comumente o desejo das pessoas transgêneras de readequar os seus traços físicos ao gênero com o qual o indivíduo se identifica, realizando-se então a cirurgia de redesignação sexual, esta não é uma regra compulsória. A identificação com um gênero diverso ao qual o sujeito foi qualificado ao nascer e, consequentemente, o posterior desejo de realizar a cirurgia de transgenitalização ou não, são elementos que compõem o direito à autodeterminação de cada pessoa, sendo dever do Estado garantir a possibilidade efetiva de escolha do modelo de vivência que melhor aprouver ao cidadão - sem quaisquer imposições arbitrárias.

4. Uma análise da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.275/DF

Percebe-se, ao longo dos últimos anos, paulatinas conquistas em relação aos direitos da população LGBTTT, com o consequente reconhecimento estatal de garantias jurídicas que envolvem tais pessoas. A mais conhecida delas talvez seja a oriunda do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.277/DF e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 132/RJ pelo Supremo Tribunal Federal, que reconheceram a legalidade das uniões civis de pessoas do mesmo sexo.(21) Não obstante a pressão conservadora exercida por grupos de caráter religioso em relação à referida decisão, o direito de constituição da união civil foi assegurado juridicamente para os casais homossexuais.

Algumas dessas conquistas abordam, em específico, o direito de utilização do nome social de pessoas transgêneras. Nesse sentido, podemos citar a Resolução nº 12, de 16 de janeiro de 2015 que reconhece e adota o uso do nome social pelas instituições e redes de ensino. Há a adoção do nome social também nas provas do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) desde 2014, bem como em concursos públicos (a exemplo do TRE/BA 2017, TRF1 2017) e o uso de crachás com o nome social por funcionários/as em algumas repartições públicas instituído pelo decreto nº 8.727, de 28 de abril 2016, que dispõe sobre o uso do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero das pessoas travestis e transexuais no âmbito da administração pública federal direta autárquica e fundacional (tais como ministérios, universidades federais e empresas estatais). O referido decreto fora sancionado pela então Presidenta da República Dilma Roussef, publicado em 29 de abril de 2016, sendo que seu art 3º teve sua vigência um ano após a publicação e os outros demais artigos começaram a vigorar na data da publicação do decreto.

Dois anos antes, em 2014, o Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão da Universidade Estadual do Piauí - UESPI estabeleceu, através da Resolução nº 056/2014, a possibilidade do uso do nome social por travestis e transexuais naquela instituição. No Rio de Janeiro, desde 06/2011, foi concedido o direito às transexuais e travestis a usarem o nome social em todos os órgãos de administração pública direta e indireta do estado. A instrução normativa nº 1718/2017 de 18 de julho de 2017, emitida pela Receita Federal do Brasil, em seu artigo 1º, altera a disposição do artigo 9º da Instrução Normativa nº 1548 de 13 de fevereiro de 2015, considerando ser possível a inclusão ou exclusão do nome social no CPF de pessoas travestis ou transexuais. Em 17 de janeiro de 2018 o ministro da Educação, Mendonça Filho, homologou resolução que autoriza o uso do nome social nos registros escolares da educação básica. Estes são alguns exemplos de resoluções, instruções, decretos e decisões que impulsionaram a confirmação da adoção do nome social por parte do STF. Com tantas decisões já acolhidas com este objeto de discussão, a tendência é que outros órgãos, partindo desta decisão em diante possam seguir a mesma lógica. O Tribunal Superior Eleitoral brasileiro, por exemplo, em março de 2019, após a publicação da decisão do STF, já informou que eleitores transexuais e travestis podem solicitar a inclusão de seu nome social no título de eleitor e no caderno de votação das eleições.

Deputados Federais como Marco Feliciano (PSC-SP à época), Ezequiel Teixeira (SD-RJ à época), Jair Bolsonaro (PP-RJ à época) e outros parlamentares federais da chamada "bancada evangélica" do Congresso Nacional brasileiro foram totalmente contra a decisão, incentivando, num outro giro, a expansão da ideologia denominada "cura gay". A referida perspectiva psicológica, que também é conhecida como terapia da reorientação sexual, terapia de conversão ou, ainda, terapia reparativa, refere-se à homossexualidade como sendo uma doença, propondo tratamento psicológicos, médicos e religiosos com o intuito de extinguir esta suposta patologia de determinado indivíduo.(22)

Felizmente, na contramão de tais parlamentares, a partir da provocação da comunidade LGBTTT e da emocionante sustentação oral feita pela primeira advogada transgênera da região sul do Brasil a subir na tribuna do STF, Gisele Alessandra Schmidt e Silva, o Supremo Tribunal Federal pôde, enfim, confirmar a decisão ora discutida neste artigo. É importante destacar a coerente fala do procurador Geral da República à época, Rodrigo Janot a este respeito: "Condicionar a realização de tal procedimento médico à alteração do registro civil, ainda que de modo indireto, vai de encontro, dentre outros, ao direito à vida, à saúde, à dignidade da pessoa humana, ao reconhecimento, à liberdade, à privacidade, à não discriminação".(23) Ainda nesse quesito e explicitando a necessidade de superação da discriminação e do preconceito em relação às pessoas LGBTTT - em especial, às pessoas transgêneras - o Ministro Celso de Mello declarou:

É preciso conferir ao transgênero um verdadeiro estatuto de cidadania, pois ninguém, absolutamente ninguém, pode ser privado de direitos nem sofrer quaisquer restrições de ordem jurídica por motivo de identidade de gênero. Isso significa que os transgêneros têm a prerrogativa, como pessoas livres e iguais em dignidade e direitos, de receber a igual proteção das leis e do sistema político-jurídico instituído pela Constituição da República, mostrando-se arbitrário e inaceitável qualquer estatuto que exclua, que discrimine, que fomente a intolerância, que estimule o desrespeito e que desiguale as pessoas em razão de sua identidade de gênero.(24)

É inegável o avanço promovido pela decisão do Supremo Tribunal Federal em sede da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.275/DF. A possibilidade efetiva de alteração do nome e do sexo nos registros civis das pessoas transgêneras é um direito que cabe ao Estado brasileiro assegurar, conforme a análise dos dispositivos jurídicos em confronto com os princípios constitucionais. Mais do que isso, o julgamento se revestiu como afirmação do direito à autodeterminação da população transgênera, que deve possuir plena liberdade para o exercício da sua identidade pessoal e sexual sem que seja imposto institucionalmente qualquer óbice a esta forma de vivência.

A desnecessidade da realização da cirurgia de transgenitalização e/ou da decisão judicial para que o registro civil das pessoas transgêneras seja alterado é, nessa seara, consequência inata do direito à dignidade da pessoa humana. Tal direito humano possui entre os seus pilares o respeito à autonomia ética do ser humano, que impõe ao Estado e à sociedade a valorização do livre desenvolvimento da vivência de cada sujeito.(25) O debate versou, além disso, acerca da necessidade de requisitos estatais para identificação das pessoas transgêneras, a partir do acompanhamento de uma junta multidisciplinar por cerca de dois a três anos - posição esta que, inclusive, foi abraçada por parcela minoritária dos Ministros do Supremo.

O voto proferido pelo Ministro Edson Fachin foi determinante para avançar nesta questão. O referido Ministro abarcou argumentos baseados na legislação internacional de direitos humanos e em seus respectivos órgãos de defesa, como a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Além de proibir expressamente qualquer modalidade de prática discriminatória baseada na orientação sexual, identidade de gênero ou expressão de gênero da pessoa, a Corte afirma ser consequente obrigação dos Estados retirar quaisquer óbices ao integral exercício destes caracteres pelos indivíduos, não prejudicando assim a autonomia ética e a liberdade privada de cada sujeito. Nesses termos:

Tais obrigações se justificam na medida em que a identidade de gênero é manifestação da própria personalidade da pessoa humana e, como tal, cabe ao Estado apenas o papel de reconhecê-la, nunca de constituí-la. Ademais, se ao Estado cabe apenas o reconhecimento, é-lhe vedado exigir ou condicionar a livre expressão da personalidade a um procedimento médico ou laudo psicológico que exijam do indivíduo a assunção de um papel de vítima de determinada condição. Noutras palavras, a alteração dos assentos no registro público depende apenas da livre manifestação de vontade da pessoa que visa expressar sua identidade de gênero. A pessoa não deve provar o que é e o Estado não deve condicionar a expressão da identidade a qualquer tipo de modelo, ainda que meramente procedimental.(26)

Assim, firmou-se o entendimento de que não seria razoável exigir a submissão das pessoas transgêneras a uma avaliação clínica para que tais sujeitos fossem considerados pelo Estado com um gênero distinto daquele ao qual fora caracterizado no seu nascimento. Tal obrigatoriedade, do mesmo modo que a exigência da cirurgia de transgenitalização e da autorização judicial, nega às pessoas o seu direito à autodeterminação, retirando-lhes a prerrogativa de definição sobre sua própria identidade. Ao ser questionada sobre a repercussão da decisão do Supremo Tribunal Federal acerca da sua autonomia identitária, Ominira declarou:

Nossa, faz toda a diferença! Por vários motivos... primeiro que o processo transexalizador do SUS só é permitido através de um laudo psiquiátrico - o que é uma merda! Você precisa da outorga de uma outra pessoa pra ser quem você é, ou melhor, a pessoa é quem vai decidir se você é trans ou não... percebe a gravidade disso? É um poder em várias camadas sobre os corpos trans. Outra que várias pessoas trans não querem passar por cirurgia alguma, justamente por entender que seu corpo pode ser vivido de diversas maneiras. Quando você pode decidir sobre você, tudo muda... a percepção que você tem sobre si muda, a percepção das pessoas sobre a comunidade trans muda... isso nos fortalece. Outro beneficio dessa decisão é que a troca de documento sempre foi muito burocrática e feita por profissionais despreparados, o que gerava uma par de transtornos para as pessoas que requeriam esse direito; com essa decisão, o caminho se encurta, se facilita!

5. Um estudo comparado: legislações e decisões na Europa

A decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal vem a consolidar o entendimento adotado por diversas outras nações em relação à alteração do registro das pessoas transgêneras no mundo, no sentido de retirar a exigência, para tanto, da cirurgia de transgenitalização e de quaisquer outras imposições legais que violem a sua dignidade. Seja através dos Tribunais Constitucionais ou por meio da edição de leis, uma série de países retiraram as barreiras jurídicas para a retificação legal dos registros públicos das pessoas transgêneras.

Na Europa, a questão avançou significativamente a partir da decisão da Corte Europeia de Direitos Humanos no caso B. v. França, julgado em 1992. Na decisão proferida, a Corte entendeu que a França falhou em reconhecer o direito da pessoa transgênera à alteração do seu registro de nascimento. O direito à alteração dos registros públicos é, segundo a Corte, garantia do art. 8 da Convenção Europeia de Direitos Humanos, que aduz que "todos devem ter o direito de serem respeitadas a sua privacidade e a sua vida familiar, seu lar e sua correspondência"(27) (tradução nossa).

No entanto, não há um consenso quanto à obrigatoriedade do cumprimento de requisitos para que a alteração dos registros civis das pessoas transgêneras seja efetivada. Enquanto alguns países adotam o formato de autodeterminação - como a Irlanda e a Bélgica(28) - outras nações europeias insistem em exigir das pessoas transgêneras condições médicas específicas para o reconhecimento do direito civil à alteração dos registros públicos, como cirurgia de redesignação sexual, esterilização e alterações hormonais - é o caso da República Tcheca e da Finlândia.(29)

A regulação institucional da matéria na Alemanha cabia à Transsexual Law, de 1980. Entretanto, o reconhecimento do gênero e a alteração dos registros civis eram condicionados ao cumprimento de diversos requisitos fáticos, entre os quais: a) a vivência como o gênero com o qual se identifica por um período mínimo de três anos; b) o desejo de não retorno ao gênero anterior; c) ser um cidadão alemão ou ser enquadrado como; d) não ser casado; e) ser incapaz de se reproduzir de forma permanente; e) ter realizado a cirurgia de transgenitalização.(30)

As excessivas exigências para a obtenção do reconhecimento do gênero da pessoa por parte do Estado constituem uma efetiva barreira institucional ao direito à autodeterminação dos indivíduos, em um panorama no qual o Estado investe a si mesmo na tarefa de caracterizar o que os indivíduos são ou não são. Tal reflexão foi exercitada pelo Tribunal Constitucional Federal da Alemanha, que determinou em 2008 a inconstitucionalidade dos referidos dispositivos da Transsexual Law.(31) Ainda assim, manteve-se o padrão de caracterização das pessoas transgêneras centrado no critério judicial anteriormente existente.

No Reino Unido, o "certificado de reconhecimento de gênero" (no original, gender recognition certificate) é um direito civil concedido pelo Gender Recognition Act, de 2004. Tal legislação foi construída pelo Parlamento inglês após longos anos de debates e de litigância junto à Corte Europeia de Direitos Humanos, na qual o julgamento do caso Goodwin v. United Kingdom, de 2002,(32) foi crucial. Desde então, o Reino Unido adota procedimentos de reconhecimento dos direitos de alteração de registros civis das pessoas transgêneras.

Não obstante, os governantes do Reino Unido já reconhecem a necessidade de revisar a referida lei, de modo a anunciar uma consulta pública com a população britânica acerca dos quesitos que deveriam ser alterados na Gender Recognition Act de 2004. Uma série de fatores ainda são postos em questionamento pela população transgênera britânica, como a proibição irrestrita da alteração dos registros públicos para as pessoas que ainda não alcançaram os 18 anos de idade, além do não reconhecimento por parte do Estado da identidade não-binária dos sujeitos.(33)

O exemplo do Reino Unido é interessante para perceber o avanço no quesito de pleito em relação aos direitos das pessoas transgêneras de alteração de registros civis em relação ao Estado, que é feita de modo administrativo. A desburocratização do procedimento estatal para a adequação dos registros públicos, nesse sentido, viabiliza o direito da população transgênera; requerer um procedimento judicial para efetivar estas mudanças legais acaba por impor às pessoas transgêneras barreiras desnecessárias e excludentes ao referido pleito.

O excesso de formalismo legal, os custos necessários à contratação de um defensor jurídico e a submissão ao juízo de convicção do magistrado - que pode ser adepto de crenças contrárias à manifestação transgênera - podem afastar pessoas transgêneras da realização do referido pleito. Na Polônia, por exemplo, a requisição de alteração de registros públicos das pessoas transgêneras deve listar pessoas que comprovem vivência com a condição transgênera do sujeito. Na prática, obriga-se a pessoa transgênera a nomear membros familiares para participar do referido ato de reconhecimento estatal - no qual os conflitos familiares podem ser acirrados, pelos membros que discriminam a pessoa transgênera, colocando-a em uma vexatória e humilhante situação.(34)

Ante a análise da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal brasileiro em comparação com a legislação e com as decisões judiciais proferidas na Europa, conclui-se que o procedimento jurídico edificado no Brasil é bastante progressista. As discussões entre os Ministros do STF percorreram, de fato, a possibilidade de adotar requisitos de aferição para o reconhecimento estatal da pessoa transgênera - como laudos médicos, período de vivência no gênero identificado, necessidade de decisão judicial. Na decisão majoritária, entretanto, prevaleceu entendimento judicial que melhor se coaduna com os valores da dignidade humana e autodeterminação dos indivíduos, disciplinando o pleito via procedimento administrativo e, ainda, com a exclusão de requisitos arbitrários de aferição da condição transgênera.

6. Considerações finais

A base cultural de determinada população cultiva práticas de vida que, de certo modo, homogeneízam padrões de comportamento. A herança cultural transmitida ao longo do tempo entre as/os cidadãs/ãos acaba por formatar visões de mundo que indicam modelos de vivência como corretos e errados, criando estereótipos acerca do chamado bem viver. No momento em que tais padrões culturais são influenciados por preceitos oriundos de seitas religiosas, este quadro é acentuado significativamente. A religião, como senso baseado na crença abstrata e metafísica - é preciso acreditar, mesmo sem contraprestações empíricas - abraça uma série de padrões comportamentais sem que haja uma motivação racional para tanto.

Há, nesse sentido, uma histórica naturalização dos preconceitos que foram construídos por uma população em específico, frutos da cultura dominante em relação aos seus cidadãos. Toda forma de rompimento com este padrão majoritário é configurada como uma ofensa ao modo de vida ideal e correto, passando a ser vista como prática atentatória à via boa. Nesse quadro, verifica-se a imposição cultural do modelo heterossexual monogâmico cristão dentro da sociedade brasileira, que consequentemente propõe a exclusão das formas de sexualidade avessas a este paradigma.

Nessa esteira, evidencia-se a luta da população LGBTTT pelo seu espaço social, em um contexto de afirmação do seu modo de vida. Alvos do preconceito e discriminação social pelo formato de sexualidade que praticam socialmente, tais grupos sociais adentram o debate público visando alcançar o entendimento social não somente pela aceitação da diferença, mas igualmente pela sua valorização. É preciso, nesse sentido, adequar o pensamento social da parcela da população que dissemina o preconceito, além de alterar os dispositivos jurídicos que neguem as alternativas de vivência contra-majoritárias, auxiliando a promoção efetiva dos direitos dos grupos marginalizados socialmente e a sua luta por reconhecimento.(35)

Seguindo tais preceitos, a decisão do Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.275/DF se consagra como um veículo de reconhecimento efetivo da vivência da população transgênera na sociedade pátria, removendo a discriminação oriunda dos próprios órgãos e veículos institucionais, abrindo o caminho para a alteração do nome e do sexo nos registros públicos das pessoas transgêneras. Este ato simboliza a valorização do formato de existência das pessoas transgêneras, demonstrando para a sociedade que todo e qualquer preconceito direcionado para estes sujeitos está em desacordo com as garantias que a Constituição Federal de 1988, vez que a pluralidade de formas de vida e a autodeterminação dos indivíduos são valores abarcados pela Carta Magna.

Nessa vertente, a entrevistada Ominira expõe o seu relato acerca da identificação e valorização do seu corpo, contrastando o seu biótipo e os seus traços com a necessidade social de alteração para adequação dentro de estereótipos edificados historicamente. A configuração anatômica do seu corpo é uma característica que cabe somente à entrevistada avaliar se está ou não em conformidade com a sua realização pessoal; não cabe, pois, ao Estado determinar arbitrariamente acerca da necessidade ou não de mudança (redesignação sexual) para que as pessoas transgêneras possam ser amparadas pelas instituições públicas. Ominira discorre sobre como se sente enquanto mulher transgênera, indicando sobre a sua esperança diante de um futuro que parece, aos poucos, ir abrindo espaço para as pessoas trans:

(...) apois tá tudo tão delícia que vou fazer um ensaio fotográfico de meu querido corpo hahahahahaha [risos]. Quem foi naninha [expressão baiana, referente a uma prática social que a pessoa deixou de realizar] com vergonha até da própria sombra ahahahaha [risos]. Sem mais, despatologização trans já!

Trata-se de uma urgente mudança em olhar com maior atenção para as questões de gênero, de orientação sexual e de direitos humanos - não somente pelo Estado, mas por toda a sociedade brasileira. A referida decisão segue um caminho profícuo dentro da sociedade para combater o preconceito e a discriminação, reconhecendo a diversidade de formas de vida e garantindo direitos para a população subalternizada historicamente. A referida vitória deverá ser certamente comemorada; entretanto, o projeto para a consecução integral dos direitos das pessoas transgêneras - e não somente delas, mas de toda a população oprimida - ainda está em curso e prescinde, pois, de muitas outras batalhas sociais, políticas e jurídicas a serem travadas e vencidas.

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1Ominira significa "liberdade, invenção, criação", segundo a nomenclatura Yorùbá. O relato de entrevista foi coletado no dia 6 de junho de 2018.

2SANTOS, T.F.S.; MARTINELLI, M.L. A sociabilidade das pessoas travestis e transexuais na perícia social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, n. 134, pp. 142-160, jan./abr. 2019. Ver também: POMPEU, Ana. STF autoriza pessoa trans a mudar nome mesmo sem cirurgia ou decisão judicial. Consultor Jurídico, 1 mar. 2018.

3BENEDETTI, M.R. Toda feita: o corpo e o gênero das travestis. Rio de Janeiro: Garamond, 2005.

4WESTBROOK, L.; SCHILT, K. Doing gender, determining gender: transgender people, gender panics, and the maintenance of the sex/gender/sexuality gender. Gender & Society, v. 28, n. 1, pp. 32-57, 2014.

5BUTLER, J. Undoing gender. London: Routledge, 2004.

6BENTO, B. Transviad@s: gênero, sexualidade e direitos humanos. Salvador: EDUFBA, 2017.

7SILVA, R. G. L. B.; BEZERRA, W. C.; QUEIROZ, S. B.. Os impactos das identidades transgêneros na sociabilidade de travestis e mulheres transexuais. Revista de Terapia Ocupacional da Universidade de São Paulo, v. 26, n. 3, pp. 364-372, set./dez. 2015.

8ROTONDANO, R.O. Investigando a herança cultural-religiosa brasileira: a dificuldade em instituir um Estado plenamente laico. Revista do Direito Público, Londrina, v. 8, n. 2, pp. 221-238, mai./ago. 2013.

9SILVA, R. G. L. B.; BEZERRA, W. C.; QUEIROZ, S. B.. Os impactos das identidades transgêneros na sociabilidade de travestis e mulheres transexuais. Revista de Terapia Ocupacional da Universidade de São Paulo, v. 26, n. 3, pp. 364-372, set./dez. 2015, p. 368.

10MISKOLCI, R. A teoria queer e a sociologia: o desafio de uma analítica da normalização. Sociologias, v. 11, n. 21, pp. 150-182, 2009.

11MÉLLO, R.P. Corpos, heteronormatividade e performances híbridas. Psicologia & Sociedade, v. 24, n. 1, pp. 197-207, 2012.

12CUNHA, T. Brasil lidera ranking mundial de assassinatos de transexuais. Correio Braziliense, s/d. Ainda nesse sentido: BOND, L. Brasil registrou 124 assassinatos de pessoas transgênero em 2019. Portal EBC - Agência Brasil, São Paulo, 29 jan. 2020.

13CARRIERI, A. P.; SOUZA, E. M.; AGUIAR, A. R. C.. Trabalho, violência e sexualidade: estudo de lésbicas, travestis e transexuais. Revista de Administração Contemporânea, Rio de Janeiro, v. 18, n. 1, pp. 78-95, 2014, p. 82.

14VILLELA, S. Fila de espera para mudança de sexo em ambulatório do Nordeste chega a 13 anos. Portal EBC - Agência Brasil, Recife, 9 abr. 2017. Nesse mesmo sentido, ver também: PALHARES, I.; DIÓGENES, J. Mudança de sexo demora até 12 anos no Brasil. O Estado de São Paulo, São Paulo, 28 mai. 2016.

15VIANA, L. Como funciona o SUS para pessoas transexuais? Portal Drauzio Varella, s/d.

16BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.275/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 1 mar. 2018, p. 83.

17ASSOCIAÇÃO Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais. Guia de Advocacy no Legislativo para Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (LGBT): Teoria e Ações Práticas nos Níveis Minicipal, Estadual e Federal. Curitiba: ABGLT, 2007, p. 11.

18CARVALHO, M. "Travesti", "mulher transexual", "homem trans" e "não binário": interseccionalidades de classe e geração na produção de identidades políticas. Cadernos Pagu, v. 52, pp. 33-67, 2018.

19CARRIERI, A. P.; SOUZA, E. M.; AGUIAR, A. R. C.. Trabalho, violência e sexualidade: estudo de lésbicas, travestis e transexuais. Revista de Administração Contemporânea, Rio de Janeiro, v. 18, n. 1, pp. 78-95, 2014.

20 DOUGLAS, M. Pureza e perigo. São Paulo: Editora Perspectiva, 1976.

21ROTONDANO, R.O. O reconhecimento jurídico da união homoafetiva no Brasil: ponderações filosófico-sociológicas. Cientefico, Fortaleza, v. 15, n. 30, pp. 29-44, jan./jun. 2015.

22Sobre a temática: MACEDO, C.M.R.; SÍVORI, H.F. Repatologizando a homossexualidade: a perspectiva de "psicólogos cristãos" brasileiros no Século XXI. Estudos e Pesquisas em Psicologia, Rio de Janeiro, v. 18, n. 4, pp. 1415-1436, 2018; GONÇALVES, A.O. Religião, política e direitos sexuais: controvérsias públicas em torno da "cura gay". Religião e Sociedade, Rio de Janeiro, v. 39, n. 2, mai/ago. 2019; TRINDADE, S.B. O discurso da "cura gay" nas igrejas neopentecostais. Reflexus, ano XIII, n. 22, pp. 531-552, 2019.

23RAMALHO, R. 'Estou fazendo história', diz 1ª advogada transexual ao subir à Tribuna do STF. Portal G1, Brasília, 7 jun. 2017.

24BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.275/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 1 mar. 2018, p. 122.

25SARLET, I.W. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. 9 ed.. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012.

26BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.275/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 1 mar. 2018, p. 38.

27European Court of Human Rights, B. v. France, Application n. 13343/87, Judgement of 25 mar. 1992.

28VAN DEN BRINK, M.; DUNNE, P. Trans and intersex equality rights in Europe - a comparative analysis. Luxembourg: Publications Office of European Union, 2018.

29DUNNE, P. Legal gender recognition in Europe: sterilisation, diagnosis and medical examination requirements. Journal of Social Welfare and Family, v. 39, n. 4, pp. 497-500, 2017. Ver também: DUNNE, P. Transgender sterilisation requiriments in Europe. Medical Law Review, v. 25, n. 4, pp. 554-581, 2017.

30KÖHLER, R.; EHRT, J.; RECHER, A. Legal gender recognition in Europe. Berlin: TGEU, 2013.

31INTERNATIONAL Bar Association. Mr. & Ms. X: the rights of transgender persons globally. London: International Bar Association, 2014.

32European Court of Human Rights, Christine Goodwin v. the United Kingdom, Application n. 28957/95, Judgement of 11 jul. 2002.

33DUNNE, P. Ten years of gender recognition in the United Kingdom: still a "model for reform"?. Public Law, pp. 530-539, 2015.

34VAN DEN BRINK, M.; DUNNE, P. Trans and intersex equality rights in Europe - a comparative analysis. Luxembourg: Publications Office of European Union, 2018.

35LOPES, J.R.L. O direito ao reconhecimento para gays e lésbicas. Revista Internacional de Direitos Humanos: SUR, v. 2, n. 2, pp. 64-95, 2005.

Recebido: 07 de Abril de 2020; Aceito: 15 de Julho de 2020

Correspondencia: Ricardo Oliveira Rotondano. Advogado. Doutor pela Universidade Federal do Pará (Brasil). Mestre em Direito pela Universidade de Brasília (Brasil). Email: rotondanor@gmail.com Naionara Maia Souza. Graduada em Letras pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. Graduanda em Direito pela Faculdade de Tecnologia e Ciências (UniFTC, Brasil). Email: negranai@hotmail.com Giovanna Almeida Armentano. Graduada em Pedagogía. Graduanda em Direito pela Faculdade de Tecnologia e Ciências (UniFTC, Brasil). Pós-graduada em Neuropedagogia e Psicanálise. Pós-graduanda em Direito Penal pelo Centro Universitário Leonardo da Vinci (UNIASSELVI). Email: giovannaarmentano@hotmail.com

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